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2 COMBATES COTIDIANOS (ARTIGOS NA IMPRENSA PERIÓDICA)

2.3 TEMAS ABORDADOS

2.3.7 Música e festas populares

A “Acta Diurna” “História do carnaval natalense” (A República, 27/01/1960) foi provocada pela publicação do livro de autoria de Eneida “História do carnaval carioca” (Rio de Janeiro, 1958). Cascudo comenta o teor da publicação e destaca, já em 1960, um detalhe que se tornaria bem atual: Naturalmente, o gostoso carnaval de rua, de

grupos improvisados, papangús e troças, está murchando e sumindo. Cedendo ante o carnaval oficializado, com desfiles, indumentária de convenção, carnaval para turista ver. Sugere que o exemplo de Eneida tenha continuação. Insinua que Pernambuco, [...] tendo o mais alucinante, telúrico e maravilhoso carnaval de rua, não possui uma história das suas agremiações antigas, foliões desaparecidos, elementos humanos que animavam a vida sonora das ruas do Recife. A respeito de Natal, faz um retrospecto dos

velhos carnavais, as ruas onde eram realizados, os foliões, os nomes dos velhos clubes e sugere o nome de um cronista que poderia começar a colher dados para a história do carnaval natalense. Era a ocasião de lembrar nossos compositores esquecidos.

Adivinhar onde está muita fotografia preciosa, escondida nas gavetas olvidadas. Músicas e alegrias que tanto merecem ressurreição. Confirmando suas preocupações

com a memória da cidade, propõe, ao concluir, a ressurreição dessas músicas dos antigos carnavais de Natal. É essa a primeira vez em que, entre as crônicas examinadas, emprega a palavra compositor.

Já a “Acta Diurna” “História do carnaval pernambucano” (A República, 04/02/1960) começa logo abertamente sugerindo: Já era tempo de aparecer uma

história do carnaval pernambucano ou do Recife, como a grande Eneida realizou com o carnaval carioca de 1958. Essa crônica ainda é uma consequência da publicação da

“História do carnaval carioca” (1958), escrito por Eneida. Indica os itens mais importantes a serem tratados: o passo e o frevo pernambucanos, o estudo da marcha- frevo. Menciona:

Com as peculiaridades musicais, rítmicas e a riqueza dos “efeitos” dos trombones e pistons, os “trios” ondulantes, “chorados” na fila das clarinetas, tão anteriores ao domínio dos saxofones, está batendo à porta dos pesquisadores para uma divulgação indispensável e uma reivindicação legítima de suas “constantes” pernambucanas.

É importante notar o destaque dado por Cascudo nessa crônica de 1960 para a característica básica do carnaval pernambucano, que é ser um carnaval de rua onde estão [...] troças, blocos, ranchos, cordões, clubes [...]. Destaca que

ao carnaval de desfiles, de expectação, carnaval assistido e brincado nos recintos fechados, que se vai tornando usual e comum no Brasil inteiro, Recife responde com um carnaval-de-rua, independendo de todas as excitações, autárquico em sua inspiração geográfica, passo e frevo garantindo, sozinhos, o espetáculo da festa biologicamente popular.

Cascudo coroa a crônica com a exaltação do compositor pernambucano Nelson Ferreira, pelo fato de haver composto três marchas-frevo com o título de “Evocação” (n. 1, 2 e 3) que ele considera já popularmente consagradas. O detalhe especial que mais tocou o cronista certamente é o fato de essas composições, como o título indica, serem evocações de velhos carnavais pernambucanos: É a cantiga de saudade, homenagem

fiel, canto sentimental, saudando, lembrando figuras dos mortos foliões, em plena tempestade ruidosa do carnaval.

Conclui com um trecho da “Evocação n. 1”, de Nelson Ferreira:

Adeus, adeus, minha gente, Que já cantamos bastante...

“Carnaval! Carnaval!” é uma longa crônica (A República, 10/02/1929) em que Cascudo busca, no passado remoto das festas gregas e romanas, ligações com o carnaval do presente. Prossegue com informações sobre o carnaval no Brasil, durante colônia, reinado e Império.

O elemento musical começou a ser referido depois do período da Maioridade, quando se observa o início dos bailes reservados. Nas salas dança-se o solo inglês, as

mazurcas, as últimas danças portuguesas do século XVIII. No âmbito popular,

semelhante processo se verifica com suas variações: E nas praças as tarantelas,

cateretês, cocos e sambas.

O português José Pereira de Azevedo Paredes numa segunda feira de carnaval, teve saudades dos zabumbas minhotos, o troar dos bombos que lá se chama Zé Pereiras. Reuniu amigos. Beberam umas lambadas infindáveis. Suspenderam os bombos na linha da barriga. Saíram. Zig-zig-zig-bum. Zig- zig-zig-bum. Estava criado o ritmo. Faltava a música. Criaram-na também. Letra imbecil, ingênua, menineira, vulgar e chocha.

Viva o Zé Pereira Que a ninguém faz mal Viva o Zé Pereira No dia de carnaval!

Em breve incursão pelas agremiações natalenses, conclui abordando o fim do antigo entrudo, substituído pelos corsos de automóveis, os lança-perfumes, confetes e serpentinas, culminando com os bailes nos clubes sociais: Só o Zé Pereira é que vive,

rebentando os tímpanos e peles dos bombos, zabumbando doido. Zig-zig-zig-bum. Zig- zig-zig-bum!...

Essa crônica bem pode representar uma demonstração do Cascudo historiador, já que o enfoque que direciona é predominantemente histórico. Igualmente, pode-se notar a ambientação do carnaval, em que o autor distingue apenas a tradição europeia, sem se referir, como o faria em outras ocasiões, a elementos originários do indígena e do africano.

Cascudo recorda na “Acta Diurna” “O Terço Cantado da Santa Cruz” (A

República, 03/06/1948) a festa religiosa da Santa Cruz dos seus tempos de menino,

realizada a 14 de setembro: Era diante do cruzeiro da Igreja do Rosário, à noite.

Cantavam o terço, vezes com acompanhamento instrumental. Depois, ouvia-se a ladainha, um bendito e um cântico final bem saudoso.

Em outra “Acta Diurna” (“Santa Cruz”), focalizou semelhante festa realizada a cada 3 de maio, igualmente com cânticos religiosos, no local chamado Santa Cruz da

Bica. Destaque-se o interesse do cronista em manter a memória dos fatos relacionados ao bloco música-religião.