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O ensino de línguas na contemporaneidade

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Embora a adoção do Communicative Approach for English Teaching e seu ensino seja amplamente aceito e se ramifique em outros métodos, como o

Cooperative Language Teaching, Content-Based Instruction, Task-Based Language Teaching entre outros, o ensino de línguas estrangeiras na contemporaneidade

encontra-se para além da época dos métodos e abordagens específicas.

Como nos explicam Richards e Rodgers (2014) todos os métodos e abordagens existentes na história do ensino de línguas têm aqueles que aprendem como o centro de suas preocupações; esses pressupõem uma relação entre o professor e os estudantes. No entanto, com o ganho de força da perspectiva da aprendizagem centrada na pessoa, após os anos oitenta, o ensino de idiomas também foi tocado positivamente rumo a se considerar a autonomia da pessoa em seu modo de aprender.

Essa mudança de perspectiva torna a relação de ensino-aprendizagem menos engessada, tal como se percebe com a busca pela superação da herança da concepção tradicional da escola que é mais voltada à linearidade da importância do professor na relação pedagógica. A mudança paradigmática dessa linearidade dos papeis do professor e do estudante transforma também a maneira como são compreendidos esses papéis sociais.

Ao se afastar da posição instrucional, o professor aproxima-se da condição de ser um facilitador dos processos de aprendizagem. Essa facilitação não pode ser compreendida como um mostrar o conhecimento, mas ofertar modos para que o

45“1. Language is a system of expression of meaning; 2. The primary function of language is to allow

interaction and communication; 3. The structure of language reflects its functional and communicative uses; 4.The primary units of language are not merely its grammatical and structural features, but categories of functional and communicative meaning as exemplified in discourse.”

estudante se aprofunde nos modos de conhecer. Assim, o empoderamento do estudante, por parte do professor, é fundamental para que o estudante construa ativamente seu conhecimento na língua alvo (RICHARDS; RODGERS, 2014).

A autonomia do estudante por seu processo de aprendizagem é motivada por seu papel ativo e participante na construção de conhecimentos por meio de vivências na língua em aprendizagem. O desenvolvimento dessa autonomia requer que o professor o auxilie a reconhecer seu estilo de aprendizagem46, assim como de refletir

a respeito desse processo. As estratégias empregadas pelos professores nessa posição também variam conforme as necessidades de cada estudante.

Desse modo, os métodos de ensino tal como eram propostos perdem seu brilho, enquanto um brasão que encabeça um determinado instituto de ensino de línguas, e passam a servir como referenciais, estratégias e fonte de material ao arcabouço teórico do ensino de línguas. Conforme Richards e Rodgers, “os pesquisadores que estudam a aprendizagem de línguas são relutantes em indicar modos de ensino baseados em suas pesquisas, pois sabem que o conhecimento atual é provisório, parcial e em mudança”47 (2014, p. 346). Junto à D. Atkinson os autores

compreendem que:

é cada vez mais claro (...) que a aquisição de segunda língua é um fenômeno extremamente complexo e multifacetado. Exatamente por essa razão que parece que nenhuma perspectiva teorética irá nos levar a entender a aquisição de segunda língua adequadamente48 (2011, p. xi apud RICHARDS; RODGERS, 2014)

Adiante na mesma apresentação do livro que organiza, o linguista cognitivista, Atkinson, afirma que o desabrochar de pensamentos teóricos isolados “não é mais o bastante”49 (2011, p. xi). As teorias de ensino de línguas fundadas em um autor ou

apenas em certo estilo de pensamento perderam espaço frente à necessidade da construção de um corpo de conhecimentos dialógicos com o todo produzido no campo teórico do ensino de línguas.

46 Cf: Richards e Rodgers (2014) os estilos de aprendizagem se referem “a uma predisposição geral ou

preferência por alguma maneira particular de se abordar a aprendizagem” (p. 337) [“ to a general

predisposition or preference to approach learning in particular ways.”].

47“researchers who study language learning are themselves usually reluctant to dispense prescriptions

for teaching based on the results of their research because they know that current knowledge is tentative, partial, and changing”

48 “it is increasingly apparent (...) that SLA is an extremely complex and multifaceted phenomenon.

Exactly for this reason, it now appears that no single theoretical perspective will allow us to understand SLA adequately”

O papel do professor de idiomas, na contemporaneidade, se afasta da rigidez existente em se professar um método fechado, no qual o professor deve depositar sua fé e seguir seus passos fechados (RICHARDS; RODGERS, 2014). Se para o professor iniciante, um método pode facilitar algumas escolhas difíceis na condução das aulas (e ainda assim, isso seria discutível), o professor experiente frequentemente é tolhido em seu modo de agir, pois as rígidas práticas presentes em certos métodos restringem suas opções, assim como a possibilidade desse professor encontrar seus próprios princípios e modos de ensinar (RICHARDS; RODGERS, 2014).

O próprio “conceito de método pode inibir o desenvolvimento de um ‘valioso, senso de coerência internalizado’ por parte do professor...”50 (KUMARAVADIVELU, p.

169). Embora toda a produção de conhecimento nesse campo seja de interesse à formação desse professor, isso não se dá pela necessidade de comprometê-lo a seguir certas prescrições sobre o que é o ensino, mas pela necessidade de apropriar- se das abordagens, teorias e métodos de ensino de línguas, com fim de se desenvolver um modo próprio de ser professor (KUMARAVADIVELU, 2006).

A adaptação das estratégias de ensino dentro de cada realidade vivida nos espaços de aprendizagem e o percurso de cada estudante, assim como a dedicação pessoal aos estudos do ensino de línguas forma um profissional eclético. “Isso pode ser entendido como uma mudança de rumos – de métodos que mudam professores para professores que são engajados no processo de desenvolvimento de seus próprios métodos e abordagens “51 (RICHARDS; RODGERS, 2014, p. 352).

A mudança de que tratamos é característica do período de ensino de idiomas nos dias de hoje, entendido como pós-método. A perspectiva pedagógica existente no período pós-método pode ser entendida:

como um sistema tridimensional consistindo em três parâmetros pedagógicos: particularidade, praticidade e possibilidade. (...) Cada parâmetro define e redefine um aos outros. Eles se entrelaçam e interagem em uma relação sinérgica onde o todo é mais do que soma de suas partes52 (KUMARAVADIVELU, p. 171).

50 “the concept of method may inhibit the development of a “valuable, internally-derived sense of

coherence” on the part of the classroom teacher…”

51 “This can be seen as a change in agency - from methods that change teachers, to teachers that are

engaged in the process of developing their own teaching methods and approaches”

52 “as a three-dimensional system consisting of three pedagogic parameters: particularity, practicality,

and possibility. As will become clear, each parameter shapes and is shaped by the others. They interweave and interact with each other in a synergic relationship where the whole is much more than the sum of its parts.”

O parâmetro da particularidade se refere à compreensão dos aspectos situacionais das relações pedagógicas estabelecidas. Deve-se considerar “as exigências locais e as experiências vividas”53 (KUMARAVADIVELU, p. 171), pois:

a ideia pedagógica da particularidade é consistente com a perspectiva hermenêutica de se compreender a situação, a qual nos indica que uma pedagogia significativa não pode ser construída sem a interpretação holística das situações particulares, e que não pode ser aprimorada sem o refinamento dessas situações particulares54 (ELIOT, 1993 apud KUMARAVADIVELU, p.

171).

A importância desse parâmetro é desenvolver a percepção tanto do estudante como do professor às demandas da cultura e da própria pessoa com a língua estrangeira.

O parâmetro da praticidade deve ser compreendido dentro das possibilidades de otimização do processo de ensino, facilitando o acesso do aluno às suas maneiras próprias de explorar a língua. A reflexão crítica do professor quanto a esse aspecto é essencial, pois com o abandono da adoção dos métodos, cabe a esse profissional compreender aquilo que cabe ou não em sua prática e ao melhor exercício de sua profissão. Esse questionamento pessoal a respeito da efetividade da sua prática pedagógica é apresentado por Kumaravadivelu (2006), como honestidade e vigilância pessoal do professor à sua atividade profissional.

O último parâmetro é inspirado por Paulo Freire, pois se compreende que “a pedagogia, qualquer pedagogia, é intimamente ligada ao poder e a dominação e seu objetivo é criar e dar suporte às desigualdades sociais” (KUMARAVADIVELU, p. 174). A possibilidade, enquanto parâmetro dessa pedagogia, refere-se à legitimação das características pessoais e sociais, dos estudantes e dos professores, em relação àquilo que os subjuga (KUMARAVADIVELU, 2006).

A preocupação aqui inclui o como as línguas são entendidas ideologicamente, assim como sua participação no modo de pensar das pessoas falantes de uma língua.

A língua é o espaço no qual as formas atuais e possíveis de organização social e suas prováveis consequências sociais e políticas são definidas e contestadas. Ainda assim, é também o lugar onde nosso senso de nós

53“local exigencies and lived experiences”

54 “the idea of pedagogic particularity is consistent with the hermeneutic perspective of situational

understanding, which claims that a meaningful pedagogy cannot be constructed without a holistic interpretation of particular situations, and that it cannot be improved without a general improvement of those particular situations”

mesmos, nossa subjetividade, é construída.55 (WEEDEN, 1993, p. 21 apud KUMARAVADIVELU, p. 175)

Isso é ainda mais presente no ensino de idiomas. Para Kumaravadivelu (2006), o contato com a língua estrangeira, essa outra forma de cultura e sua implicação no mundo vivido, abre consequências também quanto às expectativas e preconceitos quanto à sua aprendizagem e isso pode ser problemático e conflituoso à própria identidade do estudante.

A inclusão desses aspectos na sala de aula, à aprendizagem do estudante, conduz a uma prática que respeita a autonomia do estudante (assim como tratamos no início dessa seção). A condução do estudante à constante posição de aprender a

aprender, não somente a língua estrangeira, mas de se colocar ativamente aos

objetivos por ele estabelecidos, por meio de sua autonomia e percepção de seu processo de aprendizagem e situação vivida, de engajar-se em seus objetivos torna a aquisição da língua estrangeira não somente um processo de alocação de um novo idioma dentre às possibilidades de fala, mas de um processo de autoconhecimento, autocrítica e desenvolvimento pessoal.

Esse breve percurso pela história do ensino de línguas nos permitiu observar as diferentes reflexões teóricas a respeito da aprendizagem dessas línguas, em especial da língua inglesa, como segunda língua ou como língua estrangeira. As figuras do professor e do estudante emergem, no curso dessa história, como figura central e em primeiro lugar em relação as abordagens e os métodos na pedagogia pós-método, também referida como pedagogia crítica por Richards e Rodgers (2014) e Kumaradivelu (2006).

Essa possibilidade de colocar essas pessoas no centro da aprendizagem, a relação entre elas, traz à tona, por consequência, a necessidade de se pensar a linguagem e a corporeidade de um ponto de vista da existência em si. Desse modo, a discussão se direciona rumo à compreensão do que é o falar a língua materna e então retornar à reflexão do que é a língua estrangeira, visando enriquecer a discussão a partir de elementos fundantes do que se entende a posição da pedagogia pós-método.

55“language is the place where actual and possible forms of social organization and their likely social

and political consequences are defined and contested. Yet it is also the place where our sense of ourselves, our subjectivity, is constructed.”

CAPÍTULO 2

A FENOMENOLOGIA E A FUNDAÇÃO DO CONHECIMENTO

As muitas abordagens e métodos presentes na história dos métodos de ensino de idiomas nos apresentam ricos entendimentos de como a aprendizagem da língua inglesa, como idioma estrangeiro, tem sido concebida.

No curso dessa história, o entendimento a respeito do que significam os termos abordagem e método pareceu nublar a raiz desses significados. Abordagem é a tradução de Approach, palavra que data do século XV e que significa estar no entorno, aproximar-se; sua formação etimológica deriva da palavra anglo-francesa

approcher, do francês antigo appochier (século XII), cuja raiz é o latim appropiare, adpropriare, significando ‘estar perto’56. Assim, o termo Approach ao ser aplicado ao

ensino de línguas implicaria menos em um modo de se compreender a língua, mas uma aproximação da mesma (assim como nos parece ser o caso do Communicative

Approach to Language Teaching, trata-se de uma compreensão e não uma rígida

afirmação quanto ao que é a língua ou do como se dá seu ensino).

O termo método (ou method) carrega uma confusão quanto ao seu uso como um quadro fechado, uma vez que sua terminologia deriva de dois termos gregos

metha que significa direção e hodos que indica caminho. O termo método é

compreendido como ‘caminho seguro’, não como esse forte enquadre como se percebe nos métodos ali descritos. Ironicamente a proposta da pedagogia pós-método nos parece mais fiel aos termos acima discutidos do que àquelas que se afirmavam como métodos ou abordagens.

O presente capítulo também é um método. No caso, um método filosófico de pesquisa que visa compreender o ser dos objetos investigados. Esse modo de investigar a formação do conhecimento humano se dá tal como nós os vivemos, sem pressupostos ou intermediários.

Para investigar a linguagem, a língua materna e a estrangeira a partir da seguridade desse caminho, cabe compreendê-lo. Assim, direcionamos nossa

atenção, ainda que por algumas páginas a essa filosofia que se propõe como caminho às essências, para então retornarmos a discussão central dessa pesquisa.

No documento Download/Open (páginas 39-45)