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PERFIL DAS CRIANÇAS COM NEE ABRANGIDAS PELA EDUCAÇÃO ESPECIAL

CAPÍTULO 1 EDUCAÇÃO ESPECIAL NO ENSINO BÁSICO

1.4. ESCLARECIMENTOS CONCEPTUAIS

1.4.3. PERFIL DAS CRIANÇAS COM NEE ABRANGIDAS PELA EDUCAÇÃO ESPECIAL

A variedade de noções associadas às NEE conduz, necessariamente, a dificuldades ao nível da definição do conceito (Van der Veen, Smeets, & Derriks, 2010). Aliás, O`Regan (2007, p. 11) assegura que ―não existe nenhuma definição absoluta para NEE‘s‖. O termo genérico diz respeito a alunos com diferentes tipos de incapacidades, combinadas com diversas dificuldades na participação escolar.

As NEE de uma criança com dificuldades de aprendizagem não deveriam ser as suas condições pessoais mas sim o que essas condições exigem à escola. Deste modo, as necessidades educativas «especiais» de um aluno numa determinada escola podem não o ser noutra que lhe proporcione outros recursos de acesso ao currículo, tanto pessoais como materiais, atuando de modo diferente (Pastor, 1993; Vallejo, 1998, citados por Peixoto, 2008, p. 4). As condições e as interações que a escola proporciona à criança são, pois, alicerçais para determinar as suas NEE.

87 A Declaração de Salamanca contribui para a definição de NEE (Sanches & Teodoro, 2006, p. 67) com a seguinte afirmação da Unesco (1994), firmando que as escolas se devem adaptar a todas as crianças:

As necessidades educativas especiais referem-se a todas as crianças e jovens cujas carências se relacionam com deficiências ou dificuldades escolares. Muitas crianças apresentam dificuldades escolares e, consequentemente, têm necessidades educativas especiais, em determinado momento da sua escolaridade. (UNESCO, 1994, p. 6)

Na Inglaterra, estão instituídos dois grupos de alunos com NEE, os que têm dificuldades de aprendizagem moderadas, com um acompanhamento específico, e os que têm registo de NEE. Estes já usufruíam anteriormente de acompanhamento escolar específico, recebendo ―uma provisão educacional adicional para ajudá-los a ter acesso ao currículo‖ (Censo Escolar Anual do Nível dos Alunos, 2003, citado por Farrell, 2008, p. 22).

As crianças com NEE são as que têm um desempenho escolar menor que os seus colegas da mesma idade, que tiveram a intervenção adequada, mas com níveis de desempenho inferior na maioria das áreas do currículo, de acordo com o que seria de esperar para a sua faixa etária. Estas crianças revelam maiores dificuldades que os seus pares na aquisição das competências básicas da leitura, da escrita, do cálculo e em compreender conceitos. Podem apresentar ―atraso na fala e na linguagem, baixa auto-estima, baixos níveis de concentração e habilidades sociais subdesenvolvidas‖ (Censo Escolar Anual do Nível dos Alunos, 2003, p. 3, citado por Farrell, 2008, p. 22).

Segundo Rodrigues (2001), a designação de NEE abrange os alunos com alguma deficiência ou com uma realização escolar inferior à média, enquanto, para Correia (1999), as NEE dizem respeito a crianças ou jovens com problemas sensoriais, físicos, intelectuais, emocionais e com dificuldades de aprendizagem, que não conseguem acompanhar um currículo normal, distinguindo os de carácter permanente e os de carácter temporário. No grupo dos alunos com NEE de carácter permanente, para o mesmo autor (Correia, 1999), integram-se os alunos:

Cujas alterações significativas no seu desenvolvimento foram provocadas, na sua essência, por problemas orgânicos, funcionais e, ainda, por défices sócio-culturais e económicos

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graves. Abrange, portanto, problemas de foro sensorial, intelectual, processológico, físico, emocional e quaisquer outros problemas ligados à saúde do indivíduo. (Correia, 1999, p. 49)

Os alunos com NEE de carácter temporário são os que necessitam de uma adaptação parcial do currículo escolar, em conformidade com as suas características individuais, num determinado momento do seu percurso escolar. Assim, de acordo com Correia (1999), ―podem manifestar-se com problemas ligeiros de leitura, escrita ou cálculo ou como problemas ligeiros, atrasos ou perturbações menos graves ao nível do desenvolvimento motor, preceptivo, linguístico ou sócio-emocional‖ (p. 52).

No que concerne ao enquadramento legal dos alunos com NEE, na década de 90, com o Decreto-Lei n.º 319/91, de 23 de agosto, havia uma preocupação em determinar as medidas educativas especiais e em clarificar o conceito de NEE, baseado em critérios pedagógicos, em detrimento de critérios meramente médicos.

Posteriormente, com o Decreto-Lei n.º 6/2001, de 18 de janeiro, no artigo 10.º (que foi revogado, posteriormente, pelo Decreto-Lei n.º 3/2008, de 7 de Janeiro), consideram-se com NEE de carácter permanente

Os alunos que apresentem incapacidade ou incapacidades que se reflitam numa ou mais áreas de realização de aprendizagens, resultantes de deficiências de ordem sensorial, motora ou mental, de perturbações da fala e da linguagem, de perturbações graves de personalidade ou de comportamento ou problemas graves de saúde. (capítulo II, artigo 10.º, p. 261)

Neste contexto, as NEE de carácter permanente são, em consonância com Correia (1999), ―aquelas em que a adaptação do currículo é generalizada e objecto de avaliação sistemática, dinâmica e sequencial de acordo com os progressos do aluno no seu percurso escolar‖, uma vez que os alunos com NEE de carácter permanente são as crianças com alterações ―significativas no seu desenvolvimento‖ (p. 49).

89 As NEE temporárias requerem ―modificação parcial do currículo escolar, adaptando-o às características do aluno num determinado momento do seu desenvolvimento‖ (Correia, 1999, p. 49), podendo exteriorizar, como já referido, problemas ligeiros numa ou várias áreas de desenvolvimento (Correia, 1999, p.52).

Contudo, esta definição foi alterada pelo referido Decreto-Lei n.º 3/2008. Os apoios contemplados neste novo enquadramento legal têm por objetivo responder às NEE dos alunos:

Com limitações significativas ao nível da actividade e da participação, num ou vários domínios de vida, decorrentes de alterações funcionais e estruturais, de carácter permanente, resultando em dificuldades continuadas ao nível da comunicação, da aprendizagem, da mobilidade, da autonomia, do relacionamento interpessoal e da participação social. (p. 155)

Este decreto tem em consideração a distinção que se pode realizar relativamente aos alunos com NEE, em termos de intensidade e de frequência do princípio da diferenciação. Perante este enquadramento legal, os alunos com NEE são aqueles cuja participação e atividade está seriamente comprometidas, devido ao grau das suas limitações, com alterações funcionais de carácter permanente. Os alunos com um grau de gravidade menor não beneficiam das medidas contempladas pelo mencionado Decreto-Lei n.º 3/2008.

Porém, apesar do grupo das crianças a ser abrangido pela EE estar claramente definido, é complicado realizar um diagnóstico preciso, perante a dificuldade de distinguir o grupo de crianças com NEE cujas dificuldades são causadas por fatores intrínsecos do das que são causadas por fatores extrínsecos (Peixoto, 2008).

As Dificuldades de Aprendizagem (DA) que as crianças apresentam, no geral, pelas conclusões de Peixoto (2008):

Não têm uma causa única, nem uma intervenção que seja a mais eficaz em todos os casos; não existe uma única técnica de ensino e um tipo ―standard‖ de material didáctico que seja benéfico, em si, para todos os casos de DA; a maioria das crianças com DA manifesta

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dificuldades na escola desde os primeiros anos; a ênfase na recuperação e reeducação deveria ser desviada para a prevenção; o diagnóstico e a intervenção precoce nas DA devem ser desenvolvidos como meios de reduzir a emergência de outros problemas associados; um programa educativo para as DA deve preocupar-se não só com o desempenho escolar, mas com a personalidade inteira; o trabalho com os pais é essencial para a compreensão da problemática envolvida na DA em causa; os professores deverão ser apoiados por equipas multidisciplinares de profissionais qualificados, especialmente nos casos mais complexos. (p. 221)

Enfim, as dificuldades de aprendizagem das crianças com dislexia podem tornar-se muito graves de modo a comprometer a participação na vida escolar e social, transformando-se numa situação incapacitante, difícil de ultrapassar sem ajuda, como salienta Chantal Valeri, Présidente d‘APEDA France (citado por Montarnal, 2011):

Si la difficulté de certains élèves dyslexiques devient trop importante et ne leur permet plus de répondre aux attentes du milieu scolaire, si la participation à la vie sociale est rendue difficile voire impossible sans aide, alors ils sont en situation de handicap. La notion de handicap concerne l‘individu et la société, l‘individu dans la société. (p. 88)

Importa, neste contexto, atentar na definição de incapacidade, no contexto legal francês, nas palavras de Montarnal (2011):

Constitue un handicap, au sens de la présente loi, toute limitation d‘activité ou restriction de participation à la vie en société subie dans un environnement par une personne en raison d‘une altération substantielle, durable ou définitive d‘une ou plusieurs fonctions physiques, sensorielles, mentales, cognitives ou psychiques, d‘un polyhandicap ou d‘un trouble de santé invalidant. (p. 87)

91 As disposições legais para EE em França, situam a dislexia no domínio cognitivo, referindo que é um ―handicap cognitif spécifique et durable‖ (Montarnal, 2011, p. 87), o que aproxima esta definição da proposta pelo quadro legal para a EE em Portugal.

No Reino Unido, conforme informação publicada no Suplemento Educacional do Times de junho de 2004, ―um em cada quatro alunos na Inglaterra e no país de Gales apresentava alguma forma de necessidade especial‖. A Special Educational Needs and Disability Act (SENDA), de 2001, profere que uma criança com NEE apresenta uma dificuldade de aprendizagem que exige medidas educacionais especiais somente para si. As NEE não são classificadas de acordo com uma escala pré-determinada, mas em relação à maneira como a criança se comporta em comparação com os seus colegas podendo, porém, as NEE serem agrupadas. Assim, no Código de Práticas das NEE (2001), consideram-se quatro linhas principais de necessidades educacionais especiais: comunicação e interação; cognição e aprendizagem; desenvolvimento comportamental, emocional e social; desenvolvimento sensorial e/ou físico (O`Regan, 2007).

No caso português, a definição de NEE é mais restrita, se considerarmos as três áreas de especialização dos professores de EE23: (i) Domínio Cognitivo-Motor; (ii) Domínio da Audição e Surdez; (iii) Domínio da Visão (cf. Portaria n.º 212/2009, de 23 de Fevereiro). As NEE dos alunos a serem abrangidos pela EE têm que ser de carácter permanente, portadores de deficiência nas funções e estruturas do corpo, dificuldades moderadas e graves na atividade e participação escolar, cuja ―taxa de prevalência‖ seja de ―cerca de 1.8%‖ (Ministério da Educação, 2008, p. 8). Só as crianças com NEE de carácter permanente podem ser contempladas pelas medidas constantes no Decreto-Lei n.º 3/2008.

De acordo com Lima e Bento (2009), as atuais orientações emanadas pelo Decreto-Lei n.º 3/2008 excluem as NEE de carácter temporário da EE. As NEE de carácter permanente e as NEE de carácter temporário ―necessitam de um planeamento e atendimento diferentes e muitas vezes incluía-se tudo no mesmo, [sendo] necessário criar medidas educativas alternativas para os grupos de NEE temporários‖. Mencionam, ainda, que as tipologias definidas para a EE são as seguintes: ―Surdos, Cegueira e Baixa Visão, Domínio Cognitivo, Problemas de Comunicação Linguagem e Fala, Domínio Motor e Saúde Física‖ (p. 2).

23 De acordo com a Portaria n.º 212/2009, de 23 fevereiro, pp. 1261- 1264, I série, n.º 37, sobre habilitações

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