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A abertura da definição de língua de uma estrutura fechada em si para uma compreensão baseada no social permitiu aos estudos linguísticos estabelecer uma relação direta entre a linguagem e os gêneros.

Esse deslocamento afetou o conceito de gêneros mudando sua posição para o centro das discussões entre língua, discurso e estruturas sociais. Isso possibilitou o surgimento de várias teorias e pesquisas sobre gêneros em diferentes áreas, voltadas para o social e questões de linguagem, tornando-se um campo de estudos multidisciplinar (MARCUSCHI, 2008, p. 149). Corroborando isso, Bhatia afirma que “o interesse pela teoria dos gêneros e suas aplicações não se restringe mais a um grupo específico de pesquisadores de uma área em particular [...], mas cresceu a ponto de assumir uma relevância muito mais ampla do que jamais foi imaginado” (apud BUNZEN, 2004, p. 221).

Com isso, o número de publicações sobre gêneros tornou-se cada vez mais crescente, demonstrando o grande interesse pelo assunto e o desenvolvimento do campo, principalmente, nos últimos trinta anos. No entanto, construir um quadro ontológico acerca das teorias que discutem este fenômeno na atualidade11 não é tarefa fácil. Ao romper com as concepções tradicionais e estruturalistas sobre língua/linguagem, as abordagens atuais reconheceram a importância do social para a compreensão de gêneros, acatando o caráter da flexibilidade e multiplicidade existente neles. Em decorrência disso, as bases de análise tornaram-se heterogêneas, fluidas e múltiplas, possibilitando a atuação de estudos com diferentes abordagens, surgindo, consequentemente, algumas divergências quanto aos aspectos enfatizados. Entretanto, entre elas é possível enxergar a existência de um ponto em comum, o reconhecimento da importância dos fatores sociais e do contexto na compreensão dos gêneros.

A classificação de gêneros de acordo com essas perspectivas,

constitui-se um desafio para aqueles que se recusam a enquadrar eventos comunicativos essencialmente dinâmicos em esquemas ou modelos pré-definidos. (...) Nesse caso, a perspectiva dos estudos de gêneros textuais não objetiva classificar textos, uma vez que a ênfase desses estudos está na análise da funcionalidade sociocomunicativa e não nos traços formais ou propriedades linguísticas, conforme poderemos constatar nas diversas abordagens teóricas (RAMIRES, 2005, p. 40).

As abordagens atuais de pesquisas sobre gêneros correspondem a uma abundância de terminologias, teorias, enfoques e posições a respeito da questão. As que tiveram maior destaque sofreram influência dos estudos desenvolvidos, principalmente, na Austrália, na Suíça e na América do Norte e são conhecidas, respectivamente, como: 1) Escola de Sidney, 2) Escola de Genebra e 3) Escola Norte-Americana ou Sociorretórica12. Para elas, a análise de gênero deve enfatizar as propriedades funcionais, enfocando os componentes cognitivos, sociais, históricos e culturais, sem se descuidar dos aspectos formais ou estruturais.

É importante ressaltar que a opção por apresentar apenas três abordagens de pesquisas relacionadas a gêneros não dever ser compreendida como se estas

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A esse respeito, Meurer et al. (2005) acrescentam que devido a essa multidisciplinaridade que envolve os gêneros há aspectos que unificam e outros que dispersam o campo. Para maiores esclarecimentos, recomenda-se fazer essa leitura.

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fossem as únicas, negando a ocorrências de outras tantas, como a perspectiva da análise crítica (N. Fairclough, G. Kress) ou mesmo a comunicativa (Steger, Gülich, Bergmann, Berkenkotter)13. Ratificando o que diz Bezerra (2006, p. 48), também não é interessante “subestimar e simplificar os múltiplos e ecléticos tratamentos dados ao fenômeno gêneros textuais”, já que os trabalhos se mesclam, se misturam, tornando difícil que algum pesquisador se mantenha limitado estritamente às contribuições de apenas uma ‘escola’, uma vez que um aspecto marcante nos estudos dos gêneros na atualidade é justamente uma certa dose de interdisciplinaridade. Assim, a classificação não deve ser entendida de forma rígida, mas flexível e aberta a novas discussões.

Na Escola de Sidney, os estudos sobre gêneros se desenvolveram baseados nos postulados da Linguística Sistêmico-Funcional (LSF), proposta por Halliday, apesar de ele não ter desenvolvido uma teoria específica sobre gêneros. Para ele, a linguística é encarada como sistêmica por se referir à linguagem como uma rede de escolhas, relacionadas a variáveis de registro e de macro e microestruturas, e funcional devido a sua relação com a atividade social em um dado contexto (MOTTA-ROTH; HEBERLE, 2005). Conforme Vian Júnior, a LSF considera a linguagem “como um sistema de escolhas, utilizadas em um determinado meio social para que os usuários possam desempenhar funções sociais” (2001, p. 147).

Além da Sistêmico-funcional, também serviram de base para o desenvolvimento dessa abordagem os construtos da sociologia da educação e estudos sobre as práticas de letramento realizados em escolas primárias e secundárias na Austrália por vários estudiosos, entre eles, Jim Martin, com preocupação referente ao ensino de língua inglesa em diferentes contextos.

Segundo Marcuschi, alguns elementos de interesse da perspectiva sistêmico- funcional compreendem “análise da relação texto e contexto, estrutura esquemática dos textos em estágios, relação situacional e cultural e gênero como realização de registro” (2008, p. 152).

Um dos conceitos mais pertinentes ao desenvolvimento dos estudos sobre gêneros nessa perspectiva é o de registro, desenvolvido por Halliday, usado para definir características particulares de um texto determinadas pelo contexto, tanto de

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situação quanto de cultura14. Em pesquisas sobre gêneros com textos produzidos por alunos, Martin usava o termo registro, focando a função semiótica dos textos em um sistema social. Para ele, o registro funciona como uma forma de instanciação do gênero, ou seja, o registro “reflete a diversidade metafuncional no nível da linguagem materializada pela léxico-gramática, ao passo que o gênero o faz no nível dos processos sociais” (VIAN JUNIOR; LIMA-LOPES, 2005, p. 36).

Segundo Martin (1985), os gêneros são compreendidos como atividade realizada linguisticamente com objetivo definido e imerso em uma determinada cultura, ou seja,

uma atividade proposital, orientada a um objetivo, desenvolvida em etapas, na qual os falantes se envolvem como membros de nossa cultura, como atividade desenvolvidas em etapas ao marcar uma hora no dentista (...), convidar alguém para jantar, e assim por diante” (MARTIN, 1985, p. 24).

Como estão relacionados a uma cultura, os gêneros são vistos como mutáveis e sofrem modificações advindas das interações em que ocorrem.

No que concerne à teoria sobre gênero, poderíamos citar como principais estudos da Escola de Sidney os desenvolvidos por M. Halliday, Ruqayai Hasan, Martin, Ventola, Eggins, Theadgold, Rothery, entre outros.

Na Escola de Genebra, também conhecida como abordagem sociodiscursiva, os estudos desenvolvidos evidenciam, principalmente, o caráter pedagógico dos gêneros, uma vez que visam realizar trabalhos com a perspectiva de mudar práticas pedagógicas estabelecidas pelo ensino dito tradicional, centradas em uma abordagem primordialmente gramatical. Dedicando-se, principalmente, a fornecer subsídios à formação dos professores de língua materna, desenvolvem temáticas que abordam a estrutura e o funcionamento dos textos em francês, o desenvolvimento das capacidades de produção de textos na escola e a elaboração de sequências didáticas e de manuais educacionais.

Na obra inicial do grupo de Genebra, as pesquisas demonstravam o interesse em definir operações cognitivas e de linguagem referentes à atividade verbal para comprovar que condições de produção diferentes corresponderiam a diferentes tipos

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Contexto de situação e contexto de cultura dizem respeito a conceitos desenvolvidos pela LSF e estão relacionados, respectivamente, às escolhas que as pessoas fazem referentes ao registro e às escolhas referentes ao gênero (BUNZEN, 2004).

de texto ou de gêneros. Nessa obra não era apresentada uma definição precisa para gêneros, pois eram concebidos apenas como aquilo que sabemos que existe nas práticas de linguagem de uma sociedade (BRONCKART apud MACHADO, 2005). Nesse primeiro momento, os gêneros eram classificados com base na materialidade linguística, o que não foi comprovado nas pesquisas subsequentes.

Com influências da Teoria da Enunciação, com base nas discussões provocadas principalmente por Bakhtin, e da Teoria de Aprendizagem vygotskiana, esta corrente teórica se dedica a pesquisas relacionadas à constituição do interacionismo sociodiscursivo, com finalidades didáticas. Schneuwly e Dolz (2004) adotam a noção da tripla dimensão constitutiva dos gêneros (conteúdo temático, estrutura composicional e estilo) para definir um gênero como suporte de uma atividade de linguagem, afirmando que três dimensões parecem ser essenciais:

1) os conteúdos e os conhecimentos que podem ser ditos através dele; 2) os elementos das estruturas comunicativas e semióticas compartilhadas pelos textos reconhecidos como pertencentes ao gênero; 3) as configurações específicas das unidades de linguagem, traços notadamente da posição enunciativa do enunciador e dos conjuntos particulares de sequências textuais e de tipos discursivos que formam a estrutura (SCHNEUWLY; DOLZ, 2004, p. 7).

Além disso, Schneuwly também recorre à diferenciação bakhtiniana entre os gêneros primários e secundários para discutir o desenvolvimento da linguagem em crianças ao entrar na escola. Para aprofundar esta questão, ele se reporta às contribuições de Vygotsky, ao apontar a noção de gêneros como instrumentos ‘psicológicos’ para a comunicação/aprendizagem, vistos, assim, como ferramentas importantes e necessárias para o desenvolvimento das funções superiores dos alunos e, consequentemente, para sua participação nas diversas atividades. Conforme Ramires (2005), os gêneros, nessa abordagem, são encarados como ferramentas utilizadas para articulação entre as práticas sociais e os objetos escolares, mais especificamente voltados para o ensino da produção de textos orais e escritos, de modo que as práticas de linguagem implicam, ao mesmo tempo, dimensões sociais, cognitivas e linguísticas do funcionamento da língua.

Neste sentido, os gêneros não são tomados como unidade de análise privilegiada, não se constituindo, assim, o centro dessa abordagem, já que são considerados entidades vagas, impossibilitando sua identificação com base em

propriedades puramente linguísticas. Como afirma Paviani et al. (2008), o conceito de gênero, nessa abordagem, está associado aos conceitos de atividade, ação e agir, sendo estes de ordem sociológica, psicológica e de natureza interpretativista, respectivamente. Apesar dessa associação, ele é de ordem discursiva, ou seja, se refere à língua em funcionamento na sociedade, como mediadora das interações entre os humanos através das atividades de linguagem e por suas interferências no mundo pelas ações de linguagem.

De acordo com Bunzen,

O que a ‘Escola de Genebra’ vai propor é justamente uma abordagem centrada na diversificação dos textos e nas relações que esse mantêm com seu contexto de produção, enfatizando os aspectos históricos e sociais (2004, p. 226).

Nessa perspectiva, os textos são tomados como unidade de análise, embora os estudos se voltem para questões mais amplas de epistemologia, encontrando-se, atualmente, divididos em dois grupos conforme o foco. Temos, então, um grupo sob a liderança de Schneuwly, preocupado com questões que tratam da análise das ações do professor em sala de aula, e um outro que tem como líder Bronckart, voltado para a morfogênese das ações em diferentes situações de trabalho.

Essas pesquisas resultaram em modelos didáticos desenvolvidos no sistema educacional suíço, o que provocou um redirecionamento nos referenciais curriculares nas escolas genebrinas e serviu como referências para muitas pesquisas com foco no ensino e aprendizagem.

Esses estudos foram adotados no Brasil com ampla repercussão através dos Parâmetros Curriculares Nacionais (PCN), elaborados em 1996, que se constituem em um conjunto de documentos elaborados por educadores e técnicos do Governo Federal, voltado para a estruturação dos currículos escolares, com o objetivo de padronizar o ensino no país e construir um projeto pedagógico em função do exercício da cidadania pelos alunos.

Com isso, a perspectiva sociointeracionista obteve ampla divulgação no Brasil, gerando espaço para o desenvolvimento de inúmeras pesquisas através do diálogo estabelecido com o grupo de pesquisadores de Genebra. De acordo com Machado (2005), as pesquisas desenvolvidas no Brasil apresentam-se com diferenças visíveis, cujos focos poderiam ser agrupados da seguinte maneira: nas

ferramentas de ensino15; no aluno, com a análise de seu desenvolvimento; no professor em formação e no formador do professor; na interação professor- ferramenta-aluno, com análise da sala de aula; e na interação professor em formação-(ferramenta)-formador, analisando sessões reflexivas.

Para a perspectiva sociointeracionista, ensinar gêneros não significa tomá-los como objeto real de ensino e aprendizagem. O ensino de gêneros refere-se, na verdade, a compreendê-los como quadros da atividade social em que ações de linguagem se realizam16.

Para Schneuwly, os gêneros devem ser ensinados em seus variados tipos, que fazem parte da nossa realidade, com o objetivo de melhorar a competência linguístico-discursiva dos alunos bem como ampliar as possibilidades de participação social deles através das práticas de linguagem por eles internalizadas, entendendo a impossibilidade de pensar em um estudo que se realize por meio de uma progressão de gêneros, desde a sua potencialidade extremamente infinita. Nesse caso, eles devem ser vistos como elemento estruturador para as produções verbais. Para Bronckart, conforme Paviani et al. “o gênero corresponde a um ‘modelo abstrato’ para a realização de produções verbais que se assemelham do ponto de vista enunciativo e organizacional, a partir de um repertorio disponível para todos os falantes da língua” (2008, p. 178).

Como maiores representantes da Escola de Genebra, podemos citar Jean- Paul Bronckart, Bernard Schneuwly e Joaquim Dolz. Segundo Machado (2005). Esses três autores, apesar de admitirem focos diferenciados, compartilham ideias semelhantes quanto as suas teses globais e as que se referem a textos, tipos de discursos e tipos de sequência bem como aos elementos centrais do método de análise de textos.

Na Escola Norte-Americana ou Sociorretórica, a pesquisa de gêneros dá-se através de novas perspectivas adotadas no século XX advindas da tradição retórica. Em razão disso, o foco da análise dos gêneros textuais evidencia as regularidades discursivas, através de uma compreensão mais ampla, a partir da visão articulada entre os processos sociais e os diversos usos da língua.

Conforme Freedman e Medway (1994), quatro grandes perspectivas relacionadas ao conhecimento humano e às questões de linguagem servem como

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Aqui entrariam as pesquisas relacionadas a gêneros. 16

base para a elaboração das ideias sociorretóricas a respeito de gênero, a saber: o movimento chamado de Virada Retórica (Kenneth Burke, Thomas Kuhn), com a contribuição da visão da lingua(gem) como ação simbólica; o Construcionismo Social (Richard Rorty, Kenneth Bruffee), com a ênfase no conhecimento como algo construído socialmente em resposta a necessidades comuns; as Versões Retóricas da Racionalidade (Stephen Toulmin), que nos estudos das interações sociais mediadas pela linguagem direcionavam a atenção para a questão do contexto; e a Teoria dos Atos de Fala (John Austin, Searle), com o entendimento de que as palavras realizam muito mais do que simplesmente afirmações sobre o mundo.

Com base nessas perspectivas, a sociorretórica busca a redefinição do conceito de gêneros, de modo que as pesquisas envolvidas não têm a pretensão de descrever elementos textuais em si, referentes à estrutura e ao conteúdo, mas procuram explicar como os gêneros respondem a diferentes exigências retóricas, ou seja, aquelas ligadas à situação, enfatizando, assim, o contexto e seu uso. Até porque, se o foco da definição de gêneros for apenas para seus traços textuais, puramente linguísticos, o papel dos indivíduos no uso e na construção de sentidos será ignorado (BAZERMAN, 2009). Lembrando o que disse Miller, “uma definição retoricamente válida de gênero precisa ser centrada não na substância ou na forma de discurso, mas na ação17que é usada para sua realização” (2009a, p. 22).

Essa abordagem merece um destaque neste trabalho, haja vista que está diretamente relacionada às escolhas teóricas eleitas para fundamentar a análise desenvolvida nesta pesquisa. Em razão disso, ela será discutida com maior profundidade no próximo capítulo.

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3 OS GÊNEROS TEXTUAIS NA CONCEPÇÃO SOCIORRETÓRICA

Quando aprendemos um gênero...

Aprendemos a entender melhor as situações em que nos encontramos e as situações potenciais para o fracasso e o sucesso ao agir juntamente.

Carolyn Miller

A Escola Norte-Americana ou Sociorretórica se desenvolveu a partir de influências da ‘Nova Retórica’18

e da sua oposição aos modelos de ensino baseados na retórica clássica. O interesse pela retórica foi retomado através de trabalhos publicados por volta dos anos 1950. Pesquisadores nos Estados Unidos (Kenneth Burke), na Grã Bretanha (Stephen Toulmin) e na Bélgica (Chaim Perelman e Lucie Olbrects-Tyteca) se ocupavam com questões sobre a linguagem e argumento com interesses filosóficos. Com base na teoria da argumentação, dando ênfase à compreensão da audiência, estudos elaborados por Toulmin19 e por Perelman e Olbrects-Tyteca20, nos anos 1960, foram responsáveis pela popularização da retórica em contextos acadêmicos com o crescente número de alunos interessados.

Com esses novos estudos retóricos, a noção de propósito e contexto foi relacionada às discussões sobre texto, ampliando sua compreensão de artefato puramente linguístico para artefato cultural. Os discursos foram, assim, vinculados a uma compreensão social e cultural com foco na língua em uso.

Em relação aos gêneros, que doravante serão tratados neste trabalho como gêneros textuais21, devido ao interesse retórico no desenvolvimento intelectual e na instrução de alunos nas convenções e propósitos mais maduros da escrita, sua compreensão tornou-se mais sensível em relação às questões retóricas e sociais. A compreensão da organização social e das relações de poder estabelecidas através deles e o seu funcionamento na sociedade passaram, então, a ser considerados

18 Conforme Carvalho (2005, p. 130), tratava-se de “um movimento com preocupações pedagógicas acerca do ensino de composição argumentativa”.

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TOULMIN, S. The Uses of Argument. Cambridge: CUP, 1958. 20

PERELMAN, C.; OLBRECHTS-TYTECA, L. Tratado da Argumentação – a nova retórica. São Paulo: Martins Fontes, 1996.

21 A preferência pelo uso do termo ‘gênero textual’ deve-se ao seu emprego, no Brasil, para se referir à abordagem Sociorretórica, que norteará a análise aqui apresentada.

relevantes. É importante lembrar que esta corrente foi principalmente influenciada por antropólogos, sociólogos e etnógrafos.

Com a compreensão dos textos como uma entidade concreta, realizada materialmente e corporificada, mais centrada em seus aspectos sócio-históricos e culturais, essa perspectiva adotou a ‘teoria de gêneros de texto’, denominando-os gêneros textuais22. Nessa perspectiva, essas entidades não são vistas como formas linguísticas, mas como “uma forma de realizar linguisticamente objetivos específicos em situações sociais particulares” (MARCUSCHI, 2010, p. 31).

Conforme Marcuschi, os critérios que predominam na noção de gêneros textuais são os de ação prática, circulação sócio-histórica, funcionalidade, conteúdo temático, estilo e composicionalidade, uma vez que os gêneros textuais são entidades comunicativas, ou melhor, são “formas de ação social relativamente estáveis realizadas em textos situados em comunidades de práticas sociais e em domínios discursivos específicos” (2010, p. 26).

Apesar das regularidades de forma e conteúdo identificadas nos gêneros serem consideradas aspectos meramente superficiais para a sua análise, as contribuições teóricas advindas de estudos preocupados com esses aspectos não foram completamente abandonadas. Essa perspectiva busca, como disseram Freedman e Medway, “vincular essas semelhanças linguísticas e substantivas a regularidades das esferas de atividade humana” (apud RAMIRES, 2005, p. 49). Dessa forma, os estudos da escola americana vão apontar para outra forma de regularidade nos gêneros textuais que refletem um contexto de uso da linguagem mais amplo, de caráter social, histórico e cultural; sendo, assim, um aspecto indispensável e mais pertinente do que os traços formais para esse tipo de análise dos gêneros textuais.

Com a compreensão histórico-social dos gêneros e a ênfase na redefinição desse conceito, pois não era a estabilidade o que interessava, mas a relatividade presente no conceito desenvolvido por Bakhtin23, os gêneros textuais foram vistos pela questão da dinamicidade, da maleabilidade, da plasticidade e do movimento que lhes é intrínseco. Devido a esse entendimento, torna-se praticamente impossível a proposição do desenvolvimento de teorias de ensino de gêneros, prevalecendo a

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Outro grupo de estudiosos prefere denominá-los gêneros discursivos. Para uma melhor compreensão dessas escolhas, indicamos a leitura de Rojo (2005), na qual ela trata dessas questões com maior riqueza de detalhes.

compreensão do funcionamento social, histórico e cultural bem como das relações de poder estabelecidas, respeitando-se, assim, o conhecimento situado e a importância do contexto para o emprego das teorias.

Os gêneros textuais são vistos com algo instável, sujeito a mudanças e ao