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3 Estudo de vários materiais usando microscopia confocal

3.5 Estudo dos domínios ferrelásticos do vanadato de bis muto

3.5.2 Mapeamentos Raman do vanadato de bismuto

O mapeamento Raman consiste em medir o espectro Raman ponto a ponto em uma região conveniente da superfície da amostra. Desse modo, milhares de espectros são obtidos e, para viabilizar a medida, os tempos de aquisição devem ser bem pequenos. Desse modo, para se obter êxito, a amostra medida deve ter uma boa resposta Raman e o aparato experimental deve ser altamente eficiente.

O espectro Raman do BiVO4 foi medido com um tempo de integração de 0,07 segundos,

que é um tempo consideravelmente curto para se adquirir espectros, porém isso é compensado pela elevada eficiência do equipamento e pela boa resposta Raman da amostra. O espectro Ra- man medido é visualizado na Figura 3.12 e as freqüências importantes para o mapeamento são os picos referentes aos modos vibracionais localizados em 704 cm−1 e 820 cm−1. O primeiro

desses modos, corresponde ao estiramento simétrico ν1do VO4e a banda seguinte é associada

ao estiramento antisimétrico também do grupo vanadato, segundo Frost et al. [102].

Figura 3.12: Espectro Raman do BiVO4.

Para se construir as imagens Raman, o primeiro passo é escolher uma determinada banda do espectro a ser mapeada. Em seguida, escolhe-se que propriedade desse pico será estudada, como, por exemplo, sua área, sua largura ou o seu centro. O mais comum, no entanto, é usar a área sob o pico como filtro, analisando assim em que porção da amostra essa banda é mais intensa ou mais fraca. Essa diferença de intensidade (ou de largura, etc) é transformada em imagens considerando uma determinada escala de cor, que também é escolhida pelo usuário do equipamento. Assim, se optarmos por uma escala que vai do preto ao branco, o menor valor da área do pico em toda a região medida poderá ser associado ao preto (ou branco), o maior valor ao branco (ou preto) e os valores intermediários terão cores na escala de cinza. Da mesma forma, pode-se escolher escalas que vão desde o preto (menor área) até o laranja (maior área), como foi feito nesse trabalho.

As freqüências vibracionais do vanadato de bismuto que variam de acordo com a forma como as paredes de domínio estão orientadas no cristal são aquelas associadas aos modos ν1e

ν3. A imagem Raman do pico ν3 é vista na Figura 3.13a e a do pico ν1é observada na Figura

3.13b. O ponto mais marcante e facilmente identificado é o caráter complementar dessas duas imagens. Isso significa que a intensidade dos picos tem um comportamento antagônico, quando

um está forte o outro está fraco e vice-versa. Podemos, então, associar cada modo a um tipo de domínio. Outro ponto interessante nessas figuras é a identificação de domínios perpendiculares, em acordo com o que já foi observado, por exemplo, na referência [87]. De uma maneira mais compacta, todas essas informações podem ser postas em uma só imagem, desde que usemos mais de uma escala de cor, como é visto na Figura 3.13c. Nessa figura cada escala de cor está relacionada com uma das Figuras 3.13a ou 3.13b anteriores.

(a) (b) (c)

Figura 3.13: (a) Imagens Raman dos modos vibracionais ν3e (b) ν1do BiVO4. (c) Imagem

Raman unificada dos modos vibracionais ν1(vermelho) e ν3(verde).

Uma argumentação possível com relação aos mapeamentos discutidos é se as regiões mos- tradas na Figura 3.13 eram realmente domínios ferroelásticos ou simplesmente características topológicas da amostra. Esse é um questionamento plausível uma vez que o equipamento usado na realização das medidas é confocal e, com a lente de grande abertura numérica utilizada (100x/NA 0.9), planos focais diferentes da distância de trabalho da lente são facilmente iso- lados. Para esclarecer essa dúvida, a saída foi pôr a amostra em um microscópio polarizado e aquecê-la, observando se as linhas vistas na superfície do BiVO4 desapareciam. Esse teste

baseia-se no fato de que em 255 ◦C o vanadato de bismuto sofre uma transição de fase para

uma fase paraelástica, portanto perdendo a ferroelasticidade [91]. As listras desapareceram completamente para temperaturas acima da temperatura de transição e isso foi o suficiente para confirmar que nossas medidas estavam corretas e que realmente estávamos observando os do- mínios do BiVO4. Para completar, resfriamos a amostra e os domínios sobre a sua superfície

reapareceram.

A profundidade dos domínios também foi estudada usando microscopia Raman confocal e dois tipos de medidas podem ser efetuadas. A primeira delas consiste de uma seqüência de mapeamentos, sendo cada um deles em um plano focal diferente e abaixo do plano anterior, de modo a se entender a evolução do pico estudado enquanto se entra na amostra. O segundo tipo de medida é um corte transversal e o Raman é obtido nesse plano segundo linhas a alturas

diferentes. Essa última análise é mais rápida que a primeira e é útil quando se deseja investigar grandes profundidades e/ou quando a resposta Raman da amostra não é muito boa. Claro que em ambos os casos o resultados está condicionado à opacidade da amostra, que deve permitir que os fótons espalhados sejam novamente capturados pela lente. Os dois tipos de medidas foram realizados no vanadato de bismuto e, ao final de cada medida, tomou-se o cuidado de verificar se a amostra ainda era transparente àquela profundidade.

O tipo de medida contendo uma seqüência de mapeamentos em uma mesma porção da amostra é chamado de empilhamento e o resultado para o BiVO4 é mostrado na Figura 3.14,

onde o modo vibracional filtrado foi o ν1. Cada imagem foi feita em um plano focal diferente,

sendo que as imagens à direita sempre estão mais abaixo que a sua vizinha da esquerda e, ao todo, desceu-se 2 µm. A primeira imagem foi focalizada na superfície tendo como único critério a visualização da imagem a partir da câmera.

Figura 3.14: Medidas do tipo empilhamento do mapeamento Raman do modo ν1do vanadato

de bismuto e a diferença de altura entre a primeira e a última imagem é de 2 µm.

A outra investigação de profundidade realizada, em que se mede num plano vertical imagi- nário, é vista na Figura 3.15. Essa medida consistiu de se obter o espectro Raman ponto a ponto (passos de 0,2 µm) ao longo de várias linhas horizontais de 16 µm de comprimento, localizadas uma logo abaixo da outra. A profundidade total medida foi de 8 µm e os passos foram de 0,1 µm (= 100 nm). Essa medida foi iniciada a aproximadamente 4 µm acima da superfície da amostra (segundo focalização a partir da imagem da camera) e encerrou 4 µm abaixo da super- fície. Esse experimento não deixa dúvidas de que os domínios não se encontram somente na superfície do BiVO4, eles localizam-se em um intervalo maior que 4 µm ao longo do eixo b.

Os domínios ferroelásticos do BiVO4 também possuem características topológicas e isso

nos permitiu enxergar os domínios mesmo usando técnicas que não fornecem informações es- truturais, como a microscopia eletrônica de varredura (MEV). A imagem da superfície da amos- tra obtida com MEV é vista na Figura 3.16, onde os domínios são facilmente identificados. Vale perceber que as tiras são paralelas, como realmente devem ser os estados orientacionais ferrro- elásticos. Essas imagens nos permitiram estimar a espessura dos domínios de maneira simples e concluir que, pelo menos para o caso observado, ela está em torno de 2 µm, em bom acordo com os resultados da microscopia Raman.

Figura 3.15: Medida de profundidade do vanadato de bismuto obtida ao longo de um plano vertical que contém o eixo principal b.

Figura 3.16: Imagens feitas com MEV mostrando as regiões paralelas que constituem os domínios ferroelásticos.