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O RECIFE DO TEMPO DA MAXAMBOMBA: NASCE MANOEL

O Recife do século XIX era uma urbe com aproximadamente 80.000 habitantes que passava por importantes transformações. Tendo o algodão e a cana de açúcar como seus principais produtos de exportação, a cidade vinha se firmando como um dos portos mais importantes do Brasil e uma referência como centro exportador. A economia agroexportadora movimentava a capital da província de Pernambuco, que vivia também a expansão da atividade manufatureira e o surgimento da indústria.

As atividades manufatureiras e comerciais estavam concentradas nas freguesias de São Frei Pedro Gonçalves e Antônio Vaz, que também contavam com maior densidade demográfica. Já a região da Boa Vista era o lugar preferido para as novas ocupações residenciais, abrigando os casarões das famílias mais abastadas e proeminentes da sociedade local. A vida da capital tradicionalmente estava centralizada nas delimitações destas três localidades. (DUARTE, 2005). Sem embargo, a economia mais diversificada e dinâmica contribuía para a expansão e diversificação de empregos e atividades, tornando Recife um polo de atração para novos habitantes. Esse incremento populacional forçou os limites da cidade, que começou a deslocar-se em direção aos arrabaldes antes desabitados. A população crescente demandava um crescimento proporcional da oferta de serviços públicos, que nem sempre eram suficientes. Neste cenário, um dos principais problemas que afetavam o Recife era o do transporte, dificultado pelos vários rios e canais que cortavam a cidade.

Pela sua geografia peculiar, Recife não raro era comparado com “a Rainha do Adriático” e terminou por receber a alcunha de Veneza brasileira, que encantava os visitantes estrangeiros com sua beleza. Para

os norte-americanos Kidder e Fletcher3 (1857, p. 513). “[...] the towers and domes of the Recife, or Pernambuco, appeared, like those of Venice, to be gradually raising from the sparkling water”. A primeira visão do porto do Recife já havia impressionado a viajante Maria Graham4 algumas décadas antes. Ela, que levava alguns anos percorrendo a América do Sul, exclamou em seu diário de viagem: “but no previous knowledge could do away the wonder with which one must enter that very extraordinary port.” (CALLCOTT, 1824, p. 163). Depois de conhecer de perto o local que dava nome à cidade, ela concluiu que “the reef is certainly one of the wonders of the world [...]”. (CALLCOTT, 1824, p. 164).

A beleza natural da região era indiscutível. Já as condições materiais da cidade deixavam a desejar, como também registraram vários cronistas. Ruas estreitas e mal cuidadas, os mercados de escravos a céu aberto e as dificuldades de locomoção estavam entre as queixas mais frequentes. No entanto, Kidder e Fletcher (1857, p. 515), que já haviam estado em Recife, notavam alguns avanços:

In all respects Pernambuco is a thriving and a progressive city. Those who remember its former

3 Daniel Parish Kidder (1815-1891) foi um teólogo da Igreja Metodista Episcopal e missionário. Além de obras sobre religião, ele escreveu suas impressões sobre o Brasil em co-autoria com James Cooley Fletcher (1823-1901), um ministro presbiteriano e missionário que viveu no país em diferentes momentos entre 1854 e 1869. Brazil and the Brazilians Portrayed in Historical and Descriptive Sketches publicado na Filadélfia em 1857 foi uma obra pioneira que despertou bastante interesse entre o público norte-americano, o que levou a que tivesse nove edições até 1879, e se tornasse um clássico da literatura de viajantes. Também converteu-se em fonte importante para o estudo do Brasil no período. Gilberto Freyre, por exemplo, menciona em carta para Oliveira Lima que estava lendo “com deleite e proveito” a obra e a utilizaria em sua tese de mestrado Social Life in Brazil in the Middle of the Nineteenth Century. (GOMES, 2005, p. 114–115). 4 Lady Maria Dundas Graham Callcott (1785 – 1842) era inglesa, escritora, tradutora e editora de livros. Como esposa do oficial naval escocês Thomas Graham o acompanhou em sua primeira viagem à América do Sul com destino ao Chile. O marido morreu durante a viagem, porém ela optou por permanecer no Chile. Quando decidiu voltar a Inglaterra em 1823, fez uma parada no Brasil, onde conheceu Dom Pedro I e acabou contratada como preceptora da princesa Maria da Gloria, cargo que ocupou até 1826. Registrou suas impressões das terras que conheceu em livros como Journal of a Residence in Chile during the Year em 1822, Voyage from Chile to Brazil in 1823 e Journal of a Voyage to Brazil, and Residence There, During Part of the Years 1821, 1822, 1823.

unpaved streets and its other inconveniences for comfort and conveyance would now be surprised at the various changes and improvements. Water- works have been constructed, good bridges erected, and extensive quays have been formed on the margins of the rivers [...].

Ainda assim, as melhorias observadas pelos missionários não eram suficientes para acompanhar o crescimento da cidade, que eles definiam já nesta época como uma “grande cidade comercial”. De certa maneira, o caráter ‘comercial’ e o crescimento advindo desta condição obscureciam sua pródiga beleza. “As we drew near to Pernambuco, the warehouses and the shipping presented the features of a large commercial town, and the resemblance between it and the silent Queen of the Adriatic no longer forced itself upon the beholder”, observavam decepcionados. (KIDDER; FLETCHER, 1857, p. 514).

Uma das características mais particulares de Recife era também um dos seus grandes problemas. A existência de diversos rios e estuários dificultava o transporte, que até o terceiro quartel do século XIX foi totalmente dependente da condução fluvial. Baseado no uso de canoas, a comunicação entre Recife e Olinda e os povoados ao longo do Rio Capibaribe estava praticamente nas mãos dos canoeiros, permitindo que estes cobrassem preços abusivos e restringindo o acesso das camadas mais pobres da população ao transporte. (DUARTE, 2005, p. 11).

Com a prosperidade que veio a transformar Recife no mais influente entreposto mercantil do norte brasileiro, vieram as alterações urbanísticas, como novas ruas, aterros e edifícios. As novas pontes representaram um avanço significativo na mobilidade dos habitantes e no transporte de mercadorias e principalmente na capacidade de comunicação da cidade com Olinda e com os povoados próximos. A maior inovação nesta área veio em 1839, quando foi instalado um serviço realizado por carruagens puxadas a cavalos. Estabelecido pelo inglês Thomas Sayle, a diligência, conhecida como ônibus, era uma alternativa aos barcos, mas nunca chegou a ameaçar a supremacia do transporte fluvial. (DUARTE, 2005).

O grande salto definitivo do Recife para a modernidade e rumo ao progresso foi dado apenas em 1863, quando a inglesa Brazilian Street

Railway Company Limited ganhou a concessão para implantar uma

estrada de ferro na zona oeste da cidade. Com isso, a capital “preencheu com qualidade uma lacuna existente nas comunicações terrestres, podendo, assim, acelerar seu desenvolvimento urbano”. (DUARTE, 2005, p.12). A primeira ferrovia urbana em solo brasileiro consistia em

uma pequena locomotiva a vapor e três vagões de passageiros, que ficou conhecida como a maxambomba. O nome pitoresco seria uma “curruptela da expressão inglesa machine pump”. (FRANCA, 1977, p. 233).

A maxambomba foi inaugurada em 1867 e marcou a vida da cidade e seus habitantes profundamente. Ela funcionou até 1914 (alguns ramais permaneceram em uso até 1919), quando foi então substituída pelos bondes elétricos. O sucesso da maxambomba fez com que outras companhias de trilhos urbanos começassem a operar novas rotas no Recife e arredores, movimentou o comércio e alterou hábitos da população. (MARCOLIN, 2007).

Figura 2 - A ponte da maxambomba que ligava o bairro de Santo Antônio ao da Boa Vista

Fonte: Acervo Museu Cidade do Recife (s/d). Reproduzido em DUARTE, 2005. No mesmo ano em que se inaugurava um dos símbolos do Recife moderno, nascia aquele que se tornaria um dos seus cidadãos mais ilustres nas décadas seguintes. Manoel de Oliveira Lima nasceu no Recife em 25 de Dezembro de 1867 na Rua Corredor do Bispo, atualmente Avenida Oliveira Lima5, 813. Na mesma casa na região nobre da Boa Vista passou

5 Nas celebrações pelo seu natalício em 25 de dezembro de 1925 foi inaugurada uma placa comemorativa na sua antiga casa. O Prefeito do Recife, atendendo ao desejo do Conselho Municipal, rebatizou a rua em que nasceu e na mesma ocasião o governo de Pernambuco deu o nome de Oliveira Lima a um grupo escolar na

a etapa brasileira da sua infância e é de lá que guardava as memórias mais remotas. Das recordações “que em breve se fizeram vagas” registradas no seu livro de memórias, Oliveira Lima (1986, p.9) incluía “a campina por traz da nossa casa, onde se erguiam coqueiros e por onde de quando em vez silvava a machambomba”. Recordava ainda os jantares em família, as conversas do pai no jardim, o passeio ao engenho do cunhado nos arredores da cidade e a primeira montaria. Já no outono da vida, concluía que aquelas “impressões esbateram-se com um relevo bastante para que a minha idealização de Pernambuco resistisse a uma primeira visita”. (LIMA, 1986, p. 10). Os apenas seis anos passados em Pernambuco foram fundamentais na formação da identidade de Oliveira Lima. Mesmo tendo vivido a maior parte da vida fora do Brasil, ele sempre se definiu como um pernambucano legítimo, inclusive contra as acusações de “estrangeirismo”. Neste processo de formação identitaria a criação que recebeu teve um peso importante, notadamente do pai português que não admitia que se falasse mal do país que o acolhera na juventude. Gouvêa (1976, p. 43) afirma que “a maior influência transmitida pelo velho Oliveira Lima ao filho Manoel [...] [foi] um grande amor pelo Brasil.”

Manoel era o caçula dos quatro filhos do casal Luiz de Oliveira Lima e Maria Benedicta de Miranda Lima. Ele sempre foi muito discreto sobre sua vida pessoal e mesmo nas suas Memórias é bastante sucinto na descrição de detalhes íntimos e da vida familiar. Conta, entretanto, que o pai Luiz era natural do Porto e chegou a Recife aos 18 anos (1834), onde foi “caixeiro e depois patrão”. Era órfão de mãe e filho de um oficial de repartição “de escassos haveres” que acabou por refinar as maneiras na sua estância com um morgado amigo da família no Douro, para onde foi mandado para fugir da epidemia de cólera. Por seus modos elegantes, que destoavam dos companheiros de profissão, estes o tratavam por “fidalgo”. (LIMA, 1986, p. 6). Luiz é descrito pelo filho como um homem correto e escrupuloso, de modos requintados, que “detestava patuscadas”, “tão limpo que parecia que o pó fugia dele”, que andava sempre enluvado na Europa e era um amante dos livros e da boa música. (LIMA, 1986, p. 6– 7). Com estas características e “predilecções muito britânicas”, Oliveira

cidade de Victoria. (“Oliveira Lima”, 1926). Atualmente no sobrado funciona a sede do Conselho Estadual de Cultura de Pernambuco (fundado em 1967 por Gilberto Freyre, que também foi o primeiro diretor da entidade). Oliveira Lima agradeceu a “gentileza dos [meus] comprovincianos” nas suas Memórias. (LIMA, 1986, p. 8).

Lima dizia que o pai “fazia lembrar o chefe de Família inglesa6". Enfim, aos olhos do filho, Luiz de Oliveira Lima “nascera gentleman, embora não fosse nobre.” (LIMA, 1986, p. 6).

Ainda que demonstrasse satisfação pelos gostos e personalidade tão “britânicos” do pai, Oliveira Lima reivindicava suas raízes luzas com orgulho7. Em seu discurso de posse na Academia Pernambucana de Letras afirmou: “sou filho de português, disto me honro e vanglorio, e meu pai não era pássaro de gaiola”. Na mesma ocasião fez uma defesa daqueles emigrantes de espírito aventureiro que ansiavam por ganhar a vida e se possível tornarem-se abastados “à custa de um trabalho incessante cujos começos eram duros”. (GOUVÊA, 1976, p. 33).

Luiz correspondia perfeitamente ao perfil do emigrante traçado pelo filho. Começou como caixeiro e chegou a dono do negócio. Foi comerciante na Rua da Cadeia no Recife, e embora Oliveira Lima nunca tenha mencionado explicitamente a natureza das suas atividades comerciais, tudo leva a crer que foi muito bem sucedido8. Ele conta que Luiz “não trabalhou longos annos. Logo que reuniu uma modesta fortuna á custa de uma inteligente economia e de uma absoluta probidade [...] retirou-se e edificou a capricho uma vivenda fresca e confortavel". (LIMA, 1986, p. 8). Essa vivenda era a casa da Rua do Bispo onde nasceria o filho caçula e seria seu último endereço no Brasil. A vida em Lisboa também era a de uma família abastada, que proporcionou conforto e até alguns luxos ao filho Manoel, como os veraneios em Estoril e as férias na Inglaterra e na França, além de uma educação apurada. (LIMA, 1986, p. 38). Admirador que era das coisas inglesas, o pai contratou até

6 Refere-se a Uma família inglesa, romance publicado pelo escritor português Júlio Dinis em 1868. Na trama passada na cidade do Porto, o patriarca Richard Whitestone era um “verdadeiro inglês da velha Inglaterra, sincero, franco, às vezes rude, mas nunca mesquinho ou vil, podia tomar-se por uma vigorosa personificação do típico John Bull”. (DINIS; EUSÉBIO, 1991, p. 42).

7 Gouvêa (1976, p. 29) chega a afirmar que a Praieira foi a única revolução libertária a não contar com a simpatia de Oliveira Lima não tanto pelo seu conteúdo ideológico mas possivelmente pelas histórias ouvidas do pai, que como comerciante português no Recife deve ter sofrido suas consequências.

8 Um bom indício de que Luiz de Oliveira Lima gozava de prestígio na sociedade de Lisboa é o número de notas na imprensa local dando condolências pelo seu falecimento em 25 de janeiro de 1890. O pai de Oliveira Lima foi sepultado no Cemitério dos Prazeres em Lisboa e no dia seguinte O Reporter (edição de 27/01/1890) publica nota sobre o enterro e dá a ampla lista de presentes. Muitos dos nomes citados são de brasileiros proeminentes e membros da Sociedade de Beneficência Brasileira. (Pré-scrapbook, OLL).

um tutor chamado Coollingridge, um católico de Liverpool que havia sido mestre dos infantes de D. Maria II. Foi Coollingridge quem proveu o pupilo dos seus primeiros exemplares de Shakespeare, Milton e Byron e contribuiu poderosamente para sua simpatia pela terra inglesa. (LIMA, 1986, p. 54).

Sobre a mãe, D. Maria Benedicta Oliveira Lima, fala ainda menos. Nas Memórias lhe dedica apenas dois parágrafos em que ressalta seus predicados como dona de casa brasileira típica que era, “diligente e esmerada”, daquelas que vestiam os filhos e os escravos, presidiam as comidas e “ainda achavam tempo para formar o espírito dos filhos com licções de uma moral bondosa”. (LIMA, 1986, p. 9). Sobre sua origem, conta que era nascida no engenho Antas, em Rio Formoso, Pernambuco, de propriedade do Marquês de Olinda e na época arrendado ao seu avô.

A união de Luiz e Benedicta foi um exemplo do que observava Gilberto Freyre (2005) quando dizia que no Brasil açucareiro confundia- se o patriarca da cidade com o do campo, muitas vezes pelo casamento. Luiz de Oliveira Lima representava a burguesia mercantil da época e como tal foi capaz de estabelecer laços com o patriarcalismo rural. Essa ligação foi comum no período através do casamento de comerciantes portugueses bem estabelecidos mas sem tradição com moças que representavam a aristocracia rural, herdeiras de engenhos decadentes que, porém, ainda gozavam de prestígio social. Assim, Luiz, um comerciante português que fez fortuna se casa com a sinhazinha filha de uma família do sul de Pernambuco, de recursos limitados, mas aparentada com o ex- Regente do Império, Araújo Lima, Marquês de Olinda9 e logra unir tradição e fortuna novamente.

O casal teve mais três filhos. Luiz, o mais velho, já tinha 21 anos e estava casado quando nasceu o caçula. Ainda assim mantiveram uma amizade fraternal ao longo da vida, embora não compartilhassem os mesmos interesses, exceto o prazer da boa mesa, que consta ser uma característica comum aos Lima, conhecidos na cidade como os Limas Gordos10. Amalia, a irmã do meio, era diferente dos demais membros da família, uma “mulher retraída e quase tristonha” que raramente é mencionada. (GOUVÊA, 1976). A irmã preferida era, sem dúvida, Maria Benedita, conhecida como Sinhá. Inteligente e articulada, ela manteve uma ativa correspondência com o irmão, atuando como conselheira na

9 Por coincidência, Oliveira Lima havia dedicado um perfil biográfico ao Marquês de Olinda no segundo número do Correio do Brazil (1882).

10 Um primo de Flora, José Mariano Filho, faz alusão ao casarão vermelho dos “Limas Gordos”. (GOUVÊA, 1976, p. 38).

vida pessoal e na carreira. Sinhá, apesar da discordância inicial do pai, se casou com Pedro de Araújo Beltrão, político abolicionista que se tornou diplomata e teve grande influência sobre o jovem cunhado11.

Outra figura importante do círculo familiar de Manoel em Pernambuco era o tio e padrinho, Quintino de Miranda12. O juiz de Direito notava seu pendor para a História e encorajava o jovem a seguir sua vocação “philo-bibliográphica” com presentes como uma coleção de revistas do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro e livros sobre a História de Pernambuco. (LIMA, 1986, p. 13). Um destes livros seria especialmente importante para Oliveira Lima. A História da Revolução

Pernambucana de 1817 (TAVARES, 1917) foi republicado pelo

historiador em uma edição comentada comemorativa ao centenário da revolução.

11 Beltrão foi um abolicionista convicto que teve uma atitude pioneira sempre lembrada por Oliveira Lima, especialmente para fustigar Joaquim Nabuco quando suas relações já não eram tão harmônicas. Aos 25 anos e já membro da Assembleia Provincial de Pernambuco, leu um documento em sessão de 1869 em que chamava a escravidão de uma “aberração de todas as leis naturais” e concedia a liberdade de ventre a todas as suas escravas, no que era seguido por seus parentes. E terminava conclamando os verdadeiros liberais a “prestarem seu valioso apoio a tão simpática e santa causa”. Assim, o episódio foi um marco no movimento abolicionista pernambucano e nacional pois o movimento pela liberdade de ventres iniciado ali seria proclamado lei apenas em 1871. (COSTA, 1891, p. 262).

12 Nascido em Pernambuco em 27 de outubro de 1838, Quintino de Miranda formou-se em Direito em 1852 e logo foi nomeado juiz municipal e delegado de polícia em Alagoas. Mais tarde foi juiz de Direito no Rio Grande do Sul, chefe de polícia no Espírito Santo e por fim voltou a Pernambuco em 1864 para administrar justiça na comarca de Olinda. Foi ainda nomeado vice – presidente e chefe de polícia interino em Pernambuco e removido para a vara civil de Recife onde foi elevado a membro do Tribunal de Relação e agraciado com os títulos de Conselheiro e Presidente do mesmo Tribunal. (Necrologia, s/d, recorte no Pré- scrapbook, OLL).

Figura 3 - Cartão postal com a Matriz da Boa Vista no Recife onde Manoel foi batizado

“Muitos parabéns pelo dia de hoje ao menino que há muitos annos se baptizou nesta matriz”.

Fonte: Oliveira Lima Postcard Collection, OLL

A primeira grande viagem na vida do menino Manoel ocorreu quando tinha seis anos, marcando o afastamento, ainda que apenas físico, da família extensa. A ida para Portugal se realizou “por motivo sobretudo de saúde” e o casal Oliveira Lima embarcou com o filho temporão em 1 de abril de 1873 no vapor inglês Nava, em busca do “clima ameno de Lisboa”. (GOUVÊA, 1976, p. 53–54; LIMA, 1986, p. 9). A família vivia com os recursos amealhados no Brasil pelo pai e desfrutava de ótimas condições financeiras e prestígio social. Apesar da distância, mantiveram- se fortes os laços com Pernambuco. Tanto assim que Oliveira Lima considerava que seu “meio de família era estrictamente brasileiro”. As duas irmãs haviam casado com pernambucanos, em Lisboa a “comida [era] temperada ao sabor nacional, sustentado pelas constantes remessas de farinha e gomma de mandioca, de doces, de queijos do sertão, de

pimentas de cheiro e malagueta, avivando o patriotismo” e o pai “sempre prompto a rebater qualquer affirmação em desabono do Brasil”. Até a criadagem foi trazida do Brasil para que seguisse servindo os Lima na Europa13. Tudo isso fez com que o pequeno crescesse “n’uma exaltação intima pelo Brasil”. (LIMA, 1986, p. 11).

Manoel, então, cresceu em Portugal, onde fez todos os estudos. Ainda que o ambiente familiar fosse muito parecido aquele que teria na terra natal, a educação formal que recebeu foi mais requintada do que a que teria tido acesso em Recife. Estudando na Europa, levado pelo pai que, sem ser senador nem grande no Império possuía recursos suficientes, teve uma educação elitista. Inicia seus estudos no Colégio dos Lazaristas e posteriormente passa para a Escola Acadêmica, onde fez os preparatórios para o ensino superior. Do primeiro saiu fluente em francês e farto de cerimônias religiosas. Algumas características suas parecem já estar presentes na infância: o gosto pela boa mesa e a necessidade de expressar suas ideias. No seu relato dos tempos de escola, relembra que