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6.3 O PADRÃO ÉTICO DO SABER – O QUE SE TEM OBRIGAÇÃO DE FAZER OU SER O MAIS ÉTICO QUE SE PODE SER.

“O Padrão fundamental de Saber, identificado aqui como componente Ético da Enfermagem, volta-se para questões ligadas ao dever ou ao ocupar-se daquilo que deve ser feito” (171:p.20)49. Purnell(177) compreende que esse Padrão de Saber encontra-se ligado à questão da conduta pessoal baseada na liberdade para se chegar a decisões responsáveis.

Carper(171) propõe que se pensem as questões ligadas ao componente Ético, considerando o contexto moderno do cuidado à saúde, no qual os dilemas morais e os erros ganham importância, tanto no que diz respeito ao tratamento quanto à promoção. Pondera que, frequentemente, tais dilemas geram incertezas no profissional e, nessas situações, os códigos de conduta ética nem sempre são úteis, podendo até gerar contradições.

O código moral, que norteia as condutas éticas da Enfermagem, tem por base o princípio do dever, do compromisso ético no serviço prestado às pessoas, balizado pelo respeito à vida humana. Entretanto, esse enunciado geral nem sempre consegue oferecer respostas claras às dificuldades específicas presentes em cada situação particular que requer uma escolha moral, seja no ensino ou na prática(171). E mais, para se alcançar esse saber ético, torna-se fundamental um envolvimento interpessoal(44).

Há que considerar ainda que as metas a serem alcançadas sofrem influência de juízo de valores, não passíveis de investigação e validação científicas. Como exemplo, pode-se pensar a meta de autonomia e independência do paciente. Em algumas situações, essa meta pode significar somente ‘ensinar’ ao paciente como viver, agora, numa situação de dependência física ou social(171).

Carper(171) pondera que, para pensar o Padrão Ético de Saber, cumpre compreender e considerar que existem diferentes acepções filosóficas do que seja ‘o bom’, ‘o que pode ser desejado por alguém’ e enfim, aquilo que é ‘correto’. Portanto, as respostas serão distintas para distintos arcabouços teóricos. White(44), evocando a importância da visão do paciente, sugere

49 Tradução livre de: “The fundamental pattern of knowing identified here as the ethical component of

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que a expressão desse Padrão de Saber possa se valer de narrativas nas quais seria possível apreender noções individuais daquilo que é considerado bom.

A autora não discorre sobre alguns desses possíveis arcabouços teóricos advindos da filosofia, o que para Porter(193) configura-se numa fragilidade na forma como o Padrão Ético é apresentado. Porter(193:p.11) define que esse Padrão é apresentado por Carper(171) de forma abstrata e não prescritiva, demasiado liberal, o que acaba por deixar os enfermeiros “à deriva em meio ao tempestuoso mar da filosofia moral”.

Carper(171) recomenda que as escolhas morais sejam ações específicas a serem consideradas em situações específicas e concretas. Aos códigos, é dada a função de servirem de subsídios a serem analisados diante de cada situação concreta. A autora compreende que o exercício constante, que envolve o analisar as regras e aplicá-las à luz de cada situação, tem como efeito tornar mais explícitas as escolhas feitas e os princípios que a nortearam. Ao explicitar os norteadores de seu agir ético, a enfermeira pode iniciar um processo de habituação positiva(194), ou seja, aprender com uma dada situação e se abrir sempre para novas análises e aprendizagens.

A existência de um Código de Condutas não exime o profissional de fazer constantemente escolhas. Mas a compreensão desses códigos, aliada a uma firme sustentação teórica, pode produzir profissionais que consigam justificar e explicitar as regras e normas que guiaram suas ações na direção de um fazer ético.

Jacobs-Kramer and Chinn(182) sugeriram que essa clareza poderia ser alcançada a partir da descrição e discussão de casos reais, nos quais figuram tomadas de decisão a partir de preceitos éticos, valorizando o contexto no qual se deram, podendo, assim, explicitar o raciocínio utilizado. Numa posição ligeiramente distinta, White(44) propõe que os dilemas morais nem sempre serão passíveis de solução. Sua proposta é que, uma vez diante desses dilemas, pode-se conviver com eles ou ainda amenizá-los.

Outras questões são também abordadas por outros autores sobre o Padrão Ético de Saber. Silva, Sorrell and Sorrell(175) compreendem que, para além da questão epistemológica acerca do que é preciso saber para ser ético, deve-se considerar também ‘O que se deve ser para agir moralmente?’. Essa questão, assim formulada, trata, na visão dos autores, de uma referência ao que é ontológico. Referência essencial ao saber da Enfermagem não contemplada por Carper(171) na visão dos autores.

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Ancorados nas ideias de Aristóteles, Silva, Sorrell and Sorrell(175) explicitam a relação de oposição e também complementariedade entre o ‘saber que’ e o ‘ser o que’. Afirmam que o saber acerca de algo não produz atos éticos por si sós, sem que a pessoa se comporte de forma virtuosa. Os autores compreendem, assim, que contribuem para um avanço na discussão e definição do conhecimento em Enfermagem.

Porter(193), por sua vez, enfatiza que essa condição ‘ser ético’ deve se traduzir por ações norteadas por princípios éticos. Em particular, ações que inequivocamente demonstrem a adesão do profissional aos princípios éticos. Por fim, aposta que essa transparência virá da possibilidade de, a partir de investigação científica, serem desenvolvidas ferramentas que proporcionem tal transparência, sendo dessa forma uma prática que se constrói a partir de evidências.

Por fim, White(44) propõe acréscimos aos padrões de Carper. Dentre suas propostas figura a ideia de que esses Padrões requerem uma avaliação. Dessa forma, esse autor propõe como índices de credibilidade do Padrão Ético do Saber em Enfermagem: a equidade, a bondade, o cuidar e a congruência desses índices com os valores do paciente.

Ficam questões: será mesmo possível inferir o bem e o bom para outros? Uma ação pautada nesse tipo de inferência pode ser considerada por si só ética? A construção de ferramentas e instrumentos sensíveis para ‘captar’ o que ‘é ético’ e o que ‘não é’ será suficiente para se alcançar um cuidado marcado pela ética? Em que consiste essa condição de virtuose para o profissional no cuidado de Enfermagem? Será possível um cuidado de enfermagem que não inclua a pressuposição de bom e bem para o outro?

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