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O comportamento dos grupos na União Européia

No documento O interesse público no antidumping (páginas 116-120)

I. ASPECTOS FUNDAMENTAIS SOBRE O INTERESSE PÚBLICO NO ANTIDUMPING

1.3 A INDETERMINAÇÃO DA NOÇÃO DE INTERESSE PÚBLICO

1.3.4 As pressões que influenciam a formação do interesse público

1.3.4.2 O comportamento dos grupos na União Européia

O estudo do interesse comunitário é necessário por duas razões. Primeiramente, por ter sido este trabalho produzido em uma instituição francesa. Em segundo lugar, por prever a legislação da União Européia a observação deste interesse público na aplicação de direitos antidumping contra países não membros (Regulamento

262 "O antidumping abre um espaço para o lobby estratégico, segundo o qual os compromissos do lobby podem produzir efeitos favoráveis sobre as decisões das firmas exportadoras, sendo a política antidumping encorajadora do lobby. Então, uma instituição apolítica pode ser perversamente responsável pela politização das políticas de comércio de uma forma geral." (ANDERSON, James. Strategic Lobbying and Antidumping. Journal of Economic Integration, v. 9, n. 2, 1994, p. 129.)

263 Broek critica a formação de lobbys no antidumping. Para ele, não há muita razão em se defender determinada posição, em prejuízo de outra, se, no comércio, o indivíduo nunca está de um lado só. Ele aparentemente recebe sua remuneração de sua atividade da indústria doméstica, mas gasta esta remuneração sendo um consumidor. (BROEK, Naboth. Legal Persuasion, political realism, and legitimacy: The European Court's recent treatment of the effect of WTO Agreements in the EC legal order. Journal of International Economic Law, v 4, n 2, 2001, p. 428.

117 Básico europeu). Este modelo de aplicação do interesse público pode ser lembrado como exemplo para a aplicação que se pretende no âmbito da OMC.

Na construção comunitária, os Estados Membros tomaram para si determinadas competências, deixando para as instituições comunitárias o exercício de outras. Esta delegação de competências está apoiada em um “contrato social fundador”, assim chamado por Denys Simon, que pressupõe que seja reconhecida a existência de um interesse comum que não significa necessariamente a soma algébrica dos interesses individuais, e também a prevalência de um interesse geral autônomo da Comunidade que não se reduz à soma dos interesses particulares de cada um de seus componentes.264

O conceito de interesse comunitário deve ser resguardado pelo Tribunal de Justiça Europeu como sendo o pressuposto do Tratado a ser observado pelos Estados Membros. A perfeição e eficácia das instituições européias estão estreitamente ligadas à observação dos objetivos realizados pelas disposições do direito comunitário material.265

O Tratado de Roma de 1957 traz diversas disposições que prevêem a observância do interesse comunitário. Entre os vários exemplos, menciona-se que o capítulo destinado às empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse econômico geral.266

Além de uma previsão ao interesse comunitário, fala-se, também, em interesse comum europeu, que parece ser um sinônimo do interesse comunitário. Assim, o art. 99 prevê que os Estados-Membros consideram suas políticas econômicas uma questão de interesse comum e coordená-las-ão no Conselho, de acordo com o disposto no art. 98. Dispõe o art. 87 que pode ser considerado compatível com o mercado comum os auxílios destinados a fomentar a realização de um projeto importante de interesse europeu comum.

264 SIMON, Denys. Le système juridique communautaire, Paris, PUF, 2001.

265 HAMONIAUX, Thibau. L´intérêt general et le juge communautaire, Paris, LGDJ, Systèmes, 2001, p. 12.

266 “Art. 86. As empresas encarregadas da gestão de serviços de interesse econômico geral ou que tenham a natureza de monopólio fiscal ficam submetidas ao disposto no presente Tratado, designadamente às regras de concorrência, na medida em que a aplicação destas regras não constitua obstáculo ao cumprimento, de direito ou de fato, da missão particular que lhes foi confiada. O desenvolvimento das trocas comerciais não deve ser afetado de maneira que contrarie os interesses da Comunidade.”

118 Contudo, assim como acontece em outros países, não há, na União Européia, qualquer legislação que traga um conceito definido e estático para o interesse público, ou, no caso, o interesse comunitário. Sua avaliação não é menos intuitiva, de acordo com o caso concreto posto sob análise, levando-se em consideração o momento histórico, o país envolvido e o que pode ser considerado como a vontade geral da comunidade.

Os grupos de pressão e a atividade conhecida como lobbying são profundamente estudados e difundidos na Europa e nos Estados Unidos. Contudo, sua ação depende de diversas variáveis, entre elas, a necessidade de uma opinião convergente e a existência de recursos financeiros que propiciem a ação destes grupos.

Na Europa, há inúmeros grupos de pressão, atuando sobre as diversas instâncias e procedimentos. Há sempre diversos interesses em jogo, diversas posições, e, conseqüentemente, diversas reações. Há um interesse comunitário, mas há, também, diferentes territórios, fronteiras, idiomas, climas, diferenças sociais, aspectos que caracterizam a ação diferenciada dos grupos. Embora sejam diversos os interesses, eles são vistos, a partir do trabalho de Ernst Haas, como os motores da integração econômica européia, capazes de influenciar os mecanismos e os atores políticos em um processo de integração.267

Luigi Graziano cita Andy Smith para lembrar que o que ele chama de “porosidade” da União Européia ao lobby deve-se ao fato de se tratar de um Estado in

fieri, no qual não houve desenvolvimento de uma sociedade civil que abranja toda a Europa, onde não se conhecem greves que se estendam a todo o conjunto de países, onde não há uma opinião pública propriamente européia. Por outro lado, há imensos poderes da Comissão.

“Desconfio de que o relativo vazio político em que essa poderosa burocracia opera, e a insegurança política que ela provoca, estejam entre os fatores responsáveis pela porosidade da Comissão aos interesses organizados e pela ansiedade com que se busca e se estimula a organização e a manifestação das opiniões desses interesses. Redes de influência (networking), mais do que

267 GROSSMAN, Emiliano. Les groupes d´intérêt économiques face à l´intégration européenne: Le cas Du secteur bancaire. Revue Française de science politique, v. 53, n. 5, 2003, p. 737.

119 lobbies, seria a designação mais adequada dessa modalidade de interação

com grupos de pressão.”268

As trocas econômicas são o fundamento da integração européia, a integração econômica é, para a maioria, a base da construção européia. Assim, os representantes econômicos, os grupos de interesse, são os maiores responsáveis por esta integração.269

Os grupos se organizam de diversas formas jurídicas na Europa, tais como grupo de interesse econômico europeu, fundação, sociedade, entre outros. Também é bastante comum a forma de associação de direito belga, em razão da grande flexibilidade deste direito nacional sobre associações e diante da inexistência de um estatuto europeu de associações.270 Grande parte destes grupos são variações de grupos nacionais que se desenvolveram em torno de um tema pontual e estabeleceram bases em Bruxelas, mais próximos à Comissão Européia. Este movimento se deveu, em parte, à atitude da Comissão de permitir uma maior participação dos grupos.

Os grupos de interesse podem ocupar uma posição nos comitês ou grupos nomeados pela Comissão como organização sócio-econômica e nomeando seus próprios especialistas. Assim é o caso da BEUC perante o Conselho Consultivo de Consumidores e Representantes de Fabricantes de Beterrabas no Comitê Consultivo do

268 GRAZIANO, Luigi. O lobby e o interesse público. Revista Brasileira de Ciências Sociais. v. 12, n. 35, fev. 1997.

269 Após a assinatura do Ato Único Europeu, observou-se o surgimento dos chamados Eurogrupos. Este foi o termo encontrado para designar as federações européias de grupos de interesses nacionais como, por exemplo, a UNICE, que reúne os sindicatos patronais da Europa. Além destes grupos, surgiram outros tipos de empresas de lobbying, de consultores em “negócios públicos” e “relações públicas”, bem como diversos escritórios em Bruxelas interessados na representação de empresas ou grupos. Os grupos de interesse representaram um papel de extrema relevância na definição do interesse na origem da Comunidade Européia. Os grupos nacionais sócio-econômicos adotaram, em função dos Estados envolvidos e de seus interesses representados, atitudes ora favoráveis à construção européia, ora demasiadamente hostis.

270 O surgimento da CECA (Comunidade Econômica para o Carvão e Aço) mobilizou cerca de quinze grupos de interesse representando interesses do carvão e aço diante da autoridade luxemburguesa. A criação da CEE (Comunidade Econômica Européia) e do EURATOM (Comunidade Européia da Energia Atômica) provocou posteriormente um desenvolvimento considerável no fenômeno (entre 1957 e 1963, estima-se que foram criados 34 grupos por ano). O Ato Único Europeu registra a participação de cerca de 300 grupos interessados, que sugeriram textos e alterações. A resposta da Comissão foi sempre provocar um diálogo aberto e estruturado entre comissão e grupo de interesses. Em 1993, Joël Rideau estimou a participação de 10.000 pessoas empregadas em trabalhos de lobbying perante Bruxelas. (RIDEAU, Joël. Les Groupes d´intérêt dans le système institutionnel communauaire. Revue des Affaires Européennes. n. 3. LGDJ, 1993, p. 49.)

120 Açúcar. A Comissão também consulta os grupos ao publicar os Livros Verdes, Livros Brancos, Memorandos.271

No documento O interesse público no antidumping (páginas 116-120)