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O Mundo de Platão e Aristóteles

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2. CAPÍTULO CORRELAÇÃO, MUNDO E FÉ

2.3 Duas Definições de Mundo

2.3.1 O Mundo de Platão e Aristóteles

15 Não pretendemos aqui fazer descriminação há qualquer tipo de deficiência, nem tão pouco,

levantar discussões secundárias de possíveis razões ou circunstâncias que levaram ou não qualquer pessoa ao estado de surdez. Apenas exemplificamos que na formação do mundo sensível aos sons, infelizmente, quem não é capaz de ouvir precisa criar outras formas de alcançá-lo.

Não o bastante, acerca do mundo sensível encontramos na figura dos filósofos Platão (428/427 – 348/347, a. C) e Aristóteles (384/383 – 322 a. C), uma épica discussão entre o mundo sensível e o mundo inteligível. Mas porque voltar o nosso olhar para filosofia se esse trabalho não é uma obra filosófica? Por um motivo muito simples. Porque a cultura ocidental está completamente imbuída nesta ciência, seja de maneira empírica ou abstrata, até mesmo a cultura popular (do dia a dia), reflete os conceitos filosóficos de Platão, Aristóteles e outros. Mais que isso, a importância de volver as teorias platônicas e aristotélicas consiste, segundo Paviani (2001), porque Platão simplesmente:

Está no início do conhecimento teórico no sentido filosófico e científico. Platão é um filosofo inesgotável, cuja leitura é ao mesmo tempo fácil e difícil [...] além disso, o pensamento de Platão, como o de Aristóteles, e dos gregos em geral, está tão presente na nossa cultura e civilização que ele é decisivo para entender a ciência, a tecnologia, a arte, a moral, a religião e a organização social e política. (PAVIANI, 2001, p. 09, 10).

Respondida esta questão, voltemos a compreensão platônica de mundo. Platão retoma a discussão de dois filósofos pré-socráticos Parmênides e Heráclito. Heráclito defendia a tese do “mobilismo do universo” (que todos os seres se transformavam constantemente), enquanto Parmênides acreditava no “imobilismo do universo” (que os seres mantinham uma identidade entre si). Na tentativa de dar resposta a esta problemática, surge à metafísica platônica, também conhecida como “a segunda navegação”. “A segunda navegação, portanto, leva ao reconhecimento da existência de dois planos do ser: um fenomênico e visível; outro invisível e metafenomênico, captável apenas com a mente e, por conseguinte, puramente inteligível”. (REALE 1990, p. 136).

Reconhecendo o surgimento de dois mundos por intermédio do pensamento e da própria escrita de Platão, Reale (1990) apresenta o recorte da obra que diz da seguinte forma:

“E não é verdade, talvez, que enquanto podes ver, tocar e perceber com os outros sentidos corpóreos essas coisas mutáveis, já aquelas que permanecem sempre idênticas, ao contrário, por nenhum outro

meio podem ser captadas senão através do raciocínio puro e da mente, porquanto são coisas invisíveis que não podem ser colhidas pela vista? O que dizes é absolutamente verdade – respondi.

Admitamos, portanto, se quiseres duas espécies de seres: uma visível e outra invisível – acrescentou ele.

Admitamos – respondi.

E que o invisível permaneça sempre na mesma condição e que o visível não permaneça jamais na mesma condição”. (REALE e ANTISERI, 1990, p. 136).

Platão parte do pressuposto dividindo o mundo em duas partes, constituindo assim a divisão dos seres por meio do mundo sensível e do mundo inteligível. No mundo sensível, o filosofo afirma que os seres estão em continuo processo de mudança, pois a sua essência muda o tempo tudo, o ser nasce, cresce e morre, pois são efêmeros, neste processo, eles alcançam o mundo pelos sentidos, mas ao mesmo tempo são mutáveis, (Heráclito usa a metáfora do homem que vai se banhar no rio para exemplificar essa continua mutação). Por outro lado, existem seres que Platão reconhece-os como imutáveis que se alcança por meio das ideais racionais, são as ideias imutáveis, são ideias puras, como a matemática, física, etc., que pode ser entendido como os seres geométricos de maneira geral, e estes só podem ser alcançados por meio da razão, estes são seres imutáveis.

Deste modo, surge a divisão de mundo em Platão. Mundo dos seres inteligíveis – mundo inteligível, como o mundo da essência – e, mundo dos seres sensíveis – mundo sensível, como o mundo da aparência. Entretanto, essa divisão se torna mais complexa ao passo que, segundo Platão os seres sensíveis não são confiáveis porque eles podem nos enganar. Por outro lado, o inteligível pode manter-se sempre da mesma forma, pois não muda, então não engana. Após essa nova maneira de pensar o mundo que surge da metafísica platônica, é “que se pode falar de “material e imaterial”, “sensível e supra-sensível”, “empírico e metaempírico”, “físico e metafísico””. Esse dualismo Platão denominou de natureza física e “natureza não-física” e que o “verdadeiro ser é constituído pela realidade inteligível”. (REALE e ANTISERI 1990, p. 136, 137).

A partir desse ponto Platão introduz a categoria das ideias, que é a base do mundo imutável. As ideias em sua teoria, “não são simples pensamentos, mas aquilo que o pensamento pensa quando libertado do sensível: constitui o “verdadeiro ser”, “o ser por excelência” (p 137). Nessa nova forma de pensar o

mundo por meio dessa divisão da teoria platônica, entende-se que, em suma: “as ideias são as essências das coisas, ou seja, aquilo que faz com que cada coisa seja aquilo que é”. Platão usou também o termo “paradigma” para indicar que as ideias representam o “modelo” permanente de cada coisa (como cada coisa deve ser) (p. 137). Agora, pois voltemos a compreensão do mundo sensível na perspectiva platônica.

Embora tenha apresentado primeiro o mundo inteligível, precisamos ter por horizonte que este mundo na teoria de Platão só pode ser alcançado por meio do mundo sensível. O inteligível coabita o sensível.

O mundo sensível na teoria platônica não é apenas o mundo que se pode alcançar por meio dos sentidos (visão, olfato, paladar, audição e tato). Esse mundo é isso, mas ao mesmo tempo transcende a isto. Para o filósofo, o mundo sensível é uma cópia imperfeita do mundo perfeito que só pode ser alcançado por meio do inteligível. Partindo deste pressuposto ele levanta a seguinte questão: “como é possível, então, que as Ideias inteligíveis possam agir sobre o receptáculo sensível para que, do caos surja o cosmo sensível?”. Pois essa cópia imperfeita surge a partir dos casos por meio de “um princípio ilimitado e indeterminado” que é perfeito. Assim sendo, Platão apresenta a seguinte resposta para sua própria pergunta:

... existe um Demiurgo, um Deus-artífice, um Deus que pensa e quer (e que, portanto, é pessoal), o qual, assumindo como “modelo” o mundo das ideias, plasmou a “chora”, ou seja, o receptáculo sensível, segundo esse “modelo”, gerando dessa forma o cosmos físico [...] há um modelo (o mundo ideal), existe uma cópia (o mundo sensível) e existe um Artífice, que produziu a cópia servindo-se de modelo. O mundo do inteligível (o modelo) é eterno, como eterno é também o Artífice (a inteligência). O mundo sensível, ao contrário, construído pelo Artífice, nasceu, isto é, foi gerado, no sentido verdadeiro do termo, [...] Ele nasceu porque pode-se vê-lo e tocá-lo, pois ele tem corpo e tais coisas são todas sensíveis; e as coisas sensíveis (...) estão sujeitas a processos de geração e são geradas. (REALE e ANTISERI,1990, p. 142, 143).

O que de fato Platão está apresentando aqui por meio de sua teoria é que se faça o caminho reverso para se pensar a existência de todas as coisas. Primeiro, se o ser humano é capaz de criar mesmo sendo imperfeito, significa que há um ser perfeito em sua própria essência, o que ele atribui o nome de

Demiurgo. Segundo, se todas as coisas no mundo imperfeito são acessíveis pelo sensível e os sentidos falham, então há um primeiro modelo que é o Ideal, sendo assim, este é cópia daquele. Terceiro, se o ser humano mesmo sendo imperfeito e finito pode gerar e ser gerado, logo pressupõem-se que há um único criador perfeito e absoluto. Ao levantar essas questões, o filosofo Platão, passa a agir como se estivesse a desenrolar um novelo de lã com inúmeras perguntas. Muito embora esse pensador siga com seus questionamentos, apresentaremos apenas mais uma pergunta e resposta levantada pelo mesmo acerca da criação do mundo, pois acreditamos que seja fundamental para posteriormente entendermos a crítica de Aristóteles que irá contrapor o seu mestre.

Seguindo no pensamento Platônico, encontra-se a seguinte pergunta: “Mas por que o Demiurgo quis gerar o mundo?” (p. 143). Aqui pode se levar em consideração a busca por resposta a partir da concepção de causa e efeito. Se existe o criador do mundo perfeito, e este por sua vez, cria também ou permite criar um mundo imperfeito, mas, qual o motivo? Assim sendo, Platão responde:

...dizemos, portanto, a razão pela qual o Artífice fez a geração e este universo: ele era bom e, em quem é bom, nenhuma inveja pode nascer por nada. Imune, portanto, a inveja, quis que todas as coisas se tornassem ao máximo semelhantes a ele [...] de fato, querendo que todas as coisas fossem boas e, na medida do possível, não fossem más, Deus tomou tudo quanto havia de visível, que não se encontrava calmo, mas se agitava de forma desordenada, e o fez passar da desordem para a ordem [...] Ora, não é lícito ao ótimo fazer senão a coisa mais bela [...] com a finalidade de que a obra por ele realizada

fosse por natureza a mais bela e a melhor possível. (REALE e ANTISERI, 1990, p. 143).

Deste modo, pode-se constatar e fundamentar a concepção de causa e efeito. O Demiurgo divino por “bondade” e por amor ao bem (causa), criou o mundo (efeito). Acerca disso, Platão elaborou o mito da caverna16 para

exemplificar a divisão de mundo sensível e mundo inteligível. “A distinção entre os dois planos do ser, o sensível e o inteligível, superava definitivamente a antítese entre Heráclito e Parmênides”. (REALE e ANTISERI,1990, p. 138).

Muito embora não é intenção deste trabalho dialogar em sua totalidade com a metafísica de Platão, mas apenas ter uma breve compreensão do conceito de mundo na perspectiva filosófica. Reconhecendo a complexidade e

profundidade da física aristotélica, seguimos para compreensão do conceito de mundo exposto por Aristóteles. O que era o mundo para esse filósofo?

Aristóteles (384/383 – 322 a. C) foi um brilhante pensador que produziu de maneira muito fecunda e próspera para filosofia. Como discípulo de Platão, caminhou por muito ao lado de seu mestre, mas com o passar do tempo saiu da sombra de seu mentor e produziu grandes volumes fazendo com que seu nome e sua obra se tornasse imortal. (REALE e ANTISERI,1990, p. 173 - 178).

No entanto, Aristóteles não acredita em uma divisão de mundo entre o perfeito sendo o mundo das ideias, e o mundo imperfeito sendo o mundo material. Por conseguinte, ele critica drasticamente a teoria das “ideias” de seu mentor produzindo inumeráveis argumentos (os quais não iremos expor aqui), para refutá-lo. Para Aristóteles se “elas (as ideias) fossem “separadas”, ou seja, “transcendentes”, como queria Platão, não poderiam ser causa da existência das coisas nem causa de sua cognoscibilidade”. (REALE e ANTISERI, 1990, p. 190). Aristóteles propõe um mundo mais racional, compreendido apenas pela razão. Se para Platão havia um mundo supra-sensível ou inteligível, Aristóteles irá contestar afirmando que: “o mundo supra-sensível não é um mundo de “Inteligíveis”, mas sim de “Inteligências” (p. 191).

Concomitantemente, Aristóteles não apenas critica o mundo das ideias de Platão, mas apresenta outra justaposição extremamente bem elaborado para se apercebe-se do mundo. Desta maneira, distingue-se a divisão do mundo físico em mundo sublunar e mundo celeste ou mundo supra-lunar, essa transformação ocorre da seguinte forma. “Aristóteles distinguiu a realidade sensível em duas esferas claramente diferenciadas entre si: [...] o mundo sublunar é caracterizado por todas as formas de mutação, entre as quais predominam a geração e a corrupção”, no mundo supra-lunar ou celeste, os “céus são caracterizados unicamente pelo “movimento local” (ou) “movimento circular”. (REALE e ANTISERI,1990, p. 195). Mas, no que consiste suas diferenças? Aristóteles irá responder que a diferença “entre os mundos supralunar e sublunar está na matéria diferente de que são constituídos” (p. 195).

Para ele, o que existia nada mais é (que é extremamente complexo em compreender) do que apenas um mundo. Contudo, o que difere nesta concepção de mundo para Aristóteles é a forma de se apropriar desse mundo, e nesta apropriação é que surgem os mundos, ou seja, na forma de conhecê-lo.

Afirmando assim, conhecemos o mundo através de nossos sentidos, mas também com o intelecto, a nossa razão pensa um mundo e se apropria do espaço dos seres, mas para isso irá precisar usar os sentidos, pois através deles – dos sentidos – capitamos atributos e qualidades dos seres materiais. "Nada está no intelecto sem antes ter passado pelos sentidos" ARISTÓTELES, (384 – 322 a. C).

É sabido que essa discussão acerca da concepção de mundo, do que é o mundo, segue afio entre outros pensadores da filosofia, como também de outras aéreas do conhecimento, entretanto, é importante ressaltar que, os grandes pensadores que se aventuraram nessa epopeia, de uma forma ou de outra, beberam em ambos os filósofos Platão e Aristóteles, para elaborar suas contribuições. Exemplo disto, podemos encontrar no universo da religião inúmeros escritos fundamentando-se nesses pensadores, como Agostinho Hipona (354 – 430), que encharcou-se nas teorias de Platão, e Tomas Aquino (1225 – 1274), que irrigou suas obras nas teorias de Aristóteles.

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