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Linhas orientadoras na política Europeia de escassez e secas

LISTA DE VARIÁVEIS

1.4 Linhas orientadoras na política Europeia de escassez e secas

A Directiva Quadro da Água (2000/60/CE), em vigor desde Dezembro de 2000 constitui o principal documento de enquadramento legal no que toca à gestão de recursos hídricos na Europa, assumindo como objectivo principal o estabelecimento de um enquadramento de

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protecção das águas de superfície interiores, das águas de transição18, das águas costeiras e das águas subterrâneas. Para tal, esta directiva:

 preconiza a gestão integrada dos recursos hídricos ao nível da bacia hidrográfica;

 introduz a obrigação dos Estados-Membros criarem e aplicarem políticas coerentes e integradas para a gestão sustentável das águas, estabelecendo para isso as bases e o quadro institucional apropriado;

 assume como objectivo estabelecer um quadro comum no domínio da protecção das águas interiores, de superfície e subterrâneas, das águas de transição e das costeiras, visando prevenir a degradação e proteger a qualidade das águas;

 promove a utilização sustentável da água e contribui para a mitigação dos efeitos das cheias e das secas,

 privilegia os objectivos ambientais a cumprir a curto/médio prazo;

 promove a participação pública a todos os níveis.

Não obstante, no que, especificamente diz respeito às secas, verifica-se que estas situações são consideradas de excepção, segundo as referências no ponto 32 das considerações iniciais deste documento, bem como no artigo 1º, de definição do objectivo da directiva, e ainda no ponto 6 do artigo 4º, de definição dos objectivos ambientais. De facto, nas designadas situações de seca prolongada, os seus impactos poderão, mesmo, levar ao não cumprimento do bom estado ecológico das massas de água, sem que tal implique directamente a aplicação de sanções ao Estado-Membro em causa. Nessa linha, no ponto 6 do Art.º 4, é considerado que as condições de declaração de situação de seca prolongada deverão ser identificadas, a partir de indicadores apropriados, definidos nos Planos de Gestão das bacias hidrográficas e que as medidas de minimização a adoptar deverão, também, estar previstas nos Programas de Medidas, a incluir naqueles planos. Além disso, de acordo com as considerações do Anexo 6 da mesma directiva (com a lista de medidas a incluir naqueles programas, de acordo com as características e problemas da região) deverão ser utilizadas culturas agrícolas com baixas necessidades hídricas, nas regiões afectadas por situações de seca (Estrela et al, 2006).

As parcas referências às situações de seca desta directiva acabam por reflectir a própria abordagem de gestão de crise que, tradicionalmente foi sendo adoptada ao nível dos diferentes Estados-Membro da Europa. Porém, dada a crescente importância económica desses impactos, especialmente nas situações mais recentes (entre 2003 e 2005), as secas começaram a ser reconhecidas, na Europa, como um dos mais importantes desastres naturais, surgindo claramente identificado um novo conceito de gestão de situações de seca, integrado na análise e gestão de risco. Estes aspectos foram devidamente apontados pelo Water Scarcity Drafting Group da UE, um grupo de trabalho especificamente criado para avaliação da problemática de escassez e secas, em relatório elaborado em Junho de 2006, e dirigido ao Conselho de Ambiente da Comunidade Europeia. Neste documento são, então, advogadas (WSDG, 2006):

18 “Massas de água de superfície na proximidade da foz dos rios, que têm um carácter parcialmente salgado em resultado da proximidade de

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 uma gestão mais proactiva das situações de seca (com desenvolvimento de políticas e planos de acção de longo termo e estratégias de mitigação);

 a aposta nas medidas de prevenção e preparação (diminuição do risco e da vulnerabilidade, não descurando um planeamento de contingência);

 a elaboração de planos de gestão de seca, baseados em sistemas de previsão e monitorização.

No caso concreto dos planos de gestão de secas, refere-se a necessidade de estes surgirem devidamente enquadrados com os princípios de gestão da água preconizados na Directiva-Quadro da Água e, consequentemente, com os planos de gestão de bacia Hidrográfica, para os quais deverão ser definidos indicadores e valores característicos limite (atendendo às especificidades regionais), que permitam identificar os níveis de alerta e severidade de seca e auxiliar na selecção das medidas respectivas a aplicar (WSDG,2006).

Por outro lado, no que toca aos desequilíbrios verificados na utilização da água a longo prazo (caso da escassez), é apontada, na mesma avaliação (WSDG,2006), a importância da consideração da água como um recurso escasso e valioso que deverá ser gerido numa lógica de sustentabilidade de longo prazo, promovendo um equilíbrio da oferta e da procura e atendendo às necessidades específicas para a manutenção dos principais ecossistemas aquáticos.

Com base nesta avaliação, surgiu, na Europa, uma iniciativa de análise conjunta das situações de escassez de água e secas (EA&S), uma vez que estas devem ser consideradas como questões relacionais, embora diferenciadas. O processo incluiu duas fases de avaliação19 dos Estados-Membro, a primeira em Novembro de 2006 (DG Env EC, 2006) e, a segunda, em Junho de 2007 (DG Env EC, 2007).

Desse processo resultou, em Julho de 2007, uma comunicação da União Europeia - COM (2007) 414 final (CEC, 2007) definindo as principais orientações políticas, para acção futura. Estas orientações podem, então, ser individualizadas segundo o correspondente foco, orientado para a gestão de escassez, ou de secas ou comum a ambas (CEC, 2007):

Escassez de água

 Fixar um preço justo para a água;

 Atribuição mais eficiente da água e dos respectivos financiamentos através de: o melhor ordenamento do território;

o financiamento da eficiência hídrica.

 Consideração de infra-estruturas adicionais de abastecimento de água;

 Promoção de tecnologias e práticas com boa eficiência hídrica;

 Promover a emergência na Europa de uma cultura de poupança de água;

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Secas

 Melhor gestão dos riscos de seca através de: o desenvolvimento de planos de gestão de secas;

o desenvolvimento de um observatório e de um sistema de alerta precoce de secas; o optimização da utilização do Fundo de Solidariedade da UE e do Mecanismo

Comunitário de Protecção Civil. Comuns a ambos os fenómenos

 Aprofundamento dos conhecimentos e melhor recolha de dados através de: o um sistema de informação sobre a escassez e as secas na Europa; o oportunidades na investigação e desenvolvimento tecnológico.

Fruto destas orientações e, também, do destaque dado a esta temática durante a Presidência Portuguesa do Conselho da União Europeia, no segundo semestre de 2007, o Conselho de Ambiente da União Europeia apresentou as suas principais conclusões, em Outubro de 2007 (MAOTDR, 2007), relembrando que a problemática da EA&S tem impactos socioeconómicos e ambientais bastante relevantes na Europa, e que se espera que eventuais Alterações Climáticas tenham, também, considerável influência nesta temática, com impactos na quantidade e qualidade da água, também devido a uma provável maior frequência de ocorrência de eventos meteorológicos extremos, tais como cheias e secas.

Nesse sentido, reconhece-se (MAOTDR, 2007) que a gestão integrada de recursos hídricos deverá contribuir para a mitigação dos impactos dos problemas de EA&S e que a plena implementação da Directiva-Quadro da Água deverá ser uma prioridade. De facto é considerado que esta directiva, apesar de não versar directamente as temáticas de EA&S, permitirá estabelecer uma base suficientemente válida e objectiva, disponibilizando ferramentas fundamentais (como os planos de gestão de bacia ou os planos especiais de gestão de recursos hídricos) que contribuirão para a obtenção do bom estado ecológico das massas de água, para a promoção do uso sustentável da água e para a mitigação dos efeitos de fenómenos extremos. Reconhece-se, ainda, nestas conclusões, que enquanto a escassez de água pode resultar de uma gestão de recursos hídricos ineficaz, a ocorrência de secas é um fenómeno natural e não pode ser controlada, pelo que os seus impactos apenas podem ser mitigados através de apropriadas estratégias de gestão, monitorização e prevenção (MAOTDR, 2007).

Além disso, a nível Europeu, foi ainda desenvolvido um relatório específico sobre planos de gestão de seca (DG Env EC, 2007a) onde, mesmo sendo admitida a não obrigatoriedade de elaboração deste tipo de planos, se destaca a mais-valia dos mesmos como ferramenta para a minimização dos possíveis efeitos decorrentes de situações de seca. Em qualquer caso é indicado que a aplicação desses planos deverá sempre cumprir os objectivos ambientais da DQA e contemplar a definição de (DG Env EC, 2007):

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 indicadores e respectivos valores limite estabelecendo o início e o fim de uma situação de seca, bem como os níveis de severidade para as situações de seca prolongada.

 medidas a serem tomadas em cada fase de uma situação de seca de modo a prevenir a deterioração do estado da água e a mitigar os impactos da seca.

 enquadramento institucional para fazer face às situações de seca e para a revisão e reformulação dos planos de seca.

Face a estas linhas orientadoras, têm sido levados a cabo alguns desenvolvimentos ao nível dos Estados-Membro da UE, em especial sobre os tópicos destacados na Comunicação de 2007 (CEC, 2007). No que toca à gestão do risco de seca, segundo o relatório de acompanhamento mais recente (CEC, 2010), e respectivo documento de acompanhamento (CEC, 2010a), lançados em Maio de 2010, é já referida a aposta de alguns Estados-Membro no desenvolvimento de planos de gestão de seca (Bélgica, Chipre, Espanha, França e Inglaterra), enquanto outros, entre os quais Portugal, estão a equacionar esta problemática no âmbito do desenvolvimento dos planos de gestão de bacia. No que toca a sistemas de avaliação fundados em indicadores, apenas alguns Estados-Membro, como é o caso da Espanha20 e da Bélgica, possuem um sistema de indicadores adaptados às respectivas especificidades, com vista à adopção de medidas definidas no âmbito dos planos de gestão de seca já em vigor (CEC, 2010a). Por outro lado, é referido o desenvolvimento de um observatório de secas – European Drought Observatory, levado a cabo pelo Joint Research Centre (JRC)21 (CEC, 2010). Este sistema será especialmente orientado para a previsão, detecção e monitorização de secas na Europa, tendo por base informação meteorológica (com base em índices como o SPI), parâmetros hidrológicos modelados (estimativas de humidade do solo e respectivas anomalias), informação de satélite e ainda previsões a 7 dias, das condições meteorológicas (CEC, 2010a).

Ainda no que toca à escassez, a European Environmental Agency (EEA), em conjunto com o JRC, têm levado a cabo o desenvolvimento de indicadores para avaliação conjunta dos dois fenómenos, com vista à integração num sistema de informação sobre a escassez de água e secas para a Europa (WSDIS)22 (CEC, 2010; 2010a). Esse sistema terá, ainda, o apoio de uma rede de instituições que integrarão a European Water Scarcity and Drought Network (WSDN), responsável pela coordenação das iniciativas em desenvolvimento nesta matéria (EEA, 2009a).