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Movimentos migratórios mundiais

No documento Colecao Diplomata - Tomo II - Geografia (páginas 35-45)

1.3. MOVIMENTOS MIGRATÓRIOS

1.3.2. Movimentos migratórios mundiais

Do século XVI às primeiras décadas do século XX, houve a consolidação do capitalismo no mundo, inicialmente com as Grandes Navegações, e, no fim desse período, por meio do Imperialismo europeu. Não havia, assim, lugar no planeta que não estivesse subordinado às tecnologias, aos métodos administrativos e às ideias europeias. Esse longo processo foi marcado por grandes fluxos migratórios, ora espontâneos, ora forçados, que reconfiguraram as sociedades humanas em todo o planeta, além de criarem outras novas.

O primeiro grande fluxo emigratório foi, portanto, europeu. A descoberta da América possibilitou a utopia da criação do Novo Mundo aqui, e assim portugueses, espanhóis, franceses e ingleses iniciaram o processo de ocupação do continente, ainda que às custas do sacrifício de milhões de nativos. No Oriente e na África, o ímpeto colonizador foi bem menor, ainda que na África Austral o processo de ocupação tenha se iniciado em meados do Seiscentos. Calcula-se em três milhões o número de europeus que migraram para as Américas até 1820. Na centúria a partir deste ano, o número de europeus que emigraram foi de sessenta milhões.

Data também deste período o povoamento de Austrália e Nova Zelândia, e, a partir do século XIX, os europeus migravam, em princípio, da Inglaterra e da Alemanha, com menor proporção de holandeses e escandinavos. A partir do último quartel do século XIX, somaram-se a esses grupos italianos, austro-húngaros, poloneses, russos, além da permanente migração de portugueses e espanhóis, cujo fluxo teve picos devido a crises econômicas internas. Esses europeus fugiam basicamente da pobreza, e justamente esse maciço movimento migratório fez com que a Europa não conhecesse uma “explosão demográfica”.

Outro movimento emigratório de relevância foi o de escravos negros africanos. A origem da escravidão é bastante antiga, e o comércio de escravos foi uma de suas formas, mas “por sua duração, sua escala e suas consequências, constitui a maior tragédia na história da humanidade” (UNESCO, 2004: 44). Ainda conforme a UNESCO (2010: 17),

[...] a escravidão alastrou-se na África antes da abertura do comércio transatlântico de escravos, tanto dentro do continente quanto em várias partes do mundo muçulmano e diversas regiões pelo Oceano Índico. Na lei islâmica, a escravidão era uma instituição reconhecida e tema de discussões legais e razão para proibições formais contra a escravização de muçulmanos nascidos livres. Porque o árabe é a língua do Islã e era falado por todo o mundo muçulmano, pensa-se, às vezes, que mercadores “árabes” como um grupo étnico foram os responsáveis por esse comércio... Além disso, aqueles que eram escravizados no mundo muçulmano vinham de várias partes da Europa e Ásia assim como da África.

A tabela 7 (NUNN, 2005: 20) mostra a evolução do tráfico negreiro. Podemos perceber que o ápice desse comércio ocorreu no século XVIII, e que no Seiscentos o tráfico transatlântico já constituía metade desse fluxo migratório. As outras rotas eram a trans-saariana, as que cruzavam o Mar Vermelho e aquelas que se dirigiam ao Oceano Índico:

Tabela 7: Rotas de escravos e total de escravos africanos transportados.

Slave Trade 1400-1599 1600-1699 1700-1799 1800-1900 1400-1900 Trans-Atlantic 230,516 861,936 5,687,051 3,528,694 10,308,197 Trans-Saharan 675,000 450,000 900,000 1,099,400 3,124,400 Red Sea 400,000 200,000 200,000 505,400 1,305,400 Indian Ocean 200,000 100,000 260,000 379,500 939,500 Total 1,505,516 1,611,936 7,047,051 5,512,994 15,677,497

O terceiro fluxo emigratório a considerarmos é a diáspora judaica. Esta iniciou-se com o exílio na Babilônia em 586 a.C., e, posteriormente, com as revoltas originadas pelo jugo romano sobre a Judeia, as quais causaram a dispersão de judeus pelo Império Romano e pelo sudoeste da Ásia. Por volta do ano 600, os judeus se encontravam dispersos pela Península Ibérica, Leste Europeu (desde a Crimeia), norte da África, Iêmen, Etiópia, baixo curso do rio Nilo, Mesopotâmia e Império Bizantino. A conversão ao cristianismo na Europa intensificou a perseguição aos judeus, especialmente em países católicos, dos quais serão expulsos no século XV.

Deste século até o século XIX, as perseguições foram se agravando no Leste Europeu, com a ocorrência de diversos pogroms, extermínio deliberado de judeus, no fim deste período. Na Europa Ocidental, a emancipação dos judeus decorrente da Revolução Francesa criou mecanismos legais de proteção a esse grupo, mas não impediu o crescimento do antissemitismo. Assim, o retorno à Terra Prometida foi-se fortalecendo como possibilidade e a primeira Aliyah (migração para a Palestina) ocorreu entre 1880 e 1903, com cerca de 25 mil judeus.

A segunda corrente migratória, de 1904 a 1914, teve contingente de 40 mil pessoas. Paralelamente às Aliyot, houve forte fluxo migratório para as Américas. De 1915 até o fim da II Guerra Mundial, houve crescente animosidade entre árabes e judeus, ocorrendo massacres de ambos os lados. Na Europa, a ascensão do nazismo contribuiu para nova corrente migratória para as Américas, especialmente para o Cone Sul e para a América do Norte. Após o Holocausto, e com a independência de Israel em 1948, novos fluxos migratórios transformaram o Oriente Médio.

Entre 1948 e 1973, diversos judeus foram banidos de países muçulmanos, em um total de 590 mil que migraram para Israel e 260 mil para Europa e Américas. Desde a Europa, 600 mil foram para Israel, além de 60 mil do Irã, 20 mil da Índia e 100 mil da União Soviética. A criação do Estado de Israel, contudo, gerou um fluxo de refugiados árabes da ordem de 730 mil pessoas e, hoje, esses campos de refugiados somam milhões de pessoas. Ainda não há solução definida para esses refugiados árabes, e este é um dos empecilhos para a celebração de acordos de paz entre israelenses e palestinos.

Outros fluxos migratórios consideráveis são os de indianos e de chineses, que viajavam devido a contratos de trabalho para exercer serviços pesados como os de mineração e construção de rodovias. Apenas entre 1852 e 1900, 2 milhões e 300 mil chineses emigraram sobretudo para o Sudeste Asiático e, em menor proporção, para as Américas. Os indianos migraram principalmente para outras colônias britânicas, tendo 30.2 milhões partido e, destes, 23,9 milhões retornado entre 1834 e 1937. O mapa 5 (DORLING KINDERSLEY, 2005: 101) mostra a migração indiana e chinesa até o início do século XX.

Mapa 5: Emigração indiana e chinesa, meados do século XVIII ao início do século XX.

No início do século XX, em vários países, houve diversas políticas que limitavam a entrada de imigrantes, o que somente veio a mudar na década de 1960. Arrefeceu-se o movimento migratório, exceto por alguns fluxos específicos como o de judeus, supracitado, o de algumas comunidades do Oriente Médio, o de japoneses (para o Brasil, por exemplo) e o de espanhóis, em decorrência da Guerra Civil. A Oceania foi um dos mais importantes locais de destino. Na Europa, a reconstrução do pós-guerra favoreceu a formação de minorias nacionais em diversos países, como a de magrebinos na França e na Bélgica e a de turcos na Alemanha. Segundo Williamson & Hatton (http://www.casahistoria.net/emigration_williamsChp10.pdf),

[…] a participação de nascidos no exterior na população total cresceu um terço na Oceania entre 1965 e 2000 – de 14,4% para 19.1%, mais que dobrou na América do Norte1 – de 6% para 13% e mais que triplicou na Europa – de 2,2% para 7,7%... [Na Europa Ocidental] a participação de nascidos no exterior cresceu de 2,2% em 1965 para 10,3% em 2000, um aumento de cinco vezes, ainda maior que na América do Norte.

Ainda segundo esses autores, a emigração europeia para a Oceania e para as Américas, em especial para os EUA, caiu quatro vezes entre 1950 e 2000. Além disso, houve o aumento de migrantes intraeuropeus, em especial dos países mediterrâneos para o Norte, movimento também realizado pelos turcos. Com o choque do petróleo, esse movimento cessa, e é retomado entre meados das décadas de 1980 e de 1990, mas por imigrantes da África e da Ásia.

imigrantes passa a gerar um constante fluxo populacional para fora de suas fronteiras, em especial para os EUA. Os principais locais de emigração são o México e os pequenos países da América Central e do Caribe, o que torna os EUA, de acordo com o censo estadunidense, a terceira maior população latina, com cerca de 50 milhões de pessoas, atrás de Brasil e México, ou 16,3% da população em 2010. Esse grupo tem maior crescimento vegetativo entre os grupos étnicos norte- americanos.

Outras áreas que merecem atenção são o Golfo Pérsico, a costa ocidental africana e a África do Sul. Desde 1973, com o crescimento ocasionado pela elevação do preço do petróleo, o Golfo tornou-se área de forte atração de migrantes, em especial do Subcontinente Indiano e da África. Tanto África do Sul quanto os países litorâneos de Gana ao Gabão são recebedores de estrangeiros, particularmente devido à indústria do petróleo (Nigéria, Gabão) ou ao maior grau de estabilidade política e de oportunidades econômicas (Gana, Benin, África do Sul).

Já a Europa Oriental tem se tornado fonte de mão de obra para países da Europa Ocidental, especialmente após o colapso do comunismo. O fluxo é considerável e muitos trabalhadores qualificados terminam por deixar o país, trazendo consequências ruins para a economia local, como no caso da Macedônia, da Bósnia-Herzegovina, de Moldova e da Ucrânia. Já Romênia e Bulgária tornaram-se fornecedores de mão de obra para os EUA e os para os países mais desenvolvidos da União Europeia, apesar de não integrarem o Espaço Schengen.

Cabe ressaltar, ainda, que, de modo geral, as principais tendências migratórias do mundo desde a década de 1970 não se alteraram, exceto pela redução desses fluxos populacionais Norte-Sul nos países atingidos pela crise econômica, que tem afetado sobretudo EUA e Europa. O mapa 6 (COLIN, 2009: 17), extraído do Le Monde Diplomatique, geografa os principais fluxos migratórios contemporâneos.

Em 2010, os países com maior número de imigrantes eram os EUA, com 42,8 milhões, seguidos pela Federação Russa, com 12,3 milhões; Alemanha, com 10,8 milhões; Arábia Saudita, com 7,3 milhões; Canadá, com 7,2 milhões; Reino Unido, com 7 milhões, Espanha, com 6,9 milhões; França, com 6,7 milhões; Austrália, com 5,5 milhões; Índia, com 5,4 milhões e Ucrânia com 5,3 milhões. Em percentagem da população, os países que lideram o ranking são Qatar, cuja população é composta

por 86,5% de imigrantes; Mônaco, com 71,6%; Emirados Árabes Unidos, com 70%; Kuwait, com 68,8%; Andorra, com 64,4%; Jordânia, com 45,9%; Cisjordânia e Gaza, com 43,6%; Cingapura, com 40,7%; Israel, com 40,4% e Bahrain, com 39,1%.

Mapa 6: Fluxos migratórios mundiais, 2008.

Os países com maior número de emigrantes são México, perfazendo 11,9 milhões de pessoas; Índia, com 11,4 milhões residindo fora do território; Federação Russa, com 11,1 milhões; China, com 8,3 milhões; Ucrânia, com 6,6 milhões; Bangladesh, com 5,4 milhões; Paquistão e Reino Unido, cada um com 4,7 milhões; Filipinas e Turquia, cada uma com 4,3 milhões; Egito e Cazaquistão com 3,7 milhões cada; e, por fim, Alemanha e Itália com 3,5 milhões. Percentualmente, os países com maior população emigrada são Cisjordânia e Gaza, Samoa, Granada, São Cristóvão e Nevis, Guiana, Mônaco, Antígua e Barbuda, Tonga, Albânia e Barbados, todos com mais de 40% dos nativos residindo no exterior. Nesse caso, predominam pequenos países caribenhos e da Oceania, ademais da Albânia e dos Territórios Ocupados, os quais sofrem com uma economia precária, seja por conta da informalidade das atividades econômicas, seja pelas consequências das guerras com Israel.

Em número de migrantes, predominam aqueles corredores que se dirigem aos Estados Unidos, sendo o maior aquele entre este país e o México; entre os países da antiga União Soviética, o maior

é entre Rússia e Ucrânia e vice-versa; o quarto maior é entre Bangladesh e Índia. Contudo, o Banco Mundial alerta que, em alguns casos, os migrantes assumem esta condição devido às mudanças nas fronteiras internacionais. Veja o gráfico 3 (BANCO MUNDIAL, 2011: 5-6), em que mostramos os corredores com maior número de migrantes.

Para o ano de 2010, o Banco Mundial calcula que 3% da população mundial, ou mais de 215 milhões de pessoas, vivam fora dos países em que nasceram. Nos últimos anos, os fluxos migratórios tem se reduzido devido à crise financeira global, o que não impediu que houvesse surtos migratórios para Espanha, Itália e Reino Unido, especialmente do Leste Europeu, mas também da América Latina e do norte africano. Desde 2005, os EUA tem recebido o maior fluxo de migrantes do mundo.

Gráfico 3: Corredores mundiais de migração, 2010.

Outros grandes contingentes dirigiram-se para os países do Conselho de Cooperação do Golfo – Bahrein, Kuwait, Omã, Qatar, Arábia Saudita e Emirados Árabes Unidos –, especialmente oriundos do Subcontinente Indiano e do Sudeste Asiático (Filipinas e Indonésia). Ademais, deve-se lembrar que o contingente migratório Sul-Sul é maior que os fluxos Sul-Norte, e que os países do Golfo são o principal destino dessas correntes migratórias.

Em relação às transferências de valores por migrantes, os países que mais recebem dinheiro de seus emigrados são Índia, com US$ 55 bilhões, seguida pela China, com US$ 51 bilhões; México, com US$ 22 bilhões; Filipinas, com US$ 21,3 bilhões e França, com US$ 15,9 bilhões. Em

percentagem, os países mais dependentes dos emigrantes são Tadjiquistão, com 35% do PIB atrelado a essas transações econômicas. Seguem-no Tonga, com 28%; Lesoto, com 25%; Moldova e Nepal, com 23%; Líbano e Samoa, com 22%; Honduras, com 19%; Guiana, com 17%; El Salvador e Jordânia, com 16%; e Quirguízia e Haiti, com 15%.

Quanto aos que mais enviam renda para outros países devido à sua população imigrante, estão no topo dessas transferências os EUA, com US$ 48,3 bilhões; a Arábia Saudita, com US$ 26 bilhões; a Suíça, com 19,6 bilhões; a Rússia, com US$18,6 bilhões; a Alemanha, com US$ 15,9 bilhões; a Itália, com US$ 13 bilhões; a Espanha, com US$ 12,6 bilhões; Luxemburgo, com US$ 10,6 bilhões e o Kuwait, com US$ 9,9 bilhões. Em percentuais, os que mais se destacam em relação ao PIB são Luxemburgo, com 20%; Líbano, com 17% e Omã, com 10%.

No Brasil, houve anistia, em 2009, para imigrantes ilegais. Segundo Márcio Falcão (2010,

http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u6 75457.s html), da Folha de São Paulo, as nacionalidades que mais buscaram a regularização2 foram: bolivianos (14.920), chineses (5.197), peruanos (4.215), paraguaios (3.699), sul-coreanos (1.081), libaneses (972), senegaleses (758), chilenos (545), nigerianos (527) e angolanos (519). Ainda segundo essa reportagem, para cada dólar que saía para o exterior, em 1995, entravam no país US$ 37, razão, hoje, muito reduzida devido ao aumento do número de imigrantes e das remessas para o exterior. Conforme o Banco Mundial, em 2009, recebemos US$ 4,234 bilhões e enviamos US$ 1 bilhão (FAGUNDES, 2012).

O Banco Mundial calcula em 688 mil o número de estrangeiros com residência no Brasil. Estes são oriundos predominantemente de Portugal, Japão, Itália, Espanha, Paraguai, Argentina, Uruguai, Bolívia, Alemanha e Chile. Regionalmente, o Brasil encontra-se na quarta colocação entre os países que recebem migrantes, atrás da Argentina, da Venezuela e do México. O número de emigrantes brasileiros em 2010 era de 1 milhão 367 mil, dispersos entre EUA, Japão, Espanha, Paraguai, Portugal, Reino Unido, Itália, Alemanha, Argentina e França. Regionalmente, os brasileiros são o terceiro maior contingente, atrás de México e Colômbia.

Em relação aos emigrados em países fronteiriços, segundo a Folha de São Paulo (FAGUNDES, 2012), 20 mil brasileiros estão vinculados a garimpos ilegais no Suriname, 5 mil na Guiana, 48 mil na Venezuela e 19 mil na Guiana Francesa. Enquanto na Colômbia (1.800 brasileiros) e no Peru

(4.500) problemas relacionados às comunidades brasileiras são esporádicos, também vinculados a garimpos e à extração ilegal de madeira, na Bolívia e no Paraguai as tensões são maiores. Entre os 24 mil brasileiros naquele país e os 300 mil brasiguaios, há relatos de envolvimento com o narcotráfico e em conflitos agrários com a população local, em especial no Paraguai. Argentina e Uruguai não apresentam problemas relevantes.

A migração brasileira para os países fronteiriços é fenômeno que se consolida recentemente, nas últimas décadas do século XX, mas a história brasileira mostra que houve casos de áreas de fronteira3 ocupadas por brasileiros situadas além de nossas fronteiras políticas. O caso mais explícito é o do Acre, território boliviano incorporado posteriormente ao Brasil. Da mesma forma,

[...] importantes fluxos imigratórios foram gerados durante o ciclo da borracha para satisfazer a demanda por trabalhadores. O caso de Guajará-Mirim é ilustrativo, pois além dos imigrantes bolivianos que vieram trabalhar em seringais brasileiros (o inverso também ocorria), a cidade também recebeu um importante fluxo de descendentes de sírio-libaneses que vieram trabalhar com o comércio ambulante e outro ainda mais expressivo de diversos trabalhadores que foram recrutados para trabalhar na construção da Estrada de Ferro Madeira Mamoré (1907-1912). Fato que explica a presença na região de famílias descendentes de hindus, escoceses, chineses, gregos, suecos e belgas, entre outros. Nos últimos anos da construção foram trazidos também barbadianos, que se adaptaram bem ao clima quente e úmido da floresta amazônica (STEIMAN, 2002: 56).

A borracha contribuiu para forjar apenas mais um movimento migratório brasileiro. Façamos uma pequena retrospectiva até esse boom, iniciado no final do século XIX, para acompanharmos a dinâmica populacional de nosso país. Esta começa com a ocupação ​portuguesa da costa por meio da miscigenação com o índio, e, a partir do segundo quartel do século XVI, também com o negro. A economia era baseada na produção da cana-de-açúcar e o trabalho era escravo negro, onde se podia pagar pelo africano, ou indígena, quando isso não era possível.

Essa economia canavieira propiciou o desenvolvimento da pecuária no sertão nordestino, expandindo o território da América Lusa. No sul da colônia, o bandeirantismo consistiu em uma expansão dos domínios territoriais, mas, na medida em que não implicou movimento migratório fundado em bases econômicas e possuía caráter bastante dispersivo, não pode ser considerado in

totum área de fronteira. Assim, apenas após a descoberta de ouro é que essas áreas de expansão

foram integradas ao território, casos de Minas Gerais e de Cuiabá.

Ainda no primeiro quartel do século XVII, a fundação de Belém permitiu à Coroa Portuguesa o controle sobre a foz do Amazonas. Desse modo, até o fim desta centúria, o Brasil já terá uma considerável expansão para além de Tordesilhas, também por causa da União Ibérica, que suspendeu as fronteiras entre os domínios espanhóis e português na América do Sul. No século XVIII, com a descoberta das minas, haverá intenso fluxo migratório e o início de uma proto-urbanização brasileira. Houve, assim, uma primeira integração entre as diversas partes da colônia.

Ademais da escravidão negra e dos contingentes de portugueses, o próximo fluxo migratório relevante é o causado pela transmigração da Corte para o Rio de Janeiro em 1808. A população da cidade duplicou, apesar de a importância deste fato histórico não se dever tanto ao número de migrantes, mas às notórias consequências econômicas e políticas. Em meados do século, iniciaram- se a imigração de europeus como parte da política de branqueamento da população, e, no Sul, também para resguardar as belicosas fronteiras do Prata.

No Vale do Paraíba, o desenvolvimento da lavoura cafeeira acarretou a absorção da mão de obra escrava, redirecionando o tráfico interno, a qual foi substituída progressivamente pelo trabalho livre e, em muitos casos, imigrante. O próximo movimento migratório relevante, como vimos, foi o ocasionado pela borracha na Amazônia, em que diversos nordestinos se dirigiram à floresta para extrair látex. Com a virada do século, a imigração europeia foi arrefecendo, e em 1908 chegou o primeiro navio trazendo imigrantes japoneses.

Nas décadas iniciais do século XX, nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo, a indústria desenvolveu-se lentamente até que o Estado brasileiro assumisse o projeto industrializante. O êxodo rural foi considerável e constante até o último quartel deste século, embora grande parte desta corrente migratória não fosse absorvida pelas indústrias e sim pelo terciário das primeiras metrópoles brasileiras. A divisão territorial do trabalho impôs o Nordeste como fornecedor de mão de obra para o então dinâmico Sudeste, mais urbanizado e industrializado.

Concomitantemente, a Marcha para o Oeste foi continuada por Juscelino Kubitschek e Brasília tornou-se uma das metas do planejamento do governo federal – somente foi possível construí-la

porque São Paulo se firmara como metrópole nacional, substituindo o Rio de Janeiro. Brasília e a ocupação do Cerrado foram marcadas por dois fluxos bem marcantes – o dos candangos, que foram construir a capital e lá permaneceram, e o das famílias ocupadas no setor primário do Sul brasileiro, que migraram para os Estados do Centro-Oeste, cujo exemplo mais notório é o da família Maggi.

Logo após a inauguração de Brasília, a ruptura institucional gerada pela ditadura militar instaurou nova política de ocupação dos fundos territoriais, também como forma de reduzir as tensões sociais,

No documento Colecao Diplomata - Tomo II - Geografia (páginas 35-45)