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1. POLISSEMIA NOMINAL DIACRÔNICA

1.4. Polissemia e neologismo semântico

1.4.2. Neologia semântica: fonte de polissemia em Terminologia

A neologia semântica é um fenômeno amplo, que envolve os processos da metáfora, metonímia e extensão, redução e ampliação de semas de um termo já existente.

É sabido que a neologia semântica é um fenômeno difícil de detectar. Desse modo, a identificação do neologismo semântico como o processo de criação neológica resultante do fenômeno da polissemia é uma tarefa complexa. Porém, essa dificuldade pode ser contornada tendo em conta os seguintes critérios:

i) saber se o termo que já existe, faz parte da terminologia em questão; ii) identificar os sentidos, polissêmicos ou não, do termo que está sendo analisado;

iii) analisar a relação entre o novo sentido com os sentidos existentes.

Com base nesses critérios, fundamentamos o nosso ponto de vista na definição de neologia semântica, apresentada por Bastuji. A autora tem em conta que esse

processo resulta no fenômeno da polissemia e que apresenta como característica, um traço diacrônico: “La néologie sémantique est un cas particulier de la polysémie, avec un trait diachronique de nouveauté dans l'emploi, donc dans le sens” (Bastuji, 1974:6).

Na sequência da definição desta autora, referimos que esse processo de criação neológica está intimamente relacionado com os estudos diacrônicos. Partimos do pressuposto de que a absorção de um novo sentido e/ou de um novo conceito por um termo é um processo que apresenta uma sucessão no tempo, ou seja, a gênese de um termo obedece a uma ordem que pode desencadear uma trajetória ao longo do tempo (cf. ponto 1.7).

Por mais que um termo apresente duas significações, num curto espaço de tempo, cada uma dessas significações apresenta-se em momentos distintos, relativos à sua gênese, que por sua vez, são acompanhadas de seus contextos históricos.

Mencionamos ainda que, por se tratar de polissemias situadas em períodos distintos do tempo, as significações apesar de apresentarem características em comum conservam traços que identificam o contexto histórico ao qual pertencem. Desse modo, o tipo de polissemia pode variar em função dessas características.

A esse respeito, Candel (2003) fala sobre a tipologia de neologismos de sentido. Conforme a autora, o neologismo de sentido é uma unidade na qual a mudança pode ocorrer de maneira total ou parcial; como consequência, essa mudança reflete-se no próprio significante.

Contudo, é necessário observar se essas mudanças que ocorrem nos constituintes de um conceito e/ou de uma significação de um termo podem resultar numa unidade polissêmica ou homonímica.

A relação estabelecida entre a polissemia e a neologia semântica tem contribuído para o surgimento de novas perspectivas. Desse modo, Rastier e Valette (2009) quando abordam a relação entre a polissemia e a neologia denominam-na de neosemia e a designam como uma inovação semântica, ou seja, uma maneira de descrever a criatividade semântica e os novos empregos de uma unidade lexical.

Ainda no que se refere à definição de neologia semântica, Bastuji afirma que esse processo pode manifestar-se como uma criatividade responsável por mudança de

regras que ocorrem através da transgressão de traços de categorização e de seleção. O termo transgressão, aqui utilizado pela autora, reflete a evolução através da incorporação de novos traços semânticos ao semema, provocando uma mudança de significação da unidade lexical no eixo diacrônico. Nas palavras da autora: “La néologie sémantique peut enfin se manifester comme créativité qui change les règles, par transgression d'un trait de catégorisation ou de sélection.” (Bastuji, 1979:17).

Carvalho refere que as relações estabelecidas entre formas e conteúdos podem alterar, ou melhor, estão em constante mudança, concluindo que, “qualquer extensão no significado de uma forma, envolve uma redução correspondente no significado das que dela depender” (Carvalho, 2006:194).

Por seu turno, Štrbáková (2007) reflete que a ocorrência da neologia semântica está centrada na mudança da significação, que ocorre a nível mental. De acordo com a autora, a concepção de neologia semântica está intimamente ligada a falta de limites entre as possíveis significações referentes a uma dada unidade.

Por fim, Lino (2007) refere-se à ocorrência da neologia semântica no domínio da medicina. Diz-nos a autora, ser este um processo muito complexo, pelo fato de que vários são os fenômenos que intervêm na criação de um novo sentido.

Uma reflexão em torno da ocorrência de neologia semântica é imprescindível para o estudo do termo, enquanto unidade lexical já existente num dado domínio de especialidade. Essa tarefa ainda tem por objetivo a análise e a descrição deste tipo de processo de criação neológica que denomina as novas realidades, sem precisar recorrer ao processo de criação neológica formal.

1.4.2.1. Neologimo semântico: a complexidade da identificação e da descrição

O resultado do processo de criação lexical semântico é um neologismo semântico, também designado por neologismo de sentido e/ou neologismo conceitual. O neologismo semântico reflete as transformações que ocorrem nas áreas do conhecimento em virtude das recentes descobertas. Essa mesma unidade é

responsável pela reestruturação e reorganização do conhecimento nos domínios de especialidade.

O neologismo semântico não se comporta apenas como um termo que pode ser analisado e descrito por distintas abordagens linguísticas. É uma unidade lexical que veicula o caráter social, cultural, ideológico e político da comunidade científica que a utiliza para veicular um conceito ou uma significação especializada.

A transmissão de uma nova significação e/ou de um novo conceito a partir de um termo já existente é um processo que deve ser realizado com muita cautela. É indispensável que a descrição dos novos elementos que constituem o termo seja realizada exaustivamente de maneira clara, concisa e objetiva, de modo a dar conta de que se trata de um novo conteúdo, embora seja veiculado por um termo/significante já conhecido.

A descoberta científica é um processo complexo que é restrito a um grupo de especialistas. Desse modo, cada nova informação que é descoberta durante um processo científico é recolhida para posteriormente ser divulgada.

A partir dessas novas descobertas, os novos conceitos e as novas significações são parâmetros que delimitam a fronteira entre o atual, designado pelo novo, e o passado.

A difusão desses novos elementos pode ser realizada a partir de um termo que integra o domínio de especialidade. O especialista não está interessado em saber se o uso de um determinado termo vai levantar problemas de ambiguidade, de variação, de polissemia enfim, qualquer dificuldade do ponto de vista linguístico. O seu objetivo é apresentar à comunidade científica a sua descoberta através da perspectiva na qual estão inseridos os seus estudos.

Tendo em conta esse panorama de criação neológica, lembramos Guilbert (1975:65) que se refere à complexidade da formação de uma nova unidade lexical, sob a perspectiva da neologia semântica. Segundo o autor, o reagrupamento dos semas ou traços semânticos que serão utilizados para designar uma nova unidade devem ter em conta o processo pelo qual se concebe uma nova unidade.

reagrupamento dos semas para criar uma nova unidade semântica, é necessário ter em conta a relação entre esses semas que estão presentes no desenvolvimento desse processo.

Diante dessa complexidade, Pruvost e Sablayrolles (2003) sublinham a dificuldade em estabelecer uma fronteira entre um novo sentido e os sentidos já existentes referentes a uma mesma unidade.

Essa mesma complexidade é referida por Solé, quando a autora aponta que, em situação de uso, a ocorrência de um mesmo termo em textos diferentes apresenta características distintas e desse modo, influenciam no estatuto de neologismo conferido a essa unidade. Nas palavras da autora: “el concept de neologisme és molt relatiu, canviant, evolutiu, ja que els diferents textos condicionen la neologicitat de les unitats lèxiques. És a dir, una mateixa unitat pot ser considerada neològica dins d'un text determinat i no ser-ho en un text amb unes característiques diferents.” (Solé, 2002:79).

Diante desse contexto, podemos afirmar que um termo será considerado neologismo semântico se e somente se atender aos seguintes critérios:

i) pertencer a um mesmo domínio de especialidade, ou ainda referir-se à relação entre subdomínios que apresentam uma grande proximidade;

ii) apresentar sentidos que partilham semelhanças e afinidades; iii) resultar de um processo de polissemia.

Como resultado do fenômeno da polissemia, é mais evidente e produtivo analisar e descrever o neologismo semântico sob uma perspectiva diacrônica, considerando que as alterações e mudanças que ocorrem no termo sucedem num eixo temporal.

Acrescentamos ainda que, em alguns casos, a identificação de um neologismo semântico pode ser caracterizada através das aspas (cf. Petralli, 1999). Segundo este

autor, o uso das aspas pode ser considerado como um importante sinal gráfico para identificar esse tipo de neologismo.

Assim, distinto do neologismo formal, o neologismo semântico pode passar desapercebido. No entanto, o processo de criação neológico semântico é relevante quando se trabalha em polissemia, porém, como fora mencionado anteriormente, indentificar esse fenômeno neológico é complexo, ainda mais quando esse trabalho é realizado através de contextos.

No entanto, no nosso trabalho, não identificamos nos contextos nenhum processo de neologia semântica (cf. ponto 5.2).

1.5. A significação e o sentido dos termos polissêmicos