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1 OS PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS PENAIS ORIENTADORES NA

3.2 O efeito do estudo e do trabalho no comportamento do acusado, reflexos além da

Conforme verifica-se diante do histórico da execução penal, as penitenciárias foram criadas com a finalidade única de punir e permaneceram um longo período sustentando exclusivamente esse objetivo. Hoje, pode-se perceber que a finalidade da execução da pena de privação de liberdade e dos próprios estabelecimentos penitenciários ultrapassa esse intuito e busca conceder ao apenado alternativas que possibilitem sua reeducação, bem como a redução da reincidência.

Tendo em vista o cenário das penitenciárias brasileiras, as quais possuem em sua grande maioria sujeitos economicamente pobres, com baixo índice educacional, entende-se que a utilização de meios que propiciem o aprendizado tanto educacional quanto laboral,

possa fazer com que essa parcela consiga voltar para a sociedade mais preparada e até mesmo motivada a prosseguir trabalhando e estudando.

Nessa perspectiva, dispõe Armida Bergamini Miotto (1975) citada por Mirabete (2004, p. 91),

O trabalho tem seu sentido ético, como condição da dignidade da pessoa humana, e assim assume um caráter educativo. Se o condenado já tinha o hábito do trabalho, depois de recolhido ao estabelecimento penal seu labor irá manter aquele hábito, impedindo que degenere; se não o tinha, o exercício regular do trabalho contribuirá para ir gradativamente disciplinando-lhe a conduta, instalando-se em sua personalidade o hábito da atividade disciplinadora.

Portanto, o exercício laboral nas penitenciárias possibilita que o apenado encontre uma maneira de manter viva sua dignidade dentro do cárcere. Nesse sentido, vale lembrar a dicotomia tripalium e poiésis, sendo que o trabalho penitenciário deve ser visto e desenvolvido como uma obra (poiésis), uma produção prazerosa que dignifica o apenado e não como um castigo (tripalium).

Conforme destaca Julião (2012, p. 205)

Negando o ócio, o trabalho no sistema penitenciário se caracteriza como a adição do castigo à produção de bens e serviços. Já que trabalho pressupõe produção, nada mais favorável para os agentes operadores da justiça do que utilizar o trabalho como instrumento de reinserção social, visto que estarão diretamente dando a oportunidade à indivíduos improdutivos (delinquentes) de se tornarem produtivos.

Dessa forma, conforme defende Julita Lemgruber (1999), citada por Julião (2012, p. 205-206), o trabalho prisional funciona como uma espécie de “terapia ocupacional”, pois mantêm o preso ocupado, evitando o ócio e inclusive desviando-o da prática de atividades ilícitas. Entretanto, ainda na perspectiva da autora, o trabalho na realidade das penitenciárias é “invariavelmente manual e não oferece qualquer atrativo, sendo caracterizado pela monotonia e repetição.” Portanto, embora o correto fosse que as penitenciárias possuíssem infraestrutura para desenvolver atividades laborais variadas, com a finalidade de atrair os apenados para sua execução, verifica-se que o instituto da remição penal pode atuar nessa falta funcionando como um mecanismo capaz de instigar o exercício da atividade laboral.

Conforme revela pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) a pedido do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), com a finalidade de avaliar como está sendo cumprida a finalidade ressocializadora da pena nos estabelecimentos penitenciários, “Por meio das experiências de campo, de um modo geral, pode-se depreender que o trabalho era entendido como elemento fundamental para a ressocialização. Em todas as experiências, havia o fomento de algum tipo de trabalho dentro das unidades prisionais.”

Além do trabalho, o estudo também propicia o desenvolvimento da capacitação dos presos para fins de reinserção social. Para Julião (2012, p. 221) além de manter os reclusos ocupados de uma forma proveitosa, a educação dentro do sistema penitenciário possui o objetivo de “conseguir um comportamento que perdure além da prisão e permita ao apenado o acesso ao emprego ou a uma capacitação superior, que, sobretudo, propicie mudanças de valores, pautando-se em princípios éticos e morais.”

Segundo expõe Julião (2012, p. 270) em estudo feito pela Unesco e publicado em 2008 no artigo “Proyecto Educando para la Libertad: la educación em estabelecimentos penitenciários bajo el análisis”, que analisou como estava sendo desenvolvida a educação no cárcere nos estados do Acre, Espírito Santo, Maranhão, Mato Grosso do Sul, Pará e Pernambuco, quando questionados os apenados sobre as mudanças ocasionadas pela educação 86% responderam que “as principais mudanças foram em âmbito pessoal, principalmente na aquisição de hábitos de estudo, passando a ter maior interesse pelo estudo; muitos afirmaram ainda ter elevado a sua autoestima e outros a ampliação da possibilidade reinserção social.”

Estima-se também, que a prática do estudo e do trabalho possa influenciar no comportamento dos presos, de modo a reduzir as taxas de reincidência. Nesse sentido, Julião (2012, p. 370-371) traz uma pesquisa realizada no sistema penitenciário do Rio de Janeiro, levando em conta dados desde o ano de 1996, por meio da qual se depreende que:

Enquanto 26% dos que não trabalham reincidiram, somente 11,2% dos que trabalham também reincidiam; (2) quanto ao estudo, 24,2% dos que não estudaram no sistema penitenciário reincidiram. Por outro lado, somente 6,3% dos que estudaram no sistema são reincidentes.

Esse percentual de menor reincidência entre apenados que trabalharam ou estudaram também demonstra que os presos que tem interesse nessas atividades possuem uma

predisposição à reinserção, uma vontade de não reincidir, enquanto o criminoso profissional não possui interesse nessas atividades.

Outrossim, um problema que há muito atrapalha o desenvolvimento e capacitação das penitenciárias e a garantia prática dos direitos dos apenados é o superlotamento carcerário, que cada vez abriga presos demais recebendo recursos mínimos, que apenas possibilitam que os mesmos sirvam – na maioria dos casos – como depósitos de pessoas.

Nesse sentido, verifica-se que, atualmente, o Brasil é o quarto país com maior número de presos, ficando atrás apenas dos Estados Unidos, da China e da Rússia. Segundo números do ano de 2014, apresentados pelo DEPEN – Departamento Penitenciário Nacional, o Brasil fechou o ano com uma estimativa de 607.731 apenados para 376.669 vagas, ou seja, com uma taxa de ocupação carcerária de 161%, a quinta maior do mundo.

Nesse aspecto, a remição penal também possui grande relevância, pois promove a desocupação mais rápida das vagas daqueles apenados que terão diminuído o tempo de pena a ser cumprido e, portanto, deixarão mais cedo as penitenciárias. Assim, o instituto da remição penal pode ser visto como uma solução para a diminuição do superlotamento no cárcere.

Outrossim, o instituto da remição não é útil somente para o apenado. Tendo em vista que a sociedade deseja a redução da criminalidade, basta observar que se o cárcere não introduz nenhuma modificação positiva ao condenado, seu retorno ao convívio social fará com que, do ponto de vista prático, sua privação não tenha servido para alcançar resultado nenhum, não contribuindo para a redução da criminalidade. Portanto, o instituto da remição penal, ao passo que institui a incorporação das atividades de trabalho e estudo nas penitenciárias, instigando o apenado a realizá-las, é benéfico também para a sociedade, pois visa a reeducação do infrator.

Nesse aspecto, Julião (2012, p. 232) argumenta:

Cabe assinalar que a importância da educação nos presídios vem ao encontro de duas finalidades tão privilegiadas pela sociedade: coibir a ociosidade nos presídios, que, segundo alguns operadores da justiça e da execução penal, gera maior propensão à reincidência, e dar ao condenado a oportunidade de, em futura liberdade, dispor de uma opção para o exercício de alguma atividade profissional para a qual seja exigido um mínimo de escolarização.

Assim, a opção por tirar uma grande massa da população carcerária que está na ociosidade, colocando-as em salas de aula, não constitui privilégio – como querem alguns -, mas proposta que atende aos interesses da própria sociedade.

Assim, conclui-se, segundo Maria da Graça Morais Dias (s. d. apud Mirabete, 2004, p. 517), que o instituto da remição penal é um instituto completo

[...] pois reeduca o delinquente, prepara-o para sua reincorporação à sociedade, proporciona-lhe meios para reabilitar-se diante de si mesmo e diante da sociedade, disciplina sua vontade, favorece sua família e sobretudo abrevia a condenação, condicionando esta ao próprio esforço do apenado.

Portanto, o estudo e o trabalho no cárcere, fomentados pelo instituto da remição penal, trazem mais benefícios à sociedade do que se imagina. Proporcionam capacitação aos presos, utilizando o tempo ócio da prisão em tempo de produção e dignificação, buscando a redução da reincidência. Além disso, a remição penal possibilita a redução da superlotação carcerária, que constitui o grande problema do sistema penitenciário atual.