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O problema do dano e sua ameaça

No documento O interesse público no antidumping (páginas 37-40)

I. ASPECTOS FUNDAMENTAIS SOBRE O INTERESSE PÚBLICO NO ANTIDUMPING

1.1.4 As críticas mais freqüentes

1.1.4.2 O problema do dano e sua ameaça

O dano e sua ameaça já foram o alvo de discussões.62 Diversas são as questões, merecendo destaque as mais controversas, que interferem no resultado das

60 Outros casos analisados pelo mecanismo de solução de controvérsias da OMC podem ser citados como exemplos de discussão sobre a definição de produto similar:

61 Tal discussão ocorreu no Brasil, em 2007, no caso Processo MIDIC/SECEX 52500.012357/2006-38, importação de escovas de cabelo, Circular n. 62, de 14 de setembro de 2006, publicada no D.O.U em 15.09.2006.

62 Exemplos. Thailand — Anti-Dumping Duties on Angles, Shapes and Sections of Iron or Non-Alloy Steel and H Beams from Poland, WT/DS122/AB/R, 12 de março de 2001, sobre a não consideração de todos os fatores dispostos no art. 3.4.; Bed Linen from India, WT/DS141/R, 30 de outubro de 2000, no

38 investigações. A má interpretação do dano e de sua ameaça pode ser usada como instrumento para a proteção indevida de uma indústria doméstica, que ocorre mesmo quando não há comprovação de dano, dumping ou nexo. Se isso acontecer, o balanço que de ser feito para o exame do interesse público ficará comprometido, pois a razão da indústria doméstica para a aplicação do antidumping será duvidosa.

Na Europa, critica-se o cálculo da margem de dano. Esta margem é igual à diferença entre o preço na União Européia do produto importado e o preço na União Européia do produto doméstico similar. O que parece um cálculo objetivo tem sido afetado por algumas variáveis. Em primeiro lugar, o preço de revenda é usualmente usado como um preço base, calculado acrescendo-se os custos do peticionário doméstico (não se considerando sua situação de competitividade) e um lucro teórico que garanta um retorno suficiente (ex. remuneração de capital, reservas para futuros desenvolvimentos, etc). Deve-se, contudo, verificar se este retorno é realmente alcançável, de acordo com as circunstâncias do mercado, o que não acontece. Além disso, outros fatores não são considerados nesta diferença de preços, tais como melhores políticas dos exportadores, menores custos, diferenças em qualidade, reputação e, principalmente, depreciação da moeda.63

Que aspectos considerar para definir o dano? Conforme o art. 3.1 do Acordo Antidumping, a autoridade investigadora deve avaliar, de forma objetiva, a) o volume das importações objeto de dumping e o seu efeito sobre os preços dos produtos similares no mercado interno e b) a repercussão destas importações sobre os produtores nacionais de tais produtos. Cabe à autoridade verificar se houve um aumento sensível no volume destas importações em comparação com a produção nacional e, ao mesmo tempo, se houve subvalorização nos preços das importações objeto de dumping em relação aos preços no mercado interno. Nenhuma destas análises pode ser feita de forma separada.

qual as Comunidades Européias não teriam agido de acordo com o art. 3.4, investigando todos os fatores relacionados ao dano; Guatemala — Definitive Anti-Dumping Measure on Grey Portland Cement from Mexico, WT/DS156/R, 24 de outubro de 2000, a Guatemala teria falhado em considerar dois dos fatores relacionados ao dano (retorno de investimentos e habilidade para produzir capital).

63 VERMULST, Edwin. The 10 Major Problems with the Anti-Dumping Instrument in the European Community. Journal of World Trade, v. 39, n. 1, 2005, p. 108.

39 Para examinar os efeitos das importações sobre os produtores, a autoridade deve, de acordo com o art. 3.464, avaliar a diminuição real e potencial das vendas, o volume de produção, a participação de mercado, a produtividade, o rendimento dos investimentos ou utilização da capacidade, os fatores que afetam os preços internos, a magnitude da margem de dumping, os efeitos negativos reais ou potenciais sobre o fluxo de caixa, estoques, emprego, salários, crescimento, capacidade para contrair empréstimos. Ressalta o artigo que nenhum destes fatores deve ser considerado separadamente e que a lista não é exaustiva. Mesmo que os quesitos sejam bastante objetivos, caberá ao Membro investigador determinar a importância de uns sobre os outros. Desta discricionariedade nascem a arbitrariedade e a possibilidade de uma comparação inadequada.

Embora não exista previsão no Acordo Antidumping, defende-se que as autoridades devam exigir que a indústria doméstica interessada na aplicação das medidas apresente um plano de reestruturação para ser colocado em prática se as medidas antidumping forem aplicadas.65 Isto porque há diversos casos de indústrias domésticas que deixam o mercado mesmo quando a proteção do antidumping lhes é garantida, seja por deficiências em seu planejamento, seja por incapacidade de atender a demanda. Pedido comparável já é feito no Acordo de Salvaguardas, no artigo 7.2, para a prorrogação das salvaguardas.66

As investigações sobre a existência de ameaça de dano são ainda mais criticadas. Devem ser investigados o aumento significativo das importações, uma suficiente capacidade disponível do exportador e a probabilidade de dedicação desta capacidade à exportação, o fato de que os preços das importações causem queda nos preços internos, de forma que a importação passe a ser mais demandada, e os estoques

64 Art. 3.4. O exame do impacto das importações a preços de dumping sobre a indústria nacional correspondente deverá incluir avaliação de todos os fatores e índices econômicos relevantes que tenham relação com a situação da referida indústria, inclusive queda real ou potencial das vendas, dos lucros, da produção, da participação no mercado, da produtividade, do retorno dos investimentos ou da ocupação, da capacidade instalada, fatores que afetem os preços internos, a amplitude da margem de dumping, efeitos negativos reais ou potenciais sobre o fluxo de caixa, estoques, emprego, salários, crescimento, capacidade para aumentar capital ou obter investimentos. A enumeração acima não é exaustiva, nem poderão tais fatores isoladamente ou em conjunto ser tomados necessariamente como indicação decisiva.

65 Este ponto será discutido no capítulo 2.5.

66 DIDIER, Pierre. The WTO Anti-Dumping Code and EC Practice: issues for review in trade negotiations. Journal of World Trade, vol. 35, n. 1, 2001, p. 47.

40 do produto objeto de investigação.67 Embora o acordo diga claramente que a autoridade não pode se basear em meras alegações, conjecturas ou possibilidades remotas, esta regra nem sempre é respeitada.68

No caso Madeira de Lei69, o órgão da OMC concluiu que o grupo especial deve fazer um exame profundo para saber se as explicações fornecidas pelo Membro mostram como a autoridade encarregada da investigação tratou os fatos e os elementos de prova contidos no processo. O grupo deve observar, também, se a autoridade levou em consideração a complexidade dos dados que lhe foram apresentados e se ela explicou porque rejeitou algumas explicações e elementos. No caso, o Grupo Especial, depois de examinar as constatações feitas pela autoridade investigadora norte-americana, não examinou os elementos que contribuíram para a constatação final de ameaça importante, contrariando o art. 3.7.70

No documento O interesse público no antidumping (páginas 37-40)