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2. Os grupos de samba de roda de Cachoeira

2.4. Modos de aprendizagem do samba em Cachoeira

As transformações musicais e estilísticas do samba em Cachoeira estão intimamente conectadas a mudanças nas formas de transmissão de conhecimento e aprendizagem. Certa vez, conversando com o sambador Viana no quintal de sua casa, ele me mostrou uma chamada na viola que, segundo ele, era do finado Ferrolho, um dos violeiros mais celebrados do tempo antigo. Quando, animado, eu perguntei se Ferrolho havia ensinado a chamada para ele, a resposta veio em tom sério e categórico: “Ensinou não! Ele tocando e eu peguei o ritmo dele.”. Viana, com quase cinquenta anos, é de uma geração que conviveu com os sambadores do tempo antigo, mas, como os sambadores mais jovens, toca com destreza vários instrumentos e outros repertórios, fazendo parte não apenas de grupos de samba de roda, mas dos de forró, arrocha e reggae. Seu pai sambava com seu Carlito, tanto que quando eu propus a seu Carlito gravá-lo, ele me pediu que levasse mais três sambadores que ainda sabiam tocar como os antigos, entre eles, Viana, que sabia acompanhá-lo na viola como o pai fazia.

A resposta de Viana está em consonância com o que muitos sambadores mais velhos que ele me contaram. Entre eles, é comum a afirmação que aprenderam a

gritar e tocar samba frequentando os carurus, rezas e toques de Candomblé, pegando

escondido os instrumentos de seus pais ou ainda olhando os sambadores mais velhos. Como conta seu Domingos Preto:

Eu aprendi a sambar escondido, minha mãe não deixava sair, então esperava todos dormirem para poder ir pro samba. Lá, estavam alguns conhecidos que me ensinaram a sambar, aprendi tudo só olhando. Quando estava com 12 anos, Justino pediu ao meu pai pra poder sambar, aí comecei no samba e não parei mais. (seu Domingos Preto, apud Döring, 2016, p.191, grifos meus)

Muitos sambadores contam que, durante a infância, os sambas – sobretudo os que atravessavam a madrugada - não eram considerados atividades adequadas para crianças e a sua participação era limitada ou vigiada. Seu Pedro Galinha Morta, por exemplo, passou a tocar timbal em rezas e carurus ainda criança, porém sambadores mais velhos tinham que pedir permissão ao seu pai, pegá-lo e devolvê-lo em casa. Por outro lado, havia o aprendizado cotidiano do samba como uma língua franca, um

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aprendizado que não era restrito aos sambadores, mas sim, comum a todos os cachoeiranos. Zel do Samba (Entrevista em 09/02/2018) conta que começou “(...) a aprender samba nessa faixa entre treze e quatorze anos (...) nesse meio de Candombré com o sambinha que o pessoal fazia nos carurus (...) Eu ficava ali no meio dos coroas batendo pandeiro”.

Assim, não havia formalidade no aprendizado do samba, de modo que a grande maioria dos cachoeiranos é capaz de se acompanhar de palmas e cantar um vasto repertório de corridos, barraventos, sambas de caboclo e sambas de Cosme e

Damião, Santo Antônio, São Roque e outros santos. Nesse sentido, se a criança

aprendia pela experiência, olhando os mais velhos e reproduzindo o que via, não havia necessidade de ensino formal; por outro lado, se a criança se mostrava interessada demais, isso poderia gerar desconfiança e ela precisaria demonstrar merecimento para aprender. Em outras palavras, precisaria aprender não apenas a cantar ou tocar samba, mas a como se comportar no território em disputa dos grandes

sambadores, a quem deveria respeitar. Como aponta Döring (2016, p.72), para o

divertimento basta a reunião de “(...) algumas pessoas que saibam cantar, bater palmas e batucar um em qualquer objeto disponível nos ritmos do samba de roda, mas isso não significa desqualificar aqueles músicos e cantadores que realmente sabem, estudam e lideram as rodas de samba”.

No tempo antigo, o samba não era ensinado formalmente por dois motivos principais: primeiro, o samba era aprendido potencialmente por todos através da experiência nas atividades ordinárias do cotidiano – o canto de trabalho, a reza e a brincadeira – e nos muitos eventos dos sambas de vizinho que povoavam a vida social cachoeirana; segundo, aqueles que queriam se tornar grandes sambadores não encontrariam muita simpatia dos mais velhos, já que entre os grandes sambadores havia um terreno de disputa e conflito em que o conhecimento era uma arma. Transmitir o que se sabia para outro sambador significava ficar desprotegido. Com relação a essa questão, Döring (2016, p.96) relata uma interessante anedota de Mestre Quadrado, grande sambador da Ilha de Itaparica, falecido em 2004:

Mestre Quadrado contou alguns segredos de se entoar uma chula com qualidade e variedade e ao mesmo tempo não ser “imitado”, porque todos os sambadores “cobra criada” iam participar dos sambas dos outros para “espiar” e aprender uma chula nova. Precisaria cantar a mesma chula de um jeito diferente, entoar de forma variada, modulando a melodia e o timbre, para que não ficasse repetida e fácil de ser copiada, o que lembra a

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arte de Mestre Bimba que virava as costas, quando estava solando e improvisando no berimbau para que as pessoas não descobrissem os “macetes”, que vão muito além de tocar um ritmo básico. (Döring, 2016, p.96, grifos no original).

Nesse caso, Mestre Quadrado usa da inovação estilística como uma forma de se proteger dos sambadores que queriam aprender as suas chulas. O que ele dominava era muito mais do que um repertório, era também a técnica que o permitia cantar a mesma chula de um modo sempre diferente. Com isso ele se protegia dos sambadores capazes de copiar as suas chulas caso as ouvissem repetidas vezes, porém incapazes de perceber as sutilezas que ele imprimia no canto fazendo pequenas variações melódicas e tímbricas.

Mesmo com essa estratégia, por certo alguns sambadores de técnica mais apurada conseguiram aprender chulas de Mestre Quadrado e, de fato, muitas delas ainda são cantadas por sambadores de outras localidades. A chula, o samba de

parada, o samba de verso e outras modalidades de samba que exigiam técnicas de

canto e toque sofisticadas, capacidade de improvisação e ferramentas mnemônicas eram, portanto, restritas a um grupo pequeno de sambadores. Isso não quer dizer que o jovem não poderia aprender, mas, como aponta Lima (2016), a chula era uma arte iniciática: não se trata de uma instituição, mas tão longos e tortuosos eram os caminhos para se tornar um grande tirador de chula, que só com o suor de muitos anos de dedicação um menino interessado no assunto realmente se tornaria um

sambador reconhecido pelos seus pares.

Aqui vemos uma questão interessante: tirar chula é uma disputa que pode se tornar acirrada e agressiva, mas é uma disputa feita, muitas vezes, entre amigos de longa data e dentro de um conjunto de regras compartilhado tacitamente. Essa disputa é feita em parelhas, ou seja, é cantada em duo, o que exige a cooperação entre dois

sambadores. A parelha pode ser fixa – uma dupla que sempre samba junto – ou pode

se compor ali, no momento em que se tira chula e de acordo com o contexto. O encaixe das vozes em versos que não são pré-definidos, portanto, imprime uma necessidade também desafiadora de cooperação entre dois sambadores. Assim, tirar

chula não é apenas uma disputa. O jogo, na verdade, se dá em dois níveis: a disputa

entre os sambadores - ou entre as parelhas - e a necessidade que os sambadores têm de equilibrar adequadamente desafio e cooperação. Trata-se de um desafio, mas de

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um desafio onde ninguém pode sambar sozinho. Um sambador que, porventura, queira sozinho desafiar e vencer a todos, não terá sucesso ou respeito.

Écinho, sambador associado ao tempo antigo de Acupe e que gosta muito de participar das acirradas disputas de chula, passou muitos anos as frequentando quando criança e jovem e não sendo levado a sério, até que, pouco a pouco, foi aceito entre os velhos sambadores (Lamparelli, 2019). Com eles aprendeu parte do que sabe, já que nesse terreno de disputa e desconfiança dos tiradores de chula um sambador nunca ensina tudo o que sabe. Por outro lado, aquele que aprende precisa não apenas dominar o repertório de chulas dos outros, como também aprender as ferramentas para criar o seu próprio repertório. Se alguns desses sambas são de autor desconhecido e uso geral, outros têm criador facilmente reconhecível: esse verso aí é

de finado Leopoldo! O grande sambador associado ao tempo antigo, portanto,

destaca-se por, além de dominar um repertório geral e acessível a todos, criar o seu próprio e conhecer bem os repertórios de seus amigos/adversários.

No entanto, mesmo no caso da chula, as oportunidades de aprendizado informal - de pegar o ritmo olhando - eram antes muito maiores. Os sambadores consensualmente afirmam que os eventos do regime dos sambas de vizinho do tempo

antigo duravam longas horas e amanheciam o dia, sobretudo se comparados a duração

diminuta das atuais tocadas – duas ou três horas. Ivan da Maraca me contou que quando toca a maraca por muito tempo seguido, seu antebraço fica dormente devido ao esforço repetitivo. Perguntei como ele aguentava o esforço nos sambas do tempo

antigo, que duravam a noite toda. A resposta foi que nas tocadas do tempo presente a

situação é pior: nelas ele toca duas ou três horas seguidas sem revezar com ninguém; no tempo antigo, ele deixava a maraca na mão de outro tocador e ia tomar uma cerveja, sambar ou descansar. Assim seguia toda a noite. Fazendo um exercício de imaginação, eu suponho que vários meninos que estavam aprendendo a sambar pela via da experiência aguardavam ansiosamente por esse momento de revezamento, já que, mais ou menos hora, poderiam assumir o toque de algum instrumento junto aos

sambadores mais velhos.

A criança aprendia, portanto, lidando com certo descaso dos mais velhos. Isso não quer dizer que o interesse das crianças em aprender a sambar não fosse valorizado no tempo antigo, mas que o conhecimento profundo no samba era para poucos. Ainda que não houvesse um processo de iniciação institucionalizado, como no Candomblé,

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algumas modalidades de samba eram restritas a uma categoria de sambadores, enquanto outros tipos de samba eram de uso geral e não demandavam capacidades técnicas mais sofisticadas. Mesmo que não houvesse um processo de iniciação institucionalizado, a proximidade entre samba e Candomblé não pode deixar de ser levada em conta nesse caso. Como aponta o pesquisador cachoeirano Cacau Nascimento (2019b, p.17, texto inédito), no Candomblé a “antiguidade é posto” e a assiduidade dos recém-iniciados no terreiro é essencial, já que a transmissão dos segredos se dá através da convivência com os mais velhos e apenas em circunstâncias especiais. Segundo o autor (idem), a noviça é afastada da conversa entre os mais velhos, levando a um aprendizado lento e não-linear, processo conhecido como catar

folha.

É preciso levar em conta que o Candomblé em Cachoeira, qualquer que seja a sua nação, apresenta grau de institucionalização, determinação de funções e hierarquia de cargos bem maiores e mais complexos que os dos grupos de samba de roda. No entanto, esse processo de aprendizagem lento e iniciático não é exclusividade dos terreiros, senão que é parte integral do ethos cachoeirano. A máxima antiguidade é posto vale para a vida cotidiana de Cachoeira, assim como a lógica de que o aprendizado dos segredos de qualquer atividade demanda tempo, paciência e merecimento. A institucionalização dos grupos de samba de roda trouxe significativas mudanças para o processo de aprendizagem dos sambadores, mas muitos deles ainda lidam com isso de modo parecido com o que acontece no Candomblé: conhecimento, antes que algo acessível ou pertencente a todos, é um segredo aprendido pela experiência; por sua vez, se o segredo fosse para todos, não seria segredo59.

Muitos sambadores contam que, no tempo antigo, os jovens primeiro deveriam provar seu merecimento para depois receber a permissão de conhecer aquilo que estava além do que se podia aprender olhando. Ouvi mais de uma vez as histórias de sambadores que foram repreendidos pelos seus pais quando estes descobriram que o filho estava pegando escondido instrumentos de percussão ou cordas em casa; no entanto, as narrativas convergem em um clímax seguido do desfecho em que, ao se

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Lembro de uma máxima muitas vezes ouvida por mim na infância em Minas Gerais: segredo é bom

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dar conta de que a criança havia sido capaz de aprender algo de substancial sozinha, o pai passava a ensinar para o filho os seus segredos no instrumento.

Também ouvi sambadores – especialmente aqueles que gritam chula – contarem que, na juventude, só passaram a ser respeitados pelos mais velhos quando souberam responder adequadamente a um verso jogado a eles em desafio. De modo similar, Graeff&Oliveira Pinto (2012) contam que violeiros de Santo Amaro da Purificação tinham por costume tocar na viola um padrão que exigisse do sambador um grito mais complexo, quase virtuose, sempre que queriam testar a capacidade de um desconhecido que chegava ao samba. Em todos esses casos, o samba é um terreno conflituoso no qual os grandes sambadores disputam entre si e os novos sambadores que desejam obter reconhecimento precisam passar por uma série de provações.

No tempo antigo, portanto, o aprendizado pela imitação e experiência de um repertório geral era potencialmente acessível a todos, o que não significa que todos estavam aptos a aprender qualquer coisa a qualquer momento. Havia um círculo de

sambadores excepcionais que viviam em um contexto de disputa entre si e que

dominavam repertórios e técnicas pouco acessíveis à maioria dos cachoeiranos. Nesse segundo caso, o novato precisaria ser humilde frente aos mais velhos que, provavelmente, não fariam a sua vida fácil, mas que aos poucos respeitariam e integrariam o noviço na medida em que ele - olhando ou catando folha – demonstrasse a sua capacidade.

Sob nenhum aspecto, contudo, caberia no tempo antigo o ensino formalizado, a realização de ensaios ou o discurso de que é necessário engajar os jovens no aprendizado do samba. Ao longo do meu período de campo, escrevi diversos projetos culturais em parceria com sambadores de Cachoeira. Alguns deles eram editais simplificados em que os projetos resultavam da resposta escrita ou oral de uma série de perguntas, como é o caso do Prêmio Culturas Populares, do Ministério da Cultura, e do Edital Culturas Populares Versão Simplificada, do Fundo de Cultura do Estado da Bahia. Com uma pequena variação na redação, há em ambos uma mesma pergunta:

como engajar os jovens no aprendizado e manutenção de sua atividade cultural?

Não é apenas nos editais que essa questão aparece, ela também é recorrente em reportagens, entrevistas, trabalhos acadêmicos e documentários. Geralmente, essa questão vem acompanhada de duas afirmações subliminares: primeiro, uma dada

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manifestação cultural está em risco de desaparecimento e é necessário encontrar maneiras de engajar os jovens para garantir a sua continuidade; segundo, é desejável que todos se engajem nessa manifestação cultural ou que, ao menos, ela esteja ao alcance de todos. Embora bem-intencionados e necessários para a democratização no acesso aos meios da produção cultural para comunidades tradicionais e grupos de cultura popular, esses editais de cultura – e as políticas culturais em geral - ajudam a transpor para a prática de uma manifestação cultural o que José Reginaldo dos Santos (1996) identificou como a retórica da perda nos discursos institucionais e acadêmicos sobre o patrimônio cultural.

Nesse modo de pensar o samba e outras manifestações passíveis de serem classificadas como cultura popular ou patrimônio cultural imaterial, há uma suposição de que o conhecimento tradicional deve pertencer a todos ou ainda de que o conhecimento tradicional é uma substância passível de objetificação e transmissão em outros contextos e lugares. No entanto, embora exista um repertório geral de sambas efetivamente compartilhado por todos em Cachoeira – que até os evangélicos conhecem, embora se recusem a cantar -, algumas formas mais elaboradas de samba são e sempre foram para poucos, como o samba de verso e as disputas de chula. Por outro lado, outras modalidades de samba eram específicas de alguns grupos sociais, como o samba de estivador e o samba de canoeiro. Na medida em que essas atividades laborais praticamente desapareceram, essas formas permanecem apenas na memória de uns poucos e velhos sambadores.

No tempo presente, tornar-se um sambador na sede de Cachoeira não significa mais se dedicar exaustivamente a dominar um amplo repertório de chulas ou sambas

de versos e a arte de usá-los em disputas com outros sambadores. Atualmente, tornar-

se um sambador significa aprender a cantar e tocar instrumentos no contexto dos grupos de samba de roda, dominando um repertório comum de barraventos e

corridos. No tempo presente, portanto, a diferença não é mais entre um aprendizado

geral aberto a todos e um aprendizado complexo restrito aos virtuoses, mas sim um aprendizado geral aberto a todos e um aprendizado técnico restrito aqueles que serão

sambadores profissionais no contexto dos grupos de samba de roda. No primeiro

caso, os tipos de aprendizado configuram dois repertórios distintos. No segundo caso, trata-se de meios distintos para a aprendizagem de um mesmo repertório. Se os

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um amplo repertório de vários tipos de samba, é patente que os sambadores mais jovens possuem um conjunto muito mais amplo de repertórios de outros tipos de música que os sambadores mais velhos, assim como tem uma maior capacidade técnica de trânsito entre eles.

Nos contextos em que se tira chula, um sambador de respeito deve demonstrar amplo repertório e rapidez de resposta frente ao verso de outro sambador. Ainda hoje, entre os tiradores de chula das zonas rurais de Cachoeira, é corrente a afirmação de que um bom sambador não pode repetir mais que duas ou três vezes uma chula na mesma noite. Ouvi, em mais de uma ocasião, sambadores falarem mal de outros, afirmando que podiam até gritar samba bem, mas que repetiam mais que três vezes uma mesma chula, o que, automaticamente, desqualificava-os. A capacidade de dominar um vasto repertório, porém, tem se restringido a uns poucos

sambadores das zonas rurais de Cachoeira, como Domingos Preto, Nuca, Carlos

Sena, João Abade e alguns mais. Na sede do município, essa arte se reduz, basicamente, a seu Carlito, que sambou com os nomes apontados na frase anterior quando morou por alguns anos na Opalma, povoado que fica na entrada da Bacia do Iguape.

Nos anos 1960, quando saiu da Opalma para morar na sede do município de Cachoeira, seu Carlito encontrou muitos sambadores capazes de tirar chulas, como os finados Dedão, Alcebíades, Bureca, Jaca Verde e Zica, sendo que os quatro últimos fizeram parte do Samba de Roda da Suerdieck junto com ele. Hoje, ainda que na sede do município alguns sambadores conheçam parte desse repertório, como Viana e seu Nascimento, eles não estão acostumados a usá-lo em um contexto de disputa entre

tiradores de chula, como ainda é comum na região do Iguape. Quando visitam outros sambadores com quem costumam sambar, os tiradores de chula do Iguape não vão

para a sede de Cachoeira, mas sim para Saubara e para os distritos de Acupe e São Braz, ambos em Santo Amaro da Purificação. É claro que muitos fatores podem ter contribuído para o desaparecimento quase que completo da chula e da capacidade do improviso poético na sede do município de Cachoeira, mas as falas de muitos

sambadores apontam que a institucionalização dos grupos de samba de roda foi um

deles.

Entre os sambadores do regime das tocadas da sede do município, prevalece esse repertório geral que pertence a todos, formado, sobretudo, de barraventos e

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corridos. Assim, entre os mais velhos é comum o discurso de que o samba está se acabando ou que todos os grupos tocam o mesmo samba, como afirma seu Carlito

(Entrevista em 26/09/2017). Ou seja, há um discurso da perda comum a sambadores mais velhos, principalmente aqueles que fazem parte desse conjunto de virtuoses. Já entre os mais jovens e nos grupos de samba de roda, esse discurso sobre a perda raramente se faz presente. Pelo contrário, é recorrente que sambadores mais novos se mostrem animados pela introdução no repertório dos grupos de samba de roda de composições deles próprios, assim como, eventualmente, uma ou outra canção de grupos de samba e pagode de Salvador. Havia no tempo antigo a modulação entre o