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AO ESTADO NOVO NAS DÉCADAS DE 60 E

2. O político

É como «católico, lúcida e convictamente católico»10, que Manuel Clemente o define. Desta sua essência decorrem a sua vida e a maneira como interveio na cidade.

A primeira reflexão que se nos oferece decorre do contexto familiar em que nasceu, onde encontramos as linhas mestras que o terão marcado e orientado as opções que tomou.

«Quando reparamos atentamente nos nomes que avalizam várias iniciativas religio- sas, devocionais, apostólicas, caritativas, sociopolíticas mesmo, é-nos fácil estabelecer uma série de vinculações familiares. Um caso entre muitos, o da descendência de Pombal, é sintomático: o quarto11 marquês é nome certo no associativismo católico de meados do

século; o marechal Saldanha, neto do ministro de D. José, igualmente, até por escritos; Teresa de Saldanha12 fundará nos anos 60 as dominicanas portuguesas; D. António de

7 D. António da Costa – Ao meu paiz. Lisboa: Typographia Universal, 1980, p. 20. [Disponível também em http://purl.pt/6585].

8 D. António da Costa sofria de reumatismo grave e de distúrbios oftalmológicos e gastrointestinais. 9 D. António da Costa – Ao meu paiz, p. 23.

10 Manuel Clemente – Religião e ensino no debate oitocentista, p. 65.

11 Supomos tratar-se de um engano: será o quinto marquês, Manuel José de Carvalho Melo e Daun de Albu- querque Sousa e Lorena (1821-1886), e não o quarto, uma vez que este último morreu em 1834, cf. Helena Ribeiro de Castro – Teresa de Saldanha: um projecto pedagógico inovador no século XIX, uma interrogação

para o século XXI. Lisboa: FCUL, 2007. [Tese de doutoramento, policopiada; também disponível em http://

repositorio.ul.pt/handle/10451/1518].

12 Teresa Rosa Fernanda de Saldanha Oliveira e Sousa (1837-1916). Segunda filha dos terceiros Condes de Rio Maior. Em 1859, fundou, com algumas amigas, a Associação Protectora de Meninas Pobres que promoveu e sustentou a educação / instrução de milhares de raparigas que, de outro modo, não teriam tido acesso à escolarização; em 1868, fundou a Congregação das Irmãs Dominicanas de Santa Catarina de Sena, em que ingressou em 1887.

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Almeida13 reuniu em 1871 o primeiro congresso católico português; outro sobrinho do

marechal, D. António da Costa, destacava-se na mesma altura como pedagogo e apologista católico... (...) a causa católica pode ser sustentada por tradições familiares consistentes e (...) estas tradições conseguiram prolongar uma fé militante, mesmo quando mudou o quadro político e apesar das eventuais diferenças entre parentes.»14

Acrescente-se a esta lista, já longa, um dos irmãos da mencionada Teresa de Saldanha, filha do 3.º Conde de Rio Maior15 primo irmão de D. António da Costa: D. José de Saldanha16, figura proeminente dos Congressos Católicos de Lisboa em 1881 e 1882, candidato pelo Porto, com o Padre Sena Freitas, às eleições de 1884 pela União Católica Portuguesa e às administrativas do Norte em 1895 pelo Centro Católico17.

Partilhamos da convicção expressa por Manuel Clemente no texto citado, como noutros, de que as redes familiares, sobretudo no que significam de sobre- vivência das raízes da fé pela manutenção da tradição religiosa contribuíram largamente para a reconstrução18 do catolicismo no que respeita à sua teorização e igualmente à sua prática «numa sociedade que se descobria como campo de testemunho e debate»19. Haverá porventura, diríamos em linguagem mais popular, um certo espírito de família que desempenha papel de escola onde se apreendem os princípios e a militância se assume como valor de coerência que parece reflectir-se, pois, em modos semelhantes de entender e viver conceitos fundamentais.

Assim, parece que, nesta família, não há outro modo de ser cristão que não seja militante, activo e interventivo em todos os meios em que cada um se move, desde a vida pessoal à profissional e implicando a política e a acção social na dupla vertente de pensar e empreender soluções e, simultaneamente, de denunciar as injustiças. Não há lugar à indiferença: importa olhar permanentemente para o

13 António do Santíssimo Sacramento Tomás de Almeida e Silva de Saldanha (1821-1900), conde pontifício. Pelo lado materno, neto do 1.º Conde de Rio Maior e sobrinho do Duque de Saldanha.

14 Manuel Clemente – A vitalidade religiosa do catolicismo português, 2002, p. 112-113.

15 João Maria do Sacramento de Saldanha Oliveira Juzarte Figueira e Sousa (1811-1872). Par do Reino (1826-1872). Governador Civil de Coimbra em 1854. Por duas vezes, Presidente da Câmara de Lisboa. Liberal e anticlerical. Terá tido ligações à maçonaria.

16 José Luís de Saldanha Oliveira e Sousa (1839-1912). Formado em Matemática e Filosofia pela Univer- sidade de Coimbra. Foi investigador em Paris. Desenvolveu trabalhos nas áreas da química, mineralogia e metalurgia. Dirigiu a Casa da Moeda. Foi deputado eleito em duas legislaturas. Destacando-se pela sua inteligência e pelos seus dotes de comunicador, deixou publicados diversos estudos científicos e discursos políticos, alguns de carácter apologético. Entre outros: Escravatura Branca; Da necessidade da liberdade de

associação religiosa em Portugal; A questão operária.

17 Cf. Manuel Braga da Cruz – Os católicos e a política nos finais do século XIX. Análise Social. XVI: 61-62 (1980) 259-270.

18 Cf. Manuel Clemente prefere utilizar o termo «recomposição» (cf. Manuel Clemente – A vitalidade religiosa do catolicismo português, 2002).

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que se passa à volta, procurar informação, identificar os problemas e procurar-lhes solução de acordo com as capacidades pessoais e áreas de influência, seja homem ou mulher, criança, jovem ou adulto.

Braga da Cruz afirma que os católicos, enquanto grupo, não conseguiram equilibrar as preocupações social e política fazendo com que «as intervenções no domínio político se tenham revelado ineficazes, porque desprovidas duma base no domínio social, e as iniciativas desencadeadas a nível social não tenham conseguido resultados de relevo por lhes faltar a correspondente política indispensável»20. Mas também é certo que a recomposição de um movimento católico, de que fala Manuel Clemente21 se foi esboçando a partir da intervenção mais saliente ou mais silenciosa dos membros destes grupos familiares e das interacções que, a partir deles, se estabeleceram com outros, como que refazendo o tecido social do próprio catolicismo português.

É neste «esteio de militância multigeracional»22 que enquadramos D. António da Costa: comungando do modo familiar de entender a missão que lhe compete e a caridade que a move.

No seu livro O cristianismo e o progresso23, D. António apresenta o cristianismo como um imenso progresso, sendo o progresso humano, por seu lado, «a lei da civilização»:

«Melhorar o homem, melhorar o maior número, melhorar todos os homens, eis o pendão da nova ideia. O grande elemento da renovação social não nos parece que deva ser outro senão o desenvolvimento da liberdade baseando-se no evangelho; a mais vasta exten- são dos progressos políticos e sociais aliada à mais vasta extensão dos progressos morais.»24

O Homem, a humanidade, constitui «uma família de irmãos»25 em que todos são livres e imortais. Por isso, «O cristianismo só poderá ter a felicidade de ver coroada a sua obra quando se despedaçarem os grilhões do último escravo no mundo.»26

Neste sentido, urge situar a missão do cristão tendo, como matriz, a caridade. Caridade e não apenas beneficência, que o autor considera «um instinto natural no homem já civilizado: a caridade é mais, é uma virtude. A caridade transformou o necessitado em Deus»27.

20 Manuel Braga da Cruz – Os católicos e a política nos finais do século XIX, p. 270. 21 Cf. Manuel Clemente – A vitalidade religiosa do catolicismo português, 2002. 22 Cf. Manuel Clemente – A vitalidade religiosa do catolicismo português, 2002.

23 Cf. D. António da Costa – O cristianismo e o progresso. Lisboa: Imprensa Nacional, 1868. 24 D. António da Costa – O cristianismo e o progresso, p. 148.

25 D. António da Costa – O cristianismo e o progresso, p. 17. 26 D. António da Costa – O cristianismo e o progresso, p. 23. 27 D. António da Costa – O cristianismo e o progresso, p. 99.

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«A caridade, levada pelo cristianismo a esta imensa altura, não é só para o pobre, é também para o rico. Uma condessa, uma duquesa, carece às vezes de mais misericórdia do que a última das suas criadas; uma rainha necessita de mais caridade do que o mais humilde dos seus súbditos. A caridade é dos ricos e dos pobres, dos grandes e dos pequenos, transpira de todas as acções, é uma palavra que se diga, um segredo que se guarde, uma ideia que se pense, é de todos, é tudo. A caridade é a esponja do coração: quantos mais bens espreme, mais bens lança de si.»28

Por isso, para D. António, também «De classe nenhuma é feudo a heroicidade»29. Na sociedade, «todos têm uma parcela de dever e de responsabilidade»30. Compre- enda-se que o conceito de missão se aplica, então, neste contexto, a todas as classes sociais. Reconhecemos, neste modo de pensar, o que encontramos nos escritos do núcleo familiar mais restrito do seu primo, o Conde de Rio Maior, particularmente de sua mulher e de seus filhos. Num relatório da Associação de Nossa Senhora Consoladora dos Aflitos, a que presidia, escreve a Condessa de Rio Maior31:

«Deus Omnipotente, na sua suprema justiça e infinita misericórdia, dizendo-nos e obrigando-nos a acreditar que perante Ele todos os homens são iguais, permitiu, porém, neste mundo uma grande desigualdade de posição e de fortuna. Deus, na sua imensa sabe- doria, bem sabia que [d]essa desigualdade (...) provinha (...) o exercício de todas as virtudes, daquela sobre todas que mais eleva o homem, que Cristo veio personificar entre nós, isto é, do amor ao próximo por amor de Deus, da caridade cristã.»32

Por sua vez, D. José de Saldanha, afirma: «queremos que haja relações do ben- feitor e do socorrido; queremos uma protecção afectuosa do rico e do poderoso para com o pobre e para com o oprimido» porque «Não é possível bem servir, não é possível amar, a quem não conhecemos» (1891). Como resposta a quem afirma que a Religião só se ocupa do transcendente «e que a beneficência, ou filantropia, é que se ocupa da felicidade do homem neste mundo, durante a vida.

28 D. António da Costa – O cristianismo e o progresso, p. 102.

29 D. António da Costa – A mulher em Portugal. Lisboa: Companhia Nacional Editora, 1892, p. 23. [Também disponível online em http://www.archive.org/stream/mulheremportugal00costuoft#page/n9/mode/2up]. 30 D. António da Costa – O cristianismo e o progresso, p. 149.

31 Isabel Maria José dos Prazeres de Sousa Botelho Mourão e Vasconcelos (1812-1890). Filha dos Condes de Vila Real. Considerada a mulher mais culta de Lisboa, à época. Distinguiu-se, sobretudo, pela ação social, tendo sido a alma de algumas das mais importantes associações que surgiram no século XIX em Portugal com o fim de mudar o estado de miséria da multidão de carenciados que enchiam as cidades, nomeadamente Lisboa. De entre estas, sobressaem: a Associação dos Órfãos Desvalidos da Cholera Morbus e da Febre Amarela e a Associação de Nossa Senhora Consoladora dos Aflitos. Por causa da primeira viu o seu nome envolvido na Questão das Irmãs da Caridade que mandara vir de França para dirigir o Asilo da Ajuda a pedido da Imperatriz.

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(…) devemos insistir em que a Religião sempre tem (…) em mira a felicidade temporal da humanidade»33. E distingue:

«A caridade vive de dedicação, de abnegação, de sacrifícios, e assim consegue produzir essas admiráveis corporações de caridade, que são a glória, a admiração do mundo. A filantropia quer o bem, mas, levada a isso somente por considerações morais e humanas, quer o bem sem sacrifícios, sem dedicação absoluta, e por isso, para praticar o bem com vantagem, vê-se forçada a recorrer à própria caridade religiosa. (...) A caridade tem sobre a filantropia uma superioridade incontestável.»34

Tal entendimento implica que, como insiste Teresa de Saldanha, «não basta só cumprir a missão para a qual Deus nos chamou; tudo depende da maneira de a exercer»35.

A intervenção política de D. António da Costa ocupou toda a sua existência. Fê-lo através dos seus livros, dos artigos nos jornais mas, também, do seu lugar na Câmara dos Deputados, na forma como geriu o 1.º Ministério da Instrução Pública que Portugal conheceu e na legislação que, a partir desse posto, elaborou.

Algumas das suas publicações possuem um cariz mais elogioso, procurando trazer para a ribalta nomes de pessoas que, escondidas nos recantos das suas áreas de acção, incrementaram de forma, mais que meritória, eficaz, o desenvolvimento das populações locais através da ajuda social ou da fundação e sustento de esco- las. Encontram-se nesse número a de 1884, Auroras da instrucção pela iniciativa

particular e a obra póstuma, datada de 1892, A mulher em Portugal. Desta última

ressalta o cuidado em procurar, na História de Portugal, histórias de mulheres que, ao longo do tempo, contribuíram para a elevação do país.

Outras são, claramente, de cariz político e pretendem afirmar, de forma fun- damentada em estatísticas e leituras diversificadas com origem em Portugal ou no estrangeiro e imbuída das suas convicções religiosas, políticas, pedagógicas, as linhas de orientação que, em seu entender, levariam a nação mais longe. Em todas elas, porém, este desejo se explicita e se esclarece, em maior ou menor número de

33 José de Saldanha Oliveira e Sousa – Da necessidade da liberdade de associação religiosa em Portugal. Lon- dres: s.n., 1891.

34 José de Saldanha Oliveira e Sousa – Da necessidade da liberdade de associação religiosa em Portugal. Nas cartas de Teresa de Saldanha, encontramos, igualmente, diversas situações em que distingue caridade de

filantropia: «Bem pobres estamos, mas é bom isto nas Associações de Caridade e em que se trabalha só por

amor de Deus. Agora se vê (...) a diferença que há entre filantropia e caridade!» (a Maria Augusta Campos, [1876]); «Estou como a mamã sem pachorra para a quermesse. (...) um espírito diferente do nosso, os nomes das barracas, tudo acho filantropia pura» (à Condessa de Rio Maior, 18 Maio [1884]); «Vê-se agora tanta coisa que ataca os nervos. O tal bazar nos jardins do Conde de Burnay, presidindo a Princesa, a favor do hospital das crianças, também acho uma coisa que encanita. Li um artigo no Ilustrado, escrito pela [Guiomar] Torresão, elogiando a C[ondessa] de Ficalho, a sua caridade, faz a descrição do hospital, etc. Filantropia e não caridade» (à Condessa de Rio Maior, 18 Maio 1888).

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páginas. Em todas se sente um certo pendor apologético, de defesa do que D. Antó- nio acredita ser melhor para o seu país. Neste sentido, de todas podemos colher política, afirmação política, orientação política e de políticas, particularmente respeitantes à educação e à instrução enquanto motores essenciais do desenvolvi- mento dos povos, tanto mais necessárias em Portugal quanto mais ignorante sabe ser o povo português.

Podemos, eventualmente, resumir a quatro, as linhas de força da orientação política que defendeu:

– O cristianismo está na base do progresso;

– A elevação do país faz-se pela educação e pela instrução;

– A descentralização do poder é condição indispensável para a boa gestão do país;

– A urgência da instrução do povo exige a criação de um ministério específico. A estas se junta a defesa da igualdade de direitos e deveres entre os dois géneros, que se materializará na paridade da educação dispensada a rapazes e a raparigas, de todas as classes sociais, no acesso ao ensino profissional e ao ensino superior e na assunção de papéis semelhantes na vida profissional e na vida política, ainda que continue a reservar, para cada um, funções próprias directamente derivadas da sua posição na família, associadas à maternidade ou à paternidade36.

Tendo já apresentado atrás a primeira destas linhas da acção e deixando para o capítulo subsequente a segunda, importa que nos detenhamos nas duas seguintes: a premência de descentralizar o poder e a necessidade de criação de um ministério da instrução.

Por oposição à descentralização, que defende, D. António apresenta, como inconveniências do sistema centralizador: a) a falta de unidade nos negócios; b) a impossibilidade de o chefe superior poder estudá-los devidamente; c) a centrali- zação nas mãos do ministro de assuntos insignificantes37. Um assunto que o autor lembra já ter sido discutido e levado à prática na área das obras públicas com a criação de um ministério próprio em 1852 mas que carecia de ser alargado a outros sectores. Recorde-se que este será um assunto recorrente ao longo da história do sistema político português, com evidente alternância nomeadamente na educa- ção, área a que D. António da Costa se refere especificamente. Descentralizando o poder, chama a assumir responsabilidades efectivas as paróquias, os municípios, as instituições locais.

36 Cf. D. António da Costa – A instrucção nacional. Lisboa: Imprensa Nacional, 1870. [Reeditado em fac- símile por Kessinger Publishing, 2010; também disponível em http://purl.pt/147]; IDEM – A mulher em

Portugal.

37 Cf. D. António da Costa – Necessidade de um Ministério de Instrucção Pública. Lisboa: Imprensa Nacional, 1868. [Também disponível em http://www.gutenberg.org/files/32794/32794-h/32794-h.htm]

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Enquanto ministro do governo do Duque de Saldanha, entre Maio e Agosto de 1870, D. António conseguiu pôr em prática o seu desejo e convicção sobejamente defendidos, da criação de um Ministério dedicado, especificamente, à causa da educação pois «não há reformas possíveis no círculo do ensino, principalmente do ensino superior, cuja urgência é por todos reclamada, enquanto essas reformas dependerem do ministério [do Reino] que tem a seu cargo a política interna com todas as complicações eleitorais e locais»38.

«A organização do ministério do reino em Portugal era um estado no estado até há poucos anos. Dizemos estado no estado impropriamente, porque melhor diríamos negação do estado. Negócios, que noutros países constituem quatro ou cinco ministérios diferentes, acumulavam-se, por um fenómeno cuja explicação o país encontrava na carência do pro- gresso, num único ministério, ligado por um chefe superior, que tinha o direito da ciência inata, e presidido por um ministro, que tinha a obrigação de ser enciclopédico. Uma tal estagnação administrativa no centro do movimento das ideias e das justas aspirações dos espíritos era a impossibilidade governativa.»39

E acrescenta a estas razões, as económicas, sustentando que havendo em cada ano «sobras em diversos capítulos do orçamento do estado»40, se elas ocorrerem num ministério cumulativo não serão direccionadas para a educação, o que acon- tecerá se ocorrerem dentro de um ministério que seja, exclusivamente, da educa- ção. Defende, ainda, a criação de um sistema eficaz de inspecção e a diminuição da burocracia, «o nefando reinado da papelada: Mais obras e menos palavras. Não achamos que o país tenha funcionalismo excessivo; o que tem é funcionalismo excessivamente acumulado. Há muitas repartições do estado que dispensariam parte do seu funcionalismo, simplificado o expediente»41.

Mas D. António também se pronunciou sobre outros aspectos políticos da vida social. Realmente, não se escusou a tomar posição sempre que considerava ser seu dever fazê-lo. Tal foi o caso da discussão em torno do casamento civil, aquando do debate que antecedeu a aprovação do Código Civil42, a propósito do qual, em 1865, brindou Alexandre Herculano com três «respostas» que tornou públicas.

Provavelmente poderemos, ainda, vir a encontrar, nas atas da Câmara dos Deputados, as intervenções de D. António da Costa na sua condição de deputado eleito pelo círculo de Leiria no final da década de 50, a propósito dos diversos

38 D. António da Costa – Necessidade de um Ministério de Instrucção Pública, p. 9. 39 D. António da Costa – Necessidade de um Ministério de Instrucção Pública, p. 3. 40 D. António da Costa – Necessidade de um Ministério de Instrucção Pública, p. 9. 41 D. António da Costa – Necessidade de um Ministério de Instrucção Pública, p. 12.

42 O Código Civil foi aprovado e promulgado em 1867 e ficou conhecido como Código de Seabra por ter sido o Visconde de Seabra (António Luís de Seabra e Sousa, n. 1798 – + 1895) a encabeçar a sua elaboração. Vigorou até 31 de Maio de 1967.

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assuntos tratados nessa sede, certamente mais alargados. Não duvidamos de que todo o pensamento construído, todo o conhecimento produzido, nessa e noutras funções, terão estado na base do que foi escrevendo e publicando, especialmente em datas posteriores.

3. O pedagogo

«Foi um erro o não se considerar a instrução popular uma das obras mais esplêndidas do evangelho. (…) O legado derradeiro deixado aos apóstolos foi a recomendação do ensino universal: “Ide ensinar a verdade a todas as criaturas”; e como se num curto preceito quisesse encerrar a lei toda, deixou como fórmula das obras de misericórdia: “ensinai os ignorantes”. (…) só a um extravio dos princípios cristãos se pode atribuir o não ter a caridade portuguesa colocado a escola popular na mesma altura em que aliás colocou o socorro às demais desgraças sociais»43

É, pois, da própria essência do Evangelho que parte a necessidade de os cristãos se dedicarem à educação. Corresponde à aceitação, como coisa sua, do legado deixado pelo próprio Cristo aos apóstolos: «Ide e ensinai» (Mt 28,19-20) 44.

Não deixa de ser interessante que D. António da Costa, como quem quer repor