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5 A REGULAMENTAÇÃO NO CPC/1939

5.2 A RECORRIBILIDADE DOS DESPACHOS INTERLOCUTÓRIOS

5.2.4 O agravo no auto do processo

O CPC/1939 destinava o art. 851 para tratar das hipóteses de cabimento do agravo no auto do processo, recurso que tinha como objetivos evitar a preclusão e não gastar tempo ou, nas exatas palavras de Pontes de Miranda, “não procrastinar nem sacrificar a reapreciação de certas decisões”267

.

Ao contrário do agravo de instrumento, o conhecimento do agravo no auto do processo pressupunha a tramitação de posterior apelação e o seu julgamento era feito como preliminar do julgamento daquele que impugnasse a decisão final (art. 852). Apesar de o art. 852 mencionar apenas apelação, havia quem defendesse que, se o recurso contra a decisão final fosse outro, como o agravo de instrumento ou o de petição, ainda assim o agravo no auto do processo poderia ser conhecido268, quem ampliasse somente ao agravo de instrumento interposto contra decisão definitiva269 e, por fim, aqueles que optavam por uma interpretação literal do artigo270.

O art. 851, I, indicava que eram recorríveis, por agravo no auto do processo, as decisões que julgassem improcedentes as exceções de litispendência e coisa julgada. Note-se que o inciso falava apenas em decisões que as julgassem improcedentes, de sorte que aquelas que as acolhessem, caracterizadas como decisões terminativas, estavam sujeitas ao agravo de petição271. O inciso tratava, portanto, somente de despachos interlocutórios.

267 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1960, t. XI, p. 394/395.

268 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1960, t. XI, p. 409/411.

269

MARTINS, Pedro Batista. Recursos e processos da competência originária dos tribunais. Alfredo Buzaid (atualizador). Rio de Janeiro: Revista Forense, 1957, p. 323/324.

270 FAGUNDES, M. Seabra. Dos recursos ordinários em matéria civil. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1946, p. 365/366; CRUZ, João Claudino de Oliveira e. Do recurso de agravo. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1950, p. 223/225.

271 MARTINS, Pedro Batista. Recursos e processos da competência originária dos tribunais. Alfredo Buzaid (atualizador). Rio de Janeiro: Revista Forense, 1957, p. 311; MARQUES, José Frederico. Instituições de direito

Relembre-se que, contra a decisão sobre exceção de incompetência, o recurso cabível era o agravo de instrumento, conforme previsão do art. 842, II, do CPC/1939. A doutrina justificava esse tratamento diferenciado na necessidade de julgamento breve da exceção de incompetência272.

Já o inciso II do art. 851 indicava que o agravo no auto do processo era o recurso cabível contra a decisão que não admitisse a prova requerida ou cerceasse, de qualquer forma, a defesa do interessado. Destaque-se que a primeira parte, de certo modo, estava incluída na segunda, pois a inadmissão da prova requerida implicava em potencial cerceamento da defesa da parte273.

Como o art. 117 do CPC/1939 permitia que o magistrado indeferisse as diligências inúteis em relação ao objeto do processo ou requeridas com propósitos manifestamente protelatórios, bem como permitia a dispensa de testemunhas (art. 237, parágrafo único), o indeferimento de perguntas direcionadas a elas (art. 246) e o indeferimento de quesitos impertinentes ao perito (art. 254, parágrafo único), também possibilitava à parte recorrer contra tais decisões, o que ocorria por meio do agravo no auto do processo.

Quanto ao cerceamento de defesa, o CPC/1939 instituiu uma hipótese de cabimento bastante abrangente, pois abarcava decisões que, de qualquer forma, implicassem cerceamento, dentre as quais estavam incluídas, por exemplo, as que não admitiam a defesa e as que mandavam desentranhar documentos274.

O inciso III do art. 851 qualificava o agravo no auto do processo como o recurso destinado à impugnação da decisão que concedesse, na pendência da lide, medidas preventivas.

Como já visto quando do estudo do art. 842, III, o CPC/1939 destinava os seus arts. 675 a 688 às medidas preventivas, que poderiam ser requeridas como preparatórias ou na pendência da “lide”.

Quando requeridas como preparatórias, o art. 842, III, indicava ser cabível o agravo de instrumento contra as decisões que denegassem ou concedessem tais medidas.

processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 1960, vol. IV, p. 228; MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1960, t. XI, p. 399.

272 MARTINS, Pedro Batista. Recursos e processos da competência originária dos tribunais. Alfredo Buzaid (atualizador). Rio de Janeiro: Revista Forense, 1957, p. 312; MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1960, t. XI, p. 399.

273

Nesse sentido: MARQUES, José Frederico. Instituições de direito processual civil. Rio de Janeiro: Forense, 1960, vol. IV, p. 229; MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1960, t. XI, p. 403.

274

Nesse sentido: MARTINS, Pedro Batista. Recursos e processos da competência originária dos tribunais. Alfredo Buzaid (atualizador). Rio de Janeiro: Revista Forense, 1957, p. 313; SANTOS, J. M. de Carvalho. Código de processo civil interpretado. 6ª ed. São Paulo: Livraria Freitas Bastos, 1964, vol. IX, p. 322.

Já o art. 851, III, indicava que, sendo requeridas na pendência da lide, as decisões concessivas eram recorríveis por agravo no auto do processo. Por outro lado, as que as denegassem, quando requeridas pendente a lide, eram consideradas irrecorríveis275.

Por fim, o art. 851, IV, tornava impugnável por agravo no auto do processo a decisão que considerasse, ou não, saneado o processo, ressalvado, quanto à última hipótese, o cabimento do agravo de petição, previsto contra decisões terminativas (art. 846).

No tópico 5.1.2.2 deste trabalho, foram expostas as discussões em torno da natureza jurídica do despacho saneador, sendo desnecessária nova abordagem detalhada do tema, mostrando-se suficiente a fixação da regra geral, segundo a qual o agravo no auto do processo era o recurso cabível contra ele, salvo se se estivesse diante de uma decisão terminativa, contra a qual cabia agravo de petição276.

Relembre-se, porém, a já demonstrada divergência doutrinária quanto ao conceito de mérito durante a vigência do CPC/1939. Por isso, encontrava-se, na obra de Pedro Batista Martins, atualizada por Alfredo Buzaid, posicionamento no sentido de que, se o juiz reconhecesse a falta de legítimo interesse ou de legitimidade ad causam, bem como a ilicitude do objeto da ação, haveria uma decisão de mérito impugnável por apelação277. Entendimento semelhante era defendido por Pontes de Miranda, que, utilizando como exemplo o reconhecimento da ilicitude ou imoralidade do objeto, mencionava ser cabível a apelação e não o agravo de petição278.

Essa discussão, todavia, não é essencial para este trabalho, pois se voltava à recorribilidade de uma decisão final tomada no termo da fase saneadora, debatendo-se se ela era terminativa ou definitiva. Por outro lado, nesta parte do trabalho, estuda-se a recorribilidade dos despachos interlocutórios. Por isso, basta definir que, tendo a decisão natureza jurídica de despacho interlocutório, o recurso era o agravo no auto do processo.

Por fim, José Frederico Marques defendia que o ato de considerar não saneado o processo nem sempre resultaria numa decisão terminativa, pois o reconhecimento da impossibilidade do julgamento de mérito poderia alcançar apenas parte da demanda apresentada de forma cumulada. Nesta hipótese, não seria cabível o agravo de petição, mas o

275 MARTINS, Pedro Batista. Recursos e processos da competência originária dos tribunais. Alfredo Buzaid (atualizador). Rio de Janeiro: Revista Forense, 1957, p. 313; ANDRADE, Odilon de. Comentários ao Código de Processo Civil. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1946, vol. IX, p. 298.

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Ressalte-se, contudo, que, na visão deste trabalho, não se poderia falar propriamente em despacho saneador quando houvesse uma decisão final, conforme já enfrentado anteriormente.

277 MARTINS, Pedro Batista. Recursos e processos da competência originária dos tribunais. Alfredo Buzaid (atualizador). Rio de Janeiro: Revista Forense, 1957, p. 315.

278 MIRANDA, Francisco Cavalcanti Pontes de. Comentários ao Código de Processo Civil. 2ª ed. Rio de Janeiro: Revista Forense, 1960, t. XI, p. 407.

agravo no auto do processo279. Haveria, portanto, um despacho interlocutório, não uma decisão terminativa.

Essas são as principais considerações acerca do cabimento do agravo no auto do processo no CPC/1939, um dos recursos previstos para a impugnação dos despachos interlocutórios.