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7 – PÓS-OPERATÓRIO DA CIRURGIA PARA A DOENÇA AÓRTICA ABDOMINAL

No documento Manual de Cuidados Pós-Anestésicos II (páginas 67-72)

António Augusto Martins, Joana Jesus INTRODUÇÃO

A doença aterosclerótica apresenta-se, a nível da aorta abdominal, na maioria dos casos, sob a forma de doença oclusiva ou aneurismática.

Apresenta uma maior incidência no sexo masculino e associa-se a idade avançada, tabagismo e hipertensão, sendo frequente a história de doença aterosclerótica cardiovascular prévia.

Existem duas abordagens cirúrgicas da doença aórtica: a aberta (laparotomia mediana ou retroperitoneal) e a endovascular (abordagem inguinal, na maioria das vezes, bilateral). A abordagem das regiões inguinais em cirurgia aberta é requerida sempre que existam lesões das artérias ilíacas e femorais que condicionem obstrução ao fluxo.

A cirurgia aberta da aorta abdominal eletiva apresenta uma mortalidade de cerca de 5%, sendo que a principal causa de morte é a falência multiorgânica. As complicações major pós-operatórias podem chegar aos 30% (pulmonares, cardíacas, gastrointestinais e renais).1

Apesar da taxa global de complicações associada à abordagem endovascular ser inferior à aberta (até 10%),2 ainda não se estabeleceu de forma absoluta a superioridade de uma das técnicas em relação à outra.3

1. DURAÇÃO MÉDIA DA CIRURGIA

A duração é de 2 a 4 horas em cirurgia aberta.4 No entanto, é extremamente variável pelas condições anatómicas e extensão das lesões às artérias ilíacas e femorais.

As mesmas considerações são extensíveis para a cirurgia endovascular.

2. DURAÇÃO MÉDIA DE PERMANÊNCIA NA UCPA

A permanência de doentes submetidos a cirurgia aberta da aorta abdominal, sem necessidade de suporte ventilatório, é função do contexto fisiológico em que o doente chega à UCPA, nomeadamente nas condições de normotermia

e hemóstase. Em termos de logística, o doente vascular vai previsivelmente requerer uma maior dedicação de recursos humanos e tempo de internamento alargado por períodos até 24 horas.

Já os doentes submetidos a correcção endovascular podem, segundo alguns autores, ser admitidos em carácter ambulatorial e ter alta até 24h, caso não se verifiquem quaisquer complicações.5

3. GRAU DE DOR PÓS-OPERATÓRIO

Na cirurgia aberta com incisão de laparotomia mediana xifopúbica, e eventual abordagem das regiões inguinais, a avaliação da dor atinge níveis elevados, com ne- cessidade de terapêuticas com opióides sistémicos ou técnicas regionais (epidural).

4. ANALGESIA PÓS-OPERATÓRIA

A analgesia pós-operatória para cirurgia aberta da aorta apresenta-se como um desafio para o Anestesiologista pela necessidade de instituir terapêuticas prontas e eficazes para uma dor de difícil controlo.

Duas alternativas são referenciadas na literatura:

1. A analgesia endovenosa controlada pelo doente (PCA) utilizando fár- macos opióides, segundo os protocolos da instituição.

2. A analgesia regional a. Epidural (com ou sem PCA)

Em artigo de revisão sistemática os autores6 apontam uma diminuição dos eventos cardiorrespiratórios e da duração da permanência na uni- dade de cuidados intensivos, dada a vantagem desta técnica analgésica no controlo da dor. Apesar de tal conclusão, não são referidas dife- renças estatisticamente significativas na mortalidade aos 30 dias. As perfusões de anestésicos locais, em concentrações diluídas, e opióides podem apresentar-se nas concentrações de bupivacaína (0,625 - 0,1%), fentanil 5 - 10 µg/mL a 2 mL/h com administrações pelo doente de 2 a 4 mL e intervalo de segurança de 10 minutos.7

b. Intratecal

A utilização de morfina intratecal (0,2 mg) pode reduzir a necessidade de analgésicos sistémicos no pós-operatório.8

c. Bloqueio do plano transverso abdominal bilateral contínuo Aparenta ser comparável à analgesia por cateter epidural torácico, com redução no consumo de opióides sistémicos em administrações de bupivacaína a 0,375% (1 mg.kg) cada 8 horas. 9

5. MONITORIZAÇÃO/CUIDADOS PÓS-OPERATÓRIOS IMEDIATOS ESPE- CÍFICOS

O nível de monitorização na UCPA deve ser sobreponível ao utilizado durante a anestesia. Para a cirurgia aberta da aorta, para além da monitorização con- siderada standard, são habituais a monitorização da pressão arterial invasiva radial e a pressão venosa central (PVC). De acordo com a patologia do doente, outros meios de monitorização podem ser requisitados como a pressão de encravamento do capilar pulmonar, a ecografia transesofágica, técnicas de avaliação do débito cardíaco ou a oximetria cerebral não-invasiva. A avaliação clínica, instrumental ou laboratorial considerada específica no seguimento destes doentes inclui:7,10

1. Avaliação clínica

2. Avaliação dos pulsos periféricos dos membros inferiores 3. Monitorização do perímetro abdominal

4. Temperatura, coloração e capacidade motora das extremidades inferiores 5. Suspeição de síndrome compartimental (abdominal e membros inferiores) 6. Neurológica

7. Dor

Avaliação instrumental

1. Monitorização peri-operatória do segmento ST do ECG de superfície (trend) 2. Diurese

3. Contabilização das drenagens cirúrgicas 4. Temperatura

Avaliação laboratorial

1. Coagulopatia (testes de hemóstase, tromboelastografia ou tromboelasto- metria; considera-se no pós-operatório imediato “normal” o prolonga- mento do tempo de tromboplastina parcial ativada, pela administração de heparina intraoperatória)

2. Glicemia

3. Hemograma (valores de Hg > 9 gr/dL) 4. Determinação da troponina T e I

6. SINAIS DE ALERTA Alterações da pressão arterial

Hipertensão – tratamento agressivo de acordo com o paciente (inibidores

da enzima de conversão / angiotensina, vasodilatadores, beta e alfa bloqueadores e diuréticos) e excluindo a dor como causa.

Hipotensão – correção da anemia e fluidoterapia Função renal

Alerta especial para tempos de isquemia renal superior a 30 minutos (clam- pagem aórtica supra-renal)

Nefropatia de contraste

Administração de contraste endovenoso em doentes com lesão renal prévia na cirurgia endovascular é um importante aspeto e pode condicionar uma nefropatia de contraste.11 Esta complicação pode, igualmente, surgir em ci- rurgia de aorta aberta ou de revascularização do membro inferior sempre que se utilizem estes contrastes iodados.

A administração de solução isotónica salina (NaCl a 0,9%) ou bicarbonato de sódio 12 horas prévias à cirurgia e nas 12 horas seguintes na taxa de 1 mL.kg-1h-1 é recomendada.12

Função Neurológica

Isquemia e proteção da medula espinhal

A lesão da medula espinhal por isquemia é uma lesão frequente na abor- dagem da cirurgia aberta ou endovascular da aorta torácica (6 a 8%). Não está recomendada por rotina a drenagem do líquido céfalo-raquídeo em cirurgia aberta ou endovascular da aorta abdominal.13

Função Gastrointestinal

A presença de íleos, colite isquémica ou o síndrome abdominal compar- timental (monitorização da pressão da bexiga: normal se < 12 mmHg; > 20 mmHg pode indicar falência de órgãos) são situações potenciais de risco clínico.14

7. CONSIDERAÇÕES ESPECIAIS

Existem terapêuticas que se consideram relevantes pela sua especificidade nesta área cirúrgica:

A. Manutenção da terapêutica beta-bloqueante

B. Reintrodução precoce de estatinas e antiagregantes plaquetares (por exemplo, a aspirina)

REFERÊNCIAS

1. Papia G, Klein D, Lindsay TF. Intensive care of the patient following open abdominal aortic surgery. Curr Opin Crit Care. 2006;12:340–5.

2. Chaikof EL, Brewster DC, Dalman RL, Makaroun MS, Illig KA, Sicard GA,  et al. The care of patients with an abdominal aortic aneurysm: the Society for Vascular Surgery practice guidelines. J Vasc Surg. 2009; 50:S2-49.

3. Jackson RS, Chang DC, Freischlag JA. Comparison of long-term survival after open vs endovascular repair of intact abdominal aortic aneurysm among Medicare bene- ficiaries. JAMA. 2012; 307:1621-8.

4. U.S.National Library of Medicine. Medline Plus.https://medlineplus.gov/ency/arti- cle/007392.htm).

5. Chaer R. Endovascular repair of abdominal aortic repair. Official Topic from UpTo- Date® at www.uptodate.com/store

6. Guay J, Kopp S. Epidural analgesia compared with systemic opioid-based medicines for people undergoing open abdominal aortic surgery. Cochrane DatabaseSyste Rev. 2016: 10.1002/14651858.CD005059.pub4.

7. Caldicott L, Lumb A, McCoy D. Abdominal aortic surgery. In: Caldicott L, Lumb A, McCoy D, editors. Vascular Anaesthesia: a practical handbook. Oxford: Butterworth Heinemann Publishers; 1999. p 169-197.

8. Blay M, Orban JC, Rami L, Gindre S, Chambeau R, Batt M, et al. Efficacy of low-dose intrathecal morphine for postoperative analgesia after abdominal aortic surgery: a double-blind randomized study. Reg Anesth Pain Med. 2006 Mar-Apr;31(2):127-33. 9. Niraj G, Kelkar A, Jeyapalan I, et al. Comparison of analgesic efficacy of subcostal

transversus abdominis plane blocks with epidural analgesia following upper abdo- minal surgery. Anaesthesia. 2011;66(6):465–71.

10. Norris EJ. Anesthesia for vascular surgery. In: Miller R, editor. Miller´s Anesthesia. 8th ed. Philadelphia: Elsevier Saunders Publishers; 2015. p 2106-2157.

11. Guneyli S, Bozkaya H, Cinar C, Korkmaz M, Duman S, Acar T,  et al. The incidence of contrast medium-induced nephropathy following endovascular aortic aneurysm repair: assessment of risk factors. Jpn J Radiol. 2015 May;33:253-9.

12. Weisbord SD, Palevsky PM. Prevention of contrast-induced nephropathy with volume expansion. Clin J Am Soc Nephrol. 2008; 3: 273–80.

13. Erbel R, Aboyans V, Boileau C, Bossone E, Bartolomeo R, Eggebrecht H, et al. 2014 ESC Guidelines on the diagnosis and treatment of aortic diseases: Document covering acute and chronic aortic diseases of the thoracic and abdominal aorta of the adult. The Task Force for the Diagnosis and Treatment of Aortic Diseases of the European Society of Cardiology (ESC). Eur Heart J. 2014;35:2873-926.

14. Cheatham ML, Malbrain ML, Kirkpatrick A, et al. Results from the International Con- ference of Experts on Intra-abdominal Hypertension and Abdominal Compartment Syndrome. II. Recommendations. Intensive Care Med. 2007;33: 951–62.

8 – PÓS-OPERATÓRIO DO DOENTE SUBMETIDO A

No documento Manual de Cuidados Pós-Anestésicos II (páginas 67-72)