• Nenhum resultado encontrado

A S P OLÍTICAS P ÚBLICAS E DUCACIONAIS E O C ONSELHO N ACIONAL DE E DUCAÇÃO

O QUE OS ESTUDOS REVELAM

E, por último, a (in)visibilidade científica produzida menos pela ausência de investigações sobre as crianças e a infância e mais pelo tipo dominante de produção de

4 A EDUCAÇÃO COMO DIREITO, AS POLÍTICAS PÚBLICAS EDUCACIONAIS, O PODER JUDICIÁRIO E O CONSELHO NACIONAL DE

4.3 A S P OLÍTICAS P ÚBLICAS E DUCACIONAIS E O C ONSELHO N ACIONAL DE E DUCAÇÃO

No Brasil, a regulamentação de dispositivos constitucionais e de demais políticas educacionais é realizada pelo CNE, pelos CEE e pelos CME – através de pareceres, notas técnicas e resoluções –, e pelos governos – através de leis e decretos –, numa divisão de competências, estabelecidas pela LDB, entre os municípios, os Estados e a União.

Buscou-se em Cury (2006) entendimento sobre o atual Conselho Nacional de Educação (CNE)42, para o qual este é um órgão público de administração indireta do Ministério da Educação MEC , integrante do poder executivo, com composição formalmente adequada, com finalidades claras e com abertura para o controle jurisdicional de suas decisões . Possui funções consultiva, normativa, fiscalizadora e de assessoramento, e deve garantir um direito constitucional da cidadania. Considera a mais importante de suas funções a normativa, a qual deriva do e pelo poder legislativo em harmonia e cooperação com os outros poderes , cabendo ao conselheiro interpretar a legislação, normatizando ou disciplinando assuntos infraconstitucionais, através de

Pareceres43 e Resoluções44. Estes atos devem ter provisão legal e sua intencionalidade é a de executar o ordenamento jurídico que lhe dá fundamento , e, caso não se tenha o devido cuidado, pode-se incorrer em iniciativas pontuais incertas quanto à jurisdicidade constitucional ou legal das mesmas CURY, , p. -44).

A formação de uma vontade majoritária ou consensual do órgão se explicita em torno de sua função normativa. Esta

se faz aproximar da organização da educação nacional para, dentro da lei, interpretando-a, aplicá-la em prol das finalidades maiores da educação escolar. Nesse sentido, a função de conselheiro implica ser um intelectual da legislação da educação escolar para, em sua aplicação ponderada, garantir um direito da cidadania (CURY, 2006, p. 42).

Devido ao caráter genérico das leis, cabe aos regulamentos descer ao detalhe e às prescrições práticas a fim de equalizá-las sem ofendê-las em seus dispositivos CURY, 2006, p. 47). As deliberações e pronunciamentos do Conselho Pleno e das Câmaras, depois de homologados pelo Ministro de Estado da Educação, ganham força de lei, ou seja, tornam-se atos administrativos, sendo procedentes da lei e, no perímetro legal, introduzem normas capazes de impor determinadas obrigações que disciplinam assuntos de competência legal.

Trata-se então de uma norma jurídica subordinada à qual carece o sentido específico de lei que é a novidade modificativa de uma ordem existente. As leis valem por força própria em virtude do mandato popular, já Pareceres e Resoluções existem para dar maior precisão relativa ao conteúdo da lei existente e, portanto, são regrados pelo ordenamento jurídico do país, caso algum deles seja antinômico à lei que lhes dá fundamento de validade. (CURY, 2006, p. 50-51) (Grifo nosso).

Assim, as situações que são objeto de Pareceres e Resoluções devem ser consideradas sob o critério do mérito, da equidade e da justiça. Para Cury (2006), a lei instituiu o Conselho como autoridade para encaminhar, sub lege, o que o legislador não definiu e deixou em aberto . Em Aristóteles, citado por Cury (2006), encontramos que:

...o equitativo é justo, porém não legalmente justo, e sim uma correção da justiça legal... e é essa a natureza do equitativo: uma correção da lei quando ela é

43 Um parecer é um ato enunciativo pelo qual um órgão emite um encaminhamento fundamentado sobre uma matéria de sua competência. Quando homologado por autoridade competente da administração pública, ganha força vinculante.

44 A resolução é um ato normativo emanado de autoridade específica do poder executivo com competência em determinada matéria, regulando-a com fundamento em lei. O Conselho Nacional de Educação, por lei, é um órgão com poderes específicos para expedir uma resolução.

deficiente em razão de sua universalidade (ARISTÓTELES apud CURY, 2006, p. 56).

Continuando com o raciocínio, assevera que a equidade não é uma correção no sentido punitivo ou fiscalizatório, mas de uma aprendizagem que, com o estudo e com a experiência já vivida por outros, propicie um amadurecimento das normas para a melhor qualidade da educação escolar , assim o conselheiro, como um gestor normativo do sistema, necessita de clareza tanto em relação aos aspectos legais quanto em relação aos fatores educacionais e sociais de sua realidade (CURY, 2006, p. 56). Atendendo ao princípio da gestão democrática e considerando a complexidade e diversidade de um país federativo, é necessária a abertura ao diálogo com as pessoas envolvidas ou interessadas – através de audiências públicas –, o estudo de situações da educação escolar e a busca de interpretações que já tenham sido realizadas sobre determinado assunto para ir formando sua posição que será confrontada pela pluralidade dos outros membros. Para Cury (2006), os Pareceres e Resoluções são atos normativos que, sem ultrapassar o limite legal, explicitam ou interpretam uma lei. Regulam situações que exigem certo grau de discricionariedade, ou seja, uma opção, uma escolha entre duas ou mais alternativas válidas perante o direito (e não somente perante a lei), entre várias hipóteses legais e constitucionalmente possíveis ao caso concreto. Essa escolha se faz segundo critérios próprios, como oportunidade, conveniência, justiça, equidade, razoabilidade e interesse público, sintetizados no chamado mérito do ato administrativo. Isso significa que, para o autor, não há nestes atos normativos nenhuma arbitrariedade.

Os Pareceres e Resoluções, por cumprirem um regramento que não poderia estar pontuado para todos os casos e circunstâncias, interpretam a lei diante de casos concretos e arbitram um encaminhamento possível diante de vários possíveis. Nesse sentido, excluídos os casos em que a vinculação é clara porque a lei não deixou opções, estamos diante de situações que exigem um certo grau de

discricionariedade dentro do perímetro da lei (CURY, 2006, p. 51). (Grifos

nossos).

A mudança nas políticas públicas educacionais de ampliação do ensino fundamental para nove anos gerou, nos últimos anos, a judicialização da matrícula no ensino fundamental da criança com seis anos de idade no início do ano letivo , e trouxe diferentes posicionamentos, promovendo o engajamento das famílias, das escolas, dos sindicatos e da mídia. Mostrou-se como foco de tensões no Poder Judiciário e trouxe efeitos diversos na vida das crianças pequenas, bem como, de certa forma, fortaleceu o

debate acerca da criança de cinco anos, da infância e de qual é o lugar e quais as condições mais adequadas para a educação da criança de cinco anos em instituições escolares.

Como demonstrar-se-á no quinto capítulo, dentro do sistema educacional, a assincronia entre as normativas do órgão federal e dos órgãos estaduais e municipais que deveriam normatizar a matéria no limite de suas circunscrições, com uma indefinição, em teoria, de um consenso sobre o que seja início do ano letivo, e, na prática, uma consequente diversidade nas datas de corte, levou a questão aos TJs de todo o país. Os pais estavam buscando garantir, através de Mandados de Segurança, o que consideraram ser uma questão de direito e de justiça.

Em análise de Acórdãos no TJ de Minas Gerais (item 5.4, capítulo 5), veremos que, em grande parte dos Mandados de Segurança impetrados, foi concedida a segurança à matrícula, no 1º ano do ensino fundamental, da criança com cinco anos de idade, independente de data de aniversário.

Na confusão estabelecida, foram matriculadas milhares de crianças com cinco anos de idade no 1º ano do ensino fundamental, independente de uma data de corte, e mesmo, absurdamente, como veremos (item 6.6, capítulo 6), até de quatro anos. O auge da polêmica ocorreu nos anos de 2012 e 2013, conforme Tabela 4, embora não tenhamos até meados de 2015 uma solução satisfatória que vise a uma unificação nacional nesta matéria.

5 A DATA DE CORTE PARA MATRÍCULA NO 1° ANO DO ENSINO