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“Nós que passamos apressados Pelas ruas da cidade Merecemos ler as letras e as palavras de Gentilezas”

(Monte, Marisa. Gentilezas)

“Ó terra querida, Jundiaí! ” Assim, em tom romântico, se inicia o hino jundiaiense mantendo-se até o seu fim, parecendo enaltecer o orgulho de pertencer ao município de Jundiaí, entretanto, pouco reflexivo em considerar o suor de etnias tradicionais lá presentesr. De certo modo, a autora pode ter sido movida por uma cidade que, no século passado, foi importante para o transporte ferroviário, todavia, as migrações e imigrações que levaram ao embate com os locais (indígenas) não aparece no contexto do hino. Porém, na contemporaneidade quais traços regem Jundiaí? E, trazendo para a temática deste estudo: como será que se constitui a organização do sistema de saúde jundiaiense?

Para contextualizar a utilização do hino como pano de fundo ao apresentar o município, preciso esclarecer que fui motivado por uma aluna que participa do grupo de lian gong em uma das US em que trabalho. Anualmente, com a proximidade da data de aniversário da cidade ela ressalta, com orgulho, que foi a sua mãe que escreveu o hino, em meados de 1930.

Desta forma, decidi usar trechos do hino para discorrer sobre o perfil social, econômico e público de Jundiaí, bem como buscar desenvolver um olhar criterioso a partir do hino sobre o campo da saúde coletiva.

O subtítulo “Terra gentil, altruísta”, que expressa um povo generoso, pode ser um campo fértil para se valer uma política pública, ainda mais no SUS contextualmente amparado na busca da autonomia e emancipação por meio da solidariedade dos SUSjeitos. Porém, vale a reflexão de que um governo, ao conduzir um plano municipal de saúde, precisa focar para além das gentilezas e do altruísmo

q Parte do refrão do Hino de Jundiaí, compositora Haidée Dumangin Mojola. O hino foi reconhecido

oficialmente pela lei 869 de 17 de novembro de 1960. Disponível em https://jundiai.sp.gov.br/a- cidade/hino/

r Jundiaí corresponde a um dos núcleos coloniais mais antigos da capitania de São Vicente, com o

povoado sendo elevado à vila em 1655. Seu povoamento ocorreu nas primeiras décadas do século XVII em função da procura por novas terras para o plantio e da necessidade de máxima aproximação da mão de obra principal do período: as aldeias indígenas (49).

polarizado em interesses individuais; e planejar, executar e avaliar a partir do consolidado em leis, garantindo a saúde como direito e dever do estado, não como caridade e bem feitio provenientes do poder e da hegemonia. Fazendo valer a participação social e dos trabalhadores da saúde para que o direito a saúde seja efetivado, valendo no cotidiano dos munícipes.

Jundiaí é referência em algumas especialidades médicas para os municípios vizinhos que fazem parte do aglomerado urbano com os seguintes municípios: Cabreúva, Campo Limpo Paulista, Itupeva, Jarinu, Jundiaí, Louveira e Várzea Paulista somando cerca dos 805 mil habitantes (50). Deste modo, podemos utilizar de um dos refrãos: “Teus filhos amantes são de ti, saudades mil levam os que passam por aqui”.

Imaginamos que algumas pessoas cuidadas sintam saudades e guardem Jundiaí na memória; de outro lado, nem sempre os amantes munícipes valorizam o que se têm, haja vista, alguns depoimentos sobre o excesso de pacientes que vem de fora.

Deste modo, pesquisamos artigos relacionados com a saúde pública na região de Jundiaí, encontrando artigos de 2013 a 2019. Por exemplo, os municípios de Campo Limpo Paulista e Várzea Paulista sofrem com a demora de atendimentos (51,52), ainda em Várzea evidenciou-se a falta de condições de infraestrutura de algumas US (53). Em Jarinu, os vereadores se reuniram para debater de forma ampla melhorias no campo da saúde (54). Em Louveira, uma reportagem questiona como a gestão da saúde faz o gerenciamento de seu orçamento: segundo o artigo existe verba pública suficiente e serviços insuficientes (55). Já em Cabreúva os pagamentos de salários atrasados afastam médicos e servidores dos serviços (56). O artigo referente à Itupeva aponta interferência de legendas partidárias, sucateamentos de equipamentos e redução de servidores (57). O que nos fica evidente, a partir de tais artigos, é que no que se referem aos enfrentamentos, os serviços públicos desses municípios têm baixa qualidade. .

Neste sentido, Jundiaí percebe tal cenário do SUS regional pelo menos a partir de um dos artigos encontrados sobre o Hospital de Caridade São Vicente de Paulo (HCSVP), que recebe 70% da carga do atendimento entre baixa e média complexidade. O mesmo artigo relata que o Ministério Público teve que intervir no

atendimento do hospital porque as cidades vizinhas não se empenham em implantar um serviço de urgência e emergência (58).

Em Jundiaí, “Teu jardim, é um paraíso; Onde a mocidade sempre jovial; Com seu odor confunde o riso” Sua população estimada em 2018 foi de 414.810 (1), porém no último censo de 2010, apresentou 370.126 habitantes com IDHM 0,822 considerado em faixa muito alta entre 0,800 a 1, onde se destacou o índice de Longevidade em 0,866. Este IDHM levou a cidade obter a posição de 11° entre os 5.570 municípios (59).

Na questão de espaço geográfico, situa-se entre as duas mais importantes cidades do estado de São Paulo, Campinas e São Paulo capital (59), portanto “De ti me orgulho, pois és bem Paulista”.

No Censo de 2010, a cidade apresentou 244.262 habitantes com cunho religioso católico (1), representando 66% do total da população, que “Teus filhos amantes são de ti, que Deus abençoe eternamente esta terra onde nasci”.

O PMS orienta a elaboração dos instrumentos de planejamento, no caso a Programação Anual de Saúde (PASa) elaborada pelas US, e o Nível Estratégico da Unidade de Gestão de Promoção da Saúde (UGPS) – esta Unidade é equivalente à tradicional Secretaria Municipal de Saúde; unidades que levantam as metas e objetivos para o Plano. A PASa orienta e reorienta o Plano Municipal através de um Relatório Anual de Gestão (RAG) que verifica os ordenamentos e os redireciona, caso necessário. Ainda, o Plano Municipal é acompanhado por meio da Prestação de Contas quadrimestral ao Conselho Municipal de Saúde (CMS) e à Câmara Municipal de Jundiaí (59), “Teus filhos com devoção, marcham para a luta como heróis, cheios de fé em tua oração”.

A carga sobre o financiamento à Saúde, no município de Jundiaí, apresenta no plano tripartite uma grande disparidade quanto ao que deveria ser praticado na divisão real: 76% são oriundos dos cofres Municipais, 1% por parte do Estado e 23%, cumpridos pelo órgão de Federação (59), assim “Quem poderia imitar, o teu céu com suas cores? Com teus lindos fulgores? Os teus campos, tuas flores? ” Parece que este cenário de maior participação municipal se pulveriza na maioria dos municípios brasileiros.

O PMS no campo da AB funciona com 36 US, sendo: uma Clínica da Família, três USF, nove EACS e 23 UBS, divididas em quatro regionais de saúde. Ainda conta com quatro Programa Academia da Saúde (PAS), um Centro de Testagem e Acompanhamento e um Centro de Convivência, Cultura e Geração de Renda (Cecco) (59). Durante a pesquisa, o município tem vivido uma particularidade quanto à organização do modelo assistencial das USF, que no passado estavam alocadas em espaços físicos alugados e foram incorporadas dentro dos espaços físicos (públicos) de UBS e EACS passando, contextualmente, a responder à mesma gerencia do espaço ao qual foram incorporadas. Portanto, são duas USF no momento atual (setembro de 2019).

“Terra gentil, altruísta”, vem gerando um formato híbrido no modelo de assistência em saúde, prevalecendo o modelo tradicional: 58,33% (UBS) centrado no cuidado médico, 25% (EACS) com iniciativa de formar um modelo ampliado contando com a presença de Agentes Comunitários na equipe e 16,66% (USF) na diretriz da Saúde da Família com equipe multiprofissional centrada na clínica ampliada. Todas as 36 Unidades de Saúde possuem gerência própria, bem como, os equipamentos Cecco e o PAS (59).

Jundiaí conta com quatro equipes de Núcleo Ampliado à Saúde da Família – NASF, que desenvolve apoio no híbrido sistema de saúde municipal entre as 36 US da AB, realizando as seguintes ações: apoio matricial (saúde mental, ortopedia, reumatologia), grupos operativos, consulta compartilhada, visita domiciliar e PIC; e uma equipe NASF instalada na recém-inaugurada na Clínica Saúde da Família (59). Porém, temos a partir de 2018 e após o fechamento do PMS, a inclusão de uma equipe NASF/AB para a Clínica da Família.

O NASF é constituído pelas áreas de: Assistência Social, Educação Física, Fisioterapia, Nutrição, Terapia Ocupacional, Psicologia e Psiquiatria (59). O formato de contratação dos profissionais de saúde para o NASF é dividido entre profissionais de carreira municipal (minoria) com outra via de convênio terceirizado estabelecido com a UGPS e com o HCSVP. O mesmo acontece nas contratações de profissionais para atuarem nas USF e EACS sendo via terceirizada, apenas.

A UGPS compõe, com a Unidade de Gestão de Esporte e Lazer (UGEL), a Plataforma de Saúde e Qualidade de Vida dentro do organograma da

administração municipal. Ambas possuem seus próprios gestores e, juntas, buscam realizar projetos.

O município é conhecido como Terra da Uva por ter forte influência italiana, “Que belas tardes amenas! Que lindas noites, Felizes, serenas! ”. Esta influência europeia muito evidencia, nos parece, ter apagado algumas tradições, como as indígenas, por exemplo. Considerando o extermínio indígena da região, do ponto de vista histórico, os termos “amena” e “serena” só condizem com a bela canção de linguagem poética expressada no hino, narrado nos moldes do colonizador erudito português; fazendo com que nos percamos, na contemporaneidade, das nossas terras primitivas de tradições indígenas. Como há 520 anos falamos Brasil em vez de entoar Pindorama.