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Os Sistemas de Observação

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2. Os Sistemas de Observação

Nesta perspectiva de estudo do processo de ensino, particularmente quando se pretendem conhecer melhor os comportamentos, as intervenções e as interacções entre o professor e os seus alunos, a observação tem constituído o método preferencial de colheita de dados com vista a uma representação tão fiel quanto possível dessa realidade, ao permitir que se processe nas condições naturais da actividade.

De facto, de acordo com Pieron (1986a; 1996), as precauções a tomar na definição dos acontecimentos a observar, bem como o treino dos observadores, fazem da observação um método de colheita de dados que apresenta um rigor científico muito aceitável.

Para estudar actividades como o ensino, tem a vantagem de apresentar uma validade ecológica, porque se processa nas condições naturais da actividade, que não é garantida pelos estudos efectuados com base em testes, questionários ou grelhas de avaliação. Todavia, é necessário estar consciente dos seus limites pois, ela é selectiva e parcial (Postic, 1979; Pieron, 1986a), isto é, não pode apreender, ao mesmo tempo, todos os aspectos da realidade pedagógica e, por isso, vai fornecer representações específicas de segmentos dessa realidade.

A observação pode ser efectuada ao vivo ou em diferido. Na verdade, o registo audiovisual das lições veio trazer um importante avanço à análise de ensino, pois hoje podemos guardar as fitas em bases de dados em vídeo, mais conhecidas por

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Para além deste aspecto, as vantagens da observação em diferido (Altenberger e Grobing, 1978; Pieron, 1986, 1986a; Sarmento, 1988), de possibilitar a observação o número de vezes que se quiser, permitir parar a imagem, favorecer o controlo preciso da duração dos acontecimentos a observar, utilizar sistemas de observação cada vez mais complexos, treinar, afinar e aferir os observadores, e permitir a análise multidimensional dos acontecimentos ou comportamentos, levam a que cada vez seja a mais utilizada. No entanto, a observação ao vivo comporta, igualmente, algumas vantagens interessantes, como permitir melhor sentir o contexto no qual decorre a aula ou o ambiente que a envolve, ser mais apropriada para observar situações mais complexas e de alta inferência, como a disciplina ou o entusiasmo do professor, reduzir consideravelmente a intrusão que pode constituir o aparato das filmagens na aula e, mesmo assim, apresenta a fidelidade necessária, quando efectuada com observadores treinados.

A análise do ensino, nesta óptica, tem sido efectuada com a ajuda de sistemas de observação. Um sistema de observação é, para Dussault (1973), um instrumento que permite observar, nomear, descrever, classificar, quantificar e, eventualmente, interpretar os diversos fenómenos observáveis na aula.

De acordo com o autor, todos os sistemas possuem quatro características fundamentais:

- Permitem apenas o estudo de um, ou de alguns aspectos particulares do fenómeno complexo que é o ensino, e mesmo que possam fornecer uma imagem fiel da realidade, essa imagem não será mais que parcial;

- Encarnam uma facção particular de ver a realidade da classe; - Têm a forma de um conjunto de categorias;

- E fraccionam os acontecimentos observados, para fins de classificação e análise.

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- São mais descritivos que avaliativos;

- Tratam as coisas que podem ser medidas e repartidas em categorias;

- Ocupam-se de comportamentos ou de acções limitadas, e não de conceitos genéricos.

Podemos identificar, de acordo com Cheffers (1978), dois tipos de sistemas de observação:

- Os sistemas indutivos - os que se materializam, tomam forma e se constróem, depois da realização de várias observações e, portanto, resultam da observação. Exemplo: o registo anedótico, os incidentes críticos, a análise de diálogo, ...

- Os sistemas dedutivos - aqueles em que as observações se efectuam por seu intermédio, isto é, são pré-existentes e, portanto, são construídos antes da observação se processar. Exemplo: os sistemas de análise de conteúdo, de análise do produto, ou os sistemas de categorias.

Postic (1979) diz a este propósito, que é possível construir um sistema de observação pelo uso, quer de categorias, quer de sinais, mas os comportamentos fundamentais, que ocorrem mais frequentemente, serão registados num sistema por categorias. A concepção da observação objectiva, tal como se apresenta nas investigações Americanas, é dominada pelas teorias behavioristas ou comportamentalistas. O método de construção dos instrumentos de observação supõe, relativamente à opção behaviorista, a enumeração de comportamentos determinantes, categorias de respostas e de estímulos discernidas e classificadas a partir do recenseamento dos dados observados directamente na situação, do seu tratamento estatístico, e em seguida, da preparação de procedimentos de observação desses comportamentos determinantes.

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Estes procedimentos, a que Pieron (1986a; 1996) e Siedentop (1983a; 1998) chamam de afinação do sistema de observação, começam pela definição conceptual dos comportamentos a observar, isto é, cada comportamento ou categoria comportamental é definida de uma forma clara e tão objectiva quanto possível, para que possa facilitar a tarefa do observador na classificação comportamental. Depois de definidos, eles são ilustrados de exemplos que permitam passar de um universo teórico à realidade prática e que esclareçam algumas dúvidas que possam surgir na classificação e identificação dos comportamentos a observar. E, finalmente, pela verificação da fidelidade e da validade do sistema.

Ao longo dos anos, os pesquisadores em assuntos educacionais desenvolveram e refinaram numerosos instrumentos destinados a medir os comportamentos dos professores e dos alunos. Os sistemas de Flanders, Hough, Hughes, Medley e Mitzel, Hugley e Rife, Joyce, De Landsheere e Bayer, Amidon e Flanders, Amidon e Hunter, Amidon, Withall, Bellack, Bales, Medley, ou Honigman, têm sido frequentemente citados como os mais utilizados e conhecidos para a pesquisa do ensino1. Alguns destes sistemas são conhecidos pelo nome do seu autor ou pelo nome que este lhe atribuiu, como é o caso do Flanders Interaction Analysis

System (FIAS), de Flanders, o Observational System for Instructional Analysis, de

Hough, o Provo Code for the Analysis of Teaching, de Hughes, o Observation

Schedule And Record (OSCAR), de Medley e Mitzel, o Verbal Interaction Category System (VICS), de Amidon e Hunter.

Para observação do ensino da Educação Física começaram por ser utilizados alguns destes sistemas de análise, com particular relevância para o FIAS, mas, tal como afirmam Pieron e Drion (1977), e mais tarde Pieron (1985a), o sistema de Ned Flanders era largamente inadaptado ao estudo das actividades físicas.

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Na realidade, por razões óbvias, que se prendem com o contexto em que decorrem as aulas desta área disciplinar e com as características próprias das mesmas, quanto mais complexa for uma acção, quanto mais dinâmica for, e mais pessoas estiverem a actuar ao mesmo tempo, mais difícil se torna a observação sistemática e o registo (Pieron, 1998, 1992). E, no fundamental, é isto que distingue as situações da sala de aula regular, das situações da aula prática de Educação Física, onde são observáveis mais actos e, por consequência, mais formas de comportamento têm que ser registadas.

Por isso, começaram por aparecer e ser utilizadas algumas versões que se constituíam como versões modificadas do FIAS, das quais, algumas das mais conhecidas são, sem dúvida, o Cheffers Adaptation of Flanders Interaction

Analysis System, mais apelidado por CAFIAS (Cheffers, 1983), o Observation System of the Analysis of the Classroom Interaction, de Hough (Pieron e Drion,

1977; Pieron, 1985a), ou o Physical Education Interaction Analysis System, também designado por PEIAS (Tavecchio e al., 1977). A partir daqui, e procurando dar conta da realidade específica da Educação Física, começaram a ser elaborados e desenvolvidos sistemas específicos para a observação do ensino das actividades corporais2.

Hoje, temos à disposição sistemas de observação dos mais gerais e, por isso, adaptáveis a qualquer área disciplinar, aos mais específicos, que nos possibilitam a análise dos mais pequenos pormenores, específicos ao estudo do ensino de uma determinada disciplina, dum determinado tema e até, de uma determinada componente programática, ou a análise de uma competência, habilidade ou destreza de ensino particular.

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Existem sistemas de observação sequencial, que nos permitem apreciar um comportamento ou um acontecimento de cada vez, numa sequência de observações, e sistemas de análise multidimensional, que nos permitem observar cada comportamento (ou acontecimento) sob várias perspectivas, sob diferentes pontos de vista, sob diferentes dimensões de análise.

No entanto, a realidade do ensino é extremamente complexa. As interacções na aula constituem um processo muito complicado. As variáveis que o influenciam são tantas que tornam o seu estudo muito difícil e, por isso, certos dos seus aspectos não foram ainda tocados pela investigação contemporânea. Assim, mesmo que utilizássemos simultaneamente todos os sistemas presentemente disponíveis para descrever um dado período de ensino, a imagem que nos daria tal descrição, por mais fiel que fosse, seria certamente uma imagem incompleta. Por isso, nenhum sistema que se proponha identificar e classificar as variáveis da situação pedagógica pode pretender dar conta do conjunto dos seus aspectos fundamentais. Eles oferecem uma visão parcial da realidade pedagógica. Cada sistema resulta sempre de uma opção (Dussault, 1973; Pieron e Drion, 1977; Postic 1979; Pieron, 1984a, 1986a; Carreiro da Costa, 1984, 1988; Rosado 1988).

Os sistemas de observação de que dispomos para analisar o ensino, para além desta sua função fundamental, como instrumentos de pesquisa com vista à identificação de diferentes tipos de comportamento de professores e alunos e dos modelos de interacção estabelecida, encontram uma aplicação muito importante como controladores das estratégias de ensino e como feedback no treino dos professores.

O desenvolvimento tecnológico, a par do desenvolvimento conceptual, tem permitido a construção de sistemas de observação cada vez mais complexos e cada vez mais específicos, de forma a podermos observar situações tão específicas como: o modo como os professores gerem o tempo de que dispõem para dar as

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principais funções de ensino; os comportamentos de reacção à prestação dos alunos; as situações de ensino criadas pelos professores; e o comportamento dos alunos.