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5.1. Imprensa católica açoriana: local ou regional?

5.2.3. Padre Nunes da Rosa

Nunes da Rosa foi um contista ímpar no seio da literatura açoriana. Note-se o que dele é dito em artigo do Correio da Horta de 05/11/1955: “Nunes da Rosa é o mais autêntico representante do açorianismo literário, comparável a Vitorino Nemésio e a Cortes Rodrigues (…). Foi um padre que além dos dois jornais locais na ilha do Pico que dirigiu a partir da freguesia das Bandeiras. Também nas Bandeiras gerou um livro impresso – “Gente das ilhas” – retrato perspicaz do ponto de vista psicológico do povo da ilha do Pico. Do primeiro livro de contos de Nunes da Rosa, Pastorais do Mosteiro, disse Vitorino Nemésio ser “admirável”.

Os seus escritos aparecem nos jornais por ele fundados, sobretudo ao nível do triângulo constituído pelas ilhas do Faial, Pico e São Jorge. Estes jornais eram mantidos por ele próprio, com tipografia na freguesia de Bandeiras. Embora não nos seja possível demonstrar como Nunes da Rosa foi capaz de manter economicamente os seus periódicos (Tomás, 2010: 62), cremos que, consubstanciados no facto de Nunes da Rosa ser oriundo da diáspora açoriana na Califórnia, tenha garantido a sustentabilidade de periódicos surgidos num meio tão pequeno como a freguesia de Bandeiras a expensas suas. Não nos esqueçamos que ele era um sacerdote com alguns bens, filho de emigrantes regressados dos Estados Unidos com algum pecúlio amealhado.

Nunes da Rosa era padre, escritor, animador cultural e político. Nasceu na Califórnia a 22 de Fevereiro de 1871, mas cedo regressaram os seus pais ao Pico. Estudou no Liceu da Horta, no Seminário de Angra e foi colocado como pároco do Mosteiro, na ilha das Flores. Em 1896, regressa ao Pico, à freguesia das Bandeiras, onde permanecerá até ao último dia de vida, 13 de Setembro de 1946. Os jornais por ele fundados são peças fundamentais para se perceber a doutrina cristã e monárquica sobre a república, para ele, a mãe de todos os males.

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É numa freguesia pequena da ilha do Pico, como as Bandeiras, que Nunes da Rosa funda A Ordem, com uma existência de 27 de Março de 1907 a 19 de Março de 1910, e os

Sinos d’Aldeia, publicação feita entre 26 de Novembro de 1916 e 31 Dezembro de 1924. O

número de colaboradores era tão diminuto que a Nunes da Rosa caberia, certamente, a essência do trabalho. Nunes da Rosa olhava de forma cética e conservadora para algumas manifestações lúdicas e culturais, como podemos notar da sua abordagem a certas práticas desportivas então nascentes nos Açores, em especial o futebol, que designava como o “pontapé na bola”.

O pendor conservador da sua personalidade manifestava-se num certo tipo de argumentação, vincadamente nacionalista, como poderemos constatar no jornal A Ordem, de 19 de Outubro de 1907, ao utilizar uma expressão descabida de todo, tanto mais para um jornal católico, aquando das campanhas do exército português em África: “da chacina de algumas dúzias de pobres pretos selvagens”.

A República é apresentada como um papão. Nunes da Rosa frequentemente assinava contos nos seus jornais com o pseudónimo de João Azul. A educação era, segundo Nunes da Rosa, para Portugal, mais importante e anterior à economia.

A vertente cultural de Nunes da Rosa comprova-se no semanário A Ordem em 1909, quando este está a terminar a sua existência (20/03/1909), e fá-lo com extensos artigos de Ramalho Ortigão e de Fialho de Almeida sobre a morte do rei D. Carlos. Tomás (2010: 70), a este respeito, questiona-se: num pequeno jornal de uma pequena freguesia da ilha do Pico, esta colaboração de vultos nacionais tratar-se-ia tão-somente de uma curiosidade? Subjaz a pergunta: amizade de escritores? Ou utilização, pura e simples, de textos saídos em jornais do Continente?

Defendendo os oprimidos dos opressores, de uma forma bastante interessante para a aquela época, sugere a fundação e a organização de Juventudes católicas, círculos de estudo, patronatos, sindicatos, caixas rurais, associações de classe, seguros, caixas de crédito, escolas de ensino profissional, congressos, círculos de operários e patrões, limitação das horas de trabalho, regulação do salário…e sobretudo entronizar o Sagrado Coração de Jesus nas famílias (Sinos d’Aldeia, 11 de Agosto de 1918). Esta faceta é mencionada com apreço pela imprensa congénere, como podemos verificar no que o semanário O Dever, da vizinha ilha de São Jorge, aponta: “Nunes da Rosa, o organizador arrojado e o artista da pena, que

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tanto se tem evidenciado como apóstolo da Acção Social Católica nos Açores” (O Dever, “A nova cruzada”, 7 de Janeiro de 1922, n. 227, p. 1).

As medidas sociais implementadas por Nunes da Rosa visaram a melhoria das condições de vida das populações carentes em todos os sentidos. O bem da pátria, apesar do pendor monárquico de Nunes da Rosa, está acima das afeições monárquicas ou das antipatias republicanas, como podemos notar de a Nota da Semana, de 30 de Julho de 1924: “enganam- se os que nos taxam de extremismo monárquico. O que queremos é que a pátria se salve, seja lá pela mão de quem for”.

Além do seu conservadorismo monárquico, é de realçar a sua ação pedagógica junto das populações insulares, utilizando o jornal como o veículo de divulgação e, nesse particular, não se ficou pela ilha do Pico, mas manteve uma regular colaboração (contam-se noventa e duas crónicas, intituladas de Cartas da nossa Terra, onde se abordava, sobretudo, a necessidade e frequência da escola e se orientava a juventude para o desenvolvimento da agricultura das ilhas) com o jornal São Jorge, publicado na vila de Velas, na mesma época de A Ordem, sendo também um assíduo colaborador de O Telégrapho da Horta. A significativa colaboração na imprensa confessional e não confessional transformou-o em homem do triângulo, ou seja, das ilhas do grupo central: Faial, Pico e São Jorge (Tomás, 2010: 80).