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Notas sobre os casamentos e a escolha dos locais de residência

CAPÍTULO 2 AQUELES QUE VIVEM JUNTOS: RELAÇÕES ENTRE PARENTES

2.2. Notas sobre os casamentos e a escolha dos locais de residência

Nas conversas entre os jovens o que não faltam são comentários acerca de outros jovens por quem se dizem apaixonados, e das paqueras que ocorrem durante as festividades. No entanto, apesar de serem mais frequentes os encontros amorosos nesses contextos, contam

três grandes grupos: os Nhandeva (descendentes dos Apapocuva), os Mbyá e os Kaiowá. Entretanto, o autor afirma que nhandeva se constitui enquanto a denominação de todos os Guarani, significando “os que somos nós”, “os que são dos nossos” (SCHADEN 1954: 10).De maneira similar ao que fora destacado por Nimuendaju ([1914] 1987: 07) quando afirmou que “[...] Os Guarani, ao falarem de si na sua língua, para designar nação ou horda, empregam o termo Ñandeva, quando a pessoa com quem se fala pertence ao grupo, e Oréva, quando pertence a uma outra tribo”. Schaden (1954) também afirma que nhandeva era a autodenominação de grupos registrados na literatura como Apapocuva, Tanyguá e outros. Mello (2006), se referindo aos Guarani do Rio Grande de Sul com os quais trabalhou, os divide em três grupos: os Chiripá, Mbya e Nhandeva, afirmando que primeiros entendem nhandeva como qualquer Guarani. Todavia, para os grupos que assim se denominam,

nhandeva é sinômino de “nós”, “os humanos verdadeiros”. (MELLO, 2007: 55). Já Ladeira (2008), no que diz

respeito a essas denominações, afirma que os Guarani não se auto-identificam com elas, mas que acabaram adotando-as, sobretudo na relação com os não-índios. Enquanto Macedo (2009) indica que na Terra Indígena Ribeirão Silveira os Guarani desconhecem que nhandeva seja associada a um grupo específico e o seu dialeto, entendendo que a expressão é autodenominação de várias parcialidades Guarani.

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Lembro aqui, conforme fora explicado ainda na Introdução, que tenho utilizado o termo família para me referir aos meus interlocutores tupi guarani, partindo de suas configurações e formulações acerca das pessoas que tem realizado juntas inúmeros deslocamentos territoriais e que conformam atualmente a aldeia Ywy Pyhaú. Recordo também que utilizam o termo família para se referir às pessoas que moram juntas em uma mesma casa, as “famílias nucleares”, ou como faz D. Juraci, pessoa mais velha da aldeia, e que utiliza a expressão minha família, para se referir a seus filhos e cônjuges, netos e bisnetos. Não incluindo aqui, por exemplo, seus irmãos, que teriam suas próprias famílias, ainda que sejam seus parentes. Ressalto, mais uma vez, que quando o termo família é utilizado por mim, não o destaco em itálico, e que quando se trata de uma referência de meus interlocutores ele aparece em destaque.

que não se restringem a eles. Os cultos da Congregação Cristã no Brasil (CCB) também são lugares onde é possível haver encontros entre jovens frequentadores, assim como a escola, seja da aldeia ou da cidade, e também a casa de parentes que vão visitar. E os casamentos, resultado desses encontros, são o mote de inúmeras conversas, se constituindo como uma das formas de fazer parentes, ou então de atualizar relações entre eles, dado que a partir dos casamentos, sejam eles recém-contraídos ou desfeitos, as redes de relações das famílias tupi guarani podem adquirir novas configurações, e aqueles que eram distantes, podem se tornarem próximos e vice-versa, como veremos mais adiante.

Ao comentar a respeito de seus casamentos e quando falam sobre o que leva as pessoas a escolherem ou recusarem determinado cônjuge, explicam que é recomendável que os jovens batizados na CCB procurem por alguém dessa mesma religião; o que pode incluir tanto indígenas quanto não indígenas frequentadores. Já com relação às outras pessoas, aquelas que não frequentam a Congregação, notei que o que restringe os envolvimentos amorosos, são as relações entre parentes muito próximos, como as que se dão entre irmãos e irmãs, ou entre outros parentes de sangue que são criados juntos, como irmãos, que é o caso, por exemplo, daqueles que denominam de primo-irmão60. Como uma neta de D. Juraci me

disse, em certa ocasião, referindo-se a um primo muito próximo: Eu adoro ele, mas acha que dá pra casar, a gente fez tudo junto a vida inteira, não dá não! Entretanto, essa evitação não se estende àqueles que são referidos apenas como primos61, ou aos parentes distantes que,

como fora apresentado anteriormente, são os que, em sua maioria, residem em outras localidades, que não se visitam com tanta frequência e não partilham das vivências cotidianas, mas sobre os quais, de uma forma ou de outra, sempre ouvem falar. E é isso o que permite que, em alguns momentos, possam visitá-los, visitas essas que envolvem, sobretudo, jovens solteiros (as). 62

60 O primo-irmão, segundo explicam, é aquele primo que sempre viveu junto, que foi criado na mesma aldeia,

fazendo sempre as mesmas coisas, convivendo como irmãos, por vezes, até na mesma casa, nesses caso a casa das avós, que costumam, em situação de separações de seus filhos (as) acolher seus netos(as). Os primos-

irmãos, mesmo quando distantes, não deixam de receber essa denominação e os modos como se relacionam

continuam os mesmo, mesmo longe, ainda são como irmãos, porque foram criados juntos.

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Aqui tratam, sobretudo, de primos de segundo grau, mas que têm relativamente a mesma idade.

62 Foram poucos os trabalhos que acessei dedicados às regras de parentesco e casamentos guarani. Nesse

momento, a fim de ilustrar a questão, recordo-me do trabalho de Soares (1997), que explorando o parentesco a partir das relações entre organização social e arqueologia, afirma que o parentesco guarani é uma estrutura complexa, não estando os casamentos ligados somente às regras de parentesco, mas também a outras relações sociais que influenciariam na escolha do cônjuge. Dessa forma, o “casamento entre primos cruzados” seria preferencial, mas não obrigatório. Não havendo entre os Guarani atuais referências acerca da linearidade; se define tanto parentesco pelo lado do pai como da mãe, ou seja, a “descendência é bilateral”.

Apesar de se referirem a esses parentes distantes ao falar sobre seus casamentos, é importante sublinhar que as grandes distâncias físicas entre uma aldeia e outra, pode também ser um impedimento aos casamentos, ou mesmo à sua duração. Visto que aquele que se muda e vai residir longe com seu cônjuge, deixa de visitar constantemente seus pais e irmãos, dentre outros parentes ditos de sangue, o que gera saudades e até adoecimentos, impossibilitando que se acostumem nos novos lugares. E em razão disso, os pais também podem impedir essa união, evitando que seus filhos se distanciem deles. Assim, ainda que os parentes distantes, e aqui me refiro a uma convivência não tão próxima, sejam o ideal de um cônjuge, as grandes distâncias físicas entre localidades se apresentam enquanto um problema, e por isso deve-se ter em mente seu ideal de boa distância, nem tão próximos porque são como irmãos, e nem tão distantes, porque não haveriam de se acostumar. 63

As famílias tupi guarani afirmam, que o mais comum é que realizem seus casamentos com aqueles que são seus parentes, o que não inclui, como já fora dito, aqueles que lhes são muito próximos, mas pode incluir, como vimos anteriormente, outros povos indígenas, seus parentes Terena ou Kaingang. Por exemplo, Raquel que é esposa de Marcílio, um dos filhos de D. Juraci 64, é de origem Terena e eles se conheceram quando ela, junto de seus pais e

irmãos, veio do Mato Grosso do Sul visitar os parentes que vivem na T.I. Araribá. Explicam que é mais fácil encontrar cônjuges nos tekoha de parentes 65, e aqui se referem

principalmente às aldeias no norte do Paraná e T.I. Araraibá, locais onde já conhecem ou é mais fácil conhecer e se aproximar das pessoas, e por onde é possível circular. O que não se deve apenas à proximidade física das aldeias, mas também devido às relações de casamento

63 Sobre o tema da boa distância, retomarei ao abordar a respeito dos conflitos resultantes da proximidade de

suas casas, e que lhes impõe a necessidade de se afastarem, não residindo tão colados, como costumam dizer.

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Conforme descrevi no primeiro capítulo, D. Juraci tem dez filhos, sendo sete homens e três mulheres e segundo conta apesar de ter se casado mais de uma vez, prefere mesmo é viver sozinha, do jeito que criou seus

filhos. Seu primeiro marido foi Nicolau Marcolino, indígena tupi guarani, com quem teve seus três primeiro

filhos: Marilza, Célia e Reginaldo. Com o fim desse casamento se relacionou com Ronaldo Marcolino, também

tupi guarani, com quem teve um filho, Marcílio. Posteriormente casou-se com Adilson Nonato, que segundo

conta era Kaingang e pai de três de seus filhos: Carlos, Adilson e Admilson. E por fim teve dois maridos não indígenas que são os pais de seus três filhos mais novos: Danilo, Lucélia e Rafael. Dentre seus filhos, cinco residem em sua companhia na aldeia Ywy Pyhaú, são eles: Carlos, Adilson, Marcílio, Lucélia e Rafael. Os quais vivem com seus cônjuges e filhos, compondo as famílias que constituem essa aldeia.

65 Mello (2006), pesquisando entre alguns Mbya do sul, trabalha com o conceito

“Terra de Parentes”, compreendido como uma rede de aldeias ligadas entre si por laços de parentesco e por relações de reciprocidade, entre as quais, várias pessoas circulam frequentemente, formando redes de deslocamento, que configuram o território destes povos.

que foram anteriormente estabelecidas e que abriram novos caminhos de circulação de pessoas e saberes66, e criaram a possibilidade de fazer mais parentes.

Quando um jovem ou uma jovem se casa e vai residir em outra aldeia, é comum que seus irmãos e irmãs passem a visitá-los com certa regularidade, e nessas visitas costumam conhecer pessoas com quem podem vir a se relacionar; incluindo aqui os cunhados do jovem ou da jovem que acabara de se casar. Esse é o caso, por exemplo, do casamento de Carlos, filho de D. Juraci, e Edilaine que vivia na aldeia Pinhalzinho (PR), e que se conheceram em um dos passeios de sua família na T.I. Araribá. Sua irmã, na época em que realizava esses passeios, era casada com um dos irmãos de Carlos, também filho de D. Juraci, e contam que foi justamente pelo fato de seus irmãos serem casados, que puderam se conhecer, sendo esse um episódio marcante na união do casal, o responsável por seu encontro. Ou então o caso de Lucélia, que tem uma de suas sobrinhas casada com o irmão de seu marido, Alex. Sobre esses casos, de parentes em comum que se conhecem e se casam, comentam que acontece sempre assim, a gente vai, conhece uma pessoa, depois os irmãos vão lá e conhecem alguém também, acaba que é da mesma família! É tudo parente! Demonstrando, me parece, que as alianças entre determinadas famílias podem voltar a se repetir, havendo inclusive outros tantos casos similares a respeito dos quais não tenho subsídios suficientes para discutir aqui.

Apesar da preferência pelos casamentos entre parentes que decorrem, segundo explicam meus interlocutores, do fato de entre parentes ser mais fácil de se acostumar, seja com os cônjuges, seja nos lugares em que vivem, eles não se restringem a eles, podendo haver casamentos também com não indígenas67. Esses casamentos são frequentes, ainda que, de

acordo com suas formulações, alguns deles demandem mais esforços durante o processo de fazer com que se acostumem a viver mesmo como índios. Havendo inclusive, comentários sobre o fato de muitas das mulheres não indígenas, que foram residir na aldeia, se acostumarem com maior facilidade por morarem, quando solteiras, na zona rural. Sendo, dessa maneira, já habituadas a trabalhar na terra, cuidar de criação, dentre outras coisas, que

66 Sobre os caminhos de circulação de pessoas e saberes consultar a tese de Testa (2014), em que aponta que os

“[...] Mbya desenvolvem saberes e colocam-nos em circulação através de práticas contínuas de comunicação e movimento entre diferentes lugares e pessoas (humanas, divinas e não-humanas)”. Testa (2014) afirma ainda, que “[...] todos (deuses, donos e humanos) criam ou fecham caminhos que mobilizam ou retém a circulação de sujeitos, saberes e objetos. Isto é, todos esses sujeitos controlam os caminhos de circulação, cada um do seu modo”. (TESTA 2014: 124). Retomo tal assunto mais adiante nesta tese.

67 Como veremos mais adiante, os casamentos com não indígenas não se apresentam como um problema as

famílias tupi guarani com as quais trabalhei, ao contrário, por exemplo, do que ocorre entre algumas famílias mbya, que como descreve Testa (2014), relacionam os casamentos com não indígenas ao enfraquecimento dos mais velhos. Tratarei mais adiante das implicações desses casamentos e da prole que deles resultam, segundo as formulações de meus interlocutores acerca do que é ser Tupi Guarani, e da noção de mistura que a perpassa.

uma mulher que nasceu e vive nas cidades, sobretudo nas de grande porte, talvez não se acostumasse.

Entre os filhos de D. Juraci que vivem na aldeia Ywy Pyhaú, dois tem como esposas mulheres de origem não indígena e são eles: Adilson e Rafael. Contam que Adilson trabalhava em uma estância turística da região de Avaré (SP), enquanto a mãe de Maria, sua esposa, trabalhava nos ranchos do município, próximos a essa estância, e por isso circulavam pelos mesmos lugares, fato que possibilitou que viessem a se conhecer. Maria conta, que no início, sua família não aceitava seu relacionamento, diziam que ela era muito nova e temiam pelo fato de Adilson ser indígena. Apesar de sua família ser contrária a essa união, ela se mudou com ele para a aldeia Nimuendaju na T.I. Araribá, e antes que seu pai pudesse buscá- la, engravidou de sua primeira filha e, assim, aos 13 anos já era mãe. D. Juraci costuma contar, em tom de brincadeira, que Maria não sabia nem como ascender um fogão a lenha, e que no início do casamento sofreu bastante por ser ainda menina, mas que procurou acolhê-la como uma filha, lhe ensinando, sempre que podia; e não demorou muito tempo, ela se acostumou. 68 Hoje, Adilson comenta que não há sogra melhor do que a sua, ela é quase uma

mãe; e D. Juraci se orgulha de Maria e de como ela é índia de verdade.

Já Rafael, conheceu sua esposa Jakeline, que é filha de sitiantes da região, na Escola Estadual na cidade de Barão de Antonina, quando ele cursava o ensino médio e ela o ensino fundamental. A família de Jakeline, tal qual a de Maria, também não aceitava o relacionamento e, por isso, ela conta que sem o consentimento de sua mãe, pegou suas coisas e foi para a casa de Rafael, que nesse momento morava com D. Juraci. Enquanto que Rafael, ao narrar tal história, diz que na verdade ele roubou sua esposa. Assim como as outras mulheres de Ywy Pyhaú, Jakeline tem se dedicado ao fabrico do artesanato, o que segundo explicam, mostra que ela está se acostumando, e como diz D. Juraci: ela já está aprendendo a fazer igual índia mesmo!

Sobre os casamentos com mulheres não indígenas, além de Adilson e Rafael, há outros filhos de D. Juraci que são casados ou já se casaram com mulheres juruá e, ao contrario do

68 Mainardi (2015) apresenta uma discussão similar ao abordar as relações de casamentos entre algumas famílias

tupi guarani que vivem na T.I. Piaçaguera. A autora afirma que “[...] os casamentos estão relacionados à ideia do

acostumar-se, sendo um processo que se efetivava – ou que se fortalecia – com o nascimento dos filhos, momento em que as tensões tendiam a abrandar”. E continua mais adiante: “[...] para casar era preciso construir relações, era preciso domesticar o cônjuge. Quanto mais longe este estava – segundo uma classificação de alteridade sempre relativa – mais trabalho e energia se gastava para familiarizá-lo – nesse sentido, casamentos com não indígenas e outros índios podiam ser mais dispendiosos. Parece-me importante sublinhar: era a proximidade física que possibilitava os casamentos, o contato permanente e o cuidado cotidiano. Não conheço casamentos que tenham se efetivado com quem estava geograficamente longe, e mais, mudar ou desejar que o filho mude, por exemplo, era um modo de evitar ou desfazer casamentos”. (MAINARDI 2015: 37-38)

que ocorreu com o homem não indígena que viveu por um período em Ywy Pyhaú, e que era considerado meio índio, essas mulheres são identificadas e se autodenominam Tupi Guarani. Como afirmou uma senhora em meio a uma das apresentações realizada na aldeia Karugwá: Casou com índio é índio também. Explicam que o que faz com que sejam assim reconhecidas é o fato de viverem mesmo como índias, pois apreenderam, tal qual as mulheres indígenas, a fazer artesanato, os modos como devem se portar com os parentes, e em alguns casos apreenderam também a língua tupi. E dessa forma, entendo que viver como índia, fazendo-se parente, implica, sobretudo, na compreensão e compartilhamento dos seus modos de saber- fazer, que como veremos adiante, conecta-se com própria fabricação da pessoa tupi guarani.69

Ademais, elas estão sempre juntas de seu povo, em todos os contextos, seja nas tensões envolvendo ocupações territoriais e a luta pelo território, seja nos momentos de tranquilidade vivenciados nos lugares que ocupam. Há casos em que mulheres não indígenas, por exemplo, separam-se de seus maridos indígenas e vão vier em outras aldeias, casando-se novamente com um homem indígena, da mesma forma como o fazem as mulheres indígenas, as nascidas na aldeia, como dizem essas Tupi Guarani.

Acerca dos casamentos entre mulheres indígenas e homens não indígenas, pouco ouvi a respeito. No caso de D. Juraci, onde alguns de seus filhos têm como pais homens não indígenas, comentam que ela nunca chegou a morar com eles, tratando-se de homens com quem mantinha relações, namorava, mas não chegava a casar. Sobre os enlaces recentes com homens não indígenas, soube apenas de uma mulher que reside em uma das aldeias que é casada com um não indígena, o qual é mal visto pelos outros moradores.70 Dizem que isso

ocorre, não porque ele não seja índio nascido, mas porque ele não respeita o sistema do índio, tanto por cercar sua casa evitando que peguem frutas em seu quintal, quanto por não

69 Tais formulações me remetem ao trabalho de Figueiredo (2010) e de suas reflexões acerca das mulheres

Aweti. Em suas palavras: “[...] Um corpo de xinguana é mais que um corpo saudável e belo, é também um corpo apto a desempenhar as atividades que fazem com que uma mulher xinguana não seja outra coisa, uma mulher branca incapaz de descascar mandioca, por exemplo.” (FIGUEIREDO 2010: 246). No caso das famílias tupi guarani, suponho, de maneira similar ao que nos apresenta a autora, que é o fato dessas mulheres constituírem seus corpos a fim de serem capazes de desempenhar determinadas atividades e não as atividades em si, que faz com que sejam reconhecidas como índias de verdade. Dessa forma, as semelhanças, assim como as diferenças são marcadas nos corpos e por meio deles.

70 Essa discussão relacionada aos locais de residências envolvendo casamentos com não indígenas e a maneira

como ocorrem a depender se quem vem de fora da aldeia são homens ou mulheres, também foi apresentada por Nunes (2010a) ao trata dos povos Karajá de Buridina e se assemelha, em certa medida, ao contexto vivenciado pelas famílias tupi guarani. Nas palavras do autor: “Os homens indígenas que se casaram com mulheres tori passaram a levá-las para morar consigo, na aldeia, e as mulheres indígenas que se casaram com homens não indígenas saíram da aldeia para morar junto de seus maridos [...]” (NUNES 2010b: 206). Entretanto, Nunes (2010b) afirma que apesar de habituais, tais arranjos não são uma regra e que vez outra homens não indígenas vem morar com suas esposas na aldeia.

participar das coisas da cultura. Também soube pouco tempo atrás, que uma jovem de uma das aldeias se casou com um não indígena, porém foi ela quem saiu da aldeia e foi residir junto dele na cidade, ainda que visitem com frequência a aldeia e seu esposo seja considerado por sua avó como um neto.

Quando mencionam que pretendem se casar, uma das questões que se coloca é sobre o lugar onde o recém-casal planeja residir. E o que pude notar de suas discussões, é que os locais em que os novos casais escolhem para viver variam bastante, havendo homens que