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O PAPEL DA CORTE INTERAMERICANA DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS

No documento DIVERSIDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS VOL. 1 (páginas 98-102)

A PROTEÇÃO E VEDAÇÃO AO PRECONCEITO: UMA ANÁLISE

1. O PAPEL DA CORTE INTERAMERICANA DE PROTEÇÃO AOS DIREITOS HUMANOS

O Brasil é signatário de tratados internacionais, responsável pela proteção dos Direitos Humanos de seus cidadãos, conforme preconiza a própria Constituição Federal de 1988 no § 2º, artigo 5º: “os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte” (CONSTITUIÇÃO, 1988). Aliado à proteção constitucional em âmbito nacional, tem-se tam-bém a proteção em esfera internacional, uma das funções primordiais

(se-ROGERIO BORBA DA SILVA (ORGS.)

não a principal) da Corte Interamericana de Direitos Humanos (CIDH), que promove a defesa dos direitos humanos em toda a América.

Preliminarmente, a discussão sobre a proteção dos direitos LGBT-QIA+ por meio da Corte Interamericana, faz-se necessário delinear al-guns recortes sobre Direitos Humanos e o modus operandi da corte supraci-tada. Resta evidente a proteção de tais direitos como uma lógica sistêmica internacional. Toda e qualquer afronta a garantias fundamentais deve ser combatida em um domo de proteção máxima dos Direitos Humanos.

Os Direitos Humanos, nas palavras do jurista Mazzuoli, “podem ser vindicados indistintamente por todos os cidadãos do planeta e em quais-quer condições, bastando ocorrer a violação de um direito seu reconhe-cido em norma internacional aceita pelo Estado em cuja jurisdição se en-contre” (MAZZUOLI, p. 29, 2019). Ainda em consonância com o autor, se um Estado signatário de tratados internacionais descumpre com o seu papel em defesa das garantias fundamentais do cidadão, estaria ele des-cumprindo uma norma internacional, sendo possível o reconhecimento do descumprimento e acionamento das autoridades competentes para tra-tarem a situação.

Lado outro, “a inclusão dos tratados internacionais de direitos huma-nos seria automática, pois apenas explicita que basta o Brasil fazer parte do tratado ou convenção sobre direitos humanos” (OMMATI, 2019, p. 54).

Sob tal lógica, a partir da inclusão dos tratados, temos a garantia e a prote-ção de norma constitucional dentro do ordenamento jurídico, no presente caso, especificamente no Brasil. “Nesse sentido, ser parte de um tratado internacional de direitos humanos significa a ratificação pelo Brasil do re-ferido instrumento de direitos humanos” (OMMATI, 2019, p. 54).

O processamento e o julgamento de descumprimento dos Direitos Humanos competem à Corte, que irá promover a análise da denúncia re-lativa à violação da norma, independentemente da nacionalidade de quem foi o ofendido na prática de determinada violação. Mazzuoli esclarece o processamento pela Corte quando ocorre a violação

No sistema interamericano de direitos humanos compete à Corte Interamericana processar e julgar um Estado-parte (na Convenção Americana sobre Direitos Humanos de 1969) por violação dos di-reitos humanos de pessoas sujeitas à sua jurisdição. Não importa,

já se viu, a nacionalidade da vítima que sofreu a violação de direitos humanos, bastando que o cidadão tenha sido violado em seus di-reitos no âmbito da jurisdição de um Estado-parte na Convenção Americana (que tenha aceitado a jurisdição contenciosa da Corte Interamericana). O sistema interamericano de direitos humanos conta, portanto, com um tribunal supranacional responsável pelo processo e julgamento de Estados que violem suas obrigações in-ternacionais previstas na Convenção Americana sobre Direitos Humanos. (MAZZUOLI, p. 48, 2019).

Logo, resta claro que o Estado violador da norma será processado e julgado, podendo ser punido pelo descumprimento. Frise-se que as situa-ções como as aqui mencionadas, de processamento e julgamento, somente são possíveis em decorrência da participação dos Estados para se assegurar a proteção dos Direitos Humanos.

Além da proteção, é preciso que seja efetiva na prática, na realida-de, com mecanismos às vezes coercitivos de cumprimento à norma.

Conforme elucidado por Flávia Piovesan, “o que importa é o grau de eficácia da proteção e, por isso, deve ser aplicada a norma que ofereça melhor proteção à vítima, em cada caso concreto”. (PIOVESAN, p.

25, 2004).

A Convenção Americana sobre os direitos humanos assegura o direi-to à integridade pessoal do cidadão, e sua violação implica em prejuízos para a sociedade de um modo geral, ainda que um cidadão especificamen-te especificamen-tenha sido atingido pelo seu descumprimento. Inúmeros são os exem-plos, desde Vladimir Herzog a George Floyd. “A OEA busca explicitar que ações adotadas por qualquer Estado-parte objetivando unicamente

‘promover a integração social e o adequado progresso e desenvolvimento de pessoas e grupos que necessitem de proteção’ não será considerada dis-criminação. (GASPAROTO, p. 38, 2011).

Em seu artigo 5º, a Convenção Americana assegura o Direito à in-tegridade pessoal, conforme já exposto, especificando ainda que “toda pessoa tem o direito de que se respeite sua integridade física, psíquica e moral” (NORONHA, p. 91, 2020). Ainda no referido artigo, a Conven-ção expõe que “ninguém será submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos ou degradantes. Toda pessoa privada da liberdade deve

ROGERIO BORBA DA SILVA (ORGS.)

ser tratada com o respeito devido à dignidade inerente ao ser humano”

(NORONHA, p. 91, 2020).

Em violação à integridade pessoal do cidadão, no que inclui até a sub-missão à tortura, conforme foi visto, a violação de Direitos Humanos é mais profunda e mais abrangente, indo além de uma discussão puramente jurídica e que é reflexo de forte influência de questões sociológicas, entre elas, por exemplo, a moral. Verificam-se muitos casos que são discutidos na corte, no que dizem a respeito à população LGBTQIA+ são pratica-dos por sujeitos que se acham moralmente corretos para praticar violência contra esses grupos vulneráveis, os quais elucidados no próximo tópico.

Contudo, quando se discute socialmente sobre a moral, não estamos diante da mesma moral proposta por Kelsen: “uma exigência comum a todos os sistemas de moral seria: conservar a paz, não exercer violência so-bre ninguém” (KELSEN, p. 46, 1998). A moral aqui é o inverso, fomen-tada por discursos de ódio e extremamente conservadores, que culminam pela violação dos Direitos Humanos em grande escala. Fatores sociais são expressivos geradores de transtornos que chegam até a Corte para julga-mento. Nota-se a diversificação de situações decorrentes de fatores cultu-rais, propulsores da prática de descumprimentos de normas fundamentais, como a dignidade da pessoa humana, em conformidade com a norma de cada Estado.

A aplicabilidade plausível da norma, em consonância com o real pro-blema apresentado, em escala internacional, encontra obstáculos específi-cos, às vezes regionais, de validação. No Brasil, por exemplo, temos con-denação em âmbito internacional decorrente de prática delitivas na época da ditadura militar, e que infeliz e incoerentemente são enaltecidas em determinados movimentos.

De encontro com a discussão ora apresentada, podemos ainda men-cionar o artigo 4º, da Convenção, que discute sobre o Direito a vida, as-segurando que “toda pessoa tem o direito de que se respeite a vida. Esse direito deve ser protegido pela lei, em geral, desde o momento da concep-ção. Ninguém pode ser privado da vida arbitrariamente”. (NORONHA, p. 90, 2020). Vale ressaltar que o direito à vida também se encontra for-temente insculpido na Constituição Federal de 1988 no caput do artigo 5º: “todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a

invio-labilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à pro-priedade, nos termos seguintes” (CONSTITUIÇÃO, 1988).

Assim, compreende-se a importância do Estado em cumprir com a proteção dos Direitos Humanos, reforçando que a partir do momento em que é signatário de tratados internacionais deve se submeter aos julgamen-tos e cumprir toda e qualquer decisão que seja decorrente da violação, por sua parte, da norma internacional. Não se trata apenas de discutir a pauta, pois o tema se constitui, afinal, de uma norma com previsão legal, conforme se vê:

O artigo 68 da CADH estabelece que “o Estados Partes na Con-venção se comprometem a cumprir a decisão da Corte em todo caso em que forem partes”, mas não faz referência à sua jurispru-dência, geralmente entendida como elemento integrante das dis-posições constitucionais internas. Por tal motivo é que alguns au-tores contestam a ideia de que na CADH residem as bases de uma obrigação de direito internacional de “Deference” rumo à jurispru-dência dos órgãos do sistema interamericano”. (CARDUCCI, p.

78/79, 2014).

Logo, resta claro, o importante papel da Corte, não só em resguar-dar a proteção aos Direitos Humanos, como em efetivar o cumprimento de normas que violem a dignidade do cidadão. “A norma jurídica deve ser inscrita na esfera do “valor”, entendida quer como alguma coisa de aprovável, de preferível em dada cultura, quer, correlativamente, como critério — regra — de conduta ordenada sobre um valor”(FAZZALARI, p. 49, 2006).

2. A VIOLAÇÃO DE DIREITOS HUMANOS NO BRASIL E

No documento DIVERSIDADE E POLÍTICAS PÚBLICAS VOL. 1 (páginas 98-102)