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2.3 O NEO-INSTITUCIONALISMO

2.3.1 Os mecanismos de mudança isomórfica

DiMaggio e Powell (1991) sugerem que as causas da racionalização organizacional têm mudado. Apontam que, segundo Weber (apud DIMAGGIO e POWELL, 1991, p. 63), a burocratização resultava de três causas relacionadas: (1) competição no mercado entre firmas capitalistas; (2) competição entre estados, incrementando a necessidade da existência de agentes reguladores para controlar seus staffs e cidadãos; (3) e as exigências da burguesia por proteção igual por intermédio da lei. Destas três causas, Weber considerou a primeira como a mais importante.

Para DiMaggio e Powell (1991), as organizações estão tornando-se ainda mais homogêneas e a burocracia permanece a forma organizacional comum. Entretanto, atualmente, as mudanças estruturais nas organizações parecem cada vez menos dirigidas à competição ou à necessidade de eficiência. Ao invés disso, consideram que burocratização e outras formas de mudança organizacional ocorrem como resultado de processos que tornam as organizações mais similares, sem necessariamente fazê-las mais eficientes.

Melo (2000) discute o processo de difusão das normas ISO 9000 no Brasil no contexto da abertura econômica ocorrida no início da década de 90. Considera que a adoção das normas ISO 9000 pelas empresas brasileiras, numa certa medida, deveu-se à necessidade de se mostrar respostas rápidas e socialmente legitimadas num contexto de crise, em que pesaram tanto fatores internos como aqueles de ordem externa. Além disso, as campanhas de divulgação feitas pela mídia e os

mecanismos governamentais de incentivo e indução às certificações ISO 9000 também aparecem como fatores importantes que motivaram à adoção das normas pelas empresas. Este conjunto de fatores vai acelerar o processo de difusão das normas no país, muito embora de forma bastante heterogênea.

O fenômeno pelo qual as organizações se estruturam a partir das exigências do seu ambiente é explicado através de práticas isomórficas. Na Ecologia Populacional, verificou-se a existência de práticas de isomorfismo competitivo; na teoria institucional, um isomorfismo institucional, onde a organização reflete uma realidade socialmente construída (MEYER; ROWAN, 1991).

De acordo com DiMaggio e Powell (1991), as organizações adotam modelos normativos e estruturais por meio de quatro formas de institucionalização: (1) a imposição; (2) a normalização; (3) a indução; e (4) o mimetismo organizacional.

(1) A coerção ocorre por meio da imposição de estruturas organizacionais e modelos por meio do poder governamental (DIMAGGIO; POWELL,1991). No Brasil e no Espírito Santo, isto ocorre, por exemplo, com as concessionárias de pedágio que são obrigadas pelo governo a manterem a certificação ISO 9000.

Machado-da-Silva e Gonçalvez (1999) apontam que, na sociedade brasileira, bastante influenciada por modelos estrangeiros, a adoção de uma estrutura formal é mais fácil de realizar por decreto ou lei, do que institucionalizar o correspondente comportamento social. Assim, a adoção de um modelo estranho ao comportamento social poder gerar nas organizações a constituição de “meras fachadas administrativas”. Como as leis antecipam as práticas coletivas, seu aprendizado acaba se tornando lento e penoso.

De acordo com Machado-da-Silva e Gonçalvez (1999) , o Brasil continua a adotar os modelos institucionais dominantes no exterior. Entretanto isto não ocorre de forma tão passiva. Embora os modelos externos sempre tenham exercido fascínio sobre os brasileiros, não se podem ignorar os interesses pessoais daqueles que se encobrem sob o manto do formalismo. A “construção da realidade” ocorre também pela interação entre seus constituintes.

A presença desse traço cultural acentua o mecanismo coercitivo na dinâmica da mudança na sociedade brasileira. Isto implica que as organizações estão sujeitas ao freqüente uso de modelos estrangeiros por imposição legal. “É comum observar, logo após a implementação de uma nova norma, organizações agindo com indiferença ou se adaptando mediante soluções provisórias” (MACHADO-DA-SILVA; GONÇALVEZ, 1999, p. 13). Os autores apontam ainda que a presença de normas escritas, praticamente desconhecidas pelos funcionários ou que não correspondem à realidade, podem ser indicadores da presença do formalismo, o que reflete o apego aos mecanismos de coerção também dentro das organizações.

(2) a normalização pode ser associada à ação das profissões. Origina-se da profissionalização, que é um esforço coletivo de membros de uma ocupação para definir as condições de seu trabalho, para controlar a formação e ingresso dos novos profissionais e para legitimar a sua autonomia ocupacional (DIMAGGIO; POWELL, 1991). Em muitos casos, esta legitimação ocorre principalmente por intermédio do Estado (coerção).

Também pode estar associado às organizações que obtêm legitimidade pela adoção de estruturas, “acreditadas” por uma entidade supra-organizacional (SCOTT, 1987).

Este é o caso das normas ISO 9000 e ISO 14.000 (meio ambiente) e dos prêmios da qualidade.

Motta e Vasconcelos (2002) apontam que freqüentemente num setor institucional se cria um sistema de jogos de poder e pressões que torna “quase obrigatória” a adesão à certificação instituída. Em alguns mercados, a certificação ISO 9000 se torna quase obrigatória para a sobrevivência, o que conduz a algumas “implantações de fachada”.

Nesse sentido, Vasconcelos e Vasconcelos (2001, 2003) analisam a ISO 9000, como fonte de isomorfismo organizacional, sob a perspectiva da Teoria Neo- institucional, por meio do estudo de casos em dois fabricantes de computadores na França. Demonstram que há duas formas para implementar padrões de ISO 9000: um “em profundidade”, preocupado com efetividade organizacional e com legitimidade externa; e um “instrumental”, só interessado em legitimidade externa. Os resultados mostram que resistência para mudar é um fenômeno comum durante a implementação da ISO 9000, e que o programa possui alto impacto nos jogos de poder organizacionais e nas estruturas informais.

Corroborando a pesquisa anterior, Caldas e Vasconcelos (2002), em organizações que implantaram a ISO 9000, constataram que elas poderiam ser divididas em dois grupos com características contrastantes: no primeiro grupo, 54 delas estavam efetivamente engajadas com seus sistemas da qualidade. No segundo grupo, 15 organizações pareciam estar apenas “cerimonialmente” engajados, fazendo o mínimo necessário para obter e manter o certificado. Estas organizações estavam adotando um comportamento oportunista, apenas procurando o benefício da imagem que a certificação ISO 9000 pode lhes trazer.

(3) a indução ocorre em muitos setores institucionais, que não possuem agentes com poder ou autoridade para impor estruturas organizacionais. Entretanto, estes agentes podem estar numa posição que permite induzirem consideravelmente as organizações a adotarem determinados modelos.

De acordo com Motta e Vasconcelos (2002), geralmente os agentes econômicos utilizam estímulos financeiros indiretos a fim de induzir as organizações a adotarem o modelo desejado.

Normalmente, nesse caso o agente financeiro especifica as condições que tornam as organizações aptas a receberem os subsídios, financiamentos ou o reembolso parcial de seus custos. A organização que recebe ajuda econômica deve provar à outra que ela está em conformidade com as exigências (MOTTA; VASCONCELOS, 2002, p. 398).

Um exemplo desta prática, no Espírito Santo, é a Prefeitura de Vitória, que incentivava a certificação ISO 9000 de empresas de desenvolvimento de software até 2002, por meio de incentivo fiscal.

(4) o mimetismo organizacional é provavelmente o processo de influência mais estudado pela análise institucional, e envolve a aquisição, por escolha deliberada, de modelos estruturais pelos atores organizacionais (SCOTT, 1987).

Para DiMaggio e Powell (1991), o mimetismo organizacional é resultante dos padrões de resposta às incertezas. Incerteza é uma poderosa força que encoraja imitação. Quando as tecnologias organizacionais são pobremente entendidas, quando os objetivos são ambíguos ou quando o ambiente cria incerteza simbólica, as organizações podem se modelar em outras organizações.

Motta e Vasconcelos (2002) apontam que, além dos modelos (como as normas ISO 9000), as estruturas organizacionais, os modelos de produção e as ferramentas de

administração desenvolvidas e adotadas pelas empresas líderes do setor são também perseguidos pelas outras empresas.

Essas quatro formas de institucionalização nem sempre se apresentam de forma clara e podem acontecer simultaneamente. As pressões institucionais isomórficas são indicativas da limitação da ação dos atores organizacionais em tornarem as organizações mais efetivas. A inovação deixa de resultar em escolhas bem- sucedidas decorrentes de competências especiais, mas deriva de imposições no campo organizacional. Motta e Vasconcelos (2002) apontam algumas conseqüências destas imposições:

a) a separação entre a teoria e a prática organizacional (decoupling);

b) a política de ignorar a infração à regra; e

c) a cerimonialização de controles e inspeções.

Quanto maior for o grau de institucionalização de modelos e regras em um determinado ambiente ou organização, maior será a cerimonialização dos procedimentos (MOTTA; VASCONCELOS, 2002), tratados como “mitos”.