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4.4 Discussões Cinematográficas Propriamente Ditas

4.4.2 O Cinema Como Arte

Uma importante questão, e uma das primeiras grandes discussões da história teórica do cinema, é se o cinema pertence às Artes, fundamental para a história do cinema e suas perspectivas de apreciação continua a suscitar debates até os presentes tempos. Neste segmento examinaremos algumas visões acerca desta questão.

Uma das respostas suscitadas por esta questão é a definição do cinema com arte. Tal defesa difere a cada perspectiva adotada para tal empresa aqueles que avocam o Cinema como Arte dificilmente o fazem a partir do mesmo âmbito.

Cinema is an art because it offers filmmaker ways to design experiences for viewers, and those experiences can be valuable regardless of their pedrigree. Films for both small and large belong to that very inclusive art we call film or cinema. Bordwell; Thompson (2012, p.2-3)

Tal posição parte da perspectiva da visão do filme como um produto destinado necessariamente a um determinado público pagante que através de uma narrativa é guiada a viver experiências extraordinárias como participar de uma guerra ou acompanhar o desenrolar de acontecimentos que usualmente ocorreriam no período condizente com a totalidade de uma existência.

No entanto tais maneiras existiam muito antes do estabelecimento do cinema e aos conforme discutido anteriormente aos comentadores da época do zootrópio a engenhosidade tecnológica daqueles aparatos não os fazia portadores de inerente valor artístico.

Outra questão importante acerca deste enunciado é que este inadvertidamente ou não exclui filmes do universo do cinema. Ao dizermos que o fator preponderante da artisticidade de um filme são as experiências que suscitam aos espectadores incorrermos em questão maior que tal definição, sendo esta, a própria definição de cinema, não trataremos desta questão no presente segmento mas a existência de filmes como Empire , Manual of Arms, Carrots and Peas, One Second in Montreal e muitos outros filmes- que definitivamente são filmes pela maioria dos critérios aferíveis e logo compões o cinema -que não são contemplados por tal explicação por não terem sido composto através de pressupostos dentre os quais o mais destacável é a ausência de narrativas- ao menos a ausência destas pelos parâmetros convencionais.

Outra forma de defender o cinema se dá através da defesa do cinema como arte através de sua expressividade. Sendo necessariamente arte por tal motivo por ser a quintessência das artes anteriores a sua existência de modo a derivação de elementos de junção das artes (cinema, pintura, música, teatro e literatura, fotografia) resulta em uma nova substância , em algo inédito, Panofsky (1975, p.17): “instead of imitating a theatrical performance already endowed with a certain amount of motion, the early films added moviment to works of art originally stationary” . Através de tal perspectiva o cinema seria definitivamente entronizado às artes por decorrência de tal feito sendo assim a sétima arte. Outra visão diz que o cinema compõe o universo das artes por conseguir residir dentro da definição de arte que julgam apropriada sendo tal definição de arte:

to explain the artist himself to those around him what man lives for, what is his existence. To explain to people the reason for their appearance on this planet;or if not to explain, at least pose the question (…) the artist expresses these things by creating the image, sui generis detector of the absolute. Through the image is sustained an awareness of the infinite : the eternal within the finite, the spiritual within matter, the limitless given form. art could be said to be a symbol of the universe , being linked with the absolute spiritual truth which is hidden from us in our positivistic, pragmatic activities (TARKOVSKY 1989,p.36-37)

Há ainda outra contenda que reside dentro desta questão: A relação entre cinema e fotografia e suas consequências. Dissemos anteriormente que a fotografia integra o campo das artes e o cinema deriva destas, no entanto, a relação entre cinema e fotografia é maior do que mera derivação, o cinema depende da fotografia e deve a esta sua existência, um filme é composto por uma sucessão de fotogramas. Logo não diferença entre uma fotografia e um fotograma retirado de um filme sem o devido contexto.

Consequentemente o valor artístico do cinema se vê contestado, em parte devido a posição daqueles que não percebem diferenças fundamentais entre o cinema e a fotografia e por parte daqueles que negam a artisticidade tanto da fotografia quanto do cinema.

A primeira indagação pode ser respondida através do fato de que fotografias apesar de conseguirem sugerir movimento por meio de uma série de técnicas como a abertura prolongada do obturador em meio a movimento não são capazes de exprimir a concatenação de um conjunto de ações em um único fotograma, isto é, a fotografia sugere movimento mas é incapaz de verdadeiramente mostrar imagens em movimento.

A outra indagação para ser adequadamente compreendida necessidade de maior atenção. Entender certas características da pintura pois o entendimento de qual questão ocorre através da equiparação desta com a fotografia.

The ideal painting stands in a certain ‘intencional’ relation to a subject. In other words, if a painting represent a subject, it does not follow that the subject exist or nor, if does exist, that the painting represents the subject as it is (...) the paiting stands stands in this intencional relation to its subject because of a representational act, the artist´s act, and in characterizing the relation between a painting and its subject we are also describing the artist's intention. The successful realization of that intation lies in the creation of an apparence, an appearance which , in some ways, leads the spectator to recognize the subject. Scruton (2006, p.20)

Ao passo que as características próprias a fotografia apesar da intensa relação de derivação que obteve da pintura - predominantemente em seus primeiros anos- difere das anteriormente citadas, e o são por sua vez:

The ideal photograph also stands in a certain relation to a subject. A photograph is a photograph of something. But the relation is here casual and not intencional (...) if a photograph is a photograph of a subject, it follows that the subject exists. (...) The ideal photograph also yields an appearance , but the appearance is not interesting as the realization of an actual intention but rather as a record of how an actual object looked Scruton ( 2006, p.20)

A disparidade de tais características apresenta mais que uma simples dissonância entre meios diferentes, mostram por sua vez a diferença entre a presença e a ausência de representação. Representação no sentido atribuído a tal perspectiva, que é Scruton (2006, p.25) “representation in art has a special significance precisely because of the possibility that we can understand it -in the sense of understanding its content- while being indifferent to , or unconcerned with its literal truth” sendo critério de pertencimento ás Artes, de forma que a fotografia não pode ser considerada arte porque em sua natureza é incapaz de obter intencionalidade e consequentemente representação por retratar necessariamente o que existe da forma que existe de forma que por sua ligação com a fotografia o cinema não seria digno de ser considerado Arte em decorrências dos pressupostos anteriormente discutidos.

Tal perspectiva, no entanto, encore em alguns problemas, o primeiro destes é a incompreensão clara acerca da constituição do cinema, de seus elementos e dos fatores que lhe são substâncias e acidentais, isto se torna claro a partir da presunção de que:

the cameraman operates under a permanent difficulty in making any visual comment on the action, the difficulty can be solved, but its solution is perforce crude in comparison with the simpler devices of the stage; crude because it must both create irrelevancies and at the same time persuade us to ignore them. Consider , for example, the ritualized expressionism of Der Blaue Engel or The Cabinet of Doctor Calagari. (...) Whereby the actor attempts to divert the audience's attention from the infinite irrelevance of detail towards the whole. Scruton (2006, p.31-32)

Tal perspectiva trata o cinema como meio necessariamente narrativo onde o ápice de sua experiência é apreciar as performances dramáticas de seu elenco. A narrativa atinge sua supremacia sendo por tal perspectiva o único elemento digno de exegese e os outros elementos presentes em um filme representam tão somente distrações. No entanto tal perspectiva está longe descrever adequadamente o cinema, filmes no entanto podem desprezar seus elementos narrativos sem perder seu caráter fílmico, a prova disto é toda

vertente de filmes não narrativos tais como Ballet Mecanique, Dog Star Man, Entr´acte e muitos outros que comprovam a possibilidade em sua existência.

Tal concepção consequentemente ignora os elementos envolvidos no que consiste a estilística de um filme. Em decorrência disto podemos levantar uma questão fundamental a partir de tal negligência. Supondo a validade da consideração da fotografia ideal como necessariamente casual a tradução de tal noção para o cinema torna-se instantaneamente dubitável. Se a fotografia ao atingir o menor grau de causalidade possível necessariamente incide em emulações de elementos estilísticos próprios da pintura isto dificilmente poderá ser dito acerca do cinema. O desenvolvimento de imagens em movimento fator fundamental ao entendimento adequado da constituição do cinema é uma elemento completamente distinto de tais âmbitos consequentemente supor a validade da transferência da causalidade inerente a fotografia ao cinema resulta em desprover o cinema do movimento e considerar cada fotograma - geralmente 24 por segundo- como entidade autônoma e desprovida de contexto, no entanto não é assim que estes aparecem cada fotograma está inserido em uma unidade maior - uma tomada-, que por sua vez é subordinada a outro elemento - nominalmente uma determinada sequência de tomadas- .

De tal forma que um filme pode apresentar diferentes âmbitos de intencionalidade o mais claro destes se dá pela montagem. A concatenação de uma série de diferentes ângulos para a formação de sequência de tomadas para convergir em uma cena é um exemplo. Cada ângulo individualmente tende a projetar determinada sensação ou evocar determinado sentimento em virtude de elementos fotográficos como propriedades de uma determinada lente como distância focal, abertura do diafragma, etc. Os sentimentos transmitidos em uma tomada contendo um determinado ângulo podem ser ampliados ou contrariados de acordo com o arranjo da referida tomada outras em uma determinada sequência -que pode conter outros ângulos-. Esta série de sensações diferentes - principalmente àqueles que compreendem as limitações do meio- advém de uma determinada linguagem. Esta pode se expressar por meio das convenções vigentes de significância - análogo a expressão do português formal usualmente pautado em suas regras gramaticais- , ou pelo violação desta - análogo a expressão do português despreocupado com as normas gramaticais- , há de se notar a presença de intencionalidade visto que tais sequência necessariamente são formadas por alguém. A figura responsável por criar tais sequências , o editor , pode editar um conjunto de tomadas das mais diferentes maneiras possíveis, visto que em tal fase tem disponível a filmagem bruta de todos as câmeras presentes em uma determinada seção de filmagem, assim o ritmo, a sintaxe escolhida, a presença ou ausência de cores, tais elementos são formados

através de uma ideia e a sequência escolhida pode estar de acordo com a cronologia real dos acontecimentos ou não , de modo que se adequa ao modelo de representação definido anteriormente, logo, o cinema pode ser uma arte.

Uma questão semelhante surge acerca da representatividade da fotografia a perspectiva descrita anteriormente avoca que fotografia não é capaz de representar porque uma fotografia ideal é necessariamente uma cópia idêntica a imagem de um determinado sujeito e que consequentemente reproduzível pelo olhar no determinado ângulo que a fotografia ideal foi tirada. Para efetuar esta concepção esta concepção Rudolf Arnheim elaborou uma série de fatores que contrariam tal concepção e fazem do Cinema uma arte autônoma, assim o caráter artístico do cinema ocorre do cinema através do apontamento destes elementos que o separam o filme de um simples fotograma tais elementos são Arnheim (1957) :1. the projection of solids on a two-dimensional surface;2. The reduction of depth ;3. Lightning and the absence of color; Delimitation of the image and distance from the object; absence of space-time continuum.

Um fator ainda precisa ser evidenciado nos pensamentos de Rudolf Arnhem acerca de tal matéria. Se é verdade que considera filmes como arte e lista condições capazes de comprovar tal posição não defende a posição de que filmes são necessariamente Arte:

Film resembles painting, music, literature, and the dancer in this respect - it is a medium that may, but need not, be used to produce artistic results. Colored picture postcards, for instance, are not art and are not intended to be. Neither are a military march, or a strip tease. And the movies are not necessarily film art. Arnheim (1957, p.8)