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Discurso do Ministro das Relações Exteriores, Fernando Henrique Cardoso, por ocasião de banquete oferecido pelo Chanceler do Equador, em Quito, em 29 de abril de 1993

Penhor Ministro,

As palavras de Vossa Excelência ultra- passam o gesto de acolhida fraternal e indi- cam a determinação de preservar e fortale- cer a tradicional solidariedade entre nossas Pátrias. Minha esposa e eu - e todos os membros da delegação que me acompa- nham - guardaremos na lembrança a grata recordação do convívio desta noite e da hospitalidade com que nos distinguiram a Senhora de Paredes e Vossa Excelência.

É grande minha emoção ao retornar às terras do Equador, onde a beleza da natu- reza só encontra paralelo na amabilidade de sua gente.

Sinto-me especialmente honrado por retornar ao Equador como Chanceler do Brasil, atendendo ao gentil convite de Vossa Excelência. Ao aceitá-lo, foi minha intenção deixar clara a prioridade que o Brasil concede às suas relações com os países da região amazônica e - entre eles - ao Equador.

Pareceu-me esta uma ocasião oportu- na, não apenas para reafirmar velha e se- gura amizade, mas também para explorar as bases de novo diálogo, fraternal, franco

e objetivo entre o Equador e o Brasil. É o momento de nossas histórias nacionais para estreitarmos a colaboração entre nos- sos países. Estou certo, Senhor Chanceler Paredes, de que nosso encontro contribui- rá para esse magno objetivo.

Na verdade, ao rever o Cotopaxi - na manhã de hoje - reafirmou-se em mim, nítida e imediata, a certeza de que o Brasil e Equador estão bem próximos. A curta viagem que me trouxe aqui desmente a impressão de distância que nos sugerem os mapas.

A confluência de nossos interesses confirma igualmente a proximidade de nossos dois países, unidos por um destino indivisível, como nações americanas que compartilham interesses comuns. Todas as coincidências de herança material e es- piritual que nos avizinham e a estreita cooperação que temos desenvolvido, tanto em nossas relações bilaterais como em foros multilaterais, consolidaram a con- fiança e a solidariedade entre brasileiros e equatorianos.

É com esse espírito que venho a Quito, certo também de que devemos honrar com

novas realizações a herança de um passado de impecáveis relações.

Senhor Ministro,

Como povos amazônicos, brasileiros e equatorianos somos condóminos de va- lioso património, cujo desenvolvimento temos o compromisso impostergável de promover.

Para esse fim, serão necessários inves- timentos consideráveis em pesquisa cien- tífica e em desenvolvimento de técnicas novas. A cooperação bilateral neste campo deverá intensificar-se para cobrir a falta de apoio financeiro internacional que, até aqui, não tem correspondido ao interesse que demonstraram governos e povos de outras regiões.

O Tratado de Cooperação Amazônica tem-se constituído em foro apropriado para a discussão de temas de interesse comum dos países amazônicos. Construí- do sobre a base sólida da igualdade e da soberania inalienável de cada Estado Par- te sobre a porção amazônica de seus res- pectivos territórios, o TCA tem como vocação atuar como catalisador, desper- tando interesses, identificando priorida- des, multiplicando as oportunidades de trabalho em comum.

Ao renovar as bases da convivência internacional na Amazónia, o Tratado veio reafirmar que não existem alterna- tivas para a cooperação, em um momen- to de relativo imobilismo e frustração em muitos foros internacionais e regio- nais. Esse entendimento possibilitou a formação de posições conjuntas em re- lação a problemas comuns, exemplar-

mente recolhidas no texto da Declaração de Manaus com vistas à Conferência das Nações Unidas sobre Meio Ambiente e Desenvolvimento.

Possibilitou, igualmente, em nossos dias, Senhor Chanceler, a instalação de um saudável clima de distensão e diálogo po- lítico entre os países da região, consen- sualmente entendido como a única forma possível de tratar problemas comuns e de encontrar soluções definitivas e mutua- mente satisfatórias para os mesmos. É esse o espírito, que o Brasil saúda entusiastica- mente e ao qual empresta sua mais irres- trita solidariedade, que preside o diálogo político estabelecido no mais alto nível entre os Governos do Equador e do Peru.

Pensamos, contudo, que o Tratado de Cooperação Amazônica necessita fortale- cer sua estrutura institucional, como forma de adaptar-se aos desafios de nossos dias e melhor cumprir os objetivos para os quais foi concebido. Estamos certos de que a Chancelaria do Equador haverá de trazer aportes importantes derivados de sua experiência aos debates que, sobre este tema, terão lugar nas próximas reuniões do Conselho de Cooperação Amazônica e na Reunião de Chanceleres.

A propósito, quero ressaltar o reconhe- cimento do Governo brasileiro pelo traba- lho exemplar que a Chancelaria equatoria- na tem desenvolvido no exercício da Se- cretaria Pro Tempore do Tratado de Coo- peração Amazônica, ao longo dos últimos três anos. Com efeito, coube à Chancelaria do Equador gerenciar a etapa de transição do TCA entre o período pioneiro e sua atual etapa de amadurecimento, com im-

portante acervo de realizações em benefí- cio de nossos oito países.

Senhor Ministro,

Como que sedimentando nossa identi- dade de propósitos, a geografia encontrou uma maneira tão original quanto definitiva de assegurar a união de nossos países, ao fazer nascer, das encostas orientais do Co- topaxi e do Antisana, os mananciais do caudaloso Napo, também tributário do Amazonas, famoso por ser o rio pelo qual desceu Orellana e pelo qual subiu Pedro Teixeira, em 1657, até chegar a San Fran- cisco de Quito. É o que nos lembrava Miguel Maria Lisboa, nosso primeiro re- presentante diplomático por estas terras, em 1866. Já nos alertava então para a possibilidade de utilização dessa via como ligação entre nossos dois países, pois parte das águas que o Amazonas atira no Ocea- no Atlântico, origina-se, na verdade, em solo equatoriano, em suas fontes, em suas neves, em suas chuvas.

Senhor Chanceler,

Tomemos, pois, a nossa unidade ama- zônica como fonte inesgotável de inspira- ção. A Chancelaria brasileira - asseguro a Vossa Excelência - está sempre aberta ao exame conjunto com a Chancelaria equa- toriana, não apenas dos assuntos que nos interessam em base mútua e bilateral, mas de toda a problemática continental e mun- dial com que se defrontam nossa política externa e nossa atuação diplomática. Ain- da recentemente, no início deste mês de abril, as possibilidades de ação conjugada de nossos países ficaram demonstradas de

forma inequívoca em Santa Cruz de Ia Sierra, na reunião do Grupo do Rio.

Exploremos juntos os terrenos abertos pela revolução científica e tecnológica, nos quais se torna especialmente necessá- ria a conjugação vigorosa de esforços en- tre países da América Latina. O esforço de cooperação mútua, entre nações irmãs nas necessidades e nas aspirações mais gene- rosas, há de repousar na base de uma au- têntica solidariedade continental, requisito indispensável da desejada integração lati- no-americana. Quero assegurar a Vossa Excelência que o Brasil não se poupará no empenho de contribuir para que essa base se torne cada vez maior e mais sólida.

Foi essa preocupação que determinou a iniciativa do Presidente Itamar Franco, ao propor, no início deste ano de 1993, a assinatura de um conjunto de Acordos de Complementação Económica, no âmbito da Aladi, com os países da Região Ama- zônica, hoje conhecida como Iniciativa Amazônica.

Lembrava então, o Presidente Itamar Franco, que democracia enquanto modo de vida e democracia como regime políti- co só existem, com vigor e permanência, nas sociedades em que os homens atuam como cidadãos, e não se reduzem apenas a consumidores. Esta concepção básica nos orienta a todos, tanto no plano interno quanto no relacionamento que infatigavel- mente temos privilegiado no contexto la- tino-americano.

A proposta brasileira da Iniciativa Amazônica decorre da constatação de que o dinamismo assumido pelos esquemas

sub-regionais de integração, que não são excludentes, supõe a intensificação dos vínculos econômico-comerciais entre nos- sos países, com base nos princípios da exploração racional de recursos e da coo- peração mútua, consagrados no Tratado de Cooperação Amazônica.

Trata-se de lançar desde já, com di- mensão amazônica e benefício para todos os países latino-americanos, as bases da desejada articulação entre os esquemas de integração que viemos consolidando na região, dos quais são exemplos maio- res o Mercosul e o Pacto Andino, e que devem confluir, como estabelece o Trata- do de Montevidéu de 1980, para a con- formação de um mercado comum latino- americano.

O decidido esforço de modernização que empreendem nossos países deve re- percutir necessariamente no plano bilate- ral, abrindo novas e promissoras perspec- tivas de cooperação. Estamos todos cons- cientes de que o intercâmbio comercial entre Brasil e Equador continua, ainda, muito abaixo de suas potencialidades. Da mesma forma, as possibilidades de coope- ração técnica e científica não estão ade- quadamente exploradas.

O leque de oportunidades, contudo, é amplo. Devemos aproximar nossos ho- mens de negócios, nossas universidades,

nossas instituições científicas. A agroin- dústria, a biotecnologia, a saúde, as tele- comunicações são campos férteis para a cooperação. Na área cultural, torna-se ur- gente um maior conhecimento recíproco e uma troca mais intensa de experiências. As possibilidades de cooperação são mui- to grandes, sobretudo no que diz respeito à educação.

Estou certo de que nosso entendi- mento continuará a ser, como sempre tem sido, fluído e permanente, sobretu- do neste momento histórico em que se consolida um consenso universal -e que felizmente é uma realidade em nosso Hemisfério - sobre os valores democrá- ticos e sobre a consecução de seus com- ponentes. Nossas Nações perseguem os mesmos caminhos em busca do progres- so de nossos concidadãos, dentro da concórdia, do diálogo e da paz.

É com essa certeza que, em nome do Presidente Itamar Franco e em nome do Governo brasileiro, convido a todos os que se reúnem em torno desta mesa a erguerem suas taças pela prosperidade da nobre e amiga Nação equatoriana, pelo continuado êxito de Sua Excelência o Senhor Presidente Durán Ballén e pela felicidade pessoal de Vossa Excelência e da Senhora de Paredes. •

Vice-Presidente da Comissão