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Meios alternativos de provisão alimentar e responsabilidade pelo apoio alimentar

No documento Alimentação em tempos de crise (páginas 126-130)

Conforme indicado no quadro 3.8, entre as famílias em situação de segurança alimentar, uma parte considerável defende uma visão partilhada da responsabilidade (37,5 %), seguindo-se a atribuição de responsabilidade pelo apoio alimentar ao Estado (34,1 %), depois às redes familiares e comunitárias (11,2 %), às instituições de solidarie- dade social (8 %), aos próprios indivíduos (4,5 %), às instituições reli- giosas (2,9 %) e, finalmente, às empresas (1,9 %). A generalidade das famílias em situação de insegurança alimentar apresenta uma posi- ção um pouco diferente da tendência anterior, já que é o Estado a entidade à qual é atribuída maior responsabilidade (39 %), seguindo- -se 27,2 % dos inquiridos que consideram o apoio alimentar uma responsabilidade partilhada por todas as entidades contempladas, 12,7 % indicam as redes familiares e comunitárias, 10,1 % as institui- ções de solidariedade social, 4,4 % as instituições religiosas, 3,5 % as empresas e, finalmente, 3,1 % afirmam que a alimentação é da res- ponsabilidade dos indivíduos. De notar que uma parte considerável das famílias que se encontram em situações moderada e grave de insegurança alimentar concentra a responsabilidade no Estado (41 % e 52,6 %, respetivamente), enquanto as famílias menos atingidas por este fenómeno têm uma visão mais partilhada e distribuída da res- ponsabilidade (37,5 %).

Tendo em conta o nível de escolaridade mais elevado completado pelos pais, observa-se uma atribuição de responsabilidade no plano alimentar mais heterogénea entre as famílias mais escolarizadas.

Quadro 3.8 – Entidade com maior responsabilidade no apoio alimentar às famílias, por situação de (in)segurança alimentar

Segurança alimentar

Insegurança alimentar

Ligeira Moderada Grave Subtotal Familiares, amigos

ou vizinhos 11,2 % 14,2 % 9,8 % 10,5 % 12,7 %

Estado 34,1 % 36,5 % 41,0 % 52,6 % 39,0 %

Instituições de solidariedade

social (e. g., IPSS) 8,0 % 10,8 % 8,2 % 10,5 % 10,1 % Instituições religiosas

(e. g., Cáritas) 2,9 % 3,4 % 6,6 % 5,3 % 4,4 % Empresas (e. g., campanhas

de descontos, iniciativas

de responsabilidade social) 1,9 % 4,1 % 3,3 % 0,0 % 3,5 % Todas as anteriores 37,5 % 27,0 % 29,5 % 21,1 % 27,2 % Nenhuma, acho que

as pessoas devem ser capazes de assegurar a sua alimentação por si próprias

4,5 % 4,1 % 1,6 % 0,0 % 3,1 % Total 100,0 % (n = 1744) 100,0 % (n = 148) 100,0 % (n = 61) 100,0 % (n = 19) 100,0 % (n = 228) Fonte: Inquérito à Pobreza e Segurança Alimentar das Famílias Portuguesas com Crianças em

Idade Escolar 2014.

Nas famílias com níveis de escolaridade iguais ou inferiores ao 2.º ciclo do ensino básico, nota-se uma maior atribuição de responsabilidade do Estado (20,5 %), bem como das IPSS (12,4 %). Inversamente, nas famílias em que pelo menos um dos progenitores completou o ensino superior, tende-se mais a considerar a provisão alimentar como uma responsabilidade partilhada por todos os agentes sociais (45,1 %).

Quanto à utilização dos meios alternativos de provisão alimentar disponíveis, nota-se que as famílias em segurança alimentar aderem menos à produção agrícola própria, familiar ou comunitária (41,6 %) e recorrem bastante menos ao apoio de familiares, amigos ou vizi- nhos (20,3 %) do que as famílias em qualquer nível de insegurança alimentar. Saliente-se, no entanto, que mesmo entre as famílias em segurança alimentar existem casos que recorrem a meios alternativos

Quadro 3.9 – Entidade com maior responsabilidade no apoio alimentar às famílias, por nível de escolaridade mais elevado completado pelos pais

Até 2.º CEB 3.º CEB Ens. secundário Ens. superior Familiares, amigos ou vizinhos 12,4 % 16,1 % 11,5 % 10,3 %

Estado 40,5 % 40,9 % 39,0 % 28,3 %

Instituições de solidariedade social

(e. g., IPSS) 12,4 % 8,7 % 8,4 % 7,3 %

Instituições religiosas (e. g., Cáritas) 4,1 % 2,9 % 2,9 % 2,9 % Empresas (e. g., campanhas

de descontos, iniciativas de responsabilidade social)

4,1 % 2,1 % 1,5 % 2,2 % Todas as anteriores 20,7 % 24,4 % 32,6 % 45,1 % Nenhuma, acho que as pessoas

devem ser capazes de assegurar a sua alimentação por si próprias

5,8 % 5,0 % 3,9 % 4,0 % Total (n = 121)100,0 % (n = 242)100,0 % (n = 712)100,0 % (n = 807)100,0 % Fonte: Inquérito à Pobreza e Segurança Alimentar das Famílias Portuguesas com Crianças em

Idade Escolar 2014.

de provisão alimentar mais institucionalizados (como oferta de cabazes, instituições de apoio ou cantinas sociais), embora com fre- quências bastante reduzidas (quadro 3.10). Nas famílias em situa- ção de insegurança alimentar, uma grande maioria admite nunca ter recorrido a instituições de apoio social (70,3 %), a cantinas sociais (93,5 %) ou a cabazes alimentares (72,0 %), confirmando assim os resultados da literatura científica nesta matéria (Frade et al. 2006). A este respeito, Loopstra e Tarasuk (2015) explicam a baixa procura de bancos alimentares por parte das famílias em situação de inse- gurança devido a inúmeros fatores, como, por exemplo, o estigma associado ao uso deste tipo de resposta. No seu trabalho sobre bancos alimentares no Canadá, que integra os resultados de várias investigações levadas a cabo naquele país, os autores referem que, mesmo em famílias com insegurança alimentar grave, apenas 40 % recorrem a bancos alimentares.

Quadro 3.10 – Recurso a meios alternativos de provisão alimentar, por situação de (in)segurança alimentar ( % de «sim»)

Segurança alimentar

Insegurança alimentar Ligeira Moderada Grave Subtotal Familiares, amigos ou vizinhos (n = 360)20,3 % 63,3 % 82,3 % 55,0 % (n = 157)67,7 % Instituições de apoio social 2,3 %

(n = 41) 23,3 % 40,3 % 45,0 %

29,7 % (n = 69) Produção agrícola própria,

familiar ou comunitária (hortas, pesca, produção animal)

41,6 % (n = 738) 53,3 % 54,8 % 52,6 % 53,7 % (n = 124) Cantinas sociais 1,1 % (n = 19) 3,3 % 12,9 % 5,3 % 6,1 % (n = 14) Oferta de cabazes (n = 63)3,6 % 21,3 % 38,7 % 42,1 % (n = 64)27,7 % Fonte: Inquérito à Pobreza e Segurança Alimentar das Famílias Portuguesas com Crianças em

Idade Escolar 2014.

Apesar disto, quando comparadas com as famílias em situação de segurança alimentar, denota-se uma maior adesão à ajuda provi- denciada pelas redes de sociabilidade nas famílias em situação de insegurança alimentar (67,7 %). No sentido da confirmação destes resultados, Frade e colegas (2006) também observaram que são as famílias portuguesas em maior dificuldade as que mais recorrem às redes de sociabilidade (famílias, amigos ou vizinhos) e a estratégias de mobilização autonomizante (como é recorrer a produção agrí- cola própria).

Além disso, e focando-nos apenas nas famílias em situação de insegurança alimentar, os nossos dados indicam que são sobretudo as que estão em situação moderada ou grave de insegurança alimentar as que apresentam frequências consideravelmente mais elevadas de ade- são aos cuidados prestados por instituições de apoio social (29,7 %, ascendendo aos 40,3 % e 45 % no caso das famílias em situações mais graves de insegurança alimentar) e da oferta de cabazes (27,7 %, aumentando para 38,7 % e 42,1 % nos níveis mais graves de insegu- rança alimentar). O recurso às cantinas sociais é muito residual, pelo que não é possível tirar ilações.

No documento Alimentação em tempos de crise (páginas 126-130)