• Nenhum resultado encontrado

Materiais e Métodos

No documento Estudos Linguísticos (páginas 83-91)

ABOUT THE FOURCE AND ARGUMENTATIVE ORIENTATION OF “PORÉM”

4. Materiais e Métodos

Para a realização deste estudo selecionamos quatro ocorrências de porém, as quais correspondem a cada uma das propriedades desse operador: coocorrência, mobilidade, ambiguidade, e comportamento sintático-semântico de conjunção coordenada adversativa.

84

Essas ocorrências foram retiradas de quatro artigos de opinião, gênero que, segundo Rodrigues (2005), nos oferece vasto emprego de elementos como porém, de 3 diferentes jornais5 brasileiros: Gazeta de Alagoas; Zero Hora; e Pag 20.

(i) A 1ª ocorrência foi retirada do artigo “Esperar faz bem”, publicado em 21 de novembro de 2009, no jornal Zero Hora;

(ii) A 2ª ocorrência foi retirada do artigo “Ditadura e Petróleo”, publicado em 26 de novembro de 2009, no jornal Gazeta de Alagoas;

(iii) A 3ª ocorrência foi retirada do artigo “Retrato da campanha presidencial”, publicado em 27 de novembro de 2009, no jornal Pag 20;

(iv) A 4ª ocorrência foi retirada do artigo “Relato de um paciente (quase) terminal”, publicado em 24 de novembro de 2009, também, no jornal Pag 20.

Para a análise consideramos os trechos dos artigos nos quais havia porém. Em seguida, descrevemos a força e orientação argumentativa dos encadeamentos formados por esse operador argumentativo.

5. Análises

As quatro ocorrências de porém foram selecionadas em conformidade com as suas propriedades gramaticais: mobilidade, coocorrência, ambiguidade, e comportamento sintático-semântico de conjunção coordenada adversativa.

A ocorrência 1, abaixo, representa a mobilidade de porém, na qual ele é empregado no meio da oração, ou seja, em que ele apresenta variabilidade posicional:

(01) Estamos todos de acordo quanto à realidade imediatista dos dias atuais, onde a espera é uma noção muito vaga, se não inexistente, na construção mental das pessoas. Há o modelo fast food, e outros “fasts”, todos que se quiser. Fast news (notícia rápida), fast date (namoro rápido), e por aí vai. Quem tem filhos em idade escolar percebe a enorme diferença na conduta do estudante perante a aprendizagem, de uma geração atrás para a atual. Há, porém, que se considerar o seguinte: todas as pessoas, no seu processo de desenvolvimento psíquico, atravessam um primeiro sistema, que Freud chamou “princípio do prazer”. Isto significa que o bebê ou criança bem pequena funciona buscando o prazer imediato, descarregando diretamente suas tensões sem condições de dar a estas um outro destino.

5

85

A ocorrência 2, abaixo, representa a coocorrência de porém, na qual coocorre com a conjunção assim como:

(02) Desde Monteiro Lobato (1882-1948), advogado, empresário visionário, intelectual e escritor sempre dedicado às causas nacionalistas, até nossos dias, o petróleo, como fator de independência econômica do País, tem sido motivo de inúmeras lides políticas. O próprio Lobato esteve preso, em virtude de sua luta em defesa do “ouro negro”. E, por ironia do destino, é em Lobato (Salvador) - nada a ver com o Monteiro – que teria sido descoberta a primeira jazida petrolífera. Porém, assim como o petróleo motivou a prisão do escritor, propiciou, bem mais adiante na história e também em regime autoritário, à soltura de um dissidente.

A ocorrência 3, abaixo, representa porém com propriedades de conjunção coordenada adversativa, ou seja, empregado com valor adversativo, antes da última oração que coordena, e não coocorrendo com outra conjunção:

(03) O governador paulista pode usar o espaço para tentar retomar seu crescimento nas pesquisas. Porém, será importante oferecer espaço para que Aécio Neves se exponha nacionalmente e se apresente como alternativa viável caso Serra desista.

A ocorrência 4, abaixo, representa a ambiguidade de porém entre os valores adversativo e conclusivo.

(04) Chegados os exames eles confirmaram que dada à baixa imunidade do meu organismo eu poderia estar com uma tuberculose (não da galopante, como diz o povo), mas uma virótica. (saibam que existem outros tipos de tuberculose que não a pulmonar. Ela pode atacar a medula óssea, os olhos, os ossos, etc. Quem tiver interesse há vasta literatura médica sobre o assunto). Porém, era preciso confirmar.

Na ocorrência 01, porém estabelece entre o argumento que introduz e o anterior a ele a relação de contraste. No argumento que antecede porém, o produtor defende a ideia de que a geração atual é mais imediatista que as gerações passadas, por haver entre elas uma “diferença de conduta”. O contraste entre os argumentos é estabelecido,

86

assim que porém introduz o argumento que defende a ideia oposta de que ambas as gerações passam pelo mesmo “desenvolvimento psíquico”.

Dessa forma, o argumento introduzido por porém vai para uma direção oposta a do argumento anterior, e prevalece sobre ele, uma vez que se torna o foco do assunto tratado. Assim, nessa ocorrência são constituídas classes argumentativas diferentes, e, portanto, esses argumentos não formam um escala argumentativa, como representado no esquema abaixo:

Figura 01: Classes argumentativas da ocorrência 01.

Acreditamos que o fato de porém ocorrer no meio da oração, ou seja, após o verbo Há, está relacionado a intenção do produtor do texto de criar expectativa por meio desse verbo, que causa maior impacto quanto ao que vem depois do operador, dando maior ênfase ao que deve se considerar.

Dessa forma, podemos dizer que a mobilidade, nessa ocorrência, não interfere na força argumentativa de porém, pois, tanto no início da oração, como na posição em que ele ocorre nesse encadeamento, estabelece a relação de contraste, ao contrário, ela funciona como recurso argumentativo, de que dispõe o produtor, para dar ênfase a uma parte do enunciado.

Na ocorrência 2, porém estabelece a relação de contraste entre o argumento anterior a ele, que defende a ideia de que Lobato esteve preso por defender a nacionalização do petróleo, e o argumento introduzido por ele, que defende a ideia de que o petróleo propiciou a soltura de um dissidente.

R: A geração atual é mais imediatista que as gerações passadas.

P: Quem tem filhos em idade escolar percebe a enorme diferença na conduta do estudante perante a

aprendizagem, de uma geração atrás para a atual.

P’: Há que se considerar o seguinte: todas as pessoas, no seu processo de desenvolvimento psíquico, atravessam um primeiro sistema, que Freud chamou “princípio do prazer”.

R’: Todas as pessoas têm o mesmo desenvolvimento psíquico.

87

Por essa relação os argumentos não formam escala argumentativa, pois constituem classes argumentativas diferentes, uma vez que vão para direções opostas, e pela qual o argumento introduzido por porém se torna o foco do assunto tratado, e, portanto, é mais forte que o anterior, como mostra o esquema abaixo:

Figura 02: Classes argumentativas da ocorrência 02.

O argumento introduzido por porém é constituído da oração subordinada introduzida por assim como. Segundo Neves (2000) essa conjunção subordinada estabelece a correlação entre os enunciados, funcionando como uma espécie de comparante entre iguais.

Acreditamos que a intenção do produtor, com esse tipo de construção, é a de dar um tom de acusação ao enunciado anterior ao introduzido por porém, pois, ao retomar o argumento anterior pela relação de comparação introduzida pelo assim como, ele quer chamar a atenção para o tamanho do contraste que existe entre o argumento anterior e o introduzido por porém. Portanto, podemos dizer que a coocorrência é necessária na ocorrência 02 para que o produtor do texto atinja esse objetivo.

Na ocorrência 3, porém exerce a função de contraposição em direção independente, apontando o argumento anterior, que diz que Serra pode usar o espaço para crescer nas pesquisas, como menos relevante que a necessidade de oferecer espaço para Aécio, caso Serra desista, o que significa que, nessa ocorrência, prevalece o argumento introduzido por porém.

Como o argumento introduzido pelo operador considera o argumento anterior como menos relevante, e é orientado para uma conclusão independente da conclusão do argumento que o antecede, ambos os argumentos constituem classes argumentativas diferentes, não se organizando numa escala argumentativa, como representado no esquema abaixo:

R: Quem defende a

nacionalização do petróleo vai preso.

P: O próprio Lobato esteve preso em pleno Estado Novo de Getúlio Vargas, em virtude de sua luta em defesa do “ouro negro”

P’: assim como o petróleo motivou a prisão do escritor, propiciou, bem mais adiante na história e também em regime autoritário, à soltura de um dissidente.

R’: Quem desiste da defesa pela nacionalização do petróleo é libertado.

88 Figura 03: Classes argumentativas da ocorrência 03.

Na ocorrência 4, acreditamos que a intenção do produtor do texto seja a de criar uma relação adversativa, especificamente, de negação da inferência, entre as proposições. Entretanto, notamos que o verbo presente nessa ocorrência poderia, demonstra que não há confirmação da doença, ou seja, pode ser uma tuberculose. Assim, a oração introduzida por porém parece redundante se observada pelo valor adversativo desse elemento, pois, a necessidade de confirmação da doença é consequência da incerteza que se tem dela. Dessa forma, parece mais adequada a relação conclusiva entre o argumento anterior e o introduzido por porém, equivalendo ao emprego de conjunções como por isso, portanto.

Portanto, a construção semântica desse encadeamento torna o valor de porém ambíguo. Ou seja, ele não é nem inteiramente conclusivo, nem inteiramente adversativo, mas permite esses dois valores.

Dessa forma, a ocorrência 04 permite que a força argumentativa de porém seja vista, também, de duas formas diferentes. Pela relação de negação da inferência entre os enunciados, o argumento introduzido por porém nega aquilo que pode ser entendido pelo argumento anterior, sendo, portanto, mais forte. E, pela relação de conclusão não é possível falar em força argumentativa, uma vez que, porém, nesse caso, introduz a conclusão do enunciado, e não outro argumento.

Nesse sentido, como são duas as possibilidades de ver o argumento introduzido por porém na ocorrência 04, não é possível lhe definir a força argumentativa nessa ocorrência, e, consequentemente, não é possível definir a orientação argumentativa do argumento introduzido por porém, ou seja, optar por uma das duas direções possíveis, desencadeadas por esse operador, nessa ocorrência.

R: Serra pode tentar crescer nas pesquisas.

P: O governador paulista pode usar o espaço para tentar retomar seu crescimento nas pesquisas.

P’: será importante oferecer espaço para que Aécio Neves se exponha nacionalmente e se apresente como alternativa viável, caso Serra desista.

R’: É importante que Aécio, também, se exponha.

89 6. Conclusão

A análise da força e orientação argumentativa de porém a partir das propriedades: coocorrência, mobilidade e ambiguidade, nos mostrou que coocorrência e mobilidade não prejudicam seu funcionamento argumentativo, ao contrário, elas funcionam como recurso argumentativo a mais de que dispõe o produtor do texto, no momento de construir enunciados com porém.

Percebemos que a forma como porém estabelece força e orientação argumentativa num enunciado, com exceção da ambiguidade, com propriedades como coocorrência e mobilidade não se diferencia muito da forma como quando esse operador ocorre semântica e sintaticamente como conjunção coordenada adversativa, pois, tanto com propriedades que o distanciam das conjunções, quanto com propriedades que o aproximam delas, porém introduziu, nas ocorrências analisadas, argumentos mais fortes.

Quanto à ambiguidade de porém, ela prejudica sua força e orientação argumentativa, uma vez que ela faz com que o encadeamento por ele formado, apresente duas formas diferentes de ver a força e a orientação argumentativa, não sendo possível atribuir, ao enunciado, um sentido definido.

Portanto, as propriedades de porém, com exceção da ambiguidade, não prejudicam seu funcionamento argumentativo, mas auxiliam esse operador a desempenhar diferentes papéis argumentativos, sendo possível, conforme mostrou a análise das ocorrências selecionadas, porém introduzir argumentos para além de, como aponta Koch (2003), conclusões contrárias, para conclusões diferentes, independentes, e opostas.

Referências

ALI, Manoel Said. Gramática histórica da língua portuguesa. São Paulo: Melhoramentos, 1967. 375 p.

DUCROT, Oswald. Provar e dizer: leis lógicas e leis argumentativas. São Paulo: Global, 1981. 264 p.

________. Argumentação e “topoi” argumentativos. In: GUIMARÃES, Eduardo (Org.).

90

FABRI, Kátia Maria Capucci. Da diferenciação das conjunções adversativas em textos escritos. Letras & Letras, Uberlândia, v. 21, n. 1, p. 135-152, jan./jun. 2005.

GUIMARÃES, Eduardo. Texto e argumentação: um estudo de conjunções do Português. Campinas, SP: Pontes, 1987. 200 p.

______. Os limites do sentido: um estudo histórico e enunciativo da linguagem. Campinas, SP: Pontes, 1995. 91 p.

KOCH, Ingedore G. V. A inter-ação pela linguagem. 8. ed. São Paulo: Contexto, 2003. 134 p.

______. A coesão textual. 20. ed. São Paulo: Contexto, 2005. 84 p.

LONGHIN, Sanderléia Roberta. A gramaticalização da perífrase conjuncional só que. 2003. Tese (doutorado) – Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2002. 212 p.

NEVES, Maria Helena M. Gramática de usos do português. São Paulo: Ed. unesp, 2000. 1037 p.

PARREIRA, Míriam Silveira. Um estudo do uso de operadores argumentativos no

gênero editorial de jornal. 2006. Dissertação (mestrado) – Instituto de Letras e

Linguística, Universidade Federal de Uberlândia, Uberlândia, 2006. 223 p.

PERINI, M. A. Gramática descritiva do português. 4. ed. São Paulo: Ática, 2006. 380 p.

RODRIGUES, Rosângela Hammes. Os gêneros do discurso na perspectiva dialógica da linguagem: a abordagem de Bakhtin. In: MEURER, J. L; BONINI, Adair; ROTH, Désirée Motta (Org.). Gêneros: teorias, métodos, debates. São Paulo: Parábola Editorial, 2005. p.154 – 183.

91 ANÁLISE DO DISCURSO SOBRE A VELHICE NO ESTATUTO DO IDOSO

No documento Estudos Linguísticos (páginas 83-91)