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REVOLUÇÃO TECNOCIENTÍFICA OU III REVOLUÇÃO INDUSTRIAL & GLOBALIZAÇÃO

No documento Colecao Diplomata - Tomo II - Geografia (páginas 147-171)

GEOGRAFIA DA INDÚSTRIA E GLOBALIZAÇÃO

3.4. REVOLUÇÃO TECNOCIENTÍFICA OU III REVOLUÇÃO INDUSTRIAL & GLOBALIZAÇÃO

Os problemas com a regulação fordista surgiram já na década de 1960 (HARVEY, 2005: 135). Após a reconstrução europeia e o desenvolvimento espetacular da economia japonesa do pós- guerra, ambos os mercados encontravam-se saturados e havia a necessidade de criar mercados de exportação. Nos EUA, a queda da produtividade e da lucratividade corporativas, a partir de 1966, gerou um problema fiscal que prejudicou a estabilidade do dólar como reserva internacional,

rompendo o acordo de Bretton Woods. Ademais, houve a transferência do ambiente fordista para ambientes novos, como os Newly Industrialised Countries (NICs) – Coreia do Sul, Hong Kong, Taiwan e Cingapura –, e alguns países da América Latina. Para Harvey (ibid.: 135-6),

[...] o período de 1965 a 1973 tornou cada vez mais evidente a incapacidade do fordismo e do keynesianimo de conter as contradições inerentes ao capitalismo. Na superfície, essas dificuldades podem ser melhor apreendidas por uma palavra: rigidez. Havia problemas com a rigidez dos investimentos de capital fixo de larga escala e de longo prazo em sistemas de produção em massa que impediam muita flexibilidade de planejamento e presumiam crescimento estável em mercados de consumo invariantes. Havia problemas de rigidez nos mercados, na alocação e nos contratos de trabalho (especialmente no chamado setor monopolista). E toda tentativa de superar esses problemas de rigidez encontrava a força aparentemente invencível do poder profundamente entrincheirado da classe trabalhadora [...]. A rigidez dos compromissos do Estado foi se intensificando à medida que programas de assistência (seguridade social, direitos de pensão etc.) aumentavam sob pressão para manter a legitimidade num momento em que a rigidez na produção restringia expansões da base fiscal para gastos públicos. O único instrumento de resposta flexível estava na política monetária [...]. O ímpeto da expansão do pós-guerra se manteve no período 1969-1973 por uma política monetária extraordinariamente frouxa por parte dos Estados Unidos e da Inglaterra.

Isso gerou inflação, e associado ao primeiro choque do petróleo, trouxe profunda crise fiscal. Houve queda na produção e elevação nos preços, que assolaram a Europa e os EUA também quando do segundo choque do petróleo. A inflação nos países da OCDE (​ROSSETTI, 2002: 734) foi de 7,5% em 1973 e de 13,2% no ano seguinte, e de 10,9% em 1975; nos EUA, o desemprego aumentou de 4,9% em 1973 para 8,5% em 1975. Esse fenômeno foi chamado por Samuelson de estagflação, neologismo para a combinação de estagnação e inflação, e para corrigi-lo havia a hipótese de aplicar um

[...] choque de demanda agregada, provocado pela mobilização conjunta de instrumentos fiscais e monetários em direção contracionista. Com um forte e persistente recuo da procura agregada, a alta dos preços interrompe-se e as taxas anualizadas começam a declinar. Mas este tipo de ajuste tem um custo social traduzido pela expansão da taxa de hiato do PIB (ROSSETTI, 2002: 732).

Essa crise iniciada em 1973 solapou o compromisso fordista, por meio “[d]a mudança tecnológica, [d]a automação, [d]a busca de novas linhas de produto e nichos de mercado, [d]a dispersão geográfica para zonas de controle do trabalho mais fácil, [d]as fusões e [de] medidas para acelerar o tempo de giro do capital” (HARVEY, 2005: 137;140). Essas mudanças ocasionaram o surgimento da acumulação flexível, mas antes de comentarmos sobre este tema, cabe ressaltar, brevemente, alguns posicionamentos teóricos acerca dessas transformações, que tratam da ascensão de um novo marco no desenvolvimento do capitalismo.

Hindenburgo Pires (1992: 56) cita algumas das expressões que surgiram para definir as transformações ocorridas desde a década de 1970: “Revolução Técnico-Científica, Civilização Pós-Industrial (Terciária, Tecnotrônica), Sociedade da Informação, Era do Silicon, Terceira Onda, Megatrends”. Este autor (ibid.: 75) afirma que “foi com a formação das cidades informacionais e a reestruturação territorial das indústrias no capitalismo que se iniciou o período de transição da industrialização fordista para a fordista intensiva ou flexível, também chamada de pós-fordista”. Nesse sentido, não houve transição para uma sociedade pós-industrial.

A expressão pós-industrial foi popularizada na década de 1970 e sua popularização deve-se a Harvard e a Daniel Bell. Sobre a tese de uma sociedade pós-industrial, Pires (1992: 76) afirma que seus precursores acreditavam que o computador seria o pivô da revolução nesta sociedade. De acordo com o autor (ibid.: 76-80),

[...] a sociedade pós-industrial teria como princípio fundamental a centralidade do conhecimento teórico, onde a ciência ampliaria a sua participação no processo produtivo, através do crescimento das chamadas novas atividades científicas de concepção da produção. Houve uma sobrevalorização quase determinista das modificações que o computador acarretaria no desenvolvimento da sociedade pós-industrial, e, em certa medida, foram subestimadas as novas contradições, os impactos e a natureza lógica do processo que impulsionou a formação e o crescimento da alta tecnologia, e seus vínculos mais estreitos com a acumulação capitalista e a produção militar. [Havia] a crença na ideia de que, na sociedade pós-industrial, ocorreria o aumento substancial da participação de novos quadros técnicos e intelectuais no processo de produção, mas esta afirmação que foi advogada como princípio teórico axial de explicação da sociedade pós-industrial, não se evidenciou de fato. Para que seja efetuada uma crítica das ideias

dos teóricos do pós-industrialismo, é preciso que se revele os enunciados frágeis e saudosistas de suas teorias, procurando tratar o exagero otimista de suas previsões, com o realismo ipso facto das evidências empíricas que demonstram a continuidade da pré-história das condições de existência material da sociedade humana no período atual; sendo ocasionada por uma reestruturação industrial e territorial do processo de acumulação capitalista global, no lugar da ideia da emergência de uma transição da sociedade pós-industrial capitalista para outra pós- qualquer-coisa. Seria de certo modo prematuro atribuir, aos precursores do pós-industrialismo americano, a iniciativa de dar continuidade aos postulados do determinismo tecnológico, quando, ao que tudo indica, estes foram fortes opositores daquele ideário. Pois ao estabelecerem o conceito de sociedade pós-industrial, acreditavam, com uma forte dose de otimismo, que esta só se consolidaria quando fosse verificado um elevado crescimento das atividades não industriais, que requereriam para sua execução profissionais com alto grau de qualificação científica e técnica. O que se constituiu mais numa quase sobrevivência saudosista das ideias dos utopistas do século XIX, mas que ainda encontra hoje muitos ferrenhos adeptos.

Essa utopia pode ser verificada no que seria uma das principais consequências do pós- industrialismo: a sociedade da informação. Para Daniel Bell, conforme Pires (1992: 76-7),

[...] o aumento desempenhado pelo setor de ciência, no processo produtivo, amplia a eminência do profissional, dos grupos técnicos e científicos, mas a introdução do que agora é chamado tecnologia de informação conduz para um novo “princípio fundamental” do centro da economia e da sociedade. Este princípio fundamental, “o princípio alimentador”, que é a lógica de todos os outros, é a centralidade do “conhecimento teórico”. [...] [Bell] previu o crescimento de uma nova rede de trabalho social baseada nas telecomunicações que ‘pode ser decisiva para o modo que as mudanças econômicas e sociais são conduzidas, o modo em que é criado e retido o conhecimento, e o caráter do trabalho e ocupações em que os homens são engajados. O computador desempenha o papel de pivô nesta “revolução”. BELL também esquematizou outras características significativas da sociedade de informação, [como o] encurtamento do tempo de trabalho e [a] diminuição d[o número de] trabalhador[es] na produção, atualmente recoloca[ndo] o trabalho como recurso de “valor adicionado” no produto nacional. Conhecimento e informação suplantam trabalho e capital como “variáveis centrais” da economia.

elaborado pelo Ministério da Ciência e Tecnologia,

[...] o conhecimento tornou-se, hoje mais do que no passado, um dos principais fatores de superação de desigualdades, de agregação de valor, criação de emprego qualificado e de propagação do bem-estar. A nova situação tem reflexos no sistema econômico e político. A soberania e a autonomia dos países passam mundialmente por uma nova leitura, e sua manutenção – que é essencial – depende nitidamente do conhecimento, da educação e do desenvolvimento científico e tecnológico. A Sociedade da Informação está sendo gestada em diversos países. No Brasil, Governo e sociedade devem andar juntos para assegurar a perspectiva de que seus benefícios efetivamente alcancem a todos os brasileiros. O advento da Sociedade da Informação é o fundamento de novas formas de organização e de produção em escala mundial, redefinindo a inserção dos países na sociedade internacional e no sistema econômico mundial. Tem também, como consequência, o surgimento de novas demandas dirigidas ao Poder Público no que respeita ao seu próprio funcionamento. Na era da Internet, o Governo deve promover a universalização do acesso e o uso crescente dos meios eletrônicos de informação para gerar uma administração eficiente e transparente em todos os níveis. A criação e manutenção de serviços equitativos e universais de atendimento ao cidadão contam-se entre as iniciativas prioritárias da ação pública. Ao mesmo tempo, cabe ao sistema político promover políticas de inclusão social, para que o salto tecnológico tenha paralelo quantitativo e qualitativo nas dimensões humana, ética e econômica. A chamada “alfabetização digital” é elemento-chave nesse quadro.

Yoneji Masuda (1996) acredita na sociedade da informação de um modo utópico, que denomina

Computopia, a qual engendraria novo comportamento humano e na qual prevaleceria a sinergia e o

direito de uso sobre, respectivamente, a competição e o direito de propriedade. Peter Drahos (1995), contudo, assevera que a era da informação reforçou desigualdades existentes e ainda inventou novas, tornando-se mais feudal que democrática. Ademais, a informação também é mercadoria, e, dessa forma, é regulada tanto por empresas de telecomunicações quanto pelos direitos de propriedade intelectual. Milton Santos (2002: 182-4) afirma que

[...] vivemos a era da informação que, em sua forma atual, é a matéria-prima da revolução tecnológica. A grande mutação a que estamos assistindo não seria possível sem aquilo a que P. Hall & P. Preston [...] chamaram de “tecnologias convergentes”, resultado da segunda vaga de mudanças tecnológicas dos anos [19]90 [...], isto é, da combinação de uma segunda geração de

tecnologias da informação (baseadas na mecânica, na eletromecânica e numa primeira fase da eletrônica) e de uma terceira e atual geração de tecnologias da informação, com a microeletrônica. A fase atual é chamada por Philippe Breton [...] de “terceira informática”, iniciada nos anos [19]80. As tecnologias da informação constituem a substância (life-blood) de muitas outras tecnologias e a condição de sua operacionalidade. Mas essa “convergência tecnológica” entre telecomunicações, computação e burótica, acrescenta K. Morgan [...], não seria eficaz sem a desregulação, mediante a qual foi possível a vitória da “coalizão telemática” ante a coalizão postal-industrial. É dessa forma que se cria a chamada “era das telecomunicações”, baseada na combinação entre a tecnologia digital, a política neo​liberal e os mercados globais. Para muitos, apenas viveríamos agora a continuação de um processo. Mas a “sociedade da informação” não teria sido possível sem a “revolução do controle”. Esta teria começado nos Estados Unidos no século XIX, mas seu desenvolvimento teve de esperar pelo advento das tecnologias do microprocessamento, isto é, pelo amadurecimento da ciência da cibernética, como em 1940 chamou Wiener a essa nova disciplina, incumbida do estudo da “comunicação e controle no animal e na máquina”. Da informatização pode ser dito que é um novo modo dominante de organização do trabalho, graças ao seu papel na circulação física das mercadorias e na regulação dos circuitos produtivos e dos estoques. Agora não é mais possível repetir o erro apontado por F. Perroux na análise econômica das sociedades ocidentais, que não se apercebia do papel central representado pela “transferência regular de uma informação utilizável” para os agentes implicados no processo produtivo. Hoje, muito mais que há três decênios, a informação, inegalitária e concentradora é a base do poder. Controle centralizado e organização hierárquica conduzem à instalação de estruturas inegalitárias, já que a informação essencial é exclusiva e apenas transita em circuitos restritos. Cerca de noventa por cento de todos os dados veiculados por meio de satélites o fazem entre grandes corporações e metade das mensagens transnacionais cabe dentro das redes das empresas multinacionais. A revolução informática e do controle tornou possível a realização da previsão de P. Naville quanto à mobilidade generalizada (dos homens, da energia, dos usos, dos produtos, no tempo e no espaço), uma mobilidade medida, controlada, prevista, que assegura aos centros de decisão um real poder sobre os outros pontos do espaço.

Krishan Kumar (1997: 49) lembra que, “se a teoria da sociedade da informação enfatiza as forças de produção, a pós-fordista dá mais destaque às relações de produção”. Assim, “a tecnologia perde seu caráter neutro ou inerentemente progressista e é posta em uma matriz de relações sociais, que lhe

determinam o uso e aplicação” (loc. cit.). Para os pós-fordistas, a acumulação flexível é uma realidade e gera uma espacialidade própria, que não seria possível sem a tecnologia da informação. Ainda consoante Kumar (ibid.: 55-6),

[...] máquinas-ferramentas numericamente controladas permitem a produção econômica de pequenos lotes de bens – tanto de capital quanto de consumo –, voltados para setores especializados do mercado. As novas máquinas tornam possíveis mudanças rápidas de produção em resposta a novas oportunidades e necessidades. Novos produtos não exigem novas ferramentas nem reajustes caros e demorados ou a reforma das velhas máquinas. As ferramentas numericamente controladas são máquinas universais não especializadas. Novos desenhos e novos produtos são resultado de mudanças relativamente simples nos programas controlados por computador que comandam tais máquinas. A tecnologia flexível dá origem à especialização flexível. [...] A produção feita de acordo com as exigências do cliente e a curto prazo não requer fábricas de grande porte ou a tecnologia necessária para obter economias de escala (que só podem ser justificadas por produção em séries longas), nem pode depender do trabalhador sem especialização ou apenas semiespecializado e detalhista, comum nos estabelecimentos industriais do tipo fordista. A especialização desse tipo exige perícia e flexibilidade tanto da máquina como do operador. [...] As economias de escala são substituídas por “economias de escopo” – isto é, o uso pelas grandes fábricas de tecnologias flexíveis de manufatura para produzir bens voltados para vários mercados relativamente pequenos ou segmentados. Acompanhada pela utilização criteriosa de terceirização, essa orientação pode permitir que grandes empresas floresçam no novo ambiente [pós-fordista].

Benko (2002: 235-6) assegura que “a flexibilidade tornou-se conceito-chave da economia e da geografia dos anos [19]80. Após a crise do período de acumulação fordista, o capitalismo entrou numa nova fase, chamada acumulação flexível”. De acordo com este autor,

[...] as cinco principais formas da flexibilidade são: a) os equipamentos flexíveis na produção, que permitem grande adaptabilidade da organização produtiva; b) a aptidão dos trabalhadores para mudar de posto de trabalho no interior de uma dada organização de conjunto, isto é, para controlar diversos segmentos de um mesmo processo produtivo; c) ela se mede também pela fraqueza das coações jurídicas que regem o contrato de trabalho e em particular as decisões de licenciamentos; d) a flexibilidade para designar a sensibilidade dos salários à situação

econômica, própria a cada firma ou geral referente ao mercado de trabalho; e) [...] a possibilidade, para empresas, de se subtrair a uma parte dos saques sociais e fiscais e, mais geralmente, de se libertar das regulamentações públicas que lhes limitam a liberdade de ação. Todos esses elementos mostram que um novo regime de acumulação e de modo de regulação emerge, criando novos espaços de produção ao reorganizar o sistema produtivo (de maneira flexível).

Acrescentamos, por fim, a definição de David Harvey (2005: 140) para acumulação flexível. Esta [...] é marcada por um confronto direto com a rigidez do fordismo. Ela se apoia na flexibilidade dos processos de trabalho, dos mercados de trabalho, dos produtos e padrões de consumo. Caracteriza-se pelo surgimento de setores de produção inteiramente novos, novas maneiras de fornecimento de serviços financeiros, novos mercados e, sobretudo, taxas altamente intensificadas de inovação comercial, tecnológica e organizacional. A acumulação flexível envolve rápidas mudanças dos padrões do desenvolvimento desigual, tanto entre setores como entre regiões geográficas, criando, por exemplo, um vasto movimento no emprego no chamado “setor de serviços”, bem como conjuntos industriais completamente novos em regiões até então subdesenvolvidas (tais como a “Terceira Itália”, Flandres, os vários vales e gargantas do silício, para não falar da vasta profusão de atividades dos países recém-industrializados). Ela também envolve um novo movimento que chamarei de “compressão do espaço-tempo” no mundo capitalista – os horizontes temporais da tomada de decisões privada e pública se estreitaram, enquanto a comunicação via satélite e a queda dos custos de transporte possibilitaram cada vez mais a difusão imediata dessas decisões num espaço cada vez mais amplo e variegado. [...] O trabalho organizado foi solapado pela reconstrução de focos de acumulação flexível em regiões que careciam de tradições industriais anteriores e pela reimportação para os centros mais antigos das normas e práticas regressivas estabelecidas nessas novas áreas. A acumulação flexível parece implicar níveis relativamente altos de desemprego “estrutural” (em oposição a “friccional”), rápida destruição e reconstrução de habilidades, ganhos modestos (quando há) de salários reais e o retrocesso do poder sindical.

Entre os pós-fordistas, destacam-se duas correntes: Novos Tempos e Escola da Regulação ou Regulamentação, na qual se sobressaem Aglietta, Boyer e Lipietz. Os integrantes da primeira corrente afirmam que “‘diversidade, diferenciação e fragmentação’ – os símbolos do pós-fordismo –

estão substituindo a ‘homogeneidade, a padronização e as economias de escala’” muito além da esfera econômica (KUMAR, 1997: 63). Os Regula[menta]dores acreditam que o fordismo “exauriu o seu potencial de crescimento” (ibid.: 68), o que é “demonstrado principalmente pela produtividade declinante” (loc. cit.). A solução para esta crise do fordismo seria

[...] a volta, de uma forma mais explícita e completa, ao “acordo de classe” (ou “contrato social”) da era do pós-guerra, que tornou possível um período de crescimento sustentado. [...] [Contudo,] o que vem acontecendo é a tentativa do capital de resolver a crise criando um sistema de “fordismo global”. Essa orientação tomou a forma de uma série de estratégias “neofordistas”. A produção foi descentralizada, não só nacional mas internacionalmente, levando-as para as regiões de baixo salário do mundo [...]. Enquanto isso, o controle central e as funções de pesquisa permanecem nas metrópoles dos países industriais avançados. A especialização flexível e a administração delegada também têm sido empregadas como partes de uma estratégia para aliviar os encargos das empresas e evitar ou neutralizar organizações trabalhistas fortes. Desse modo, elementos “pós-fordistas” no Primeiro Mundo coexistem ao lado do fordismo clássico e do “fordismo periférico” no Terceiro Mundo. Na verdade, não há três mundos [...], mas apenas segmentos de um sistema capitalista global, que tenta manter seu dinamismo em um período de crise. [...] O pós-fordismo [...] explorou muito o surgimento, ou renascimento, do localismo e do particularismo, o cultivo da identidade através do apego a um lugar ou a culturas e tradições locais. E não apenas aproveita isso, mas celebra os recrudescimentos étnicos, a ascensão dos “nacionalismos periféricos”, as lutas para conservar costumes e histórias locais (KUMAR, 1997: 68).

Há diversas críticas ao pós-fordismo. Devemos lembrar que esses localismos têm impulsionado bastante as práticas capitalistas, em especial com o turismo; agregar em um mesmo conjunto uma diversidade de distritos industriais no mundo – Vale do Silício, Rota 128, Cambridge-Reading- Bristol, Oyonnax, Baden-Wurttemberg – com características distintas entre si (terceirização, alta tecnologia, tradição artesanal) pode ser equivocado; as empresas de ponta ou de grande porte não se utilizam da flexibilidade numérica no mercado de trabalho com tanta intensidade, se comparadas ao setor de serviços e à Administração Pública.

fordistas. Deve-se lembrar que a produção não fordista, como a artesanal da pequena empresa, em todo o desenvolvimento do capitalismo, esteve ao lado da produção em massa, a qual “nunca foi, nem poderia ser, a forma dominante de produção industrial” (KUMAR, 1997: 71). De todo modo, essa flexibilização não teria sido possível sem que fosse alterado o arranjo do espaço interno da fábrica, o que aconteceu na forma do toyotismo, no Japão.

A Toyota, para produzir em larga escala, deveria resolver quatro problemas, segundo Thomas Wood Junior (1992: 12): dificilmente, a força de trabalho japonesa adaptar-se-ia ao taylorismo; havia a impossibilidade de compra de tecnologia no exterior; a possibilidade de exportações dos bens produzidos era baixa e o mercado doméstico japonês era pequeno e exigia diversidade de produtos. Desse modo, “Toyoda e Ohno desenvolveram uma série de inovações técnicas que possibilitavam uma dramática redução no tempo necessário para alteração nos equipamentos de moldagem” (ibid.: 13).

Isso teve por consequência a redução dos preços de bens produzidos em pequenos lotes, tornando-os mais baratos que os homogêneos fabricados em grandes quantidades, ademais da

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