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Discurso do Ministro de Estado, interino, das Relações Exteriores, Embaixador Luiz Felipe Lampreia, no XXIII Período de Ses- sões da Assembleia Geral da Organização dos Estados Americanos, em Manágua, aos

7 de junho de 1993

òenhor Presidente,

Desejo, inicialmente, congratular-me com Vossa Excelência por sua eleição para presidir este XXIII Período Ordinário de Sessões da Assembleia Geral da OEA. 2. A Delegação do Brasil tem a convic- ção de que, sob sua orientação e nesta hospitaleira Manágua, poderemos de- senvolver trabalho frutífero, que nos permitirá avançar no tratamento de te- mas de alta relevância para os países aqui representados.

3. Examinaremos, entre outros, o tema fundamental da segurança hemisférica em seu contexto amplo. Trataremos da pro- moção, fortalecimento e consolidação da democracia no continente e do progresso económico e social dos países americanos. Estes temas - segurança, democracia e desenvolvimento - se acham estreitamen- te vinculados e dizem respeito à questão central da dignidade do homem e do res- peito aos seus direitos fundamentais. 4. A Organização dos Estados America- nos, desde a sua criação, tem persistido no

desempenho da sua missão histórica de oferecer ao homem uma terra de liberda- de e um âmbito favorável para o desen- volvimento de sua personalidade e a rea- lização de suas justas aspirações. Sob a direção firme e serena do Secretário-Ge- ral, João Clemente Baena Soares, a Orga- nização tem ganho significativo alento e buscado renovar-se, de conformidade com os propósitos e princípios consagra- dos na sua Carta.

5. Desde a Assembleia Geral de Nas- sau, vários passos significativos foram dados na consecução dos objetivos que se propôs a OEA.

6. Recordo a realização em Washington, em dezembro de 1992, de Período Ex- traordinário de Sessões desta Assembleia, dedicado à reforma da Carta da Organiza- ção. Naquela ocasião, se adotou emenda que possibilita à OEA suspender do exer- cício de direito de participação nas suas atividades governos de Estados membros onde vierem a ocorrer fatos que interrom- pam pela força o funcionamento do estado democrático. Assinou-se, então, o «Proto-

colo de Washington», no qual se procurou manter o indispensável equilíbrio entre o propósito de promover e consolidar a de- mocracia representativa e os princípios do Direito Internacional, que nos obrigamos a respeitar como membros da OEA e das Nações Unidas. A inclusão de cláusula de suspensão na Carta refletiu, muito clara- mente, a preocupação em não afetar o compromisso que todos temos com o res- peito à vontade soberana dos Estados e ao princípio da não-intervenção. A moldura jurídica em que se move a OEA reflete um necessário e delicado balanceamento entre a defesa da democracia e o pleno respeito à personalidade dos Estados. É esta mol- dura que permitirá traçar caminho seguro a percorrer neste campo.

7. A emenda foi reforçada, por outro lado, pelo fato de neste empreendimento de reforma da Carta ter sido incluída a noção sociedades e põe em risco o próprio processo democrático. Com efeito, a de- mocracia requer um horizonte de aspira- ções comuns no rumo da melhoria pro- gressiva dos níveis de vida de nossos po- vos. Defender a democracia significa, como consagrado no «Protocolo de Was- hington», não só repudiar a violação da ordem constitucional, mas também zelar pela saúde socioeconômica de nossas na- ções. A preocupação com a justiça social não se pode dissociar da manutenção e da consolidação do Estado democrático, que deve ter por centro o indivíduo, sua liber- dade, seu bem-estar, sua segurança. 8. Temos diante de nós a renitência que caracteriza a situação no Haiti, onde per- siste um quadro de ilegitimidade institu-

cional, insegurança social e desproteção dos direitos humanos. O Brasil tem apoiado as resoluções adotadas pelos Chanceleres das Américas a respeito da crise haitiana, inclusive, e em toda a sua plenitude, o embargo comercial ao Hai- ti, implementado por meio do decreto do Governo brasileiro, que torna obrigató- rio o seu cumprimento.

9. Respaldamos também as recentes de- cisões por nós tomadas aqui em Maná- gua, com a esperança e o propósito de que nossa ação conjunta possibilite a pronta restauração do Governo demo- crático no Haiti.

10. Preocupou-nos, por outro lado, a inter- rupção do processo democrático na Gua- temala. Ao se associar ao consenso intera- mericano em deplorar os acontecimentos de 25 de maio último e em tomar as medi- das que nos faculta a Carta da OEA, o Brasil formulou seus votos de que a nor- malidade democrática fosse prontamente restabelecida de forma pacífica naquela nação amiga.

11. As notícias procedentes da Guatemala, que apontam para a normalização consti- tucional do país, nos permitem agora re- gistrar, com satisfação, a eficaz e pronta ação da Organização enquanto instrumen- to confiável a serviço dos princípios esta- belecidos na Carta.

12. Em particular, desejo destacar o rele- vante papel desempenhado pelo Secretá- rio-Geral, que, à frente de missão desta Organização, integrada pelos Chanceleres de Barbados, Nicarágua e Uruguai, pôde contribuir positiva e decisivamente no en-

caminhamento da crise política que se ins- talara no país.

13. Igualmente, deixo registro especial -e o reconhecimento do Governo brasileiro - dos esforços dos Presidentes centro-ame- ricanos, que tiveram também importante participação na busca de uma solução para a crise política na Guatemala.

14. Tema central em nossa agenda é o da cooperação para a segurança hemisférica. Foi aprovada, em Nassau, resolução sobre a matéria copatrocinada pelo Brasil, que tratou também, numa clara compreensão da abrangência da questão, dos aspectos não-militares da segurança, incorporando as preocupações sobre o desenvolvimento económico e social como base indispensá- vel para que se possa atingir uma verda- deira segurança hemisférica.

15. A democracia e a segurança se apoiam, para serem estáveis e duradouras, sobre o desenvolvimento económico e sobre ajus- tiça social, e estes florescem em condições de respeito à vontade da cidadania.

16. Com o fim da confrontação que do- minava o cenário internacional no perío- do da Guerra Fria, afirmam-se univer- salmente os valores da democracia e es- maece a ameaça de uma conflagração militar de grandes proporções. Parado- xalmente, em momento, pois, em que as atenções e recursos globais estariam li- berados para as tarefas de paz e da cons- trução de sociedades material e espiri- tualmente vigorosas, vemos arrefecer o grande debate internacional sobre as questões do desenvolvimento.

17. A prudência, o bom-senso e a visão do futuro indicam claramente, no entan- to, que as questões da conservação am- biental, da prevenção e da repressão do tráfico de drogas e da proteção dos direi- tos humanos não podem ser tratadas fora do contexto do desenvolvimento econó- mico e social das nações.

18. Aquelas questões, por sua visibilidade e inegável importância, merecem ser tra- tadas em profundidade e não podem ser corretamente equacionadas se não se levar em conta as disparidades económicas e sociais que marcam as sociedades de nos- sos países.

19. Permanecem, assim, mais urgentes do que nunca numerosos problemas que atin- gem diretamente os Estados membros da Organização. A um quadro negativo que afeta, de um modo geral, as relações co- merciais de nossos países somam-se a re- duzida taxa de crescimento dos países in- dustrializados e os esquemas restritivos a transferência de tecnologia e conhecimen- to justamente quando a nova estrutura de produção vem-se apoiando mais e mais na informação e no conhecimento.

20. Estes fatores dificultam uma inserção dinâmica da maioria de nossos países na economia mundial e acentuam a perda de participação relativa na expansão global do comércio e na prosperidade dela resul- tante. Observam-se, assim, neste hemisfé- rio, em maior grau, os sintomas de um processo de deterioração de estruturas económicas e sociais, de agravamento das disparidades na distribuição da renda, que leva a riscos maiores de desagregação so- cial e é generalização de episódios de vio-

lação dos direitos humanos, de depredação do ambiente, de violência e de instabilida- de política.

21. Estes elementos indicam o quanto per- manecem atuais os problemas da coopera- ção internacional para desenvolvimento. O desafogo da situação económica, do balanço financeiro internacional da região e, em especial, das situações de pobreza crítica que nos afligem, seria sem dúvida, uma contribuição inestimável para a segu- rança deste hemisfério e para a estabilida- de de suas instituições democráticas. As ações com este propósito devem estar no alto das prioridades estratégicas que hoje se definem.

22. A ênfase que dou nestes aspectos, re- ferentes ao imperativo do desenvolvimen- to, visa a apontar uma faceta essencial da questão da estabilidade e da segurança da região - a de que a América latina requer o entendimento e o apoio da comunidade internacional para o êxito dos árduos es- forços que desenvolvem os Estados da região para bem resolver os seus próprios problemas e tornar-se fonte de paz e pro- gresso para o mundo e não teatros de ins- tabilidade e insegurança.

2 3 . 0 Grande desafio portanto, é trazer novamente para posição de relevo o tema do desenvolvimento. Passos significativos nesse sentido têm sido dados no âmbito da OEA. A revisão da cooperação técnica, levada a cabo pela Organização, no senti- do de torná-la mais adequada à prioridade que os Estados membros atribuem à elimi- nação da pobreza crítica no continente, encontra-se em estágio avançado de deli- berações. A XIX Sessão Extraordinária

desta Assembleia Geral deverá aprovar um conjunto de medidas nesse sentido, que, esperamos, possam tornar a coopera- ção técnica regional instrumento impor- tante no processo de desenvolvimento dos países americanos.

24. A cooperação técnica é, contudo, um meio relativamente modesto ante a gran- deza das necessidades estruturais da maio- ria dos Estados membros. Temos, certa- mente, plena consciência de que a respon- sabilidade primordial de desenvolvimento de nossos países incumbe a nós mesmos individualmente. É essencial, no entanto, que os árduos esforços que fazemos nesse sentido não sejam afetados por fatores ex- ternos sobre os quais não temos controle. É preciso, ao contrário, que sejam apoia- dos e reforçados numa cooperação solidá- ria e de interesse real recíproco.

25. São, portanto, necessárias ações e me- didas concretas em áreas variadas que pos- sam efetivamente contribuir para a erradi- cação das causas da pobreza e do atraso que, em maior ou menor intensidade, afe- tam todos os nossos países. Seria desejável que essas ações e medidas fossem visuali- zadas e estabelecidas sob forma de um verdadeiro programa multifacetado e inte- grado de desenvolvimento que refletisse adequadamente os problemas a equacio- nar e a superar assim como a maneira e meios de encaminhar este grande e com- plexo desafio.

26. Apesar do muito por fazer, cabe reco- nhecer que caminhamos com passos segu- ros no longo e árduo caminho que leva à consecução dos ideais da Organização. A cada Período de Sessões da Assembleia

Geral vamos somando realizações. Todas fazem parte integrante e essencial da cons- trução da paz, da segurança, da justiça e da liberdade em nosso hemisfério.

27. Temos a nossa frente mais uma opor- tunidade de contribuir, com o trabalho que partilharemos nos próximos dias, para esta construção. O Brasil acolhe esta oportuni- dade com ânimo e decisão.

Senhor Presidente,

2 8 . 0 Governo brasileiro teve a honra de oferecer a cidade de Belém do Pará para sede da XXIV Período Ordinário de Ses- sões desta Assembleia. Esperamos que esse convite possa contar com a aceitação dos Estados membros, de forma a que, no próximo ano, tenhamos o prazer de rece- ber suas delegações naquela hospitaleira capital amazônica.

Muito obrigado. •

Posse do Secretário-Geral