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A presente seção consiste numa tentativa de traçar o perfil dos coletivos urbanos com base na pesquisa de campo realizada. No entanto, tendo em vista a amostragem colhida, os resultados não foram suficientes para se alcançar o resultado pretendido. Apesar disso, diversos elementos como juventude, elitismo e institucionalidade, surgiram ao longo das entrevistas e são relevantes para iniciar a criação de tal perfil.

“havia um reconhecimento de que tinham novos atores na cidade que se organizavam de uma forma diferente, que não era nos movimentos sociais mais tradicionais, que também não era em partidos, mas, sim, esses coletivos e grupos ou culturais, ou de intervenção urbana, de comunicação, de diversos temas, que a cidade estava sendo movimentada e questionada por esses grupos, na sua maioria jovens, buscando uma outra forma de organização, de intervenção na cidade. Intervenção para além do sentido físico também… de participação, de intervir na gestão da cidade. A partir do reconhecimento destes novos atores, estava colocado para a gestão pública: “como se relacionar com esses grupos”? Eram grupos que dificilmente participariam ou tinham interesse em participar destas instâncias de conselhos, de conferências, mas que pautavam, sim, e buscavam uma relação com o poder público. Então tinha um desafio do lado de cá que era como estruturar esta relação com os grupos? O que a gente formulou no Plano [de Ocupação do Espaço Púbico pela Cidadania] é: como criar esses novos espaços de participação que acolham esses grupos, esses atores, sem desmerecer a importância de conselhos e conferências… Mas como se relacionar com esses novos grupos entendendo que há uma variedade enorme de como esses conselhos funcionam, não dá pra colocar tudo no mesmo lugar, desde vinculação orçamentária, se é conselho consultivo, etc. Mas num panorama geral tinha esses diagnóstico deste esgotamento destes espaços de participação social.” (Entrevistado RG1, 2016)

Uma característica interessante sobre o perfil dos coletivos urbanos é a faixa etária. Segundo Entrevistado RG3, tem-se um aspecto geracional: “eles vêm desta nova geração (...)

maio de 2013 (...) uma geração autonomista, (...) que busca romper os paradigmas da institucionalidade” (2016). No entanto, há de se relativizar esse dado, como colocado por outros entrevistados:

“a maioria dos grupos que fazem isso são grupos de jovens, indubitavelmente. Mas o que me chama a atenção é como esse tipo de ação, de linguagem, de intervenção urbana, de intervenção artística e cultural, também tem mobilizado grupos de faixas intermediárias. Pelo estatuto da juventude, o jovem vai dos 15 aos 29 anos. Tem muita gente na casa dos 30 anos que compõe esses grupos, que utiliza estas linguagens. Então não são só os jovens stricto sensu. Tem muita gente mais velha também que se mobiliza, que se envolve com isso. Eu confesso que nem sei explicar porquê. Mas pode ser uma sensação errada de quem está com 35 anos” (Entrevistado RG2, 2016)

“São jovens que não se reconhecem nesta cidade. Eles querem moldar a cidade de uma maneira em que eles se reconheçam. Como os jovens não podem moldar os espaços privados, pois não são acessíveis a eles, um objeto de desejo para eles é o espaço público” (Entrevistado RA, 2016)

A partir das entrevistas, almejava-se criar uma categoria analítica sobre os coletivos. O Quadro 4 foi elaborado na tentativa de serem identificadas semelhanças e diferenças entre os integrantes dos coletivos entrevistados enquanto o Quadro 5 foi construído com foco nos próprios grupos, a sua atuação, institucionalidade e organização.

Quadro 4: Perfil dos integrantes de coletivos urbanos entrevistados

Fonte: elaboração própria.

São claros os elementos convergentes entre os integrantes dos coletivos em questão. No que diz respeito à idade, temos pessoas jovens, entre 29 e 35 anos, não filiados a partidos políticos, com nível superior completo e formação na área de humanas. Além disso, residem em bairros nobres da cidade de São Paulo. Esse perfil harmônico será mencionado mais para frente,

quando será avaliada a relação de proximidade que possuem esses atores sociais com a máquina pública. Isso se deve ao perfil dos gestores também, que se assemelha ao dos grupos, criando assim uma maior aproximação entre eles.

A questão do elitismo pode ser facilmente percebida, mas deve também ser relativizada. O arquiteto e professor da USP Guilherme Wisnik, em matéria para Folha de São Paulo (2015, ilustríssima), após um ciclo de debates que esteve presente, comentou sobre uma discordância não somente relativa ao sentido da palavra “grupo” ou “coletivo”, mas também relativa à divergência de posicionamentos “de grupos ligados à arte e ao urbanismo, de extração predominantemente universitária e de classe média, e de grupos ligados a questões raciais, de gênero e mais diretamente sociais, vinculados às periferias”15. Mas ele pondera essa crítica, ao dizer que a onda ativista global incide prioritariamente nos espaços centrais das cidades, e nem por isso devem ser considerados movimentos elitistas apenas: “pois seriam, todos esses, movimentos de classe média intelectualizada que se preocupa apenas (ou prioritariamente com as áreas centrais da cidade, e não com as periféricas) ”16.

Em publicação realizada pelos estudantes da disciplina “História de urbanismo Contemporâneo” da FAU-USP, que analisou e sistematizou diversas iniciativas de ocupação urbana pela cidade, nota-se realmente que tais movimentações se dão em regiões mais centrais da cidade, onde os grupos atuantes são mais informados, com maiores redes e então maiores possibilidades de concretizar seus projetos (CYMBALISTA, 2016). Ainda para Cymbalista, “as iniciativas apontam para novas possibilidades de ação e cidadania no espaço público, que buscamos iluminar aqui. Por outro lado, os microurbanismos reeditam velhos desafios” (II, 2016).

15 Matéria colhida do jornal Folha de São Paulo. Disponível em <http://www1.folha.uol.com.br/ilustrissima/2015/11/1705535-o-ativismo-urbano-e-o-valor-de-uso-do-espaco- publico.shtml>. Acesso em: 10 fev. 2017.

Quadro 5: Perfil dos coletivos urbanos entrevistados

Fonte: elaboração própria.

Sobre o levantamento do perfil dos coletivos, tem-se também um panorama mais ambíguo. Apesar da fala dos entrevistados apontar para um discurso da não-institucionalidade, metade dos entrevistados pesquisados possuem CNPJ. Por um lado, é necessário se institucionalizar para ter acesso a fundos públicos ou privados, por outro, há uma resistência em participar de espaços formais de participação social. Sobre esse ponto em especial, nenhum coletivo ocupa assentos de conselhos ou participa de conferências.

Outro elemento interessante observado durante o trabalho de campo foi a oposição aos movimentos sociais - que será retomada ao final do trabalho.