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P ROJETOS DE ASSENTAMENTOS RURAIS ORIGINÁRIOS DO MST

Trabalhadores x atividades econômicas

P ROJETOS DE ASSENTAMENTOS RURAIS ORIGINÁRIOS DO MST

Dentre os vários tipos de projetos de assentamentos rurais há os que se originam da luta política do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST). Em sua maioria são iniciados na forma de acampamento, onde as famílias se organizam e se estruturam, a partir da ocupação da terra por elas almejada, como forma de pressionar o poder público para que suas reivindicações sejam atendidas. É nesta fase que acontecem as primeiras discussões sobre como se processará a forma de vida no futuro assentamento, em seus aspectos sociais, políticos e produtivos. Assim, são realizadas as primeiras intervenções sobre como será a distribuição das famílias no espaço físico; quem serão os responsáveis pela coordenação do assentamento; como se processará a produção agrícola, de maneira individual ou coletiva, e assim por diante. É neste momento que o Movimento dá início aos trabalhos de formação da sua base: os acampados.

Para Bernardo Mançano Fernandes (1996), é um espaço que adquire uma série de significados, apresentando um multidimensionamento. Além disso, está sob a custódia do principal movimento social que luta pela terra e pela reforma agrária no nosso território (FERNANDES, 1996). Por isso, apresenta alto teor de organização política, onde seus integrantes procuram lutar pelos seus direitos, pressionando constantemente os detentores do poder (BORGES, 2002). Estão estruturados sob uma ótica própria, sujeitos aos seus princípios, filosofia e postulados. Buscam implementar uma estrutura que prima pela coletividade, pelo bem comum, pela igualdade a todos os envolvidos e pela descentralização do poder, estando calcados sobre princípios democráticos. Dão grande ênfase à divisão do trabalho e ao trabalho coletivo, representado principalmente pela produção agrícola. Procuram formar espaços que apresentem uma estrutura social que promova a participação e o convívio de todos os envolvidos.

Uma peculiaridade dos assentamentos originários do MST é a existência de normas e diretrizes, elaboradas em encontros e congressos pelos integrantes do Movimento, que regem a sua vivência desde o momento de sua estruturação até a sua consolidação, e que devem ser postas em prática por seus usuários. Um exemplo é a cartilha “Construindo o Caminho” (MOVIMENTO DOS TRABALHADORES SEM TERRA, 2001) que sintetiza todos os aspectos referentes às experiências, conceitos, crenças e ideologia. Segundo essa cartilha os debates sobre a maneira de estruturar o assentamento devem começar desde a época do acampamento, sendo combinadas sete ações básicas de atuação, as quais promoverão as ideais condições para a organização do assentamento, e conseqüentemente, da vida que nele se desenvolverá. Essas ações são: controle político sobre o projeto do assentamento e a divisão

da área; o sorteio em grupos de família; o processo de titulação; a organização da moradia; a organização dos núcleos de base; a organização da produção e da cooperação agrícola; a formação política e social.

De uma forma geral, procuram defender a existência de certa padronização. Esta deve ser seguida por todos os assentamentos que se encontram sob a influência da bandeira do MST. No entanto, admitem uma adequação dos postulados e das normas, levando em consideração alguns fatores, principalmente a região do país (suas características culturais, físicas, etc.), a quantidade de pessoas envolvidas, o estado da propriedade desapropriada, entre outros fatores. Cabe aos dirigentes regionais coordenar o debate sobre estas interpretações e adaptações. O MST recomenda que deva haver um apropriado controle político sobre a elaboração do projeto de assentamento.

ORGANIZAÇÃO SOCIAL E POLÍTICA

Os postulados do MST preconizam que suas famílias devem se organizar política e socialmente em núcleos de base, também denominados núcleos de família ou brigadas. Nos assentamentos compostos por de mais de 30 famílias, o Movimento recomenda que haja mais de um núcleo. A forma de divisão das famílias fica a cargo da liderança de cada assentamento, sendo em geral definida por sorteio. Em certas circunstâncias utiliza-se, também, o critério do grau de afinidade entre as famílias.

Significa que cada família acampada deverá procurar outras famílias com as quais se identifica, organizando assim um grupo para que, durante o sorteio, este agrupamento de famílias fique reunido numa mesma localidade no futuro assentamento. Em muitos casos mantém-se o próprio grupo de famílias do acampamento como base para o sorteio. Evita-se, assim, a dispersão das famílias. Entre as famílias, normalmente, utiliza-se o sorteio interno para saber que família fica com qual lote (MOVIMENTO DOS TRABALHADORES SEM TERRA, 2001, p. 75).

O MST considera os núcleos de família como a base da organização social do assentamento. Estipula que dentro de cada núcleo devem existir dois coordenadores, um homem e uma mulher, eleitos de forma democrática pelas famílias componentes. Também são escolhidas pessoas responsáveis por setores dentro do respectivo grupo, como produção, saúde, disciplina, finanças, dentre outros.

Os problemas são discutidos inicialmente no âmbito de cada núcleo de família, para depois ser tratado no contexto geral do assentamento. Entende-se que dessa maneira há maior possibilidade de participação da base assentada, tornando os processos decisórios mais

democráticos e participativos. Assim, as escolhas e tomadas de decisão são feitas em assembléias gerais, devendo ter a participação de todos os moradores. Ao chegar a este estágio, as questões já foram bastante discutidas.

Atualmente, também pode ser observada a figura da Associação, como uma das formas de organização social e política dos assentamentos do MST. Nesta, o poder fica concentrado na figura do presidente. No nível hierárquico inferior, tem-se o vice-presidente, o tesoureiro, o secretário e o conselho fiscal. Neste formato se reproduz o modelo presidencialista, enfatizando a concentração do poder, fazendo com que haja disputas, existindo assentamentos com reduzido número de famílias, mas onde são registradas mais de uma associação.

ORGANIZAÇÃO DO ESPAÇO FÍSICO

Em relação ao espaço físico, de uma maneira geral, os assentamentos originários do MST possuem praticamente as mesmas características inerentes a um assentamento qualquer. São espaços rurais constituídos, na maioria das vezes, por área de preservação permanente (APP); área de reserva legal; área destinada à produção agrícola; vias de circulação (estradas vicinais) e o habitat (BORGES, 2002).

FIGURA 01: PROPOSTA DE PARCELAMENTO DO SOLO PARA O ASSENTAMENTO MARGARIDA ALVES. FONTE: CERQUEIRA, 2002.

ÁREA DE RESERVA LEGAL

ÁREA DE PRODUÇÃO INDIVIDUAL HABITAT

Área de preservação permanente (APP)

Atualmente tem-se um conjunto de leis que trata da questão ambiental no âmbito dos assentamentos rurais. Dentre estas existem as que abordam de maneira mais específica a questão da área de preservação permanente e área de reserva legal. Esta temática também é tratada, porém de modo abrangente, no art. 225 do Capítulo VI (Do Meio Ambiente) da Constituição Federal de 1988. Aparece de maneira mais detalhada no Código Florestal (Lei 4.771, de 15/09/1965); Política Nacional do Meio Ambiente (Lei 6.938/81); Lei de Crimes Ambientais (no 9.605/98); Resolução CONAMA 01/86; Resolução CONAMA 237, de 19/12/97 (que trata sobre licenciamento ambiental, competência da União, Estados e Municípios, listagem de atividades sujeitas ao licenciamento, estudos ambientais, estudo de impacto ambiental e relatório de impacto ambiental); Resolução CONAMA 302, de 20/03/2002 (que dispõe sobre os parâmetros, definições e limites de áreas de preservação permanente de reservatórios artificiais e o regime de uso do seu entorno); Resolução CONAMA 303, de 20/03/2002 (que dispõe sobre parâmetros, definições e limites de áreas de preservação permanente); Resolução CONAMA no 387, de 27/12/2006 (que estabelece procedimentos para o licenciamento ambiental de projetos de assentamentos de reforma agrária, e dá outras providências).

O conceito de preservação permanente aparece já no Art. 1º, § 2o, II do Código Florestal, equivalendo a:

Área protegida nos termos dos arts. 2o e 3o desta Lei, coberta ou não por

vegetação nativa, com a função ambiental de preservar os recursos hídricos, a paisagem, a estabilidade geológica, a biodiversidade, o fluxo gênico de fauna e flora, proteger o solo e assegurar o bem-estar das populações humanas (BRASIL, 1965).

FOTO 01: APP DO ASSENTAMENTO LENIN PAZ - CE.