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3.2. Desenvolvimento dos Estudos de Análise de Risco

3.2.1. Os Estudos de Análise de Risco

A análise de risco é um processo sistemático para entender a natureza e deduzir o nível de risco de uma atividade. Ela deve conter a base para a avaliação e a tomada de decisão sobre o gerenciamento do risco.

A análise de risco pode ser elaborada variando o grau de detalhamento dependendo do risco, o propósito para o qual está sendo realizada e a informação, os dados e os recursos humanos e financeiros disponíveis. Pode ser qualitativa, semi-quantitativa ou a combinação de ambas, dependendo das circunstâncias. A análise de risco também é conduzida para identificar as conseqüências adversas.

Segundo a U.S. Environmental Protection Agency – USEPA (2008), a análise de risco fica bem estabelecida se no seu escopo, além do processo de avaliação do risco em si, forem contemplados a comunicação do risco e o gerenciamento do risco.

Para Lammerding (1997), há uma dinâmica que rege as etapas de uma análise de riscos e que faz com que elas não aconteçam de maneira compartimentada ou simplesmente com aplicações seqüenciais, mas inter-relacionadas entre si.

15 Neste contexto deve ser ressaltado que a FEEMA, Fundação Estadual de Engenharia do Meio Ambiente do

Estado do Rio de Janeiro, foi o primeiro órgão ambiental no Brasil a trabalhar na resposta e prevenção de acidentes ambientais, entretanto o órgão ambiental do estado de São Paulo acabou ocupando um lugar de destaque no cenário nacional não só pelos investimentos nesta área como também por se tornar um organismo internacional a ser credenciado pela Organização Panamericana de Saúde (OPAS) para dar treinamentos em outros países da América Latina.

A análise de riscos deve ser descrita e compreendida como algo interativo, visto que requer uma comunicação entre os diversos atores sociais envolvidos na situação em pauta. O termo interativo, nesse contexto, não representa apenas o envolvimento de decisões científicas, regulatórias e legais, mas a concepção de um processo de tomada de decisão que deve ser construído de forma democrática e isto só é possível com o envolvimento de todas as partes interessadas. A Figura 3.2 representa esquematicamente essas inter-relações.

Figura 3.2 – A estrutura da moderna análise de risco

Fonte: Adaptado de Lammerding (1997)

Nesse contexto a estrutura de análise de riscos que será abordada neste trabalho é aquela dotada pela CETESB, que se baseia na metodologia estabelecida pelo AIChE –

American Institute of Chemical Engineers, denominada Chemical Process Quantitative

Risk Assessment – CPQRA, aplicada de acordo com o parque industrial destacado referente

a área de estudo.

Também para este caso vale a estrutura da moderna análise de risco proposta por Lammerding (1997), e como tal é fundamental o conhecimento das interdependências entre os sistemas avaliados, do inventário e das condições do material envolvido.

O risco é considerado uma associação do perigo, é uma propriedade inerente a um material ou atividade, da conseqüência, é o resultado de um evento e da probabilidade de um evento ocorrer.

O risco de um acidente, passível de ocorrer nas instalações perigosas pode, portanto, ser caracterizado quantitativamente como um conjunto formado por três elementos cenário, freqüência e conseqüência.

O cenário de um acidente consiste na composição da ocorrência de um evento iniciador do acidente (causas básicas) e de suas diferentes possibilidades de evolução dependendo do desempenho dos sistemas de proteção, das várias possibilidades de condições atmosféricas no instante do acidente e da presença ou não de eventuais fontes de ignição (em se tratando de um acidente envolvendo produto inflamável).

Os riscos ligados à indústria química podem ser estudados de acordo com o modelo sugerido pelo Center for Chemical Process and Safety – CCPS (1989), como parte do processo de gerenciamento de risco para instalações perigosas. A CPQRA (Análise Quantitativa de Riscos de Processos Químicos) segue o procedimento sugerido pelo CCPS (Center for Chemical Process and Safety), conforme apresentado na Figura 3.3, que pode ser compreendida no contexto da metodologia proposta pela CETESB.

De um modo geral a metodologia para o desenvolvimento de um Estudo de Análise de Risco deve contemplar seis etapas, a saber (SERPA, 2000): a) caracterização do empreendimento e da região; b) identificação de perigos; c) análise de conseqüências e de vulnerabilidade; d) estimativa de freqüência; e) estimativa e avaliação dos riscos; f) proposição de medidas para redução e gerenciamento de riscos, a quais serão descritas a seguir.

a) Caracterização do empreendimento e da região

Nessa etapa deverá ser definido o limite físico e analítico do estudo a ser realizado, no contexto do licenciamento ambiental considerando os sistemas vulneráveis (público interno e externo, meio ambiente e patrimônio).

Figura 3.3 – Análise quantitativa de risco de processos químicos Fonte: CCPS (1989)

b) Identificação de perigos e consolidação dos cenários acidentais

Nessa etapa, são identificados os possíveis perigos que possam ocorrer no empreendimento, que resultem ou possam resultar em danos às pessoas, ao patrimônio e ao meio ambiente, cenários acidentais relevantes, bem como a proposição de medidas preventivas e corretivas.

Para o conhecimento de eventos acidentais que possam ter ocorrido em outras instalações similares, a análise histórica de acidentes, é muito importante, pois mesmo não sendo obrigatória, norteia a seleção dos cenários acidentais relevantes. A análise histórica deverá incluir os acidentes e os incidentes ocorridos no empreendimento de modo a consolidar, de fato, os cenários acidentais identificados reestruturando as medidas de redução dos riscos.

Várias técnicas podem ser utilizadas nessa etapa, sendo que algumas são mais comuns e de maior uso, como a Análise Preliminar de Perigos (APP), a Análise de Perigos e Operabilidade (Hazard and Opeability Analysis – Hazop). Entretanto outras técnicas podem ser usadas como o What if? (E se?), e a Análise de Modos de Falhas e Efeitos (Failure Modes and Effects Analysis – FEMEA), dependendo de cada caso.

c) Análise de Conseqüências e Vulnerabilidade

A análise de conseqüências (efeitos físicos) é a técnica utilizada para determinar a extensão das áreas sujeitas aos vários níveis de danos a partir da definição das hipóteses acidentais oriundas da análise preliminar de perigos.

A determinação dessas áreas deverá ser realizada por meio da aplicação de modelos matemáticos e de simulações para a representação dos cenários acidentais estudados (incêndios, explosões, vazamentos tóxicos etc.).

A Análise de Vulnerabilidade visa identificar a região que pode ser atingida pelos efeitos danosos causados por liberações acidentais. A análise de vulnerabilidade fica bem caracterizada mediante duas perguntas:

2ª. Quais são os limites da área vulnerável a cada um destes efeitos físicos?

A determinação das áreas vulneráveis requer o uso de relações semi-empíricas que correlacionem a intensidade do efeito físico (sobrepressão, explosão, radiação térmica versus tempo de exposição, concentração tóxica versus tempo de exposição etc.) com um dado nível de dano para um percentual das pessoas expostas (ou outros recursos vulneráveis quaisquer).

Como a extensão dos possíveis danos é proporcional à intensidade do efeito físico causador do dano, os modelos de vulnerabilidade devem estabelecer a relação entre a intensidade do efeito físico e o dano correspondente, permitindo obter-se o limite da zona vulnerável a um determinado nível de dano.

A estimativa dos efeitos físicos decorrentes de cenários acidentais envolvendo substâncias inflamáveis deverá ser precedida da elaboração de Árvores de Eventos para a definição das diferentes tipologias acidentais.

A Análise de Árvores de Eventos (AAE) deverá descrever a seqüência dos fatos que possam se desenvolver a partir do cenário acidental em estudo, prevendo situações de sucesso ou de falha, de acordo com as interferências existentes, até a conclusão das mesmas com a definição das diferentes tipologias acidentais.

A AAE é similar à Análise de Árvore de Falhas (AAF), que corresponde à próxima etapa do estudo de análise de risco, em alguns passos. Tal como na AAF, desenvolve-se um esboço da estrutura da análise de eventos com cenários de perigo. Contudo, a AAF apresenta uma árvore lógica orientada verticalmente, enquanto que as árvores AAE os cenários são construídas horizontalmente.

No entanto, de acordo com a complexidade da instalação em análise, pode haver a necessidade de ser utilizada a Análise de Árvores de Falhas (AAF) para a estimativa das freqüências. A AAF é um método sistemático para determinar e exibir a causa de um grande evento indesejável. O método inicia com o topo (ou final) do evento e desenvolve uma árvore lógica, mostrando as causas de evento através do uso de operadores lógicos “e” “ou”.

A análise da árvore de falhas identifica pequenos grupos de eventos iniciadores, resultando no evento principal disposto no topo da árvore. Estes grupos de eventos são chamados conjuntos de pontos mínimos (minimal cut sets). Se cada evento, em um conjunto de pontos mínimos, ocorre, o topo do evento irá ocorrer. A partir destes conjuntos de pontos mínimos, desenvolvem-se as recomendações para minimizar a probabilidade do evento iniciador, reduzindo a probabilidade de ocorrência do evento principal.

Uma árvore de eventos completa descreve o processo em vários estados alternativos de falhas. Se todas as conseqüências e suas falhas forem discriminadas em um documento, para cada conseqüência pode ser dada uma codificação específica, indicando a falha que a originou.

A análise de vulnerabilidade deverá feita por meio da aplicação de equações do tipo

PROBIT (PROBABILIT UNIT), de modo a avaliar os possíveis danos à saúde humana em

termos de probabilidades de ocorrência de fatalidades.

O mapeamento das áreas vulneráveis demonstrando o alcance máximo dos efeitos físicos originados do empreendimento atualmente é feito por meio de uma ortofoto16 atualizada em função do uso e ocupação do solo e circunvizinhança.

Nessa etapa, começa a ser delineado o perfil de risco da instalação a partir do conhecimento e a identificação dos Pontos de Liberação – PL, de onde podem ser originados os eventos acidentais, em função de cada hipótese acidental identificada e, ou, considerada, tendo em vista os possíveis desvios operacionais, atos de vandalismo ou sabotagem.

d) Estimativa de Freqüência

Na estimativa de freqüência (de ocorrência dos cenários acidentais) são identificados os principais eventos que podem ocasionar falhas e, portanto, resultar na

16 Uma ortofoto é uma imagem fotográfica que foi retificada diferencialmente para remover qualquer

distorção de geometria (posição e inclinação) e deslocamentos devido ao relevo. As principais vantagens são: a) A ortofoto não está pré-interpretada como um mapa. Isto dá oportunidade ao usuário de extrair as informações desejadas a qualquer momento. b) A qualidade da ortofoto é a mesma de um mapa com a vantagem da riqueza de dados apresentados. c) Fornece ao usuário uma visão do terreno muito mais compreensível que um mapa.

ocorrência de efeitos adversos à saúde humana, meio ambiente e a propriedade. Esta etapa do Estudo de Análise de Risco constitui-se, portanto, na estimativa de probabilidade de os eventos estudados ocorrerem.

Para os cenários acidentais, cujos efeitos físicos possam causar impactos à população externa, deverão ser estimadas as freqüências de ocorrência dos eventos iniciadores para posterior estimativa dos riscos. A freqüência esperada de ocorrência de um cenário é referida a um dado intervalo de tempo, normalmente considera-se o período de um ano, de modo que o risco seja obtido em uma base anual.

e) Estimativa e avaliação dos riscos

Esta etapa envolve a estimativa e a avaliação dos resultados obtidos. O risco é definido como o produto da probabilidade de ocorrência do evento identificado pela magnitude da conseqüência.

Sendo o risco uma função que relaciona as freqüências de ocorrências de cenários acidentais e suas respectivas conseqüências em termos de danos ao homem e ao meio ambiente, pode-se com base nos resultados quantitativos obtidos nas etapas anteriores, estimar o risco de um empreendimento.

O cálculo do risco imposto por um empreendimento deve ser realizado a partir da

seguinte equação:

= =

=

1

.

j i j i

C

f

R

onde:

fi = freqüência de ocorrência do evento i;

Cj= conseqüência j associada ao evento i; normalmente expressa em termos de mortes.

O risco calculado deve ser comparado com critérios previamente definidos para avaliação quanto a sua tolerabilidadeou não e a definição de medidas a serem implantadas para a sua redução, caso necessário.

Nesse contexto duas grandezas devem ser estimadas: o risco social e o risco

individual. O risco individual expressa a probabilidade de fatalidade ou um dano sério

por ano de exposição de um indivíduo localizado a uma certa distância da fonte. O risco

individual deverá ser representado por meio de Curvas de Iso – risco também em uma

ortofoto atualizada indicando o uso e ocupação do solo e circunvizinhança de modo a

demonstrar a distribuição geográfica real do risco. O risco social, por outro lado, se refere ao risco de fatalidade da sociedade como um todo em decorrência de uma operação

anormal de uma instalação ou qualquer atividade humana. Pode-se dizer que o risco

social é referente a um número ou grupamento de pessoas expostas aos danos decorrentes de cenários acidentais.

O risco social deve ser expresso por meio da curva F–N (Freqüência acumulada para N ou mais fatalidades), ou seja, caracterizando o risco para a comunidade exposta, fornecendo a Freqüência acumulada de ocorrência de acidentes com N ou mais vítimas (acidentes com múltiplas vítimas).

f) Medidas de redução e gerenciamento de riscos

Tendo em vista os resultados apontados pelo Estudo de Análise de Risco e as recomendações dele decorrentes, deve-se elaborar um Programa de Gerenciamento de Riscos – PGR.

Como instrumento de gestão o PGR deverá contemplar adicionalmente as seguintes atividades (SERPA, 2000):

Medidas de prevenção:

- Melhoria da qualidade da instalação;

- Aumento da confiabilidade dos sistemas de controle e segurança; - Programas de inspeção e manutenção;

- Programas de treinamento e capacitação técnica.

Medidas de proteção:

- Ações para redução dos impactos de acidentes; - Sistemas de contenção de vazamento;

- Redução do inventário de substâncias perigosas armazenadas; - Sistemas de abatimento de vapores tóxicos inflamáveis;

- Reforço de estruturas para a absorção de impactos de correntes de explosões; - Ações para proteção da população exposta;

- Plano de Ação de Emergência – PAE; - Plano de Comunicação de Riscos – PCR.

Conforme pode ser observado, o Estudo de Análise de Risco apresenta-se como uma ferramenta importante na complementação da avaliação sobre a viabilidade ambiental de um empreendimento, mostrando-se útil para o processo de licenciamento ambiental de atividades perigosas.

Assim, se o Estudo de Análise de Risco for introduzido no processo de licenciamento ambiental, desde o início, ou seja, ainda na fase da Licença Prévia, seus resultados contribuiriam para a tomada de decisão mais racional e efetiva, especialmente onde existam riscos, que depois de conhecidos, avaliados e comunicados, podem ser utilizados como critério fundamental, por exemplo, para a escolha da localização de um dado empreendimento e, principalmente, garantir o mínimo de segurança e de qualidade vida à população.

De modo geral, nos Estudos de Análise de Risco, a ênfase é dada aos efeitos potenciais envolvendo vidas humanas localizadas na área externa à fonte geradora do risco, ou seja, o empreendimento Entretanto, o bom senso recomenda que no processo de geração-exposição-conseqüência do risco, se leve em conta todos os bens vulneráveis: a população concernida (trabalhadores internos, trabalhadores das empresas vizinhas e residentes), o meio ambiente e os bens patrimoniais (internos e externos).