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Prevalência da insegurança alimentar – focos de risco

No documento Alimentação em tempos de crise (páginas 105-112)

Conforme já foi referido anteriormente, a insegurança alimentar é um fenómeno complexo que, apesar de estar fortemente relacionado com as condições financeiras das famílias, decorre de um conjunto alargado de fatores. Importa, pois, identificar os grupos mais expostos ao risco de insegurança alimentar avaliando para tal a sua prevalência em diferentes segmentos sociais.

Apesar de não se observarem diferenças acentuadas entre as regiões do país, nota-se que a insegurança alimentar afeta ligeiramente

mais as famílias das regiões Norte (12,4 %; n = 93), Lisboa (11,7 %; n = 70) e Centro (10,1 %; n = 44) (figura 3.5). É ainda na região Norte que se observa um maior número de famílias (14 casos) classificadas como estando numa situação de insegurança alimentar grave. Ape- sar do seu reduzido número no total da amostra, o que não permite fazer interpretações muito conclusivas ou seguras sobre este número, fica apenas a nota de que pode ser interessante aprofundar com mais detalhe a insegurança alimentar nesta região ou verificar se a região Norte continua a mostrar esta tendência em futuros estudos. É impor- tante frisar que nos inquéritos do INFOFAMILIA (2011, 2012, 2013 e 2014)5 são sobretudo as regiões de Lisboa e do Algarve as mais afe- tadas pela insegurança alimentar, embora no nosso estudo esta ten- dência só se tenha confirmado para Lisboa. Por sua vez, dados do IAN-AF (2017) apontam para uma maior prevalência do fenómeno nas Regiões Autónomas, sendo no Alentejo que se encontram as situações de maior gravidade. Estas diferenças parecem indicar uma elevada dificuldade em medir rigorosamente a insegurança alimentar, sendo de admitir que algumas famílias tentem esconder a verdadeira gravidade do problema por vergonha.

Figura 3.5 – Prevalência da (in)segurança alimentar, por região (NUTS II), N = 2007

Fonte: Inquérito à Pobreza e Segurança Alimentar das Famílias Portuguesas com Crianças em

Idade Escolar 2014.

Quanto ao efeito do tipo de meio – urbano, semiurbano ou rural – em que vivem as famílias sobre a sua condição de (in)segu- rança alimentar, as diferenças que observámos também não são assinaláveis, o que nos leva a crer que a insegurança alimentar se encontra disseminada de modo relativamente homogéneo, inde- pendentemente do tipo de meio em que vivem os agregados domés- ticos (figura 3.6).

Figura 3.6 – Prevalência da (in)segurança alimentar, por tipo de meio, N = 2007

Urbano

Semiurbano

Rural

Seg. Alimentar IA Ligeira IA Moderada IA Grave

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

Fonte: Inquérito à Pobreza e Segurança Alimentar das Famílias Portuguesas com Crianças em

Idade Escolar 2014.

O que observamos quando consideramos a prevalência da inse- gurança alimentar atendendo à escolaridade dos pais é que a falta de capital escolar surge como um importante fator de risco: a prevalên- cia da insegurança alimentar é bastante mais acentuada nas famílias com pais menos escolarizados, sobretudo no que respeita aos níveis mais graves de insegurança alimentar (ver a figura 3.7). De facto, é nas famílias onde os pais completaram no máximo o 2.º ciclo do ensino básico que observamos as prevalências mais acentuadas de insegurança alimentar, nomeadamente nos níveis ligeiro (18,4 %; n = 23) e grave (6,4 %; n = 8). A prevalência da insegurança alimentar diminui à medida que aumenta a escolaridade dos pais, notando- -se, contudo, que atinge também as famílias mais escolarizadas, não sendo exclusiva dos segmentos menos escolarizados. Concluímos,

a partir desta análise, que há uma relação entre capital escolar e a insegurança alimentar. Isto é, as famílias com menos capital escolar estão mais expostas a situações de insegurança alimentar, facto tam- bém confirmado no IAN-AF (2017).

Figura 3.7 – Prevalência da (in)segurança alimentar, por escolaridade dos pais, N = 2007

Ensino superior

Ensino secundário

3.º CEB Até ao 2.º CEB

Seg. Alimentar IA Ligeira IA Moderada IA Grave

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100%

Fonte: Inquérito à Pobreza e Segurança Alimentar das Famílias Portuguesas com Crianças em

Idade Escolar 2014.

A insegurança alimentar assume uma prevalência mais acen- tuada nas famílias afetadas pelo duplo desemprego, sendo que 22,7 % (n = 10) destes agregados se encontram em situação de insegurança alimentar ligeira, 6,8 % (n = 3) em insegurança alimentar moderada, e outros 6,8 % (n = 3) em insegurança alimentar grave. De salientar também a maior vulnerabilidade das famílias com situações profis- sionais diversas, onde um ou ambos os pais se encontram, por exem- plo, incapacitados para o trabalho. Note-se, porém, que as famílias em que ambos os pais estão inseridos no mercado de trabalho são igualmente atingidas pela insegurança alimentar, sobretudo no nível ligeiro (4,9 %; n = 64). Tal como observámos em relação ao capital escolar, sublinhamos que a insegurança alimentar não é exclusiva dos segmentos mais vulneráveis (figura 3.8).

Figura 3.8 – Prevalência da (in)segurança alimentar, por situação profissional dos pais, N = 2007

0% 10% 20% 30% 40% 50% 60% 70% 80% 90% 100% Ambos desempregados

Um empregado e um noutra situação Um empregado e um desempregado Ambos desempregados Outras situações

Seg. Alimentar IA Ligeira IA Moderada IA Grave

Fonte: Inquérito à Pobreza e Segurança Alimentar das Famílias Portuguesas com Crianças em

Idade Escolar 2014.

As famílias com rendimentos médios mensais mais baixos, inferio- res a 500 €/mês, estão mais sujeitas ao risco de insegurança alimentar, apresentando as prevalências mais elevadas de todos os níveis deste indicador. Observa-se, desde logo, que quase metade destes agregados com maiores vulnerabilidades financeiras se encontram em situação de insegurança alimentar. A relevância do capital económico para a situação de segurança alimentar das famílias é claramente manifesta, observando-se que a prevalência da insegurança alimentar diminui progressivamente à medida que o escalão de rendimento mensal aumenta. No entanto, também as famílias com rendimentos mais elevados são atingidas pela insegurança alimentar, afetando mesmo (ainda que essencialmente no nível mais ligeiro) famílias com rendi- mentos mensais superiores a 1200 € (figura 3.9).

Se o efeito isolado da escolaridade e do rendimento sobre a condi- ção de (in)segurança alimentar das famílias é expressivo, mais claro é o efeito combinado dos dois fatores: a insegurança alimentar é bastante mais prevalecente entre famílias de baixos rendimentos e com níveis de escolaridade baixa. Repare-se no próximo gráfico (figura 3.10) onde se verifica que a combinação entre baixos rendimentos e baixo

Figura 3.9 – Prevalência da (in)segurança alimentar, por escalão de rendimento mensal, N = 2007

Seg. Alimentar IA Ligeira IA Moderada IA Grave

Fonte: Inquérito à Pobreza e Segurança Alimentar das Famílias Portuguesas com Crianças em

Idade Escolar 2014.

capital escolar constitui um fator de risco acrescido para a situação de insegurança alimentar das famílias.

De facto, os dados recolhidos demonstram a importância que os fatores escolaridade e rendimento possuem perante os níveis de (in) segurança alimentar, sendo junto das famílias com rendimentos infe- riores a 500 € e com níveis de escolaridade mais baixos (até ao 2.º CEB) onde existe uma maior prevalência do fenómeno (30,4 %). É também interessante realçar os níveis de insegurança encontrados em famílias que se encontram num intervalo de rendimentos superiores a 750 € e inferiores a 900 € e com níveis relativamente elevados de escolaridade (Ensino Secundário e Superior). Tal constatação demonstra o carácter transversal da insegurança alimentar, afetando também famílias com rendimentos e níveis de escolaridade mais elevados.

Este carácter de transversalidade é espelhado no relatório de resul- tados do IAN-AF (2017), que denota a prevalência do fenómeno de insegurança alimentar em diferentes grupos de rendimento e escolari- dade. Estes dados também vão ao encontro da investigação realizada por Nielsen, Lund e Holm (2015) com famílias dinamarquesas. Estes autores concluíram que as restrições no orçamento familiar destinado

Figura 3.10 – Prevalência da (in)segurança alimentar, por escalão de rendimento mensal e nível de escolaridade dos pais, N = 2007

IA Ligeira IA Moderada IA Grave Ensino superior Ensino secundário 3.º CEB Até ao 2.º CEB Ensino superior Ensino secundário 3.º CEB Até ao 2.º CEB Ensino superior Ensino secundário 3.º CEB Até ao 2.º CEB Ensino superior Ensino secundário 3.º CEB Até ao 2.º CEB Ensino superior Ensino secundário 3.º CEB Até ao 2.º CEB

Fonte: Inquérito à Pobreza e Segurança Alimentar das Famílias Portuguesas com Crianças em Idade Escolar 2014.

à alimentação não são exclusivas das famílias com menores níveis de educação ou rendimento.

De acordo com os nossos dados, existe ainda uma relação entre a prevalência da insegurança alimentar e o número de filhos por agre- gado familiar, sendo que foi junto das famílias com três ou mais filhos que se registou uma maior prevalência do fenómeno, sobretudo nos níveis mais graves (figura 3.11).

Figura 3.11 – Prevalência da (in)segurança alimentar, por número de crianças no agregado, N = 2007

Seg. Alimentar IA Ligeira IA Moderada IA Grave

Fonte: Inquérito à Pobreza e Segurança Alimentar das Famílias Portuguesas com Crianças em

Idade Escolar 2014.

Tipificação das famílias em situação

No documento Alimentação em tempos de crise (páginas 105-112)