3.1 A PESQUISA EMPÍRICA
3.1.2 Os PCN+
As Orientações Educacionais Complementares aos Pa râmetros Curriculares Na cionais (2002), também chamadas de PCN+, complementam e ampliam a orientação contida nos PCNEM. Assim como os parâmetros, essas orientações têm como objetivos: contribuir na implantação das reformas educacionais, definidas pela nova LDB e pelas Diretrizes do Conselho Nacional de Educação, assim como facilitar a organização no trabalho das escolas com as áreas do conhecimento.
O texto dos PCN+ dedicado às Ciências Humanas e suas Tecnologias reflete sobre a reformulação do Ensino Médio e as áreas do conhecimento; sobre a natureza do Ensino Médio e as razões de sua reforma; orienta a revisão do projeto pedagógico da escola; apresenta novas orientações para o ensino, a partir da articulação entre as áreas e entre as disciplinas em cada uma das áreas, refletindo sobre o trabalho interdisciplinar e contextualizado. O documento também apresenta os conceitos estruturadores da área, reflete sobre o significado das competências da área, faz a articulação dos conceitos estruturadores com as competências gerais e apresenta critérios para a organização dos conteúdos programáticos no âmbito das disciplinas que compõem a área.
No que se refere especificamente à filosofia, os PCN+ tratam dos conceitos estruturadores da Filosofia, o significado das competências específicas da Filosofia, a articulação dos conceitos estruturadores com as competências específicas da Filosofia, finalizando com sugestões de organização de eixos temáticos em Filosofia.
A noção de conceito estruturante ou articulador remete, inicialmente, à identidade de cada disciplina escolar ou de uma determinada área de conhecimento, que articula mais de uma disciplina. Efland, citado por Hernandez (1998), sugere a organização de currículos a partir de ideias- chave, ou seja, conceitos construídos historicamente em cada área de conhecimento que se organizam a partir de temas-problema. Nos anos sessenta do século passado, Bruner desenvolveu a noção de conceitos-chave a partir de estruturas de cada disciplina, buscando facilitar a compreensão e a aprendizagem das disciplinas e a pauta de estudos por elas construídas ao longo de sua história específica. (RICCI, 2006).
Para cada uma das áreas, os PCN+ fazem uma articulação entre os conceitos estruturadores ou as “ideias-chaves” das disciplinas das áreas, com suas respectivas competências, conforme foram elencadas nos parâmetros. Dessa complementariedade entre conceitos e competências, as orientações complementares propõem um conjunto de temas e subtemas, que organizados ao redor de eixos temáticos representam um roteiro de estudo em cada para uma das disciplinas das áreas. Ainda conforme Ricci:
O Conceito Estruturador é um pilar para a organização de currículos que buscam conectar as disciplinas e atribuir sentido às aprendizagens escolares. É uma base para superar a organização disciplinar fragmentada das matérias na estrutura curricular em mosaico ou cadeiras, isto é, por matérias, com tempos separados e fronteiras bem definidas entre elas. O conceito estruturador contribui para superar essa especialização, pois norteia a organização dos conteúdos por matéria e, na busca de um currículo mais integrado, ordena uma área de ensino. (RICCI, id. ibid.).
Como nos PCNEM – que apresentam uma lista com seis tipos de competências que
seriam próprias da filosofia e, ao mesmo tempo, correspondem a uma “versão filosófica” do
quadro geral de todas as competências requeridas para o Ensino Médio – os PCN+, acrescentam outra listagem contendo nove temas para serem ensinados e aprendidos na disciplina de filosofia.
Conforme mostra o quadro a seguir, esses temas foram subdivididos em 24 subtemas e reunidos em três eixos temáticos10:
10
Posteriormente, um novo documento, as Orientações Curriculares para o Ensino Médio (2006), agregou um terceiro grupo de propostas na forma de conteúdos programáticos para as disciplinas.
Quadro 4 – Os eixos temáticos em Filosofia (PCN+). EIXO 1: RELAÇÕES DE PODER E DEMOCRACIA:
Temas Subtemas
1 A democracia
grega.
1 A ágora e a assembleia: igualdade nas leis e no direito à palavra.
2 Democracia direta: formas contemporâneas possíveis de
participação da sociedade civil.
2 A democracia
contemporânea
3 Antecedentes: Montesquieu e a teoria dos três poderes; Rousseau
e a soberania do povo.
4 O confronto entre as ideias liberais e o socialismo.
5 O conceito de cidadania.
3 O avesso da
democracia.
6 Os totalitarismos de direita e esquerda
7 Fundamentalismos religiosos e a política contemporânea.
EIXO 2: A CONSTRUÇÃO DO SUJEITO MORAL:
Temas Subtemas
4 Autonomia e
Liberdade.
8 Descentração do indivíduo e o reconhecimento do outro.
9 As várias dimensões da liberdade (ética, econômica, política).
10 Liberdade e determinismo.
5 As formas de
alienação moral.
11 O individualismo contemporâneo e a recusa do outro.
12 As condutas massificadas na sociedade contemporânea.
6 Ética e Política.
13 Maquiavel: as relações entre moral e política.
14 Cidadania: os limites entre o público e o privado.
EIXO 3: O QUE É FILOSOFIA:
Temas Subtemas
7 Filosofia, mito e
senso comum.
15 Mito e Filosofia: o nascimento da Filosofia na Grécia.
16 Mitos contemporâneos.
17 Do senso comum ao pensamento filosófico.
8 Filosofia, ciência e
tecnocracia.
18 Características do método científico.
(continuação)
8 Filosofia, ciência e
tecnocracia.
20 A tecnologia a serviço de objetivos humanos e os riscos da
tecnocracia.
21 A bioética.
9 Filosofia e Estética
22 Os diversos tipos de valor.
23 A arte como forma de conhecer o mundo.
24 Estética e desenvolvimento da sensibilidade e imaginação. Fonte: Brasil (2002).
Esses eixos temáticos têm origem na relação entre conceitos estruturadores11 e competências específicas em cada uma das disciplinas. Decorre que os PCN+ mantêm a mesma orientação contida nos parâmetros. Entre elas, o documento também parte do pressuposto de que a principal característica do pensamento filosófico é sua natureza reflexiva, ainda que tal reflexividade não seja uma exclusividade da filosofia. Diz o documento:
Mesmo reconhecendo a multiplicidade de caminhos que cada filósofo- educador possa privilegiar, por questões didáticas, optamos por assumir determinada orientação – uma entre muitas possíveis, voltamos a frisar – pela qual a Filosofia é compreendida em linha gerais como uma reflexã o crítica a respeito do conhecimento e da ação, a partir da análise dos pressupostos do pensar e do agir e, portanto, como fundamentação teórica e crítica dos conhecimentos das práticas. (BRASIL, 2002, p. 44, grifo do autor).
Para os PCN+, refletir é a principal característica da atividade filosófica. Trata-se de uma reflexão radical no sentido mais original dessa palavra, pois remete às raízes (radix) e mais profunda daquilo que é o seu objeto de compreensão. Também para o documento, a radicalidade do pensamento filosófico dá-se na forma de uma crítica radical acerca do
11
Os conceitos estruturadores em filosofia são o ser, o conhecimento e a ação. Enquanto reflexão, a filosofia reflete sobre esses conceitos e, a partir deles, constrói o seu campo conceitual, do qual partem todos os grandes temas da filosofia e suas respectivas áreas de tratamento temático. Exemplo: na reflexão sobre os fundamentos e fins do conhecimento, a filosofia investiga os instrumentos do pensar, como a lógica e a metodologia, constituindo-se como teoria do conhecimento. Ao analisar os fundamentos e os fins a ação, adentra-se no campo da reflexão ética, estética, política, antropologia etc., a fim de compreender as formas do agir ético-moral, da ação política etc.
conhecimento e da ação12 e, segundo essa perspectiva, a filosofia deve auxiliar o educando “a lançar outro olhar sobre o mundo e a transformar a experiência vivida em uma experiência compreendida” (BRASIL, 2002, p. 45). Outra característica dessa reflexão é sua abrangência, no sentido de que, trata-se de uma reflexão marcada pela totalidade e que, por isso difere, das demais áreas do saber-ciência, acostumadas a lançar um olhar fragmentado sobre a realidade.
Os PCN+ mantém a mesma concepção de filosofia e de filosofar contida nos PCNEM. A grande novidade do texto fica por conta da proposta metodológica que apresenta, ao orientar a construção de um currículo pautado nos eixos temáticos e na lista de temas gerais e específicos a serem trabalhados por cada uma das disciplinas. Portanto, sem alterar a concepção contida nos parâmetros curriculares que identifica o filosofar como uma atividade reflexiva, o documento apresenta quais seriam os temas de filosofia que deveriam ser refletidos por professores e alunos no nível médio.