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O Paradigma do Pensamento do Professor e o Modelo de Pensamento e Acção do Professor.

Do Paradigma Ecológico ao Paradigma dos Processos Mediadores.

1. Os Paradigmas de Investigação

1.4. O Paradigma do Pensamento do Professor e o Modelo de Pensamento e Acção do Professor.

O paradigma do pensamento do professor tem origem nos anos 70, numa altura em que o paradigma Processo – Produto se encontrava no auge, baseando-se no facto de que o ensino, na lógica da informação e da formação, ser, em grande parte, ainda um fenómeno desconhecido (Camilo Cunha, 1999).

Considerando as reflexões, representações, construtos relativamente ao desempenho profissional, contexto, ensino, formação, conhecimento... como factores importantes na melhoria do processo formativo (Lowyck,1986) e começando a crescer o interesse em saber como pensa o professor, como decide e como selecciona as estratégias a empregar em cada situação concreta (Garcia, 1987), Shulman (1986) define novos objectos de investigação, no interior deste paradigma, ao conceber o professor como um clínico, que toma decisões, reflecte, emite juízos, tem crenças e atitudes particulares, defendendo, neste contexto, a necessidade de estudar a vida mental dos professores, seus antecedentes e consequentes.

Este modelo, como refere Rosado (1997), centrando-se sobre o processamento de informação ou, como também se denomina, sobre o pensamento do professor, constitui um novo caminho para desvendar ângulos diferentes da actividade do professor e para colmatar algumas das lacunas apontadas ao paradigma processo- produto. Ele deixa aparecer um professor reflexivo, que toma decisões, emite juízos, tem crenças, expectativas, necessidades, representações que orientam a sua conduta em parceria com um professor executor, técnico, que domina um conjunto de destrezas e competências (Camilo Cunha, 1999).

Revisão da Literatura

Para este último autor, o contexto problemático em causa, no tocante às linhas investigativas, remete para um novo paradigma investigativo - o pensamento do professor - que assenta numa linha construtivista/desenvolvimental, partindo do pressuposto que o ser humano (professor) é um ser epistémico, com papel extremamente activo e sempre inacabado, na construção do conhecimento e do auto-conhecimento.

O paradigma do pensamento do professor fundamenta-se em alguns pressupostos essenciais: considera que os professores são profissionais racionais, que realizam juízos e tomam decisões, num meio complexo e incerto como é a sala de aula e a escola (Pereira, 1999); supõe que o comportamento dos professores é guiado pelos seus pensamentos, juízos e decisões (Shavelson e Stern 1981; Borko e Shavelson, 1988); e parte do pressuposto de que os professores estruturam a sua actividade profissional, a partir das representações que formulam dos fenómenos em que estão envolvidos, dos significados que lhes atribuem e dos valores que defendem (Carreiro da Costa, 1996). Segundo este modelo de investigação, os comportamentos de ensino reflectem as crenças dos professores acerca da sua função, do papel que atribuem à escola e à Educação Física na formação dos alunos. Pode dizer-se, em suma, que esta linha de investigação se preocupa, sobretudo, com uma dimensão invisível do ensino.

Portanto, de acordo com Januário (1996), esta abordagem nasce com a pretensão de superar as limitações imputadas ao paradigma anterior, assumindo o valor da experiência pessoal, dos processos decisionais e das convicções pessoais, quer do professor, quer do aluno. Trata-se de olhar os sujeitos como pessoas, de os considerar como construtores de sentidos e de significados sobre a realidade, na qual elaboram representações e concepções, fazendo parte de visões próprias do mundo.

Os estudos enquadrados sob a égide do paradigma do pensamento do professor, lembra Rosado (1997), são relativamente recentes em Educação Física e

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trazendo, para a investigação nesta área, temas e metodologias novas. De facto, este paradigma permitiu desenvolver e aperfeiçoar novos métodos e técnicas de pesquisa que tiveram a sua origem na Psicologia Cognitiva (Clark e Lambert 1986).

A análise do ensino a partir de uma perspectiva cognitiva permitiu, segundo Januário (1996), enriquecer o conhecimento, ao reforçar o postulado o ensino é

um fenómeno complexo, abrindo um novo campo de pesquisas, em relação aos

processos mediadores do pensamento, e forneceu elementos sobre o conhecimento prático dos professores, acentuando o seu caracter contextualizado e o papel interactivo da sua experiência.

Embora a pesquisa sobre o pensamento do professor tenha sido considerada, inicialmente, uma área promissora (Shulman, 1986), os resultados ainda não comprovaram essas expectativas, na medida em que não forneceram um conjunto de dados tão valiosos, pertinentes e aplicáveis, como aqueles proporcionados pela via behaviorista centrada na eficácia pedagógica (Januário, 1996).

Apesar dos inúmeros contributos, o paradigma do pensamento do professor apresenta obstáculos e criticas, nomeadamente, o perigo de se transformar, exclusivamente, numa filosofia do sujeito, que privilegia o sujeito cognoscente e activo e a análise intuitiva da consciência de si (Habermas, 1990), o perigo da fossilização do pensamento e da acção do professor, principalmente com a idade (Pacheco, 1993), o perigo da simplificação do conhecimento dos professores (Jackson, 1968) e o perigo da descontextualização institucional, pois o professor trabalha inserido numa instituição escolar, pelo que o seu pensamento não poderá estudar-se desenraizado dos contextos social e profissional (Pacheco, 1993). Toda a investigação sobre o pensamento do professor é, necessariamente, uma investigação localizada e circunscrita, sujeita a limitações, em termos de generalizações (Pacheco, 1997).

Revisão da Literatura

Apesar das limitações que possa apresentar, refere Pacheco (1997), a emergência do paradigma do pensamento do professor significa um novo olhar sobre a realidade educativa, sobretudo quando é privilegiada a via interpretativa e hermenêutica na procura das inter-relações do pensar e do agir.

Na verdade, a grande limitação do paradigma do pensamento do professor é poder isolar a actividade cognitiva (Rosado, 1977), sem referência ao processo de ensino aprendizagem e aos seus efeitos, pois como diz Januário (1996:24), ao

afastarmo-mos exageradamente de um grande perigo tentando evitá-lo, acabamos por cair inevitavelmente, num outro. Do mesmo modo, ao rejeitar liminarmente a perspectiva behaviorista e hipervalorizar os processos mentais, muitos estudos omitiram a realidade objectiva na sala de aula (e não esqueçamos que o ensino é acção).

Face às limitações das perspectivas anteriores, começa a emergir uma nova tendência.

Trata-se de ver o ensino de outra forma, de ver o ensino pela perspectiva representativa e activa, como uma actividade molar (Lowyck, 1988; Marland e Osborne 1990), que rejeita a unilateralidade do que podemos designar por perspectiva atomista da análise tradicional de ensino e da perspectiva holista do pensamento do professor. Ora, ambas estas abordagens, tomadas individualmente, são insuficientes para explicar o processo de ensino- aprendizagem.

Valorizar apenas a dimensão cognitiva e os motivos da acção, seria supor erradamente, como sublinha Januário (1996), que o que conta no ensino é a intenção, negando a vertente da acção prática, e valorizar somente os comportamentos do professor, seria como descerebralizar o ensino. Por isso, os processos de pensamento aparecem, então, como meio privilegiado de aumentar a nossa compreensão, do como e do porquê, do comportamento.

Do Paradigma Ecológico ao Paradigma dos Processos Mediadores

Figura 2 – Modelo de pensamento e acção do professor de Clark e Peterson (1986)

Para mostrar como as diversas partes da literatura sobre o estudo do processo de pensamento do professor se relacionam umas com as outras e como o estudo destes processos complementam o largo corpo de investigação da eficácia do ensino resultante do paradigma anterior, Clark e Peterson (1986) desenvolveram o modelo do pensamento e acção do professor.

O modelo é constituído por dois grandes domínios: Os processos de pensamento do professor e as acções do professor e seus efeitos observáveis (figura 2).

Ao nível das acções do professor e dos seus efeitos observáveis, a grande distinção deste modelo com o clássico Processo – Produto, reside no facto de não haver uma direccionalidade, mas sim um ciclo: Comportamento do professor - comportamento dos alunos - Consecuções dos alunos.

Moreover, rather than representing the direction of causation as linear, we think that it is more accurate to represent the direction

Limitações e condições Acções do professor e efeitos observáveis Processos de pensamento do professor

Revisão da Literatura

Esta representação circular assenta na possibilidade dos comportamentos dos professores serem influenciados pelos comportamentos dos alunos e pelas suas consecuções, assim como o comportamento daqueles por estas.

Ao nível do processo de pensamento dos professores, três grandes categorias são consideradas: planeamento do professor (pensamentos pré-activos e pós-activos); pensamentos interactivos do professor e decisões; teorias e crenças dos professores. Estas categorias reflectem mais uma conceptualização dos investigadores do processo de pensamento dos professores, do que uma caracterização empírica do domínio, porque até à data, a investigação sobre os processos de pensamento dos professores foi dirigida para esses três maiores tópicos.

As primeiras duas categorias, representam uma distinção temporal, quer o processo de pensamento ocorra durante a interacção na aula ou antes, ou depois, dessa interacção. A terceira categoria, representa a armazenagem de conhecimento que os professores têm, que afecta todas as outras: as teorias implícitas, concepções e crenças, representando as proposições e convicções que os professores defendem, bem como as imagens e os valores que estes transportam para a actividade docente (representando proposições mais gerais, como as teorias pedagógicas perfilhadas, as representações de sucesso educativo, o conhecimento sobre o conteúdo de ensino, ..., estas representações são parte integrante do seu repertório pedagógico-didáctico).

The third category, teachers’ theories and beliefs, represents the rich store of knowledge that teachers have that affects their planning and their interactive thoughts and decisions (Clark e Peterson, 1986:258).

Para Januário (1996), as relações entre as 3 categorias do modelo de Clark e Peterson podem ser perspectivadas como a figura 3 sugere, em que a primeira

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categoria é representada como uma zona cinzenta influenciando os restantes processos. Concepções e teorias implícitas Decisões de planeamento ou interactivas Decisões interactivas Decisões pós-interactivas

Figura 3 – Relações entre as categorias dos processos de pensamento dos professores do modelo de Clark e Peterson (Januário, 1996)

O modelo fundamenta-se na ideia de que os processos de pensamento do professor respeitam às cognições e às tomadas de decisão, querendo significar que, muito do que o professor faz depende da forma como concebe, como pensa e como decide (Januário 1996). Portanto, a relação entre o que o professor faz e o que o professor pensa, parece assumir uma força maior, pela influência que podem ter um no outro.

Teachers’ actions are in a large part caused by teachers’ thought processes, which then in turn affect teachers’ actions. However, we contend that the process of teaching will be fully understood only when these two domains are brought together and examined in relation to one another. (Clark e Peterson 1986:258)

Revisão da Literatura

Januário (1996) diz acreditar que esta ligação entre pensamento e comportamento é uma via promissora para a compreensão do processo de ensino-aprendizagem, permitindo encontrar os significados da conduta docente.

Esta relação entre processos mentais, julgamentos e decisões, nomeadamente interactivas, e os seus efeitos, seu valor, ou pertinência na condução do ensino e da aprendizagem, constitui, para Rosado (1997), uma área de estudo a explorar pela pesquisa em Pedagogia.

1.5. O Paradigma dos Processos Mediadores ou Paradigma do