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5 RESULTADOS E DISCUSSÃO

5.6 Obtenção das Estruturas dos Peptídeos por RMN

Amplamente empregada nos estudos conformacionais e de moléculas orgânicas variadas, a RMN é muito utilizada na investigação estrutural de biomoléculas, como ácidos nucléicos e de peptídeos e proteínas biologicamente ativas. Essa técnica permite estudar a conformação, orientação e topologia de peptídeos ao interagir com membranas biomiméticas, a partir de informações que são coletadas de um conjunto de espectros de RMN (Gomes et al., 2018; Resende et al., 2014; Reis et al., 2018). Neste sentido, experimentos de RMN em solução foram realizados para o peptídeo análogo StigA15 e o peptideo nativo Stigmurina a 2,0 mM em TFE:H2O (40:60%, v/v). A Figura 23 apresenta as estruturas químicas dos

peptídeos.

A atribuição dos sinais de RMN para os espectros 2D, foi realizada pela análise simultânea dos mapas de contornos, empregando-se a metodologia desenvolvida por Kurt Wüthrich (Wüthrich, 1986). Para exemplificar essa estratégia, destaca-se na Figura 24 (pag. 72) os assinalamentos dos sinais referentes às correlações dos resíduos de Ser-3, Leu-4 e Ile-5.

Figura 23. Estrutras químicas das sequências primárias dos peptídeos (A) Stigmurina e (B) StigA15. Em azul são apresentados os resíduos de serina (S) Stigmurina que foram substituídos por resíduos de lisina (K) StigA15.

Fonte: Autor, 2019

Conforme discutido na seção 3.7 (pag. 39), através da análise do mapa de contorno TOCSY é possível verificar as correlações intra-residuais, enquanto o NOESY informa correlações espaciais de curta, média distância e, eventualmente, longa distância entre os núcleos (Fig. 13, pag.41). Os espectros apresentam os sistemas de spins padrões para os resíduos de Ser-3 (HN, HA, HB1 e HB2), Leu-4 (HN, HA) e Ile-5 (HN, HA). A partir da correlação atribuída no mapa de contornos TOCSY (Fig. 24B) entre 4.HN x 4.HA, identifica- se prontamente a correlação equivalente no mapa de contorno NOESY. Observa-se no mapa de contorno NOESY (Fig. 24A), para o mesmo valor de deslocamento de HN, correlação envolvendo outro HA, que é relativa a Ser-3, o que caracteriza uma correlação inter-residual do tipo αN (i, i+1) (4HN.3HA). Correlações de NOE do tipo βN (i, i+1) são ainda verificadas na Figura 24B entre o HN do resíduo Leu-4 os hidrogênios  da Ser-3 (4HN.3HB1 e 4HN.3HB2. Vale destacar que os H da serina apresenta deslocamentos químicos distintos, por estarem conectados a um carbono diastereotópico. Fixando-se na frequência de ressonância de 4HA, chega-se à correlação 5HN.4HA e, a partir da frequência de ressonância de 5HN, chega-se à correlação intraresidual 5HN.5HA, a qual é prontamente reconhecida no mapa de contornos TOCSY. Abaixo é representado uma porção da estrutura química da sequência peptídica StigA15 e as correlações observadas nos mapas de contornos apresentados na Figura 24

Figura 24. Ampliação dos mapas de contornos (A) NOESY e (B) TOCSY da StigA15 a 2,0 mM em TFE-d2:H2O (40:60%).

Para a confirmação dos assinalamentos, uma outra ferramenta importante é o mapa de contorno 1H-15N-HMQC, que correlaciona os valores de deslocamento dos HN, assinalados

no mapa de contornos NOESY com os valores de deslocamento químico de 15N. As Figuras

25 (pag. 74) e 26 (pag. 75) apresentam esse tipo de correlação obtido para a sequência do peptideo StigA15 e Stigmurina, respectivamente.

As Figuras 25A e 26A mostram as regiões características de correlções entre hidrogênios amídicos (NN) no espectro de NOESY, onde o HN do aminoácido correlaciona com o HN do aminoácido vizinho NN (i, i+1). De acordo com as Figuras, é possível observar esse tipo de correlação entre praticamente todos os resíduos da cadeia peptídica da StigA15 e Stigmurina. Embora seja detectado um menor número de conectividade para a Stigmurina, é possível predizer que os respectivos peptídeos adotem conformações bem definidas.

Nas Figuras 25B e 26B são apresentados os mapas de contornos 1H-15N-HMQC, nos

quais foram realizados os assinalamentos de quase todas as correlações entre 1H e 15N, às

exceções das correlações dos resíduos de Gly-11, para a StigA15, e para ambos os peptídeos, o resíduo Phe-1 (grupo amino protonado com cinética de troca muito rápida com hidroxilas do solvente), que não foram detectados no espectro. São ainda destacadas, para os dois peptídeos, duas correlações para frequência de 15N de ~105 ppm, referente aos

acoplamentos entre o núcleo de nitrogênio e os dois núcleos de hidrogênios da carboxamida presente na região C-terminal. Por ser mais básico que a carboxamida, a amina do N-terminal não possui o núcleo detectado. Esse comportamento é esperado em peptídeos que possui N- terminal na sequência, por razões de dinâmica, associada a troca rápida com os hidrogênios do solvente. Nesse sentido, o sinal referente ao primeiro resíduo não é verificado no mapa de contornos do NOESY e 1H-15N-HMQC. Além disso, por ser uma amina terciária, o resíduo de

Figura 25. Ampliação do mapa de contornos (A) NOESY região NN (i, i+1) e (B) 1H-15N-HMQC da StigA15 a 2,0 mM em TFE-d2:H2O (40:60%).

Figura 26. Ampliação do mapa de contornos (A) NOESY região NN (i, i+1) e (B) 1H-15N-HMQC da Stigmurina a 2,0 mM em TFE-d2:H2O (40:60%).

O mapa de contornos 1H-13C-HSQC foi assinalado com base nos deslocamentos

químicos de Hα e Hβ da cadeia lateral dos resíduos identificados nos espectros de TOCSY e NOESY. As Figuras 27 (pag.77) e 28 (pag.78) exemplificam os assinalamentos dos mapas de contornos 1H-13C-HSQC a partir das respectivas ressonâncias nos espectros de TOCSY,

tendo sido possível o assinalamento de todas as correlações Hα-Cα da StigA15 e da Stigmurina. Além disso, com o uso dos espectros de 1H-13C-HSQC é possível diferenciar e

caraceterizar os sistemas de spins de resíduos que apresentam deslocamentos próximos ou ainda sobrepostos em outros espectros, como foi verificado para os pares de resíduos de aminoácidos para ambos os peptídeos Leu-8 e Leu-12, e referente a StigA15 os resíduos Ile- 5 e Lys-14, que apresentaram sinais sobrepostos nos mapas de contornos NOESY e 1H-15N-

HMQC devido às proximidades das frequências de ressonâncias dos respectivos hidrogênios amídicos.

É importante destacar as correlações de núcleos de carbono CH2 em fase oposta

(vermelho) aos carbonos CH e CH3 (preto), presente tanto nas cadeias laterais como no Cα

da glicina. Esses tipos de sinais ajudam no assinalamento das cadeias laterais. As correlações com fase negativa foram observadas para núcleos de CA das glicinas (Gly-10 e Gly-11), CB das serinas (Ser-3, -7 e -14) e o CD1 da Pro-6 no espectro 1H-13C-HSQC, esses resíduos de

aminoácidos foram confirmados devido ao deslocamentos químicos característicos e sinal em fase negativa, como pode ser observado nas Figuras 27B e 28B.

As vizinhanças espaciais entre os núcleos, pode ser acessada pelo mapa de contorno NOESY, sendo que a determinação de um conjunto de interações de NOE para um determinado segmento, possibilita a determinação do tipo de estrutura adotada nessa parte da molécula. Na Figura 29 (pag.79), estão apresentadas regiões do mapa de contorno NOESY onde foi possivel obter um grande número de correlações de NOEs inter-residuais NN (i, i+1), αN (i, i+1) e βN (i, i+1), αN (i, i+2), αN (i, i+3), αβ (i, i+3) e αN (i, i+4) que indica uma elevada estabilidade estrutural dos peptídeos StigA15 e Stigmurina no meio estudado, sendo as respectivas correlações a média distantância, típicas de estruturas em -hélice (Fig. 13, pag. 41) (Wüthrich, 1986). Na Figura 29, referente ao peptideo StigA15, observam-se correlações a média distância, como por exemplo entre os núcleos 9HN.7HA, 8HN.5HA, 9HN.5HA (Fig. 29A) e 8HB1.5HA (Fig. 29C). Além dessas, destacam-se as correlações sequências αN (i, i+1) e βN (i, i+1), como exemplos pode ser citado os núcleos 7HN.6HA (Fig. 29A) e 10HN.9HB (Fig. 29B), respectivamente. Esses tipos de correlações são essenciais para a estruturação e estabilidade da hélice. Comparativamente, observam-se um menor número dessas correlações para a Stigmurina (Fig. 29D e E), além disso, não foi encontrado nehuma correlação de NOE do tipo αβ (i, i+3), logo, é possivel predizer que esse peptideo possui uma estabilidade estrutural reduzida em relação ao peptídeo análogo.

Figura 27. Ampliação do mapa de contornos (A) TOCSY e (B) 1H-13C-HSQC da StigA15 a 2,0 mM em TFE-d2:H2O (40:60%).

Figura 28. Ampliação do mapa de contornos (A) TOCSY e (B) 1H-13C-HSQC da Stigmurina a

Figura 29. Ampliação das regiões de correlação de NOEs no mapa de contornos NOESY a 2,0 mM em TFE-d2:H2O (40:60%) dos peptídeos. StigA15 (A) N (i, i+n) n=1,2,3,4; (B) N (i, i+1) e (C) β (i, i+3) e Stigmurina (D) N (i, i+n) n=1,3 e (E) N (i, i+1).

Após assinaladas as correlações de NOEs, os volumes das mesmas foram obtidos através de integração numérica, sendo esses convertidos em restrições de distância semi- quantitativas, classificadas nas faixas de fortes, médias e fracas, tendo-se retrições máximas de distâncias interatômicas de 2,8, 3,4 e 5,0 Ǻ, respectivamente. As correlações inter-

residuais sequenciais e a médias distâncias típicas de -hélice observadas para os dois peptídeos estão resumidas no diagrama de conectividades de NOEs apresentado na Tabela 8.

Tabela 8. Sumário gráfico de correlações de NOE características de estrutura helicoidal obtidas a partir da análise do mapa de contornos NOESY a 2,0 mM em TFE-d2:H2O (40:60%) dos peptídeos (A)

StigA15 e (B) Stigmurina. As linhas finas correspondem a restrições de distância fracas (entre 5,0 e 1,8 Å), as linhas com larguras intermediárias a restrições de distância médias (entre 3,4 e 1,8 Å) e as

linhas grossas a restrições de distância fortes (entre 2,8 e 1,8 Å).

Esses NOEs são observados em maior quantidade no meio da cadeia polipeptídica, estendendo-se para região C-terminal. A ausência de correlações inter-residuais é encontrada para a porção N-terminal, do primeiro ao quarto resíduo (Tab. 8A) e para a Stigmurina até o sexto resíduo (Tab. 8B), podendo indicar uma menor ordenação estrutural nessa região dos peptídeos. Ressalta-se que, na porção N-terminal, algumas das interações entre oxigênios carbonílicos i com os hidrogênios amídicos do tipo i+4, que estabilizam em grande parte estruturas -helicoidais, são ausentes nessa região (Resende et al., 2008).

Embora as poucas correlações observadas no terminal N para os dois peptídeos, vale ressaltar que foram observadas algumas correlações sequênciais de NOEs envolvendo o terceiro e o quarto resíduo, e esse último com o quinto resíduo para a StigA15, e de média

distância entre o quinto e o sexto resíduo na Stigmurina, o que sugere a existência de um pequeno ordenamento na cadeia peptídica a partir desses resíduos de aminoácidos.

Observa-se claramente na Tabela 8A a presença de correlações de NOEs tipicas de hélice com intensidades fortes, médias e fracas, principalmente correlações do tipo N (i, i+1), N (i, i+2) e  (i, i+3) envolvendo os resíduos Ile-5 a Phe-16. No caso da Stigmurina, apesar da ausência de correlações do tipo N (i, i+2),  (i, i+3) e N (i, i+4), conectividades fracas e médias do tipo N (i, i+1), N (i, i+1) e N (i, i+3) foram observadas envolvendo os resíduos Ser-7 a Phe-16 (Tab. 8B), o que sugere um gau de estruturação envolvendo esses resíduos. Essas correlações espaciais são características de conformação -helicoidal e esses resultados sugerem um elevado teor de helicidade para os peptídeos, como observados nos experimentos de CD, a qual mostrou um elevado teor de hélice em concentração consideráveis em TFE. Vale ressaltar que os experimentos de CD da Stigmurina foram realizados em trabalhos anteriores por Amorim e colaboradores (2019). Além disso, é possível verificar para os dois peptídeos, um maior número de correlações inter-residuais na região C- terminal em comparação com a região N-terminal, revelando assim uma maior estabilidade da hélice nessa porção da cadeia polipeptídica.

A fim de fundamentar os dados das correlações de NOEs apresentado na Tabela 8, foi calculado, com o auxílio do software NMRView, o CSI (Chemical Shift Index) para os núcleos de C (Wishart et al., 1992). Esse cálculo leva em consideração os valores de deslocamentos químicos experimentais, e basea-se na diferença entre os deslocamentos químicos experimentais dos C e os deslocamentos químicos análogos para os resíduos na sequência não estruturada do peptídeo, sendo os resultados apresentados na Figura 30 para os dois peptídeos. Os valores positivos indicam os resíduos que participam do segimento helicoidal, enquanto que valores negativos numa conformação-, e valores próximos a 0 indica uma região não estruturada (Wishart et al., 1992). Os CSI obtidos corroboram os pontos discutidos pelas correlações de NOEs apresentado na Tabela 8, uma vez que a sequência de valores positivos entre os resíduos Ile-5 e Phe-16 sugere que a StigA15 adquire uma conformação favorável em -hélice para esse segmento, enquanto que, os valores positivos obtidos a partir da Ser-7 indicam um fragmento helicoidal bem inferior para a Stigmurina.

Esses resultados de segmentos helicoidais, observadas nos dois peptídeos, estão próximos aos modelos de estruturas secundárias teóricas, obtidas pela análise in silico, conforme discutido no item 5.1 (pag. 54). Além disso, a atividade antimicrobiana expressiva para a StigA15 juntamente com a carga liquida (+4) pode ser expliacada devido a elevada estabilidade estrutural observada em relação ao peptideo nativo, uma vez que características estruturais bem definidas são necessárias para o mecanismo de ação dos PAMs (Travkova et al., 2017; Yeaman & Yount, 2003).

Figura 30. Diferenças entre deslocamentos químicos de Cα experimentais e deslocamentos químicos padrões de C a 2,0 mM em TFE-d2:H2O (40:60%) dos peptídeos (A) StigA15 e (B) Stigmurina. Valores positivos são indicativos de que os resíduos participam de um segmento -helicoidal e valores negativos indicam que resíduos participam de uma conformação-.

A obtenção da estrutura tridimensional dos peptídeos foi realizada via rotina de annealing simulado do Xplor-NIH, tendo sido calculadas 100 estruturas a partir da estrutura estendida. Com o auxílio do software TALOS+ determinou-se as restrições de ângulos diedros obtidas a partir dos deslocamentos químicos de C, C, H, H. Essas restrições angulares, juntamente com as de distância obtidas pelos dados de NOE são cruciais para a determinação das estruturas tridimensionais do peptídeo. Dessas 100 estruturas, as dez mais estáveis foram selecionados para representar o conjunto de estruturas modelo da StigA15 e da Stigmurina na presença de TFE-d2:H2O (40:60% v/v), sendo os resultados apresentados nas

Figuras 31 (pag. 84) e 32 (pag. 85). Observa-se um segmento helicoidal para o peptideo StigA15 muito bem definido do resíduo Ile-5 ao de Phe-16, enquanto para Stigmurina esse segmento se estende a partir da Ser-7. Observa-se também, para os dois peptídeos, segmentos com maiores flexibilidades nas porções N-terminal, o que é concordande com o menor número de correlações inter-residuais nas proximidades do terminal N das cadeias polipeptídicas (Tab. 8, pag. 80). Essa ausência de estruturação no início da sequência é comum a vários peptídeos antimicrobianos, como observado para os quatro primeiros resíduos das filoseptinas -1, -2 e -3 que, coincidentemente, possuem a sequência primária entre o primeiro ao sexto resíduo análoga para os dois peptídeos, diferenciado somente no segundo resíduo (FLSLIP) (Resende et al., 2008).

Uma outra hipótese que deve está relacionada a um número reduzido de correlações de NOEs, resultando numa ausência de estruturação no terminal N para ambos peptídeos é a presença do grupo amina na porção N-terminal, uma vez que estudo realizado por substituição desse grupo por um grupo acetato promoveu uma maior conformação helicoidal nessa porção. Esse é o caso do LyeTxI-b, um PAM de sequência análoga ao LyeTxI, isolado do veneno da aranha Lycosa erythrognatha, popularmente conhecido como aranha de jardim (Reis et al., 2018). A acetilação da amina terminal do peptideo LyeTxI-b, resultou numa

estabilidade estrutural elevada perto do terminal N, devido a remoção da carga positiva, proveniente da amina protonada, que estabilizou a extremidade positiva do dipolo da hélice, e além disso, conferiu interações extra de ligações de hidrogênio envolvendo o grupo acetil e os hidrogênios amídicos próximos da porção N-terminal (Reis et al., 2018). Portanto, além do número reduzido de interações C=O···H–N i+4, essa flexibilidade também parece estar relacionada com a sequência peptídica na porção N-terminal e pode apresentar função relevante para a atividade antimicrobiana, já que é comum a outras sequências.

É possível verificar numa visão vertical (Fig. 31) uma boa distribuição das cadeias laterais dos resíduos de aminoácidos hidrofílicos (verde) e hidrofóbicos (azul) em faces opostas, indicando um forte caráter anfipático dos peptídeos, uma outra similaridade com várias sequências antimicrobianas, como as próprias filoseptinas (Resende et al., 2008). Como já foi dito, a anfipaticidade é uma característica importante de um peptídeo para uma melhor interação com a membrana (Ciumac et al., 2019). Essa característica pode favorecer interações dos peptídeos com a cabeça das estruturas fosfolipídicas carregadas negativamente (polares) da membrana celular e a sua inserção, mesmo que parcial, da face hidrofóbica do peptídeo na interface ou interior da membrana (apolar) (Kumar et al., 2018). Entretanto, apesar dessa similaridade observada para os dois peptídeos, é interessante verficar um segmento de hélice bem definido para a StigA15. Em contrapartida, a Stigmurina apresenta um leve largamento no inicio da hélice, do sétimo ao nono resíduo. Provavelmente, esse fato deve está relacionado com a ausência de algumas correlações tipica de hélice (Tab. 8B, pag. 80), principalmente do tipo N (i, i+2), uma vez que essa distorção está contida nessa porção da hélice.

Contudo, a anfipacidade da StigA15 em conjunto com a alta carga líquida do peptídeo StigA15 (+4) são certamente fundamentais para sua interação com a membrana, conforme caracterizado por espectroscopia de CD e por ITC, fazendo com que esta molécula apresente caracteríticas biotecnológicas interessantes para a tentativa de reverter a situação da resistência microbiana aos antibióticos convencionais.

Os resultados estruturais da StigA15 concordam com os estudos de ITC que demonstraram uma boa interação do peptídeo com meios miméticos de membrana, com a obtenção de constantes de interação da ordem de 10³ em vesícula de POPC:POPG (3:1). Também está de acordo com os estudos biológicos, que demonstram que a interação do peptídeo com os microrganismos provoca a lise celular em concentrações inferiores quando comparado ao peptídeo nativo.

Figura 31. Dez estruturas de menor energia obtidas via rotina de annealing simulado a 2,0 mM em TFE-d2:H2O (40:60%) dos peptídeos (A) StigA15 (sobreposição dos resíduos Ile-5 a Lys-17) e (B) Stigmurina (sobreposição dos resíduos Ser-7 a Lys-17). Cadeias laterais de resíduos hidrofílicos são apresentadas em verde e de resíduos hidrofóbicos em azul. A porção N-terminal aponta para a parte inferior da Figura.

As estruturas de menor energia obtidas para os dois peptídeos são também apresentadas na Figura 32 em uma visão lateral. Pode-se observar uma conformação alfa helicoidal que se estende, para ambos os peptídeos, até o resíduo Phe-16. Apesar das poucas correlações dos núcleos da Lys-17 com os hidrogênios da carboxamida, é possivel observar uma continuidade no segmento helicoidal que se estende até a porção C-terminal. A presença de um resíduo extra de lisina na porção C-terminal na ocelattina-F1 resultou num segmento helicoidal nessa região da sequência peptídica (Gomes et al., 2018), uma vez que a presença de resíduos carregados nas proximidades dessa terminação possibilita neutralizar o dipolo resultante de estruturas helicoidais, resultando em maiores graus de estruturação (Armstrong & Baldwin, 1993).

Outra característica importante associada a esses peptídeos é a existência de uma porção C-terminal amidada. Em alguns estudos, a amidação artificial na posição C-terminal de peptídeos com terminações carboxílicas tem levado ao aumento da atividade de peptídeos antimicrobianos (Katayama et al., 2002), possivelmente devido à neutralização do ânion carboxilato. A remoção da carga negativa na porção C-terminal leva, claramente, a duas consequências e ambas normalmente promovem a atividade antimicrobiana. Primeiramente, a carga negativa resulta na desestabilização de conformações helicoidais, devido a interações

repulsivas com o dipolo negativo em C-terminal e, em segundo lugar, a atividade antimicrobiana é intensificada devido ao aumento da carga positiva total da molécula, que promove interações com a superfície com carga negativa da membrana bacteriana (Dathe et al., 1997; Gomes et al., 2018; Resende et al., 2008).

Figura 32.Dez estruturas de menor energia obtidas via rotina de annealing simulado a 2,0 mM em TFE-

d2:H2O (40:60%) dos peptídeos (A) StigA15 (sobreposição dos resíduos Ile-5 a Lys-17) e (B) Stigmurina (sobreposição dos resíduos Ser-7 a Lys-17). Cadeias laterais de resíduos hidrofílicos são apresentadas em verde e de resíduos hidrofóbicos em azul. A porção N-terminal aponta para o lado esquerdo da Figura.

Na Figura 33 estão apresentados todos os resíduos pertencentes a sequência peptídica. Apesar da presença do resíduo de prolina-6, resíduo que possibilita uma certa desestabilização na estrutura, é possível observar um segmento helicoidal linear. Isso pode estar relacionado com a posição desse resíduo na sequência, uma vez verificado esse resíduo na mesma posição (Pro-6) nas filoseptinas -1, -2 e -3 (Resende et al., 2008), podendo conferir inúmeras correlações de NOEs típicas de hélice, conforme mostrado na Tabela 8, pag. 80.

Além disso, vale ressaltar as substituições das serinas na posição 7 e 14 na sequência da Stigmurina por dois resíduos de lisina na sequência do StigA15. Essas substituições promoveram um segmento de hélice, resultando em uma elevada estabilidade estrutural do peptídeo StigA15, uma vez que a inserção das lisinas em posições adequadas na sequência peptídica pode promover a hélice, bem como a atividade antimicrobiana (Almaaytah et al., 2014; Sato & Feix, 2008).

A estrutura tridimensional da StigA15 e da Stigmurina obtida a partir dos dados de