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O cabimento dos agravos após a Lei n 11.187/2005

6 A REGULAMENTAÇÃO NO CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 1973

6.3 A RECORRIBILIDADE DAS DECISÕES INTERLOCUTÓRIAS

6.3.5 O cabimento dos agravos após a Lei n 11.187/2005

Na Exposição de Motivos do PL 4.727/2004, posteriormente convertido, com

377 SICA, Heitor Vitor Mendonça. “O agravo e o “mito de Prometeu”: considerações sobre a Lei 11.187/2005”. In: NERY Junior, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, v. 9, p. 194.

378 SICA, Heitor Vitor Mendonça. “O agravo e o “mito de Prometeu”: considerações sobre a Lei 11.187/2005”. In: NERY Junior, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, v. 9, p. 194. José Henrique Mouta Araújo fazia ponderações semelhantes, atribuindo a pouca utilização da conversão a duas razões: a) à locução verbal “poderá converter”, que poderia ensejar a interpretação de se tratar de uma faculdade; b) à possibilidade de agravo interno contra a decisão da conversão, o que não diminuía o trabalho do relator do agravo de instrumento: ARAÚJO, José Henrique Mouta. “O recurso de agravo e as diretrizes estabelecidas pela Lei 11.187/2005”. Revista de Processo. Ano 30, n. 130, 2005, p. 120/121.

alterações, na Lei n. 11.187/2005, o então Ministro da Justiça, Marcio Thomaz Bastos, afirmava que a proposta tinha como objetivo “alterar a sistemática de agravos, tornando regra o agravo retido” e reservando o agravo de instrumento para hipóteses específicas379

.

Assim, a Lei n. 11.187/2005 modificou o art. 522 para indicar que as decisões interlocutórias eram recorríveis por agravo na forma retida, salvo aquelas que: a) fossem capazes de causar à parte lesão grave e de difícil reparação; b) inadmitissem a apelação; c) decidissem sobre os efeitos nos quais a apelação era recebida. Nestes últimos três casos, o recurso seria o agravo de instrumento. Por consequência, o art. 523, §4º, que tratava da matéria, foi revogado.

Posteriormente, a Lei n. 11.232/2005 indicou que cabia agravo de instrumento contra a decisão em liquidação de sentença (art. 475-H). Esta hipótese de cabimento é enfrentada em tópico específico, mais à frente.

A Lei n. 11.187/2005 também tornou o art. 527, II, harmônico com o art. 522 e pôs fim à controvérsia sobre à suposta facultatividade na conversão em agravo retido, isto é, deixou claro que o relator converteria (não utilizando mais o verbo “poder”) o agravo de instrumento em agravo retido quando a decisão impugnada não fosse suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação, não fosse de inadmissão da apelação ou não tratasse dos efeitos nos quais ela era recebida (art. 527, II).

As alterações também impuseram a irrecorribilidade da decisão que convertesse o agravo de instrumento em retido, conforme nova redação do art. 527, parágrafo único.

Nesse novo cenário, a doutrina convergia ao reconhecer que o agravo retido era a regra no que dizia respeito à impugnação das decisões interlocutórias380 e que o relator estava

379 CALMON Filho, Petrônio (Org.). Reforma infraconstitucional do processo civil. São Paulo: Instituto Brasileiro de Direito Processual, 2005, vol. 4, p. 123.

380

Nesse sentido: WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. Os agravos no CPC brasileiro. 4ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, p. 97; NUNES, Dierle José Coelho. “Primeiros comentários à Lei 11.187, de 19.10.2005, que altera a sistemática do recurso de agravo, e à aplicação da cláusula geral lesão grave e de difícil reparação do novo art. 522 do CPC”. Revista de Processo. Ano 31, n. 134, 2006, p. 65; GOMES Junior, Luiz Manoel. “O novo regime do agravo de instrumento (Lei 11.187, de 19.10.2005)”. Revista de Processo. Ano 31, n. 134, 2006, p. 113; SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 364; NETTO, Nelson Rodrigues. “Recurso de agravo: generalização de sua interposição sob a modalidade retida”. Revista Dialética de Direito Processual. n. 33, 2005, p. 80/81; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 543; NERY Junior, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 11ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 912. Em sentido contrário, Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha defendiam que não era possível falar em primazia de algum dos regimes, mas apenas em delimitação da incidência de cada um, sem opção para o recorrente: DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de direito processual civil. Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2014, vol. 3, p. 136.

obrigado a converter o agravo de instrumento em retido nas hipóteses do art. 527, II381.

No que dizia respeito ao agravo retido, são necessárias apenas breves considerações, já que a decoberta das suas hipóteses de cabimento era alcançada por exclusão, isto é, não sendo caso de impugnação por agravo de instrumento, deveria se seguir o regime da retenção.

A primeira consideração está ligada à supressão, por parte da Lei n. 11.187/2005, do cabimento restrito de agravo retido contra decisões posteriores à sentença, excetuadas as que inadmitissem apelação ou versassem sobre os efeitos nos quais ela era recebida.

Quanto ao tema, deve-se concordar com Flávio Cheim Jorge, que, antes mesmo da Lei n. 11.187/2005, afirmava que não havia muita utilidade na previsão de agravo retido contra decisões posteriores à sentença, período no qual notadamente só havia prolação de duas delas: sobre a admissibilidade da apelação e sobre os seus efeitos382. A primeira delas já havia sido excepcionada pela Lei n. 9.139/1995 e a segunda o foi pela Lei n. 10.352/2001. Desta forma, não havia decisões relevantes posteriores à sentença. Ademais, mostrava-se incompatível recorrer por agravo retido, uma vez que não haveria apelação posterior na qual se pudesse ratificá-lo.

Sobre esse tema, J. E. Carreira Alvim chegou a sustentar que as decisões posteriores à sentença, salvo as duas exceções mencionadas, estavam sujeitas ao agravo de instrumento ou ao retido, sendo livre a escolha por parte do recorrente383. Na visão deste trabalho, tal posicionamento não era o mais correto, uma vez que não havia compatibilidade do agravo retido com eventual decisão posterior à sentença.

A segunda ressalva dizia respeito à interposição oral contra decisão em audiência de instrução e julgamento, que passou a ser obrigatória, não se admitindo a interposição por escrito (art. 523, §3º). Sobre ela, é preciso ponderar que, havendo risco de lesão grave ou de difícil reparação, o agravo de instrumento era cabível, uma vez que, não sendo caso de agravo

381 Nesse sentido: ALVIM, J. E. Carreira; CABRAL, Luciana Gontijo Carreira Alvim. “Nova mexida nos agravos retido e de instrumento”. In: NERY Junior, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, v. 9, p. 284; NUNES, Dierle José Coelho. “Primeiros comentários à Lei 11.187, de 19.10.2005, que altera a sistemática do recurso de agravo, e à aplicação da cláusula geral lesão grave e de difícil reparação do novo art. 522 do CPC”. Revista de Processo. Ano 31, n. 134, 2006, p. 66; GOMES Junior, Luiz Manoel. “O novo regime do agravo de instrumento (Lei 11.187, de 19.10.2005)”. Revista de Processo. Ano 31, n. 134, 2006, p. 117; NETTO, Nelson Rodrigues. “Recurso de agravo: generalização de sua interposição sob a modalidade retida”. Revista Dialética de Direito Processual. n. 33, 2005, p. 85; NERY Junior, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 11ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 929.

382 JORGE, Flávio Cheim. “Os recursos em geral – Lei n. 10.352, de 26 de dezembro de 2001”. In: JORGE, Flávio Cheim; DIDIER Jr., Fredie; RODRIGUES, Marcelo Abelha. A nova reforma processual: as mudanças introduzidas no CPC pelas Leis ns. 10.352 e 10.358, de dezembro de 2001. São Paulo: Saraiva, 2002, p. 87/89. 383 ALVIM, J. E. Carreira. “Agravo retido e agravo de instrumento – nova mini-reforma do Código de Processo Civil”. Revista de Processo. Ano 30, n. 130, 2005, p. 88/90.

retido, não faria sentido exigir interposição oral384.

Ademais, ressalte-se que havia precedentes do STJ afirmando que a interposição oral só era exigida em audiência de instrução e julgamento, de sorte que era possível interpor o recurso na forma escrita quando a decisão fosse tomada em audiência de conciliação385, o que contrariava o defendido por Fredie Didier Jr. e Leonardo Carneiro da Cunha, para quem o recurso deveria ser interposto oralmente, pois a intenção seria prestigiar a oralidade e a celeridade386.

Feitas essas duas considerações, pode-se partir para o estudo do agravo de instrumento neste último período de vigência do CPC/1973.

A primeira hipótese de cabimento de agravo de instrumento, segundo o art. 522, caput, envolvia a impugnação de decisão interlocutória suscetível de causar à parte lesão grave e de difícil reparação.

A doutrina afirmava que “lesão grave e de difícil reparação” era um conceito vago ou indeterminado, cuja aferição se daria à luz do caso concreto387.

Teresa Arruda Alvim Wambier defendia que o conceito de “lesão”, além do dano iminente, pressupunha a demonstração de fumus boni iuris, isto é, da probabilidade de provimento do recurso, uma vez que só seria lesado quem tivesse algum direito388. Essa tese, contudo, não encontrava respaldo no restante da doutrina, que só fazia menção à ideia de urgência389 ou de risco de dano390 ou referia-se genericamente ao perigo de “lesão grave ou de

384 No sentido da admissibilidade do agravo de instrumento: ARAÚJO, José Henrique Mouta. “O recurso de agravo e as diretrizes estabelecidas pela Lei 11.187/2005”. Revista de Processo. Ano 30, n. 130, 2005, p. 114; DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de direito processual civil. Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2014, vol. 3, p. 137; ASSIS, Araken de. Manual dos recursos. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015, p. 582/583.

385

Nesse sentido: AgRg no AREsp 354975 / SP. Segunda Turma. Rel. Min. Herman Benjamin. DJe 06/03/2014; REsp 1288033/MA. Terceira Turma. Rel. Min. Sidnei Beneti. DJe: 19/10/2012.

386 DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de direito processual civil. Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2014, vol. 3, p. 137.

387

Nesse sentido: NERY Junior, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 11ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 912; DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de direito processual civil. Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2014, vol. 3, p. 144. Dierle José Coelho Nunes falava em “cláusula geral”: NUNES, Dierle José Coelho. “Primeiros comentários à Lei 11.187, de 19.10.2005, que altera a sistemática do recurso de agravo, e à aplicação da cláusula geral lesão grave e de difícil reparação do novo art. 522 do CPC”. Revista de Processo. Ano 31, n. 134, 2006, p. 71.

388 WAMBIER, Teresa Arruda Alvim. “O agravo e o conceito de sentença”. Revista de Processo. Ano 32, n. 144, 2007, p. 247.

389

DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de direito processual civil. Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2014, vol. 3, p. 144.

390 SICA, Heitor Vitor Mendonça. “O agravo e o “mito de Prometeu”: considerações sobre a Lei 11.187/2005”. In: NERY Junior, Nelson; WAMBIER, Teresa Arruda Alvim (Coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis e assuntos afins. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2006, v. 9, p. 197/198. O autor, contudo, fazia ressalvas quanto à ideia de “gravidade” do dano para fins de cabimento do agravo de instrumento.

difícil reparação”, sem qualquer ressalva semelhante391

.

Perceba-se que essa primeira hipótese não estava relacionada ao conteúdo da decisão interlocutória, isto é, ao objeto decidido, mas a um efeito possível do pronunciamento do juiz.

A segunda e a terceira espécies de decisões impugnáveis por agravo de instrumento, nos termos do art. 522, caput, eram as que inadmitissem a apelação e as que decidissem sobre os efeitos nos quais elas eram recebidas.

O art. 518, caput, indicava que, interposta a apelação, o magistrado declararia os efeitos nos quais ela era recebida e mandaria dar vista ao apelado para responder. Na sistemática do CPC/1973, conforme dispunha o art. 520, a apelação era recebida, em regra, com efeitos devolutivo e suspensivo, excetuadas algumas hipóteses, nas quais só teria o primeiro deles (art. 520, I a VII). A decisão do juiz de primeiro grau sobre tais efeitos era recorrível por agravo de instrumento.

O recurso de apelação, na vigência do CPC/1973, estava sujeito a um duplo juízo de admissibilidade: a análise poderia ser feita pelo juízo a quo e, em caso de admissão por parte dele, não havia prejuízo à possibilidade de o juízo ad quem também realizar tal controle.

Nesse sentido, o art. 518, parágrafo único, incluído pela Lei n. 8.950/1994, indicava que, apresentada a resposta à apelação, era facultado ao juiz o reexame dos “pressupostos de admissibilidade” do recurso.

Posteriormente, a Lei n. 11.276/2006 modificou o art. 518, mantendo o seu caput com a redação dada pela mesma Lei n. 8.950/1994. Por consequência da alteração, o §1º do art. 518 indicava que o juiz não receberia a apelação quando a sentença estivesse em conformidade com súmula do STJ ou do STF. Já o §2º manteve redação semelhante à do antigo parágrafo único, indicando que, após apresentada resposta, o juiz poderia, no prazo de cinco dias, reexaminar os “pressupostos de admissibilidade” do recurso.

Contra a decisão do juiz de primeiro grau que inadmitisse a apelação cabia agravo de instrumento, conforme dispunha a parte final do art. 522, caput, do CPC/1973.

Após a Lei n. 11.187/2005, o CPC/1973 continha mais duas hipóteses expressas de cabimento de agravo de instrumento, contidas no art. 475-H e no art. 475-M, §3º. A primeira dessas decisões será analisada em tópico específico, mais adiante. Neste momento, examina- se apenas a hipótese do art. 475-M, §3º.

Como já se falou, a Lei n. 11.232/2005 impôs como a regra a fase processual de

391 MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 543; NERY Junior, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 11ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 912.

execução de obrigação de pagar quantia fundada em título judicial, reservando o processo autônomo a algumas exceções. Nesse sentido, passou a regular a fase de “cumprimento de sentença” entre os arts. 475-I a 475-R.

Por consequência, a regra passou a ser que a defesa em tais execuções deveria ser feita mediante impugnação ao cumprimento de sentença, apresentada nos próprios autos, não mais por embargos à execução (arts. 475-J, §1º, 475-L e 475-M).

Como a impugnação poderia ser total ou parcial, bem como ser totalmente acolhida, parcialmente procedente ou rejeitada em sua íntegra, os seus resultados possíveis variavam entre dois extremos: a manutenção da execução em todos os seus termos (rejeição total da impugnação) e extinção da execução (acolhimento integral da impugnação). Dessa forma, a decisão sobre a impugnação poderia encerrar ou não a fase executiva.

Anteriormente, pode-se definir que a sentença pressupunha o encerramento do processo ou de alguma de suas fases, enquanto a decisão interlocutória, não. Por isso, a decisão em impugnação de sentença só deveria ser entendida como sentença quando extinguisse a fase executiva. Nos demais casos, seria decisão interlocutória e a fase continuaria em prol da satisfação da obrigação. Por consequência, havendo extinção da execução, o recurso seria a apelação (art. 513) e, nos demais, o agravo seria o recurso cabível (art. 522).

Tornando esse raciocínio mais claro, o art. 475-M, §3º, definia que a decisão que resolvesse a impugnação era recorrível mediante agravo de instrumento, salvo quando importasse extinção da execução, caso em que caberia apelação.

Como se viu, tratava-se de dispositivo dispensável. Além do mais, a menção à recorribilidade desta decisão interlocutória por agravo de instrumento também era até certo ponto desnecessária, uma vez que clara a absoluta incompatibilidade do agravo retido na medida em que a sentença futura (da qual se poderia apelar e ratificar o agravo retido) só seria proferida após a satisfação do débito, o que poderia pressupor até mesmo expropriação. Esse tema, no entanto, será enfrentado em seguida.

Neste momento, cumpre destacar que esses eram os casos expressamente previstos no CPC/1973 nos quais era cabível a impugnação de decisão interlocutória por agravo de instrumento.

Além deles, havia hipóteses em que, apesar de inexistir urgência ou expressa previsão legal, a recorribilidade da decisão interlocutória deveria se dar por agravo de instrumento, não por agravo retido. Isto decorria da incompatibilidade do agravo retido com a impugnação em questão.

a doutrina392 e o STJ393 entendiam que o recurso cabível era o agravo de instrumento.

A justificativa era bem simples: o julgamento do agravo retido pressupunha a ratificação em sede de apelação ou contrarrazões. Ocorre que o processo de execução caminhava em prol da satisfação do crédito e a sentença, se tudo estivesse em ordem, declararia a anterior satisfação do crédito. Logo, quando fosse apresentado um pronunciamento apelável e possibilitada a ratificação do agravo, o executado, por exemplo, já teria sofrido com todos os atos tendentes à satisfação do crédito, como medidas coercitivas e atos expropriatórios, por exemplo394.

Neste caso, não era de todo incompatível o agravo retido, uma vez que, negada uma substituição de penhora requerida pelo executado e interposto agravo retido, por exemplo, seria possível a sua ratificação em contrarrazões se a sentença posterior decretasse a prescrição do crédito executado e houvesse apelação do exequente. Todavia, como a execução voltava-se à satisfação do crédito e havia alta probabilidade de a sentença apenas reconhecer anterior pagamento, deveria se entender que só era cabível agravo de instrumento contra as decisões interlocutórias nesses procedimentos395.

A doutrina apresentava outros casos de incompatibilidade do agravo retido, como o indeferimento da intervenção do assistente396, o indeferimento parcial da petição inicial397 e a decisão em exceção de incompetência relativa398.

Assim, além das hipóteses previstas nos arts. 522, 475-H, 475-M, §3º, do CPC/1973, eram agraváveis por instrumento as decisões interlocutórias cuja impugnação mediante o

392 Nesse sentido: MOREIRA, José Carlos Barbosa. O novo processo civil brasileiro. 25ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 146; MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 544; DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de direito processual civil. Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2014, vol. 3, p. 147; SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 365.

393

Assim, por exemplo: AgRg no AREsp 5.997/RS. Primeira Turma. Rel. Min. Benedito Gonçalves. DJe: 16/03/2012; RMS 27.227/RS, Rel. Min. Laurita Vaz. DJe: 24/02/2012; RMS 27.194/RS. Quinta Turma. Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima. DJe: 15/03/2010.

394

Nesse sentido: DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de direito processual civil. Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2014, vol. 3, p. 136/137.

395 Em sentido semelhante, Luiz Guilherme Marinoni e Sérgio Cruz Arenhart falavam da incompatibilidade do agravo retido quando não fosse “usual a interposição de apelação contra a sentença finalmente dada”, o que ocorreria na fase de cumprimento de sentença e no processo de execução: MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 544.

396

NERY Junior, Nelson; NERY, Rosa Maria de Andrade. Código de processo civil comentado e legislação extravagante. 11ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2010, p. 917.

397 DIDIER Jr., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de direito processual civil. Meios de impugnação às decisões judiciais e processos nos tribunais. 12ª ed. Salvador: JusPodivm, 2014, vol. 3, p. 147.

398

MARINONI, Luiz Guilherme; ARENHART, Sérgio Cruz. Processo de conhecimento. 7ª ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2008, p. 544; SOUZA, Bernardo Pimentel. Introdução aos recursos cíveis e à ação rescisória. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2014, p. 366.

regime da retenção fosse incompatível. Cabem, ainda, algumas considerações.

É importante frisar que, havendo a interposição de agravo de instrumento em casos nos quais o regime adequado era o da retenção, o CPC/1973 não impunha a inadmissibilidade do recurso, mas a simples conversão em agravo retido, que poderia ter seu mérito futuramente julgado. Esse raciocínio já era pertinente desde a vigência da Lei n. 10.352/2001.

Situação peculiar era aquela na qual, a despeito da obrigatoriedade da interposição de agravo de instrumento, era apresentado o agravo retido.

Teresa Arruda Alvim Wambier defendia que, nesses casos, o magistrado não deveria fazer nada, uma vez que o juízo de admissibilidade do agravo caberia somente ao tribunal399. Nelson Nery Junior e Rosa Maria de Andrade Nery chegavam a acompanhar o mesmo entendimento, afirmando que o juiz só deveria analisar os requisitos de admissibilidade do agravo retido para fins do juízo de retratação, não podendo indeferi-lo, ainda que fosse caso de agravo de instrumento, deixando-o nos autos para análise em julgamento de futura apelação400. No entanto, mais à frente, afirmava que, como não era possível a conversão do agravo retido em de instrumento, o juiz deveria indeferir o agravo retido quando fosse o caso de interposição de agravo de instrumento401.

A ideia de o juiz a quo ser indiferente ao agravo retido e deixá-lo nos autos para julgamento em futura apelação não resolvia todos os casos, pois nem sempre haveria espaço para futura apelação. Isto é evidente no caso das decisões interlocutórias, sujeitas a agravo de instrumento, que inadmitissem a apelação ou resolvessem os efeitos nos quais elas eram recebidas. Havendo impugnação por agravo retido, ele não poderia ser ratificado posteriormente, já que não haveria outra apelação.