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O “diagrama social”: do “mural” inicial à implantação do “feed de notícias”

2 ACESSANDO O SISTEMA: REDES SOCIAS EM TEMPOS LÍQUIDOS

2.2 Explorando a rede: desvendando o Facebook

2.2.3 O “diagrama social”: do “mural” inicial à implantação do “feed de notícias”

“Fizemos uma reflexão e decidimos que o valor central do Facebook está no conjunto de conexões entre amigos”, continuou. “Chamamos isso de diagrama social, no sentido matemático de uma série de nós e conexões. Os “nós” são as pessoas, e as conexões são as amizades.” (KIRKPATRICK, 2011, p. 235).

Zuckerberg, desde o início, vislumbrava o “Thefacebook” como algo que teria no seu cerne a sociabilidade e a partilha, para isso, o site foi se metamorfoseando com o passar do tempo. Logo que o site foi lançado, era minimalista, possuía poucos recursos e cores. Os perfis dos usuários eram compostos por uma única foto de perfil e algumas informações básicas sobre o próprio. A principal interação consistia em adicionar novos amigos e “bisbilhotá-los”. Com base nas alterações que o usuário “x” fazia em seu perfil, era possível saber, por exemplo, se ele continuava solteiro ou não, se ele ainda estava no mesmo curso ou não, entre outras coisas. Contudo, em setembro de 2004, o “Thefacebook” acrescentou um recurso que incitou os estudantes a passarem mais tempo no site. Zuckerberg havia incluído, no perfil dos usuários, um recurso denominado “mural”, que permitia a qualquer um escrever o que quisesse diretamente em seu perfil, configurando uma espécie de e-mail público. Sobre o “mural” Kirkpatrick afirma que

Podia ser uma mensagem para você ou um comentário sobre você [...] Qualquer visitante do seu perfil podia vê-lo. Agora, você não só podia navegar à vontade, examinando pessoas, mas também podia reagir ao que descobrisse. De repente, todos os usuários do Thefacebook passaram a ter seu próprio quadro de avisos público. [...] O mural foi concebido para manter os usuários ainda mais transfixados, dando- lhes mais coisas para ver. Pareceu funcionar. Quase imediatamente, o mural tornou-se a característica mais popular do Thefacebook (KIRKPATRICK, 2011, p.104).

Ainda sobre o recurso “mural” Correia e Moreira (2014) complementam que “O mural permite a publicação de mensagens, de comentários breves, e permite, também, que o utilizador veja a data e a hora de publicação do comentário. Todos os

utilizadores autorizados podem aceder a um mural.” (CORREIA e MOREIRA, 2014,

esse “novo” recurso permite a identificação tanto da data quanto da hora que foi feita a postagem no perfil selecionado.

Com o passar o tempo, a plataforma sofreu alterações e, atualmente, o compartilhamento de informações/ideias no Facebook se dá pelo “feed de notícias”. Na própria plataforma, há uma página destinada a ajudar seus usuários, esclarecendo possíveis dúvidas que eles possam ter em relação ao uso da rede social digital. No que diz respeito à concepção do feed de notícias, a página esclarece que

As publicações vistas no Feed de Notícias servem para manter você conectado com pessoas, locais e assuntos importantes, começando com amigos e família. As publicações que aparecem primeiro são influenciadas por suas conexões e atividades no Facebook. O número de comentários, curtidas e reações recebidos por uma publicação e o tipo (foto, vídeo, atualização de status) também podem torná-la mais propensa a aparecer primeiro em seu Feed de Notícias. As publicações que você vê primeiro incluem: Um amigo ou um membro da família comentando ou curtindo uma foto ou uma atualização de status de outro amigo. Uma pessoa reagindo a uma publicação de um publisher que um amigo compartilhou. Várias pessoas respondendo aos comentários umas das outras em um vídeo a que assistiram ou em um artigo que leram no Feed de Notícias11.

O algoritmo do Feed de Notícias, segundo a página em foco, usa diversos fatores para determinar as principais histórias compartilhadas pelas pessoas e

fanpages, tais fatores são: o número de comentários, quem compartilhou a história

e o tipo de publicação (por exemplo: foto, vídeo, atualização de status). Há, basicamente, dois modos de controlar quem pode ver as publicações postadas por seus usuários. O primeiro seria utilizar a ferramenta “público restrito” para limitar o acesso ao conteúdo publicado. O segundo seria usar o direcionamento contido no próprio feed de notícias para aumentar a probabilidade do conteúdo publicado ser visualizado por mais usuários.

De acordo com Rojo e Barbosa (2015), o feed de notícias “anda” e “empurra” para o buraco negro fazendo com que a superficialidade se estabeleça no curtir/comentar sem reflexão sobre o que se lê, somente pelo exercício de se posicionar, de aparecer e de se satisfazer no reino da opinião pessoal. “As curtições rendem milhões, mapeiam o que agrada, e quem são os consumidores

em potencial; elas são um indicador importante da terceira fase do consumo (Web 3.0)” (ROJO; BARBOSA, 2015, p. 121).

Para Rojo e Barbosa (2015), não basta apenas viver, ela afirma que, na hipermodernidade, é preciso contar o que se vive, essa “narrativa/divulgação”, muitas vezes, desconsidera os limites entre o público e o privado. Esse narcisismo compulsivo se realiza, principalmente, por meio de selfies, de fotos e de vídeos. Nessa perspectiva, a autora afirma que somos impelidos a buscar novidade o tempo todo, a não prescindir dela. Tal procura compulsiva pela novidade da informação desencadeia o que tem se nomeado, atualmente, como SFI (Síndrome da Fadiga de Informação) conceito cunhado pelo psicólogo britânico David Lewis em 1996. A SFI era desenvolvida, primeiramente, pelos profissionais que precisavam trabalhar, por um longo tempo, uma grande quantidade de informação. Segundo Han (2018), hoje todos são vítimas da SFI uma vez que somos confrontados com quantidades rapidamente crescentes de informação que tem como principais efeitos colaterais: o decréscimo das capacidades analíticas, déficits de atenção, inquietude generalizada e incapacidade de assumir responsabilidades. Nessa perspectiva,

Uma informação ou um conteúdo [...] se espalha rapidamente na internet como uma epidemia ou pandemia. Nenhuma outra mídia é capaz desse contágio viral. [...] Um dos principais sintomas da SFI é o estupor das capacidades analíticas. Justamente a capacidade analítica constitui o pensamento. O excesso de informação faz com que o pensamento definhe. A faculdade analítica consiste em deixar de lado todo material perceptivo que não é essencial ao que está em questão. Ela é, em última instância, a capacidade de distinguir o essencial do não essencial. A enxurrada de informações à qual estamos hoje entregues prejudica, evidentemente, a capacidade de reduzir as coisas ao essencial. [...]. Mais informação não leva necessariamente a melhores decisões. Justamente devido à crescente massa de informação a faculdade do juízo definha hoje (HAN, 2018, p. 32).

Ainda com base nas formulações do pensador sul coreano, é possível depreender que a massa de informação, por si só, não produz nenhuma verdade e que quanto mais informação é liberada, mais o mundo se torna não abrangível, já que informação e conhecimento não se equivalem semanticamente. E, a partir de um determinado ponto, a informação já não é mais informativa, ela passa a ser um mero

revozeamento do mesmo. De igual modo, a comunicação já não é mais comunicativa, e sim cumulativa. Se mais informação/comunicação não esclarecem o mundo por si mesmo, tampouco, a tão “bem-intencionada” e tão reivindicada transparência não torna, por si mesma, nada clarividente.

O feed de notícias é um espaço-tempo marcado pela informação incessante e cumulativa no sentido numérico do termo. Ao “rolar” o feed de notícias é perceptível que há uma velocidade frenética em relação às renovações das informações. Devido a sua programação, é humanamente impossível ler todas as notícias que foram postadas por todos os seus “amigos” em um determinado espaço-tempo. É fluxo contínuo cuja renovação é perene. Nesse mar de informações, é possível que quem navegue, contínua e compulsivamente, não perceba que ele proporciona uma sensação da não passagem do tempo. Dialogicamente e de forma contundente, Han (2018) radicaliza que “[...] a fenomenologia do digital, em contrapartida, é livre da dor dialética do espírito. Ela é uma fenomenologia do curtir.” (HAN, 2018, p. 55).