O crescimento da crítica não significava, todavia, que o termo cessara de ser mobilizado de forma positiva na década de 1970. Em escolas de negócios, nas corporações, em eventos internacionais e em alguns segmentos da imprensa, esse uso continuou ganhando espaço.
Henry Heinz II, por exemplo, empresário co-fundador do Agribusiness Council, fazia coro à narrativa do desenvolvimento tecnológico que teria possibilitado uma revolução na quantidade e qualidade dos alimentos. Entretanto, a grande expansão na produção havia trazido, segundo ele argumentava, problemas que os agricultores não estariam equipados para resolver, gerando um contexto no qual eles precisariam das indústrias. A única forma de converter a produção agrícola de todos os produtores em meios efetivos de alimentar a crescente população mundial seria por meio do papel a ser desempenhado pelas empresas do agribusiness, advogou Heinz (MOUSE RIVER FARMERS PRESS, 08/11/1973).
Em Roma, durante a Conferência Mundial sobre Alimentação, organizada em 1974 pela FAO, empresas representantes do agribusiness obtiveram destaque na imprensa por sua presença. Queriam ter certeza de que seriam incluídas nos planos de ação em países com alta insegurança alimentar ou baixa produção agrícola, pois, segundo argumentavam, somente suas empresas teriam o conhecimento para enfrentar o desafio de superar essa situação (WP, 17/11/1973). A principal vitória das corporações nesse evento internacional, entretanto, estava relacionada à manutenção da perspectiva de que o aspecto central para o projeto de diminuição da desnutrição seria o aumento da produção de commodities, em ambiente de ressurgimento de argumentos neomalthusianos (SIMON, 2012).
1.6.1 Harvard Business School
Por certo, a influência da HBS em relação à mobilização da ideia de agribusiness não ficou restrita à criação da noção, à formulação de parte de seu espírito (BOLTANSKI & CHIAPELLO, 2005) e à congregação de corporações que atuariam em conjunto diante da inflexão na política alimentar exterior dos EUA. Não que isso fosse pouco, mas cabe salientar que a HBS se consolidou como o principal centro irradiador da ideia de agribusiness ao longo das décadas, tendo papel bastante influente nos rumos que o agronegócio veio a tomar no Brasil.
A partir do Moffett Program in Agriculture and Business, Davis havia passado a oferecer a disciplina Agriculture and Business já em setembro de 1955, com o apoio de Goldberg, que relatou terem sido somente 5 alunos a participarem nesse ano (GOLDBERG, 2017a). Em 1956, o anúncio do Programa na HBS era o seguinte:
O Programa em Agricultura e Negócios combina pesquisa, ensino e cooperação com administração, para avaliar problemas críticos selecionados que estão afetando a agricultura e os negócios relacionados (agribusiness) à luz de uma política nacional de
agribusiness (HARVARD BUSINESS SCHOOL, 1956).
Em parte por não ter recebido posição vitalícia na HBS, John Davis saiu da instituição em 1959 para trabalhar na Agência das Nações Unidas de Assistência aos Refugiados da Palestina, deixando a cátedra Moffett Program in Agriculture and Business sob responsabilidade de Henry B. Arthur, que, com o professor assistente Goldberg, passou a oferecer a disciplina Agricultural Businesses. A década de 1960 veria uma diversificação dos cursos relacionados ao agribusiness, com os dois professores dividindo-se entre elas no Master of Business Administration (MBA). Entre 1968 e 1969, por exemplo, Arthur ministrou o curso de pesquisa “Agribusiness Management Research Report”, ao passo que Goldberg esteve à frente do “International Agribusiness Management Seminar” (HARVARD BUSINESS SCHOOL, 1968).
Após os cursos regulares de MBA começarem a ganhar mais popularidade na HBS, em 1961 foi criado um evento voltado especificamente
aos executivos, o Harvard Agribusiness Seminar (HAS). Goldberg fala que, convidado para criar o seminário naquele ano, teve como desafio convencer altos executivos das corporações a aceitarem fazer parte de um encontro “vertical”, no qual atores de funções a montante e a jusante da agropecuária estariam dialogando (GOLDBERG, 2017a).
Logo no primeiro seminário, os dirigentes das grandes empresas começaram a ser presença majoritária dentre os participantes, inclusive retornando a ele em edições posteriores. Goldberg argumenta que “[...] o seminário acabou não sendo apenas uma ferramenta de educação para a empresa. Ele acabou sendo uma renovação para as pessoas que voltavam todos os anos” (GOLDBERG, 2017a).
Figura 8: Goldberg ministrando aula sobre o agribusiness na Harvard Business
School.
Nas dinâmicas do seminário, tem-se utilizado, desde seu início, o método de casos, clássico na HBS. Segundo explicação do atual coordenador do seminário (BELL, 2017)79, no método de casos alguns exemplos reais de
desafios empresariais e governamentais são selecionados e disponibilizados para leitura prévia pelos participantes. O segundo passo é a divisão em pequenos grupos nos quais nos quais acontecem discussões mais espontâneas das causas e possibilidades de soluções. Completa o processo a discussão mais formal com todos presentes conjuntamente.
A ideia, afirma Goldberg (2013), era que os executivos estivessem em ambiente no qual pudessem pensar de forma mais criativa sobre os planejamentos estratégicos de suas áreas. Estimulava-se que esse processo se desse sob a referência sistêmica da noção de agribusiness, tendo cada participante que fazer propostas levando em conta as cadeias produtivas como um todo. Ainda de acordo com Goldberg,
[...] por sentirmos que – conceitualmente e operacionalmente – os setores privado, público, e das ONGs tinham de pensar sistemicamente, nós deveríamos fornecer casos para que cada uma dessas partes componentes, em cada nível do sistema, pudesse compreender não somente como se inseririam mas também para entenderem a forma como eles se relacionavam com todos os outros setores desse sistema de commodity (GOLDBERG, 2013: 205).
Com isso, encorajavam-se predisposições para que os diferentes segmentos se aproximassem e passassem a negociar de maneira mais bem fundamentada. Nesse ambiente, os principais desdobramentos práticos eram as maiores possibilidades para a criação de alianças corporativas.
Com o tempo, o HAS iria tornar-se referência internacional para líderes de corporações, governos e entidades da sociedade civil que estariam ligados a toda a cadeia de suprimentos da agropecuária, como produtores, processadores e distribuidores de produtos agropecuários e alimentícios, grandes redes de supermercados, prestadores de serviços relacionados a alimentos, fabricantes e distribuidores de insumos e equipamentos agrícolas, firmas financiadoras,
79 David Bell, atual titular da cátedra de Agriculture and Business da Harvard Business
governos, instituições educacionais e empresas de tecnologia. Na história do seminário, pode-se destacar a participação de corporações e organizações como a Coca-Cola, a Cargill, a Bunge, a Monsanto, a John Deere, a Nestlé, o McDonald’s, o Walmart, a FAO e o Banco Mundial, além de empresas brasileiras como a JBS e a BRF (HAS, 2016;; BELL, 2017).
Figura 9: Goldberg durante aula sobre o agribusiness na Harvard Business School.
Foto: Baker Library Special Collections, Harvard Business School (ca. 1970).