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4.3 As Missões Jesuíticas Guaranis

3. O Olhar Fotográfico

Para se concretizar a formação técnica de uma imagem no interior de um equipa- mento eletrônico, faz-se necessária a manipulação por parte de um ser humano, indiví- duo este que ao se fazer presente em um ambiente e capturar uma fotografia, passa de mero observador para compor um quadro de presença, pois transita de um ser passivo para transportar-se ao interior de sua composição imagética.

Adentrando o vasto mundo de sua composição, traz consigo seu repertório de vida, seu gosto, deleito e emoção, criando assim, uma particularidade, que não poderá ser igualada a outra obra, afinal, com tamanha unicidade, uma forma de sentir, sensibilizar e “ver” o mundo, cria narrativas que serão distintas, levando em consideração fatores como o período histórico, que desempenha extrema importância na caracterização de obras visuais. Portanto, toda concepção estética está intrínseca ao ato fotográfico.

O ato de fotografar envolve tanto seu objeto de observação quanto o olhar, efetivando a fotografia como uma relação, que gera um documento e mutuamente uma composi- ção artística, fornecendo conforme Sontag (2004), um testemunho. Corroborando com esta concepção Peter Burke (2017) em sua obra “Testemunha Ocular”, ressalta ainda que nas entrelinhas de uma imagem, estão ocultos significados, ausências e contextos específicos.

Kossoy (2014, p. 50) afirma que o testemunho em que a fotografia consiste, é obtido e elaborado “segundo a mediação criativa do fotógrafo”, portanto, qualquer que seja o assunto registrado, este “também documentará a visão de mundo do fotógrafo. A foto- grafia é, pois, um duplo testemunho: por aquilo que ela nos mostra da cena passada, irreversível, ali congelada fragmentariamente, e por aquilo que nos informa acerca de seu autor”.

E sob o autor da fotografia que é cunhada a expressão “olhar fotográfico”, que remete a forma de vislumbrar o mundo à frente de seus olhos, tendo o auxílio de um equipa- mento para registrar sua visão. Sendo assim, somos dirigidos a uma compreensão mais ampla, não restrita a técnicas fotográficas, estéticas, semióticas ou históricas, e sim “sim- biótica”. Conforme Dubois (2015, p. 59-60), o “fotográfico” se configura em “uma verda- deira categoria de pensamento, absolutamente singular e que introduz a uma relação específica com os signos, o tempo, o espaço, o real, o sujeito, o ser e o fazer”.

Embora a câmera seja o posto de observação, conforme Sontag (2004, p. 22-23) “o ato de fotografar é mais do que uma observação passiva”. Para a autora, realizar o processo de produzir imagens é ter “interesse pelas coisas como elas são, pela permanência do

status quo [...] é estar em cumplicidade com o que quer que torne um tema interessante

e digno de se fotografar”.

Sendo assim, a busca pela originalidade e autenticidade em registros fotográficos, será derivada conforme Kossoy (2014, p. 49) explica, da “atuação do fotógrafo enquanto filtro cultural: seu talento e intelecto influirão no produto final desde o momento da seleção até sua materialização”. Logo, toda fotografia é manipulada, não apenas a pos-

teriori com a edição, mas no próprio momento em que ocorre a captura da imagem, na

seleção de conteúdo, escolha do que ficará em primeiro ou segundo plano, posiciona- mento, intensidade tonal, balanço de brancos, e demais decisões a respeito do melhor uso dos recursos disponíveis.

As decisões técnicas, estéticas ou ideológicas a respeito de como e o que se preten- de capturar na imagem, são respostas (às vezes inconscientes), respaldadas conforme Kossoy (2014, p. 50) indica, por toda a visão de mundo do fotógrafo, definindo assim a sua singular artisticidade, e também seus novos e distintos critérios de olhar. Conforme Borges (2011, p. 30), cada indivíduo “define não apenas o que merece ser registrado, mas também sob que ângulo as ações sociais de seus cotidianos devem ser imortalizadas”.

Toda a concepção fotográfica (considerando suas manipulações inerentes) afeta di- retamente na compreensão interpretativa de quem vier a observá-la, mesmo querendo retratar a estrita realidade, conforme nos lembra Sontag (2004, p. 17), os fotógrafos são “assediados por imperativos de gosto e de consciência”. Estando suas particularidades estéticas e suas relações próprias com luz, enquadramento, pontos focais, manuseio do equipamento em constantes processos de seleção. E isso torna-se perceptível inclusive na posterior escolha das imagens, evidenciando a relação desenvolvida por ela com a cena fotografada, comprovando as intencionalidades de seu autor.

O fotógrafo deve estar flexível a assumir novos ângulos de observação e reflexão em torno da amplitude que se estende a sua frente, e descobrir ao longo do seu processo criativo, sua própria identidade, que expressará sua artisticidade. De acordo com Cyr (1968, p. 8), após assumir sua própria identidade, ao criar suas obras, cria-se um mundo de sua autoria, que está aberto para visitação, “um mundo que outros podem abraçar, desde que também procurem estender suas capacidades estéticas”.

Talvez uma das mais complexas tarefas que cabe ao olhar aguçado por trás das len- tes fotográficas, seja a captura não apenas dos elementos físicos a sua frente, mas sim a busca pelas significações ocultas, as histórias desconhecidas, ou pouco difundidas, sobre a realidade dos objetos fotografados. Vale aqui ressaltar, conforme aponta Laizos (2015, p. 141) que a “informação pode estar na fotografia, mas nem todos estão prepara- dos para percebê-la em sua plenitude”. Pautando-se nessa conjuntura, são apresenta- das na sequência algumas fotografias onde analisaremos o olhar fotográfico, contendo breves descrições, a respeito do momento em que foram captadas, junto com as sensa- ções envolvidas, e um pouco da história que as entrelaçam.