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MODELO DUPLA VIA E A DISLEXIA

CAPÍTULO 2 DISLEXIA EM CONTEXTO EDUCACIONAL

2.3. MODELOS E MECANISMOS DE LEITURA

2.3.2. MODELO DUPLA VIA E A DISLEXIA

O défice nas duas vias, no modelo dupla via para a leitura, pode indicar três tipos de dislexia: o tipo fonológico, quando o sujeito não ativa a descodificação grafema-fonema; o tipo lexical, também designado de superfície, quando existem dificuldades em aceder à palavra na globalidade e necessitam de recorrer constantemente à reconversão fonema-grafema (têm a via lexical comprometida); o tipo misto que está patente quando os disléxicos apresentam ambos os problemas (lexical e fonológico) em simultâneo (Castro & Gomes, 2000; Citoler, 1996; Frith, 1985).

Devido à heterogeneidade de casos de dislexia, têm surgido diversas hipóteses que procuram explicar as causas da mesma, viabilizando uma disparidade de critérios na classificação em subtipos de dislexia, nomeadamente, ―los trabajos pioneros de Boder (1973) con su clasificación de los niños con dificultades lectoras en disfonéticos, deseidéticos y mistos, se han sucedido otros trabajos que proponen una clasificación desde los referentes teóricos‖ (Defior & Serrano, 2004, p. 22). Têm sido utilizadas outras designações, comopor exemplo: a dislexia fonológica e a dislexia de superfície (Castles & Coltheart, 1993), conforme a via utilizada para a realização da leitura, tendo como princípio o modelo dupla via que, como já explanámos, pretende explicar como é realizado o procedimento da leitura.

Na perspetiva de Defior e Serrano (2004), os disléxicos fonológicos:

Solo pueden leer por la ruta léxica, ya que está alterada la fonológica, y se caracterizan porque leen bien palabras familiares pero no pueden leer pseudopalabras, ni palabras

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desconocidas, debido a que no pueden utilizar el mecanismo de conversión de grafema- fonema. (pp. 23-24)

Por outro lado, para os mesmos autores, os disléxicos de superfície:

Pueden leer por el procedimiento fonológico pero no por el léxico, y por ello, normalmente son incapaces de reconocer una palabra como un todo. Estas personas leen mejor las palabras regulares, sean familiares o no, pueden leer pseudopalabras y sus errores más frecuentes son omisión, adición o substitución. (pp. 23-24)

Coltheart (2006) aprofunda a temática ao referir que o modelo conexionista se diferencia do modelo dupla via, tendo em conta as componentes básicas da leitura.

A abordagem dupla via não explica totalmente como é que são introduzidas as novas palavras ou as representações no léxico ortográfico e, ainda, como é que as crianças aprendem a correspondência letra - som. Neste sentido, surge a teoria conexionista, que difere da teoria da dupla via em três aspetos fundamentais: 1) na abordagem dupla via, as palavras são representadas localmente no sistema de leitura, significando que uma dada palavra corresponde a uma única unidade de entrada no léxico; na abordagem conexionista, qualquer palavra pode ser representada pela ativação de diversas unidades do sistema e qualquer unidade pode representar várias palavras diferentes; 2) na abordagem conexionista, todas as letras são processadas em simultâneo, ao contrário da abordagem dupla via, em que o procedimento não lexical faz corresponder às letras os sons, sequencialmente, letra após letra, da esquerda para a direita; 3) na abordagem conexionista, é utilizado o conhecimento da palavra para a leitura em voz alta, de acordo com a grafia e a pronúncia das palavras, que vai melhorando, gradual e progressivamente, com treino; em contrapartida, a abordagem dupla via utiliza um conhecimento gradualmente adquirido, como resultado da aprendizagem (Coltheart, 2006).

Os trabalhos de Manis et al. (1996; 1999) ―han validado esta división partiendo de la perspectiva de los modelos conexionistas, en lugar de los de doble ruta‖ (Defior & Serrano, 2004, p. 23).

125 Neste sentido, foram desenvolvidas variações do modelo dupla via, nomeadamente o modelo de Seymour e de Bryant, mas que não têm reunido consenso, sendo a teoria da dupla via ―um dos quadros teóricos que melhor explica a maior parte das questões relacionadas com dislexias, afasias, situações de baixo rendimento leitor e dificuldades ortográficas‖ (Silva, 1995, p. 45) e a classificação mais utilizada é a que ―distingue entre disléxicos fonológicos y superficiales‖ (Defior & Serrano, 2004, p. 23).

Coltheart (2006) concluiu que a abordagem conexionista não explica a tarefa da decisão lexical. Sendo assim, como já afirmámos, o modelo dupla via é a abordagem mais promissora que, convertida num modelo computacional, poderá abrir caminhos para a compreensão cabal desta problemática.

A classificação da dislexia em subtipos tem sido questionada, existindo diversos autores que discordam da divisão em subgrupos, considerando que é difícil criar grupos homogéneos. A criação de subtipos poderá ser realizada com base em diferentes critérios e com base em diferentes teorias, dependo das causas que se atribuem à dislexia. Na verdade, estas podem ir desde a atribuição de causa única, como por exemplo, neurológica ou genética, até à atribuição de múltiplas causas, que podem derivar de estudos clínicos, qualitativos ou de estudos estatísticos, quantitativos. Existe, indubitavelmente, ainda um longo caminho a percorrer até se chegar a um consenso (Rebelo, 2001).

Contudo, os estudos, que procuraram diferenciar os disléxicos em subtipos, contribuem para uma maior compreensão da problemática e permitem confirmar que a dislexia é caracterizada por diversos problemas relacionados com a aprendizagem da leitura e da escrita e não por um ―distúrbio único‖ (Rebelo, 2001, p. 109).

As descobertas relativas ao funcionamento do cérebro de crianças disléxicas em idade escolar, em comparação com o de crianças sem dislexia, confirmaram que existem evidências consistentes que atribuem a dislexia a défices de linguagem precoces, nomeadamente no processamento fonológico, isto é, défices básicos da dislexia, sendo que a manifestação da dislexia ―dependerá da idade da criança e da extensão em que têm sido remediados, quer através de ensino ou através de outras formas de intervenção, incluindo a fonoaudiologia‖ e não tanto pelas duas vias, a via lexical e a via fonológica (Frith, 1995; Morton & Frith, 1995, citados por Snowling, 2004, pp. 14-15).

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No entanto, subsiste ―carência visível de evidências em prol de subtipos distintos‖ de dislexia (Bryant & Impey, 1986, citados por Snowling, 2004, p.18), atendendo a que as crianças disléxicas diferem na ―gravidade dos seus problemas de processamento fonológico‖, afetando o modo como os seu sistema de leitura se estabelece, sendo o foco da dislexia um défice neste processamento.. Assim, as ―habilidades próximas ao cerne da dislexia incluem a leitura de não- palavras e aspectos da consciência fonológica; as habilidades não tão próximas incluem avaliações da memória de trabalho e da compreensão auditiva‖ (Snowling, 2004, pp.18-19).