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3.1 – Paradigmas e estratégias de formação

Sabe-se que os programas de formação suportam um conjunto de pressupostos que são comuns a um determinado paradigma de formação, ou seja, estão anexados a um conjunto de crenças e princípios filosóficos e científicos que se encontram subjacentes aos objectivos da escola, dos currículos e da formação que se pretende desenvolver.

Segundo Pacheco & Flores (1999), Zeichner (1983) referencia e distingue quatro paradigmas de formação de professores que originam o modelo que se pretende fomentar: o paradigma comportamentalista, o paradigma personalista, o paradigma tradicional- artesanal e o paradigma orientado para a pesquisa. Considera que estes paradigmas podem não existir isoladamente, acontecendo na prática cruzamentos e interligações entre eles. Posteriormente, Liston & Zeichner (1990, citados por Pacheco & Flores, 1999) referem ainda tradições distintas na formação de professores, nos Estados Unidos da América: académica, de eficiência social, desenvolvimentalista e de reconstrução social. Imbérnon (1994) propõe três orientações principais nos curricula de formação: perenialista, racional- técnica e prático reflexivo (Pacheco e Flores, 1999).

Referimos apenas estas tendências, não sendo objectivo deste trabalho analisar cada uma delas de forma exaustiva. Contudo, faremos referência aos paradigmas apresentados por Zeichner (1983), de modo a sintetizar alguns dos seus princípios fundamentais.

a) Paradigma tradicional (ou tradição académica)

Segundo o autor acima referido, no paradigma tradicional (ou tradição académica), a imagem de um bom professor surge associada ao domínio dos conteúdos de tipo conceptual, relegando para plano secundário as competências pedagógicas e didácticas; estas podem ser adquiridas pela aprendizagem prática na escola, com a ajuda de um orientador.

Verificamos que, “na concepção e na prática prevalece uma formação artesanal do professor que faz do aprender a ensinar um processo equivalente à aprendizagem de um ofício, onde se distinguem os aprendizes (os alunos) e os mestres”(Pacheco & Flores, 1999:58). Assim sendo, neste paradigma aceita-se que o saber de uma disciplina é suficiente para se poder ensinar eficazmente, chegando-se a professor pela “acumulação de experiência, sobretudo através do método do ensaio-erro, e por uma formação que privilegia o estudo dos conteúdos de ensino (ibidem: 59).

b) Paradigma condutista/comportamentalista (ou de tradição de eficiência social)

Este paradigma, baseado no behaviorismo como corrente psicológica, e no positivismo enquanto corrente filosófica, permitiu uma valorização do estatuto das Ciências da Educação. Nesse sentido, releva técnicas de ensino observáveis e específicas, bem como o desenvolvimento de competências ligadas à aprendizagem dos alunos, encontrando-se associado a uma técnica de formação muito utilizada num passado recente: o micro-ensino, “que tem por finalidade principal o treino de competências específicas com vista a um desempenho ideal e ao reforço da dimensão tecnológica da formação” (Pacheco & Flores, 1999:58).

O professor é encarado como um mero técnico, a quem compete transmitir os conhecimentos, podendo, também, ser visto como um gestor ou organizador especializado que actua de uma forma racional e técnica, executando um conjunto de competências previamente adquiridas. Nesta lógica, “a formação – training – é concebida como um

processo meramente aquisitivo de um repertório de destrezas necessárias para o desempenho da profissão” (ibidem: 59).

O currículo subjacente a este tipo de formação é bastante estruturado, sobressaindo as competências que o professor deverá adquirir e desenvolver; Garcia & Garcia (1989) classificam-nas em competências respeitantes a conhecimentos, a actuações e a consequências.

c) Paradigma personalista (ou tradição desenvolvimentalista),

No que diz respeito ao paradigma personalista (ou tradição desenvolvimentalista), salienta-se, sobretudo, o desenvolvimento pessoal do formando, pressupondo um currículo formativo mais flexível.

Segundo Pacheco & Flores (1999: 60), “a formação implica um processo de maturidade psicológica, pelo que requer a participação activa do sujeito que se forma, bem como a consideração das suas necessidades e preocupações. Como salientam Zeichner & Liston (1990), a ideia de que é a «ordem do desenvolvimento do aluno que fornece as bases para a determinação do que deve ser ensinado tanto aos alunos das escolas como aos seus professores» constitui a característica principal desta tendência”.

Esta tradição apresenta ainda três versões: a formação progressiva, centrada no aluno; a formação humanista e a formação personalizada. Quanto à tendência progressiva, “tem como critério de formação o estudo do aluno e o desenvolvimento de atitudes de interrogação, atitudes criativas e de espírito aberto. De acordo com a concepção humanista (Coms et al., 1979), a formação do professor depende, essencialmente, da natureza de um quadro particular de percepções prévias, correspondendo à autodescoberta pessoal e à tomada de consciência de si mesmo e das suas crenças (…). A individualização das situações de formação de um professor, em função das suas necessidades, problemas e preocupações constitui o aspecto principal da formação personalizada (Fuller & Bown, 1975). Na tradição desenvolvimentalista, o professor é visto como um naturalista (ligado à jardinagem), como um artista e como um investigador, pelo que a sua formação deverá incidir não nos processos técnicos de ensinar mas nos processos que favoreçam a sua introspecção e maturidade” (Pacheco & Flores, 1999: 60).

d) Paradigma orientado para a indagação (ou tradição de reconstrução social)

Este paradigma constitui uma alternativa aos anteriores e parte de uma concepção de escola e de professor como elementos essenciais do movimento para uma sociedade mais justa e humana. É baseado na psicologia cognitiva, em que a formação deve ser orientada para desenvolver, no futuro professor, a reflexão para, na e sobre a acção e, simultaneamente, promover uma atitude crítica. As estratégias de formação a desenvolver deverão basear-se “fundamentalmente no método de questionamento, passando por (…) uma etapa de problematização, (…) uma etapa de investigação e (…) uma etapa de tomada de decisões” (Oliveira & Terça, 1991: 163). Na opinião dos seus adeptos, este tipo de estratégias confere competências de reflexão crítica ao futuro professor, competências essas fundamentais para que o visado se comprometa nos processos relativos à reflexão, utilizando os próprios recursos e estratégias que o levem a ser, progressivamente, um observador reflexivo, um participante reflexivo e um prático reflexivo.

Convém salientar que esta tendência aglutina vários movimentos, de índole mais ou menos crítica e interventora, onde a reflexão e a investigação se assumem com traços distintos. Tal pressuposto implica a “consideração de um currículo de formação estático e previamente determinado ao mesmo tempo que se encara a prática como momento importante de aquisição e (re)construção de conhecimento(s). Nesta lógica, o professor ocupa um papel determinante no seu percurso de formação, pois implica um processo de consciencialização de crenças e teorias e a análise das consequências das suas decisões no desempenho profissional. Nesta perspectiva, surgem as metáforas do professor- investigador e do professor como prático-reflexivo, assumindo um papel mais activo no processo de desenvolvimento curricular” (Pacheco & Flores, 1999: 61).

Pacheco & Flores (1999) apresentam uma figura-síntese que relaciona os quatro paradigmas apresentados por Zeichner (1983), atendendo às dimensões aluno/contexto e currículo:

Figura 1 – Paradigmas de formação de professores (Pacheco & Flores, 1999:62)

Pacheco & Flores (1999: 62-63) afirmam que: “na dimensão aluno/contexto, os paradigmas tradicional, personalista e comportamentalista são institucionalmente seguros, não discutindo os pressupostos e fundamentos da formação e considerando o aluno como objecto de formação. Por seu turno, o paradigma de indagação é institucionalmente crítico, porque problematiza o contexto de formação e valoriza o aluno como sujeito da sua formação. Quanto à dimensão «currículo», enquanto os paradigmas comportamentalista e tradicional apresentam um currículo com uma estrutura predeterminada, os paradigmas de indagação e personalista caracterizam-se pela existência de um currículo aberto com potencialidades de se construir em função das características do sujeito a formar”.