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2. ACERCA DE DANÇA CONTEMPORÂNEA

2.2 Observando contextos: a Grande Modernidade

Neste tópico, será traçada uma reflexão sobre desdobramentos históricos específicos da dança cênica dos Estados Unidos, além deconsiderações acerca do cenário da dança contemporânea independente da cidade de São Paulo. Não há intenção de narrar a história da dança cênica ocidental estadunidense em seus detalhes, tampouco da cena artística paulistana.

O traçado proposto segue a linha de pensamento defendida por Louppe (2012), a respeito da Grande Modernidade, com a finalidade de aprofundar melhor o delineamento a respeito do entendimento de dança contemporânea para a pesquisa, cujo desenho teve inicio no tópico anterior. Como estratégia, propõe-se uma abordagem a partir da observação de três artistas da dança cênica dos Estados Unidos: Isadora Duncan, Merce Cunningham e Yvonne Rainer.

As e os artistas mencionados foram escolhidas (os) levando-se em consideração o impacto de seus atos artísticos, que marcaram rupturas e geraram tendências no pensamento coreográfico em suas respectivas épocas, cujos princípios se enxertaram, em maior ou menor escala, nos modo de fazer e pensar dança contemporânea, nos desdobramentos que se seguiram posteriormente.

A escolha de Isadora Duncan se deve ao fato de Louppe (2012), referência importante desta investigação, eleger a bailarina e criadora como marco inicial da dança contemporânea. Merce Cunningham, por ter iniciado o desenvolvimento de seu trabalho com a criação de pequenos solos e, também, por ser considerado um "artista-passagem" da modernidade para a pós-modernidade na dança cênica dos Estados Unidos. Como espécie de convergência e divergência de gerações.

Por fim, tem-se Yvonne Rainer, dançarina e coreógrafa protagonista de um ato simultaneamente inaugural e de ruptura em relação ao pensamento em dança perpetuado até aquele momento, na dança cênica moderna estadunidense. A escolha da artista também se faz em razão de seu trabalho ter-se tornado uma das referências fundamentais da geração de artistas reunidos na Judson Dance Church, e de ter sido um solo seu, um dos trabalhos emblemáticos dessa época.

Na sequência, um traçado do cenário artístico da dança cênica contemporânea independente da cidade de São Paulo, também a partir de eventos e artistas específicos, será realizado, a fim de ilustrar, parcialmente, o contexto no qual venho me desenvolvendo como artista da dança e como certas instâncias desse cenário dialogam com a dança cênica ocidental euro-estadunidense referenciada.

O percurso apresentado foi planejado com base na hipótese de que o cenário de fragmentação e proliferação dos modos de fazer e pensar dança, que se sucederam na história do desenvolvimento da dança cênica do e no ocidente, culminou em um terreno fértil para que o formato solo de dança se tornasse atrativo para as gerações atuais de dançarinas e dançarinos.

Retomando o pensamento de Louppe (2012), o solo emergiu como um modo de fazer e pensar dança cênica, na dança contemporânea. A autora discorre que o solo, no Balé, consistia em momentos pontuais dos espetáculos. Assim, percebe-se ,nessas peças, a dança solo das personagens protagonistas dessa forma de narrativa em dança, na qual todo o corpo de baile se afasta, reunindo-se ao redor do solista localizado no centro do palco. Grosso modo, o solista no Balé era uma ou um bailarina(o) cujas características e habilidades físicas se adequavam à personagem interpretada e se sobressaíam aos demais artistas.

Será na Grande Modernidade, na perspectiva de Louppe (2012), que o solo como formato autônomo surgirá com o gesto de rejeição ao Balé, realizado por Isadora Duncan (1877-1927). Nos Estados Unidos, uma nação ainda jovem, com um patrimônio cultural e artístico por se construir. Sem uma longa tradição em dança cênica, a exemplo da Europa, o país gozava de uma atmosfera favorável ao movimento protagonizado por Duncan. Desse modo, a artista pôde lançar mão da liberdade necessária, partindo de diversas fontes como literatura e imagens, para a elaboração de uma dança que refletisse melhor sua própria personalidade, extremamente avessa à técnica do Balé, considerado por ela, feio e não orgânico. A artista se encarregou de se tornar porta-voz de novas possibilidades de dançar, que se pretendiam tão legítimas quanto à dança cênica reinante até aquele momento: o Balé. Não por acaso, a dança produzida pela artista é identificada como de autoexpressão.

Autodidata por vocação e contingências, Isadora escapou depressa de um curso de ballet, brigando com tudo e todos desde as primeiras lições. Assim, apenas adolescente, ela se fez professora de uma dança livre, inventado no quintal de casa, e que misturava, de modo aleatório, observações sobre a natureza, paixão pela Grécia clássica e o produto de leituras desordenadas (PORTINARI, 1989 p. 136).

Segundo bibliografias históricas da dança, nascida em 1878, na cidade de São Francisco, nos Estados Unidos, Duncan propôs uma dança conectada à musicalidade, mas não construída a partir de gestuais altamente codificados e estilizados. Interessada em diversos assuntos, a reimaginação de um legado cultural localizado na Antiguidade Grega e a ideia de conexão com as forças da natureza tornaram-se objetos de estudos corporais e cênicos para a dançarina e criadora, não tanto caracterizado por um resgate histórico de manifestações artísticas do passado, mas conduzido por um sentimento de libertação e invenção. Autores relatam que a artista foi muito criticada pela sua falta de

técnica, assim como encontrou respaldo naquele público que se identificava com seu ato de oposição ao Balé, que, por sua vez, estava sintonizada pelo espírito de rejeição à cultura tradicional erudita herdada dos europeus nos Estados Unidos.

Um público entre 1902 e 1913, auge da carreira de Duncan, teria notado uma voluptuosa mulher de cerca de 1,64m de altura, dançando sozinha no palco. Só depois que fundou sua primeira escola em 1904, ela passou a dançar com suas jovens alunas (Jowitt, 1988:70) ao som de Chopin, Schubert, Brahms e Wagner ou, ainda acompanhada por piano ou orquestra (CAVRELL, 2015, p. 100).

Curiosamente, a dança liberta de Isadora Duncan foi mais bem sucedida fora de sua pátria: ganhou reconhecimento, justamente, no Velho Continente, a Europa, onde construiu sua escola, constituiu família e teve sua vida ceifada por um evento trágico. Faleceu enforcada por seu lenço preso na roda de um automóvel em movimento no qual se encontrava.

Com a indicação de Louppe (2012) desse momento histórico, como surgimento da dança contemporânea, parece compreensível a declaração da pesquisadora acerca de como o formato solo incorporou, de modo bem sucedido, o projeto da dança contemporânea, uma vez que solo e dança contemporânea, aqui, nasceram simultaneamente, um atrelado ao outro. De acordo com este raciocínio, a autora dirá que: "Na dança contemporânea, existe apenas uma verdadeira dança: a de cada um" (LOUPPE, 2012, p. 52).

Vista como um ato de rebeldia contra a rigidez técnica do Balé, a dança de Isadora Duncan passou a ser tida, como dito anteriormente, como uma dança de autoexpressão: um ato de liberdade de movimento gestado a partir do corpo peculiar da bailarina.

Refletindo sobre o gesto de ruptura de Isadora Duncan, entende-se o motivo pelo qual Louppe (2012) atribui ao formato solo características que remetem à ideia de atos inaugurais. Nos dias de hoje, entretanto, este ato inaugural não teria de ser necessariamente a instauração de um movimento artístico, mas pode ser a inauguração do trajeto de uma ou um artista. Pode ser um movimento de passagem, um ato de transformação na trajetória desta ou deste artista, como se observa em Louppe (2012):

Na história da dança moderna, quando os grandes mestres sentiram a necessidade de partir do zero para reinventar uma linguagem própria, o solo foi o único meio de testar as suas próprias descobertas e de se testarem a si próprios através delas. O solo foi um laboratório do movimento e do ser, para além dos limites do conhecimento corporal (LOUPPE, 2012 p. 293).

Por meio da observação dos artistas eleitos, em seus atos artísticos de ruptura- inauguração, será percebido que o contexto no qual as e os artistas estão inseridos foi muito importante para que seus trabalhos ganhassem a notoriedade de que desfrutam hoje, tal como foi possível notar, de modo muito breve, de que modo cenário artístico dos Estados Unidos, ainda por tomar forma, favoreceu para que Isadora Duncan, com seu comportamento incisivo, construísse sua dança.

Para este momento da dissertação, é prudente lembrar que os traços realizados são um scaneamento muito superficial acerca da história da dança ocidental estadunidense. Essa história pode ser melhor observada e entendida em obras especializadas disponíveis no mercado e que gozam de comprovada reputação científica. Portanto, é salutar que se considere a dança moderna nos Estados Unidos como um momento de elaboração de modos de pensar e fazer dança peculiares e povoado de artistas tanto quanto, ou mais importantes na construção desse cenário, mas que não serão tratados aqui. A citação de Isadora Duncan se faz necessária, para entender o que Louppe (2012) percebe como potencialidades criativas implicadas no formato solo de dança.

A historiadora e crítica da dança Sally Banes (1980) diz que a dança moderna, nos Estados Unidos, foi construída a partir das particularidades de cada artista e que, para além dos conteúdos subjetivos de suas obras, estas e estes dançarinas(os) e coreógrafas(os) se empenharam em elaborar gestos e movimentos próprios que explicitassem suas inquietações teóricas e temáticas. No entanto, a autora dirá que a dança moderna estadunidense entrou em uma lógica de operação recorrente, alternando- se entre revolução e institucionalização. As e os estudantes, engajados em técnicas específicas desenvolvidas por artistas da dança, tomavam duas direções em relação a essas metodologias: ou aderiam-nas obstinadamente, ou rompiam e criavam novos modos de dançar. A autora nomeia essa lógica daquilo que o crítico de arte, Harold Rosenberg (1959)18 denominou de "tradição do novo", cuja implicação era a possibilidade de que cada dançarina(o) pudesse ser um coreógrafo em potencial. Merce Cunningham realiza uma fala que reflete esse pensamento, ao responder sobre o duplo papel de dançarino e coreógrafo:

Isso é muito comum na dança moderna, simplesmente porque se alguém quer dançar e tem uma ideia não tradicional de dança, tem que criar as próprias

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coreografias, senão ninguém o fará. É uma necessidade prática. Era o único jeito para um dançarino moderno. A tradição no balé é que um coreógrafo crie uma dança para os dançarinos (LASSECHAEVE, 2014, p. 82).

Talvez seja possível observar essa característica relatada por Banes (1980) e por Cunningham em Lassechaeve (2014), como um dos fatores que favoreceu o florescimento do solo como modo autônomo de construção cênica em dança.

O relato destacado corrobora o apontamento feito por Louppe (2012), acerca da vocação laboratorial do solo de dança contemporânea para a(o) dançarina(o), na investigação experimental de movimento, que nos reporta ao ato de ruptura de Isadora Duncan no início da modernidade da dança, na invenção de modos de movimentar-se ainda desconhecidos.

Para Banes (1980), o auge do período de ruptura inaugurado pela dança moderna em relação ao predomínio do Balé como sinônimo de dança cênica ocidental, por quatrocentos anos, foi relativamente curto, seguido por um cenário que se manteve estável em termos de grandes inovações. Entretanto, a autora destaca a figura do dançarino e coreógrafo Merce Cunningham como tendo papel importante nesse período.

Merce Cunningham (1919 - 2009) tem sido considerado, a partir de certas historiografias, como um entremeio de uma geração de artistas modernos da dança cênica dos Estados Unidos e a geração que emergia e marcaria a última fase da Grande Modernidade de Louppe (2012), ou pós-modernidade, na percepção de outros pesquisadores.

Vindo de uma cidade do interior dos Estados Unidos, Cunningham conheceu Martha Graham19, um dos grandes nomes da dança cênica moderna daquele país, durante cursos de verão no Mill College, em Oakland, Califórnia, sendo convidado pela bailarina e coreógrafa a juntar-se a ela em sua companhia, em Nova York. O bailarino e coreógrafo tornou-se um dos artistas principais de Graham, durante o período em que oferecidas pelo American Ballet School, assim como se dedicou a criações próprias em parceria com o músico John Cage.

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Martha Graham foi uma das mais importantes bailarinas e coreógrafas da dança moderna nos Estados Unidos. Estudou dança na Denishawn School e teve o diretor musical, Louis Horst, como um grande parceiro na construção sua obra artística. Sua técnica é extremamente reconhecida por se estruturar no movimento de contraction e release (contração e liberação) e sua obra é reconhecida pela alta carga emocional e temas fortes relacionados a história da findação dos Estados Unidos e a mitologia grega, por exemplo. Influenciou inúmeras dançarinas e dançarinos, coreógrafas e coreógrafos, assim como artista da indústria do entretenimento estadunidense. Ver Cavrell (2015).

Cunningham dedicou-se à realização de várias experimentações corporais em dança, sendo a criação de solos o formato que o ajudou a testar em cena as investigações desdobradas em um pequeno apartamento em Nova York.

Apesar de ter tido aulas de composição com Louis Horst20, revelou que tais modos de criar não lhe interessavam de fato, assim como as ideias trazidas por John Cage acerca de estrutura eram, para o dançarino, "ao mesmo tempo claras e contemporâneas" (LESSCHAEVE, 2014).

Fundamentalmente, Merce Cunningham declara que, naquele momento, pensava que qualquer movimento poderia ser usado para dançar. Cunningham segue na "tradição do novo", da dança moderna descrita por Banes (1980), vai na direção de romper com a linguagem na qual se desenvolveu como dançarino e caminha para criar seu próprio modo de dançar. Entretanto, mantém o padrão de sistematizar seu vocabulário de gestos e movimentos, elaborando uma linguagem e técnicas próprias, que levariam seu nome, e com isso, viria a formar seu próprio séquito. Contudo, seu pensamento acerca da construção em dança é devotado, também a sua incursão e contaminação com uma pujante cultura Nova Iorquina da época. O artista teve a oportunidade de ver obras de artistas visuais, como Max Ernst, Marcel Duchamp e Piet Mondrian, que vinham à cidade naquele período. Além disso, John Cage foi uma parceria muito influente na criação da obra de Cunningham, com seu pensamento acerca de música, que influenciou não só o dançarino, como uma geração de artistas. O impacto do trabalho de Cage na construção da vanguarda artística dos Estados Unidos pode ser verificado em Banes (1980):

Cage foi inspirado pelas ideias teatrais de Antonin Artaud, pelo uso de operações casuais de Marcel Duchamp, e da doutrina de não julgamento do filósofo Zen Hang-po. Cage sintetizou as vertentes vanguardistas do Futurismo (especialmente Bruitisme, ou "noise music") e Dadaísmo para criar a vanguarda americana que gerou novas formas de música, teatro, dança, pintura, poesia, assim como categorias menos definidas de Happenings, Eventos, e Fluxus21

(BANES, 1980, p.10).

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Louis Horst (1884-1964) foi um músico e compositor que teve papel importante na construção da dança moderna dos Estados Unidos, muito reconhecido como grande colaborador da bailarina e coreógrafa Martha Graham por anos, ajudando-a na criação de seu trabalho artístico. No entanto o músico influenciou toda uma geração de artistas trabalhando com dançarinas e coreógrafas reconhecidas desse período como Doris Humphrey e Helen Tamiris. Trabalhou em instituições importantes como o Neighbothood Playhouse, no Bennington School of Dance, American Dance Festival e na Julliard School.

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Cage was inspired by Antonin Artaud's theatrical ideas, Marcel Duchamp's use of chance operations, and the Zen philosopher Hang-po's doctrine of non evaluation. Cage synthesized the avant-garde strains of Futurism (especially Bruitisme, or "noise music") and Dadaism to create an American avant-garde that generated new forms of music, theater, dance, painting, poetry, as well as the less definable categories of Happenings, Events, and Fluxus (BANES, 1980, p.10).

Recordando Louppe (2012), o solo pode ser um momento de passagem para a(o) dançarina(o) na criação de sua própria linguagem, um laboratório em que a(o) artista testa suas capacidades e, portanto, não há como compartilhar com outras(os) o que não sabe ainda, como será. Portanto, não à toa Cunningham se engajou em trabalhar sozinho, baseado no entendimento de que qualquer movimento poderia ser usado para se fazer dança e, mais adiante, de que cada peça de dança deveria ter seu vocabulário de movimentos específicos. O dançarino dizia procurar um movimento que não conhecia e do qual procurava um jeito de fazê-lo.

A respeito do pensamento que construiu as bases da obra do artista, Banes (1980) diz que este fez as seguintes declarações:

1) qualquer movimento pode ser material para uma dança; 2) qualquer procedimento pode ser um método válido de composição; 3) qualquer parte ou partes do corpo podem ser usadas (sujeitas apenas às limitações naturais); 4) música, figurino, cenário, iluminação e dança tem sua lógica e identidade, separadamente; 6) qualquer área do espaço cênico pode ser utilizado; 7) a dança pode ser sobre qualquer coisa, mas é fundamentalmente e primeiramente sobre o corpo humano e seus movimentos, começando com o andar(BANES, 1980, p. 6).

O pensamento sobre dança, defendido por Cunningham, contribui para evidenciar o dançarino como um indivíduo específico na cena, conferindo a cada um o status de solista. O artista descentralizou o espaço com base na frase de Einstein, "não há pontos fixos no espaço", e, a partir disso, relatou: "pensei: com efeito, se não há pontos fixos, todos os pontos são de fato igualmente interessantes e igualmente cambiantes" (LESSCHAEVE, 2014, p. 15). A ideia de que cada elemento, como destacado anteriormente, – música, figurino, cenário e dança – teria sua lógica e identidade, resultava na criação desses componentes isoladamente, sem que cada profissional envolvido na confecção de cada um deles conhecesse as características um do outro. Tais elementos se reuniam no momento da cena.

Merce Cunningham relata para Lessachaeve (2014) que trabalhou sozinho, apesar da parceria com John Cage, na elaboração corporal de sua técnica, nos primeiros dias. Como já mencionado, Cunningham confessou, que, para ele, trabalhar desse modo era algo terrível e por isso teve de desenvolver uma estrutura para se disciplinar a repetir os exercícios explorados, todos os dias.

Nessas investigações, começaram a aparecer mais evidentemente algumas dinâmicas que lhe interessavam, como a articulação das costas com as pernas, com as

quais dizia ter muita facilidade em trabalhar. Ele destaca, também, que tinha uma habilidade rítmica aguçada.

Cunningham admirava Graham, realizava os movimentos de sua técnica, procurava entendê-la, mas confessa que não mostrava um interesse excepcional em absorvê-la com maestria. O mesmo comportamento ocorria no seu engajamento na técnica do balé. Queria entender como funcionava a articulação do corpo em cada modo de dançar, procurando compreender como passar de um passo para outro. Desse modo, declarava que: "O que eu estava tentando descobrir era como as pessoas se movem" (LESSCHAEVE, 2014).

Podemos Observar em Cass (1993) o impacto do trabalho coreográfico desenvolvido por Merce Cunningham na dança cênica dos Estados Unidos. Abaixo o autor ilustra o "antes e o depois" de Cunningham:

Antes de Cunningham, a dança expressava emoções: êxtase, medo, raiva e frustração. Fazia declarações sobre a dignidade humana, a liberdade, a ansiedade e a fraternidade. Era performada por dançarinos treinados para projetar dramaticamente, sentimentos. Depois da aparição de Cunningham, a dança passou a ser para e sobre o movimento. Apresentou corpos treinados sem expressões faciais, se movendo pelo espaço. Descartava todos os ornamentos da arte e mostrava pessoas ordinárias realizando coisas aleatoriamente. Antes de Cunningham, a dança era composta de acordo com os princípios formais. Depois de Cunningham, a dança dispensou temas e estruturas reconhecíveis. O artista trabalhava por meio de tentativas e erros, ou por meio do acaso. Um trabalho artístico podia ser produzido de acordo com fórmulas matemáticas, ou para testar os limites do tempo, do espaço, ou uma ideia. Ele podia ter como acompanhamento o silêncio, quebrado pelos sussurros do público, a música não tinha conexão com a ação, ou palavras ditas pelos próprios bailarinos22(CASS, 1993, p. 345, tradução livre).

Os anos 1960 constituíram um período de grande agitação política, cultural e econômica nos Estados Unidos. Particularmente o ano de 1963, segundo Banes (1999), é considerado um dos períodos cruciais na história desse país, marcada por, entre outros