• Nenhum resultado encontrado

O Princípio da Universalidade dos Direitos dos Homens.

1. A Evolução dos Direitos do Homem.

1.6. O Princípio da Universalidade dos Direitos dos Homens.

Liberdade, igualdade e fraternidade, são direitos conquistados na Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão, que têm seu apogeu na Revolução Francesa e na Americana. A primeira característica que diferencia a Declaração dos Direitos do Homem Francesa da Americana é o fato de a primeira aspirar ser universal, ou melhor, ser uma declaração dos direitos de todos os homens. Seu objetivo é ser uma declaração que alcance toda a humanidade, é o seu caráter universal que

“sensibiliza seus beneficiados e faz tremer, em contrapartida em toda a Europa, as monarquias que circundavam a França” (ODALIA, 2003:164).

A Constituição de 1791, para satisfazer aos pobres, dispunha que é preciso ser construído e aparelhado “um estabelecimento geral de assistência pública para criar

crianças abandonadas, aliviar os pobres enfermos e prover trabalho para os pobres saudáveis que forem incapazes de consegui-lo por si mesmos” (SINGER, 2003:212).

Determinava, também, em outro artigo, a instituição de “um sistema de instrução

pública comum a todos os cidadãos, gratuito com respeito àquelas partes do ensino que são indispensáveis a todos os homens” (p.213).

Assim, surgem os primeiros passos para universalizar os direitos do homem. Entretanto, se por um lado é a partir da assistência pública a todos os indivíduos que o direito vai se expandindo, por outro, os constituintes buscavam meios para reduzir a mendicância, uma vez que achavam “indispensável à ‘ verdadeira prosperidade

nacional’ que sempre haja um número substancial de homens em busca de quem queira empregá-los, pois a inefável mão invisível garante a qualquer um que queira trabalhar algum emprego, ainda que mal ou insuficientemente pago” (SADER,

2003:214).

Marx (1991: 45), ao criticar a Declaração de 1791, afirma que a igualdade é a capacidade perfilhada a todos de possuir e desfrutar egoisticamente do direito de propriedade, portanto é

“Um pouco estranho que um povo que começa precisamente a

libertar-se, que começa a derrubar as barreiras entre os distintos membros que o compõe, a criar uma consciência política, que este povo proclame solenemente a legitimidade do homem egoísta, dissociado de seus semelhantes e da comunidade”.

No dizer de Singer (2003), a Declaração de 1789 avançou ao introduzir nos núcleos doutrinários o direito à vida, à liberdade, à propriedade e à segurança (leiam-se direitos fundados com base no jusnaturalismo), inclusive, o senso de justiça e igualdade. Porém, a Declaração de 1791, com relação aos direitos civis e políticos, não foi generosa com os cidadãos, pois distinguia cidadãos ativos, com todos os direitos, e passivos, com direitos legais e humanos, mas não políticos35

O processo de universalização dos direitos presentes na Declaração tende a difundir um arquétipo único. A universalidade exige que se compartilhe, no sentido da palavra, o direito para todos os homens. A expansão dos direitos de cidadania36 ocorre a partir da interação entre as diversas sociedades com culturas distintas, ao adotarem a Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão de 1789 como “bem

comum” à humanidade.

A universalidade dos direitos, em outras palavras, ocorreu com o desenvolvimento do capitalismo. Essa universalidade dá-se, primeiramente, nos chamados direitos de primeira geração que também são os chamados direitos civis e políticos, ou seja, afirmados como direitos do indivíduo contra o poder do Estado absolutista e surgiram nos séculos XVIII e XIX, respectivamente.

A ampliação dos direitos civis do homem ocorreu, a partir da segunda guerra, fundamentalmente, em dois sentidos: o primeiro, na direção da sua universalização, e o outro, na sua propagação. A universalização tem como ponto de partida a

35

A Assembléia Geral das Nações Unidas, em 10 de dezembro de 1948, instituiu que os direitos políticos e civis fazem parte dos preceitos da Declaração Universal dos Direitos Humanos. Esta, em seu Artigo III, determina: “Todo o homem tem direito à vida, à liberdade e à segurança”. No Artigo XVII, temos no § 1º : “Todo o homem tem direito à propriedade, só ou em sociedade com outros”. No §2º: “Ninguém será arbitrariamente privado de sua propriedade”. Ver em DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 2001. Pp. 72-77.

36

Segundo Barbalet (1989:12), “A cidadania pode ser descrita como participação numa comunidade ou como membro dela. Tipos diferentes de comunidade política dão origem a diferentes formas de cidadania. Estes simples princípios foram anunciados há quase dois mil e quinhentos anos no terceiro livro da obra de Aristóteles. A principal diferença entre a cidadania nas cidades gregas e no moderno Estado democrático é a extensão do âmbito da comunidade política em cada um deles”.

transformação do direito das “gentes”, como ficou conhecido, durante séculos, em direitos dos “indivíduos”, dos indivíduos singulares, os quais, ao conquistarem o direito de argüir o seu próprio Estado, se transformam de cidadãos de um Estado particular em cidadãos do mundo (BOBBIO, 1992: 68).

Como fenômeno social, podemos considerar que é a partir da origem social dos direitos civis, ou melhor, é a partir da análise do processo histórico das transformações societárias e o aparecimento de novos sujeitos políticos de direitos que teremos a base para entender a relação entre o Estado e a sociedade civil.

A universalização ou expansão ocorreu de três maneiras: primeiro, porque aumentou a quantidade de bens considerados merecedores de tutela (passagem dos direitos de liberdade para os direitos políticos e sociais que requer a intervenção direta do Estado); segundo, porque foi estendida a titularidade de alguns direitos típicos a sujeitos diversos do homem (consideração do indivíduo como pessoa para sujeitos diferentes do indivíduo, como a família, as minorias étnicas e religiosas, toda a humanidade em seu conjunto); terceiro, porque o próprio homem não é mais considerado como um ente genérico, ou homem abstrato, mas visto na sua especificidade ou concreticidade de suas diversas maneiras de ser em sociedade, como criança, velho, doente (ultrapassagem do homem como homem para o homem específico).

Nestes termos, o homem é visto na diversidade, com base em diversos critérios de diferenciação, tais como: sexo, idade, classe social, condição física, entre outros. Cada sujeito revela sua diferença entre iguais; o que requer tratamento e proteção desiguais entre iguais (BOBBIO, 1992).

Ressaltamos que o processo de universalização traz uma interdependência: o reconhecimento de novos direitos de (em que ‘de’ indica o sujeito), implica quase sempre o aumento de direito a (em que “a” indica o objeto a que se tem direito).

De acordo com Barbalet (1989:13), universalização da cidadania no Estado moderno é “ao mesmo tempo a marca do contraste das suas realizações e a base das suas

significa que todas as pessoas, como cidadãos, são iguais perante a lei e que, portanto, nenhuma pessoa ou grupo é legalmente privilegiado”. Destarte, a

concessão da cidadania, indo além da divisão social, parece significar a possibilidade prática (real) de indivíduos exercerem direitos legalmente instituídos, o que os torna cidadãos, possuidores de status quo.

Porém, com relação à impossibilidade do exercício (real) da cidadania para aqueles que são desfavorecidos ou estão fora do sistema de status de cidadão, ocorre quando não podem usufruir, na prática, dos direitos de cidadania que legalmente possuem. Esta impossibilidade é dupla, no sentido de usufruto do direito e no aspecto do pertencimento como membro da sociedade a qual faz parte.