• Nenhum resultado encontrado

Nam, ut ait Pedius, quotiens lege aliquid, unum vel alterum introductum est,

CONTRA LEG EM

INTERPRETAÇÃO AUTÊNTICA E DOUTRINAL

2) Nam, ut ait Pedius, quotiens lege aliquid, unum vel alterum introductum est,

bona occasio est coetera, quae tendut a d eandem utilitatem, vel interpretatione, vel certe ju risdiction e snppleri - “pois, conform e diz Pédio, toda vez que é por lei

algo estabelecido, um só ou diversos; boa oportunidade se nos antolha para serem acrescentados, por meio da interpretação ou de com petente adm inistração da justi­ ça, outros m ais, tendentes à m esm a utilidade” (4).

M algrado o sábio ensinam ento rom ano, o C ódigo das Sete Partidas (Partida I, tít. I, lei 14) vedara, ainda a interpretação das regras perem ptórias. Tanto na A lem anha, com o na Á ustria, antes da prom ulgação dos respectivos C ódigos civis, com o outrora no Piem onte, nas Duas Sicílias, na Toscana e no Estado Pontifício, deviam os juizes abster-se de decidir em casos duvidosos, c provocar a propiciação dc exegese autêntica (5).

Em França existia o apelo, obrigado, ao legislador, para resolver as dúvidas ocorrentes na prática (réferé au Xégislateur), interrom pido, para aquele fim, o anda­ mento da causa. A Lei de 10 dc abril de 1837 aboliu a consulta forçada c restabeleceu a autonom ia da m agistratura no interpretar e aplicar o Direito (6). Prosseguiu a evolu­ ção no m esmo sentido, dc dilatar dia a dia o cam po da exegese doutrinai e restringir o da autêntica; esta “filha do absolutismo” é hoje um a exceção, rara e antipática exce­ ção, em iodos os países cultos: assim declara a torrente unânim e dos civilistas (7 ).

94 - Justifica-se esse desprestígio crescente. C om põem -se m ais de políticos

do que de jurisconsultos as C âm aras dc senadores e deputados; raram ente os pro­ pósitos de justiça orientam as suas deliberações; quando sc em penham em dar o sentido a um texto, não observam as regras de H erm enêutica, atendem antes a su­ gestões do interesse regional, ou pessoal. Os próprios hábitos do Poder Legislativo predispõem -no mais para atender a considerações gerais do que para buscar a ver­ dade em sua essência90 (1). A política intervém em todos os atos c pensam entos dos parlam entares; por isso as disposições interpretativas quase sem pre se originam do propósito de m elhorar a situação de concessionários de obras, contratantes de serviços públicos, funcionários ou operárias do Estado. R esulta um trabalho cheio

de defeitos, sem utilidade gemi e ptejtiilU utllssimo, quase sem pre, ao tesouro, do país, estado, ou m unicípio.

95 — N ão há propriam ente interpretação autêntica; se o Poder Legislativo declara o sentido c alcance de um texto, o seu ato, em bora reprodutivo e expli cativo de outro anterior, é uma verdadeira norm a jurídica, e só por isso tem força obrigatória, ainda que ofereça exegese incorreta, em desacordo com os preceitos basilares da H erm enêutica91 (1).

É feita a lei, seja qual for a sua espécie, a fim de concretizar o Direito, toiná Io claro, expressivo, visível, positivo; se o não consegue por defeito dc redação, falta-lhe o seu prim eiro requisito, e a que lhe explica o conteúdo é a que realiza o objetivo colim ado; portanto constitui um a lei nova, m ais do que a precedente, que resultara quase inútil, falha na prática (2).

Por outro lado, é quase impossível fazer uma norm a exclusivam ente inlerpre tativa, sim ples declaração do sentido e alcance de outra; em verdade, o que se apre senta com esse caráter, é um a nova regra, sem elhante à prim eira e desta modilicadi>i a tle m odo quase im perceptível. “ É, de fato, o estabelecim ento de direito novo, com o acréscimo de determ inar que seja considerado como contido já em um texto antcrioi (3). Nada m ais difícil do que caracterizar as norm as sim plesm ente explicativas, islo é, distinguir a m era interpretação da verdadeira inovação, no campo do Direito H ).

96 - A própria dúvida sobre se a lei rege apenas os casos futuros, ou se se aplica desde a data de outra anterior (escola italiana precipitadam ente aceita |ioi alguns juristas brasileiros), essa divergência to m a contraproducente a tentativa de exegese autêntica, por aum entar, ao invés de dim inuir, a incerteza reinante, as cau sas de disputas e litígios. Demais, não é de presum ir que três entidades, C àniata, Senado e E xecutivo, não especializadas em jurisprudência e desvairadas jioi pre venções e pendores diversos, cheguem a acordo no sentido da verdade cicntílu a, tia explicação correta de um texto92 (1).

97 - Q uando projetam exprim ir por m eio de uma lei o conteúdo de outra, res Iringem a atividade do herm eneuta, produzem m enos um a espécie de interprclaçao tio que o contraste, a exclusão desta, que deve ser m u ato livre da inteligência orien tada cientificam ente, e não um a ordem irretorquível dos poderes políticos'" (1 ).

llllei|l|p|rt(,0O AulPntli a e Doutrliiiil |

91 95 - (1) Coviello, vol. I, p. 65.

(2) Conselheiro Antônio Luis de Seabra, apud Dias Ferreira, vol. I, p. 23.

(3) Emilio Caldara - Interpretazione delle Legqi, 1908, n9 85; W indscheid, vol. I, p. 87. (4) Dias Ferreira, Prol. da Universidade de Coimbra, vol. I, p. 24.

')2 96 - (1) Prol. Em m .iniielle Cilaiilint n Sh,lcm a di Diritto Civile Italiano, 3- ed., 1909, vol. I, p 115, nota 7.

7 6 Hermenêutica e Apllcaçílodo Direito | Carlos Maximiliano

98 - O ideal do Direito, com o de toda ciência, é a certeza, em bora relativa; pois bem , a form a autêntica de exegese oferece um grave inconveniente - a sua constitucionalidade posta em dúvida por escritores de grande prestígio.94 E la posi­ tivam ente arranha o princípio de M ontesquieu; ao C ongresso incum be fazer leis; ao aplicador (Executivo e Judiciário) - interpretá-las. A exegese autêntica transfor­ m a o legislador em ju iz; aquele tom a conhecim ento de casos concretos e procura resolvê-los por m eio de um a disposição geral.

A m plifica-se, deste m odo, a autoridade da legislatura, num regim e de freios e contrapesos; revela-se desam or pelo dogm a da divisão dos poderes, pedra angular das instituições vigentes (2).

Em resum o: se a lei tem defeitos de form a, é obscura, im precisa, faça-se outra com o caráter franco de disposição nova. Evite-se o expediente perigoso e retrógrado, a exegese p o r via de autoridade, irretorquível, obrigatória para os p ró ­ prios juizes; não tem m ais razão de ser; coube-lhe um papel preponderante outrora, evanescente hoje (3).

99 - R igorosam ente só a doutrinai m erece o nom e de interpretação, no senti­ do técnico do vocábulo; porque esta deve ser, na essência, um ato livre do intelecto hum ano95 (1). D ivide-se em ju d ic iá ria ou usual, e doutrinai propriam ente dita, p ri­ vada ou científica, am bas obtidas pelos m esm os processos e resultantes da aplica­ ção das m esm as regras. A prim eira origina-se nos tribunais, a segunda é o produto das lucubrações dos particulares, das pesquisas dos eruditos - communis opinio

doctorum. Uma e outra adquirem grande prestígio quando uniform es, duradouras,

e confirm adas ou defendidas por jurisconsultos de valor, com assento no pretório, ou brilhantes advogados, catedráticos, escritores.

94 98 - (1) Certos jurisconsultos entendem que a interpretação autêntica m erece alguma consi­ deração, exame respeitoso por parte dos tribunais; porém os não obriga; tem apenas o valor científico dos próprios argumentos (Black - Handbook on the Construction and Interpretation

o f the Laws, 2? ed., p. 306-307; Sutherland - S ta tu te s and Statutory Construction, 2a ed., vol.

II, § 476). Muitos outros avançam mais; repelem-na, como inconstitucional (Salis - Le Droit

Fédéral Suisse, trad. Borel, 2- ed., vol. II, p. 202-203; Lisandro Segovia - El Código Civil de Ia República A rgentina, vol. I, nota 3 à p. 2; Kent - vol. I, ns 456, nota c; Countryman, op. cit.,

p. 73). M erece especial menção um argumento de Segovia: o estatuto federal não atribuiu ao Congresso o poder, expresso, de fazer leis e interpretá-las, como estipularam as Consti­ tuições de algumas províncias argentinas (e o Código supremo do Império do Cruzeiro); e a competência não se presum e, as disposições que a estabelecem entendem-se e aplicam-se estritam ente.A Constituição brasileira de 1824 prescrevia: "Art. 15. É da atribuição da Assem- bleia Geral: VIII - Fazer leis, interpretá-las, suspendê-las e revogá-las."

(2) Dias Ferreira, vol. I, p. 24; Piola Caselli, apud Jandoli, p. 41; Caldara, op. cit., p. 72-73; Laurent, vol. I, n“ 282 e 284; Cooley, op. cit., p. 137; Kent, vol. I, n9456, nota c; Segovia, vol. I, p. 2, nota 3. (3) Lukas, op. cit., p. 405 e segs.; Laurent, vol. I, n9 271.

95 99 - (1) W indscheid, vol. I, § 20; Savigny, vol. I, p. 202-203; Jandoli, op. cit., p. 43. Geny e mui­ tos outros autores nem se ocupam com a interpretação autêntica.

Iill. l I I I I '1,11,,1o A l i i ( ' l l l l l .1 e I I l l l l l l lh .il 77

Tam bém os /^/<■<«•<A•///«•> /><// hnih nhucs, isto é, a m aneira uniform e de se i

pelo C ongresso entendido e nplli a d o un) dispositivo, eonslituem um elem ento de

interpretação tloulriiml (.’),

9 9 - A — Predom inando em certa época na Itália, com o sucedeu no Brasil, o

anseio pela interpretação uniform e da lei, várias sugestões foram ali apresentadas. Um grupo, tendo à frente Filangieri e R om agnosi, propôs instituir-se um eensoi suprem o ou um a suprem a consulta, com o repartição governativa dc conservação

e exegese obrigatória das norm as positivas. C aiu a proposta, que oferecia Iodos o:,

inconvenientes da tradicional interpretação autêntica. O utra corrente aventara a ideia de tornar as decisões da Corte Suprem a com pulsoriam ente aplicáveis a todos os casos sem elhantes, em todos os tribunais do país. Isto contrariaria o princípio

universal consubstanciado na parêm ia - res inter alios acta vel ju d ic a ta ali is n o n

nocet nec podest; dem ais, m udando, com o tem po, os com ponentes da consulta,

ou da C orte de C assação, seria de esperar que se m odificasse tam bém a orienta ção interpretativa dos textos perem ptórios. Terceira providência aproxim ava se do pensam ento de B onaparte é partira de A m brosoli, P rocurador do Rei: consistia num com entário oficial e obrigatório de todas as leis. A os com petentes a ideia se deparou com o ineficiente sob o aspecto técnico, desaconselhável soli o prisma político, e contrário aos fins da ju stiç a96 (1).

A s três sugestões envolviam u m grande inconveniente: a ossificação do I )irci to. É incom patível com este a im obilidade; ele é essencialm ente dinâm ico, acom panha a sociedade, que não para, e, portanto, não pode ficar tolhido por fórmulas petrificadas.

N o B rasil, o propósito unificador da exegese teve consagração na Reforma C onstitucional de 1925-1926 e nos estatutos fundam entais posteriores, com admi tir o R ecurso E xtraordinário para a C orte Suprem a, quando ocorresse diversidade de interpretação definitiva de lei federal entre tribunais locais superiores.