• Nenhum resultado encontrado

O papel do Estado na industrialização

4. O ESTADO NA ECONOMIA BRASILEIRA

4.2. O papel do Estado na industrialização

A Grande Depressão verificada, em nível mundial, nos anos 30 levou o Brasil a iniciar sua fase de industrialização por substituição de importações, o que resultou também na ampliação e mudança no papel de intervenção do estado na economia.

A necessidade de industrialização, como forma de superar os constrangimentos externos e o subdesenvolvimento, passou a ser meta de política econômica. Para atingir esse objetivo seria necessário empreender esforços para a geração de poupança e sua transferência para a atividade industrial, através de mecanismos de política econômica, que rompessem com o Estado oligárquico e descentralizado da República Velha. A Revolução de 1930 fortaleceu o Estado Nacional e promoveu a ascensão de novas classes econômicas ao poder.

A Tabela 3 mostra que as despesas do Governo em seus três níveis passaram de 11,9% em 1925 para 17,6% e 15,6%, respectivamente em 1930 e 1935, permanecendo nesse nível até o inicio do milagre econômico em 1970 quando atinge 25,1%.

Tabela 3 - Despesas do governo, em seus três níveis, em proporção do PIB - 1920-1975 (em %)

Ano % Ano % Ano %

1920 13,0 1940 16,3 1960 16,6 1925 11,9 1945 14,7 1965 18,5 1930 17,5 1950 16,0 1970 25,1 1935 15,6 1955 15,6 1975 23,3

Fonte: Dados Básicos: GOLDSMITH, R.W. Brasil 1850-1984:

desenvolvimento financeiro sob um século de inflação. São Paulo:

11

Conforme TAVARES (1975), TAVARES (1978), BELLUZO (1977) e MELLO e BELLUZZO (1977).

Harper & Row do Brasil Ltda., 1986. Dados coletados e compilados pela autora.

Na década de 30, o Regime Vargas também expandiu a política de intervenção do Estado com o objetivo de proteger e encorajar o crescimento de diferentes setores. Nesse sentido, foram criadas autarquias federais para gerir e negociar com certos setores, como o de açúcar, mate, sal, madeira de pinho, pesca, marinha mercante etc.

Em 1934, o Estado cria a Companhia Siderúrgica Nacional, em Volta Redonda, e o Conselho Federal do Comércio Exterior. Esse último para estimular as exportações, constituindo-se na primeira tentativa de planejamento da economia brasileira. Em 1937, foi criada a Carteira de Crédito Agrícola e Industrial do Banco do Brasil, que fornecia créditos a longo prazo a estabelecimentos industriais (BAER, 1979).

O início da industrialização da economia brasileira está assentado na Substituição de Importações (PSI), sendo que estrangulamento externo funcionava como estímulo e limite para a produção industrial brasileira, a qual passou a determinar o crescimento econômico e a condicionar a pauta de importações, ditando a prioridade dos setores quanto à obtenção de investimentos industriais.

Nos primeiros anos da década de 40, o Governo criou várias empresas governamentais, a maioria por questões de segurança nacional, sendo que algumas viriam a se tornar companhias poderosas nos anos 50 e 60, como a Companhia Vale do Rio Doce (CVRD), em 1942, a Fábrica Nacional de Motores (FNM) e a Companhia Nacional de Álcalis, ambas em 1943.

Durante a arrancada de desenvolvimento dos anos 50, o papel exercido pelo Estado na economia continuou a expandir-se. Em 1952, tem-se a criação do Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico (BNDE) para promover o financiamento e o fomento ao setor de indústrias pesadas e a certos segmentos do setor agrícola e aos setores de energia, siderurgia e transportes. Observa-se o aumento das rodovias e o crescimento da indústria siderúrgica. Destacam-se também neste período a expansão de Volta Redonda e a criação da Companhia

Siderúrgica Paulista (COSIPA), em 1953, da Petróleo Brasileiro S.A. (Petrobrás), do Banco do Nordeste do Brasil, em 1954 e da Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais (USIMINAS), em 1956.

Medidas no campo econômico12, a partir de 1952, objetivavam reaparelhar financeiramente o Estado. Todavia, nas palavras de Lessa:

“Predominou nas alterações tributárias, ao longo dos anos cinqüenta, o que se poderia chamar de pragmatismo fiscal. Apenas o montante de recursos captáveis preocupava o legislador, e as reformas realizadas, quase sempre devido à pressão de amplos déficits, fizeram com que se montasse um sistema fiscal contraditório em muitos aspectos e pouco operacional para a política econômica” (LESSA, 1981:151).

Nos anos 50 verifica-se também a difusão do controle dos preços. A ampliação do controle das tarifas dos serviços de utilidade pública atingiu a energia elétrica, a telefonia e os transportes coletivos, estendendo-se sobre os aluguéis, a gasolina e os alimentos, item que passou a ser monitorado pela Comissão Federal de Abastecimento e Preços (COFAP).

O rápido crescimento das empresas estatais no setor de serviços de utilidade pública deveu-se à política de controle dos preços, porém tal iniciativa não garantiu uma taxa de retorno de investimento adequada às empresas privadas, principalmente as estrangeiras, que as levassem a expandir e modernizar seus estabelecimentos.

No Plano de Metas do Governo Juscelino Kubitschek, entre 1956/60, considerado o auge do período de substituição de importações, foram definidas quatro principais linhas para a ação do estado: investimentos estatais em infra- estrutura, com destaque para os setores de transporte e energia elétrica; estímulo ao aumento da produção de bens intermediários; incentivo à introdução dos setores de bens de consumo duráveis e bens de capital; e construção de Brasília.

12

Criação do Adicional Restituível sobre o Imposto de Renda para a constituição de um banco federal de investimentos, o BNDE. Elevação das alíquotas e taxas do Imposto sobre Combustíveis e Lubrificantes, para financiar o Plano Rodoviário Nacional. Reforma cambial pela Instrução 70/53, da SUMOC, para auferir ganhos de cambio em cinco categorias de importações, conforme o caráter essencial ou supérfluo das mercadorias. Consultar LESSA (1981:22). Criação do Imposto Único sobre Energia Elétrica e constituição do Fundo de Eletrificação Rural, que possibilitaram o aumento da oferta de energia no Nordeste.

Mesmo tendo cumprido as metas estabelecidas, o Plano, principalmente, a partir de 1958, quando se intensificou a industrialização, acabou aprofundando as contradições do processo de substituição de importações, tornando visíveis os limites do modelo assentado na entrada do capital estrangeiro, na captação de poupanças externas e no mecanismo inflacionário.

A Figura 2 distingue diferentes níveis de gastos da Administração Pública em proporções do PIB. Entre 1955/56, observa-se um salto relacionado, basicamente, à expansão das despesas da Administração Direta, principalmente nos ministérios da Guerra, Aeronáutica e Marinha, ou aquelas relacionadas ao atendimento das necessidades básicas da população (Tabela 4). Um novo patamar de gastos que se observa a partir de 1965 é justificado pelo aumento do número de entidades da Administração Descentralizada. Percebe-se, pela Figura 2, a maior importância da Administração Descentralizada entre 1964/65.

0,0 5,0 10,0 15,0 20,0 25,0 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58 59 60 61 62 63 64 65 66 67 68 69 70 71 72 73 74 75 76 77 78 79 80 Anos Par tici paç ão (%)

Adm Direta Adm Indireta Adm. Direta e Indireta

Fonte: Dados Básicos: Balanços Gerais da União, Brasília, Ministério da Fazen- da, Inspetoria-Geral de Finanças, 1947 a 1980. Elaboração: própria.

Figura 2 - Evolução da participação relativa da despesa da administração pública federal em relação ao PIB - 1947-1980 (em %).

Verifica-se que os percentuais de participação da despesa no PIB atingem, 16,0% e 16,6%, em 1950 e 1960, respectivamente, pela Tabela 3, contra 9,2% e 11,2%, respectivamente, nos mesmos anos, pela Tabela 4. Os últimos percentuais referem-se apenas a despesa da Administração Direta e Descentralizada (exclusive estatais) em proporção do PIB; enquanto os primeiros incluem as três esferas da Administração Pública Brasileira, exclusive estatais.

Tabela 4 - Despesa da administração direta e descentralizada em relação ao PIB - 1947-1980 (em %)

Anos Despesa/PIB Anos Despesa/PIB Anos Despesa/PIB

1947 7,6 1958 12,2 1969 16,5 1948 7,7 1959 11,3 1970 14,5 1949 9,4 1960 11,2 1971 14,3 1950 9,2 1961 12,8 1972 15,3 1951 8,9 1962 12,8 1973 16,2 1952 7,6 1963 12,1 1974 16,0 1953 9,4 1964 11,6 1975 17,2 1954 8,6 1965 16,1 1976 18,5 1955 9,5 1966 15,6 1977 18,0 1956 11,6 1967 16,9 1978 21,0 1957 11,4 1968 14,7 1979 20,7 1980 20,0

Fonte: Dados Básicos: Balanços Gerais da União, Brasília, Ministério da Fazen- da, Inspetoria-Geral de Finanças, 47/80. Elaboração: própria.

No início da década de 60, registra-se a primeira grande crise do Brasil em sua fase industrial, com a queda dos investimentos e da taxa de crescimento do PIB, em face das contradições do processo de substituição de importações.

O diagnóstico para a recuperação preconizava a necessidade de desenvolver o setor de bens de capital e de ampliar o setor de bens intermediários

e a infra-estrutura urbana. Apesar do nível de consumo já se apresentar em patamar adequado para viabilizar a retomada dos investimentos, reformas institucionais eram necessárias para viabilizar a adoção de medidas de política econômica. O Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico Social (1962-1965) atribui ao déficit do governo a origem dos desequilíbrios estruturais que contribui para a desaceleração da economia brasileira a partir de 1962 (LAFFER, 1975:57).

Segundo FURTADO (1964:45), o déficit do setor público atingiu 4,0% do PIB no período 1961/64, sendo que entre 1957/60 o déficit representava, em média, 0,7% do PIB. Furtado assegura que a Reforma Cambial realizada no Governo Quadros (Instrução 204, de marco de 1961) veio agravar ainda mais o problema, acarretando profundos desequilíbrios no esquema de financiamento do setor público.

O golpe militar de 1964 impôs, de forma autoritária, uma solução para a crise política, possibilitando novas orientações à política econômica e uma

reorganização dos mecanismos de financiamento do Estado. O Plano de Ação Econômica do Governo (PAEG) adotado no período

1964-66, teve como linhas de atuação as medidas conjunturais de combate à inflação, associadas a reformas estruturais para equacionar os problemas de crescimento econômico. O déficit do setor público, a elevada propensão a consumir e a falta de controle sobre a expansão do crédito eram os determinantes da inflação no período.

As medidas estabilizadoras utilizaram os instrumentos clássicos: corte no gasto público, aumento da carga tributária, e contenção do crédito e dos salários. Ocorreu acentuada diminuição no gasto público (apenas 11,6% do PIB em 1964, conforme Tabela 4) e, ao mesmo tempo, elevação na taxa tributária, paralelamente à criação de um mecanismo de financiamento do déficit, que passou a ser efetuado mediante haveres não monetários, ou seja, via lançamento de Obrigações Reajustáveis do Tesouro Nacional (ORTNs). Essa inovação brasileira serviu de instrumento à política de transferência de renda do setor privado para o setor público.

Essas medidas resultaram em rápida expansão da dívida pública; aumento de liberalização das importações, atribuindo maior flexibilidade à lei de remessas de lucro ao exterior; expansão acentuada da participação do estado na economia; e forte política de arrocho salarial.

A expansão da participação do Estado na economia brasileira nos anos 60 ocorreu tanto pela consolidação e crescimento de suas diferentes atividades quanto pela criação de alguns novos campos de ação, por exemplo: o estabelecimento, em 1965, do Banco Nacional da Habitação (BNH). Esse Banco tornou-se, em pouco tempo, importante instrumento de financiamento de políticas públicas, por receber parte dos fundos de aposentadoria dos trabalhadores e negociar com instrumentos financeiros indexados.

Várias empresas estaduais do setor de geração de energia foram unificadas na criação, em 25 de abril de 1961, da companhia holding Centrais Elétricas Brasileira (Eletrobrás). A rede de telecomunicações nacionalizada em setembro de 1965 ficou a cargo da Empresa Brasileira de Telecomunicações (Embratel), companhia estatal que iniciou um programa de expansão e modernização, para integrar o país. A Petrobrás consolidou-se com a criação de várias subsidiárias, num processo de integração horizontal e vertical de sua cadeia produtiva.

O exame das formas alternativas de financiamento dos encargos do Governo, ou seja, a forma como o Estado se aparelha para fazer frente à expansão de suas atribuições, quer pelo o aumento de sua capacidade extrativa, quer pelo aperfeiçoamento do aparelho arrecadador, quer pela criação de novas fontes de recursos de origem parafiscal, também constitui numa forma de considerar a questão da expansão da participação do estado na economia nesse período (BARACHO, 1982:88; MARTINS, 1977:4).

O manejo da política de estabilização pelo Estado, no período 1964/67, preparou as condições para um novo ciclo de expansão, tendo como eixo a indústria de bens de consumo duráveis, a partir de 1968. A principal atribuição dessa política de stop and go foi “potenciar a acumulação”, e preparar, institucionalmente, a economia para o desempenho dos oligopólios.

A introdução do mecanismo de correção monetária (Lei n.º 4.357, de 16 de junho de 1964), a adoção da taxa cambial flexível (em agosto de 1968), as reformas fiscal e bancária (Lei n.º 4.595, de 31 de dezembro de 1964, conhecida como a Lei da Reforma Bancária), a política de arrocho salarial, a criação do Fundo de Garantia por Tempo de Serviço - FGTS (lei 5.107/66), criação do Sistema Financeiro de Habitação (Lei n.º 4.380, de agosto de 1964), a dinamização do mercado de capitais (Lei n.º 4.728, de 14 de junho de 1965) e a reestruturação dos preços dos serviços de utilidade pública, dentre outras providências relativas à política econômica do período, criaram as condições necessárias para que o país viesse a crescer a partir de 1968.

A Lei da Reforma Bancária (Lei n.º 4.595, de 31 de dezembro de 1964) criou o Conselho Monetário Nacional e o Banco Central. Objetivava a especialização das instituições; o aperfeiçoamento dos instrumentos financeiros utilizados na mobilização de recursos, na concessão de créditos e a transferência para o Banco Central de algumas funções que o Banco do Brasil vinha desempenhando, mas que, em face do seu duplo papel, dificultavam a condução da política monetária. A Reforma preconizou a implementação de uma técnica de programação – o Orçamento Monetário –, através da qual o Banco Central poderia fixar as metas quantitativas de expansão do crédito e dos meios de pagamentos e, ainda, para que suas previsões não fossem ultrapassadas, acompanhar e controlar as operações do Banco do Brasil.

Adicionalmente esta lei permitiu que se mantivesse o Banco do Brasil como agente financeiro do Tesouro Nacional (cujos déficits são cobertos pelo Banco Central, com recursos provenientes da colocação de títulos da dívida pública federal), não chegando a transferir para este último todas as funções das autoridades monetárias, mas instituindo duas autoridades monetárias no país.

Nesses termos, o formato institucional do sistema brasileiro de autoridades monetárias prosseguiu, a partir dos anos 60, dificultando o controle da oferta de moeda.

O Banco do Brasil continuava a arrecadar e manter em depósito as reservas bancárias, a executar serviços de compensação de cheques, a receber

depósitos de qualquer instituição federal e, principalmente, a atuar como agente do próprio Banco Central. Operando com o sistema de “caixa única”, suas operações ativas não se vinculam à existência antecipada de disponibilidades (passivo), porque não se pode separar o que é necessidade do Tesouro, do Banco Central ou do próprio Banco do Brasil.