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Estudar a performance está longe de ser uma tarefa fácil. Objeto de estudo de diferentes áreas do conhecimento, como a antropologia, etnografia, psicologia, sociologia, linguística e artes, o conceito de performance assume diferentes contornos e definições. Como explica Freire Filho (2012), esta é uma noção tipicamente moderna, pós- revolução industrial.

Oriundo do francês antigo parformance (século XIII), traduzível por «execução», «cumprimento», o termo foi adotado na língua inglesa em 1839, com a grafia atual, performance. O prefixo per é o mesmo empregado na composição de per-fection (assim como o par da antiga palavra francesa par-formance subsiste em par-fait). A princípio, o termo sugere, pois, um movimento de transformação: uma perfeição que se forma. Dito de outra maneira, performance remete, originariamente, para um processo de aperfeiçoamento em fase de realização ou prestes a consumar-se. (FREIRE FILHO, 2012, p. 41).

Embora os estudos da performance tenham origem no século XX, principalmente nos anos de 1960 e 1970, Renato Cohen (1989) afirma que o nascimento da performance pode ser associado ao próprio ato do ser humano de se fazer representar. Neste sentido é possível pensar em uma corrente ancestral da performance já nos primeiros “ritos tribais, nas celebrações dionisíacas dos gregos e romanos, no histrionismo dos menestréis e em inúmeros outros gêneros, calcados na interpretação extrovertida, que vão desaguar no cabaret do século XIX e na modernidade.” (COHEN, 1989, p. 41).

No campo das artes, a performance se refere a um movimento artístico que teve início nos anos de 1970 e abarca um conjunto de manifestações artísticas híbridas que não podiam ser classificadas dentro dos formatos já estabelecidos. Ela conjuga dança e teatro, poesia e música, artes visuais, happenings e também experimentos com a fotografia, com o vídeo e com novas tecnologias. Cohen considera a performance artística como uma arte de fronteira, que rompe convenções, formas e estéticas ao penetrar em caminhos e situações antes não valorizados como arte. Se por um lado “se tira a arte de uma posição sacra, inatingível, vai se buscar do outro, a ritualização dos atos comuns da vida: dormir, comer, movimentar-se, beber um copo de água” (COHEN, 1989, p. 48), que passam a ser encarados como atos rituais e artísticos. Sibilia (2013) caracteriza a performance artística como um ato qualquer, ou, ao menos, como uma enorme variedade de atos possíveis efetuados por um ou vários artistas performáticos. “Se trata de una acción practicada por alguien que considera estar realizando una performance, y cuyo público así lo vivencia.” (SIBILIA, 2013, p. 06).Apesar de ter sua origem nas artes plásticas, a partir da body art, na qual o artista é sujeito e objeto de sua arte, a

performance se consolida nas artes cênicas, “numa linguagem ‘cênico-teatral’ e é apresentada na forma de um mixed-media onde a tonicidade maior pode dar-se em uma linguagem ou outra dependendo da origem do artista (mais prática no Fluxus, mais teatral em Disappearances).” (COHEN, 1989, p. 57).

No campo das ciências sociais, e mais especificamente da antropologia e da etnografia, os estudos da performance se preocupam principalmente com o caráter cultural da performance, ou seja, com a função que ela desempenha dentro de uma cultura e como ela opera dentro de uma sociedade. Para muitos antropólogos, entre eles, Victor Turner, as performances revelam o caráter mais profundo, genuíno e individual de uma cultura, havendo, segundo Carlson (2010), um consenso geral de que a performance seria, em cada cultura, uma espécie de “atividade separada de outras atividades por espaço, tempo, atitude ou por todos eles juntos.” (CARLSON, 2010, p. 25). Principalmente a partir das teorias culturais, os estudos antropológicos e etnográficos da performance terão como principais preocupações “a função da performance dentro de uma cultura, a relação do performer com a audiência e do repórter da performance com a performance, a geração e a operação de performances que se baseiam ou são influenciadas por culturas diferentes” (CARLSON, 2010, p. 44), sendo todas essas preocupações culturais importantes contribuições para o pensamento contemporâneo sobre o que é a performance e como ela opera.

A partir da abordagem psicológica e sociológica, a performance é reconhecida como um comportamento social e os indivíduos como atores sociais que desempenham diferentes papéis em suas relações sociais. Na obra The theatre in life (O teatro na vida), o escritor russo Nicholas Evreinoff destaca que o indivíduo está sempre encenando papéis em sociedade, sendo a vida de cada cidade, país ou nação articulada pelo diretor de palco invisível daquela cultura, que dita “os cenários, o figurino e os personagens das situações públicas em todo o mundo” (CARLSON, 2010, p. 47). Segundo o autor, cada época teria seu próprio guarda-roupa e cenário e também sua “máscara”. Tal entendimento teve grande influência sobre os estudos sociológicos da performance e no pensamento de autores como Erving Goffman, um dos maiores expoentes do estudo da performance no campo sociológico.

Independente da perspectiva adotada, uma característica comum aos diferentes estudos da performance é reconhecer a relação que se estabelece entre o performer e a audiência, ou seja, que a performance acontece frente ao outro, “é sempre performance para alguém, um público que a reconhece e valida como performance mesmo quando, como em alguns casos, a audiência é o self.” (CARLSON, 2010, p. 16). Como explica Zumthor (2000), uma canção,

por exemplo, cantada para um público em uma praça envolve, por meio de seus ritmos: linguagem, melodia e os próprios gestos do cantor, não só aquele que canta como também aqueles que escutam, fazendo com que compartilhem algo em comum. “Para o corpo que escuta, voz e gesto convidam ao contato virtual. O ouvinte atende ao chamamento e canta, dança, recria o espetáculo sem o qual não haveria performance integralmente”. (NUNES, 1993, p. 91).

De acordo com Carlson, existem pelo menos três conceitos diferentes de performance: um envolvendo a exibição de habilidades, outro a exibição de modelo de comportamento reconhecido e codificado culturalmente e um último relacionado ao sucesso da atividade, tendo em vista algum padrão de realização.

Reconhecer que nossas vidas estão estruturadas de acordo com modos de comportamento repetidos e socialmente sancionados levanta a hipótese de que qualquer atividade humana possa ser considerada como performance, ou, pelo menos, que toda atividade é executada com uma consciência de si mesma. A diferença entre fazer e “performar”, de acordo com esse modo de pensar, parece estar não na estrutura do teatro versus vida real, mas numa atitude – podemos fazer ações sem pensar, mas, quando pensamos sobre elas, isso introduz uma consciência que lhes dá a qualidade de performance. (CARLSON, 2006, p. 15).

Para nosso estudo da performance do apresentador Marcelo Rezende, adotaremos principalmente a perspectiva sociológica de Goffman em diálogo com o trabalho de Richard Schechner, importante teórico do teatro, que dedicou seus estudos para o desenvolvimento de uma teoria da performance que estabelece diálogo entre as teorias do teatro e as ciências sociais. Segundo Schechner (2003), a performance está presente em diversas situações: vida cotidiana, artes, esportes, negócios, tecnologia, sexo, rituais e brincadeira.

Performances afirmam identidades, curvam o tempo, remodelam e adornam corpos, contam histórias. Performances artísticas, rituais ou cotidianas – são todas feitas de comportamentos duplamente exercidos, comportamentos restaurados, ações performadas que as pessoas treinam para desempenhar, que tem que repetir e ensaiar. (SCHECHNER, 2003, p. 32)

É no contexto da interação, ou seja, do indivíduo em copresença do outro, que os atores sociais irão performar, ou seja, administrar a impressão que os outros têm deles, de modo a convencê-los sobre seu desempenho em determinado papel. Goffman entende a performance como uma ação consciente do sujeito, como “toda atividade de um determinado participante, em dada ocasião, que sirva para influenciar, de algum modo, qualquer um dos outros participantes” (GOFFMAN, 2011, p. 24). O autor explica que quando um indivíduo representa um papel, ele deseja que seus observadores levem a sério a impressão sustentada

por ele, que acreditem em seu desempenho, ou seja, que seu personagem possui os atributos necessários e atende às expectativas sociais por trás daquele papel. Ou seja, “quando um indivíduo se apresenta diante dos outros, seu desempenho tenderá a incorporar e exemplificar os valores oficialmente reconhecidos pela sociedade e até realmente mais do que o comportamento do indivíduo como um todo” (GOFFMAN, 2011, p. 41).

Na perspectiva de Simmel, a interação é sempre e principalmente uma relação mútua e múltipla, que se estende infinitamente, sendo que o resultado disso é que o todo está sempre em processo, móvel, sendo tecido continuamente. O autor entende a sociedade como o conjunto das interações, sendo possível, a partir de cada interação social, entender a dinâmica social.

Através do conceito de wechselwirkung (interação, no sentido de relações mútuas, efeitos mútuos), adentramos no tecido da sociedade, na rede de entrelaçamentos, dependências e inter-referências que constituem a sociedade enquanto tal. Se tudo está a tudo relacionado, trata-se sempre de buscar os laços dessas relações, trata-se de ver as relações mútuas, os “efeitos infinitamente múltiplos” as interações que ocorrem no mundo e na vida. (WAIZBORT, 2001, p. 97-98)

Simmel compara as interações a um jogo, que só é jogado com a participação de todos. Os jogadores não jogam sozinhos, mas em conjunto, em uma relação de interdependência. Como explica Schechner (2012), “jogar consiste em ações e reações, que despertam e/ou expressam diferentes emoções e humores.” (SCHECHNER, 2012, p. 100). Jogar é resultado da troca entre os sujeitos, sendo que o jogo envolve não só os jogadores, que estão diretamente implicados na ação, como também os observadores, que tanto podem se envolver ativamente no jogo, como seguidores ou fãs, ou simplesmente desempenharem o papel de testemunhas desinteressadas. Neste sentido, a comparação da interação a um jogo é rica na medida em que reconhece não só os interlocutores como também os observadores como agentes ativos no processo de interação.

Interpretando o telejornal como um conjunto de interações, percebemos que ele envolve apresentador, repórteres, equipe de produção e também o público. O apresentador atua como principal condutor das interações que se dão ao vivo no decorrer do programa, estabelecendo diálogo tanto com a equipe do programa (câmeras, produtores, repórteres) e entrevistados quanto com telespectador, que mesmo no papel de público fiel do programa (fã) ou testemunha dos fatos, é convocado, a todo o momento, a se envolver ativamente com a narrativa tecida. Como destaca G.H. Mead, o processo comunicacional é um processo de mútua afetação, no qual todos os sujeitos estão implicados. Através do conceito de

reflexividade, o autor explica que durante a interação, através do simbólico – do gesto significante –, conseguimos antecipar a reação do outro, sua resposta, tendo então uma ideia, mesmo que hipotética, do que o outro vai compreender e ele também tem uma ideia sobre nosso entendimento. Através do gesto significante não só estimulamos o outro, como antecipamos sua reação futura, ou seja, temos ideias, tentamos prever o que o outro vai fazer. Neste sentido, a comunicação entre os sujeitos é um processo no qual passado e futuro são acionados pela ação no presente.

A aposta central da comunicação é esta afetação mútua: “É este controle da resposta do indivíduo, graças à absorção do papel do outro, que produz o valor desse tipo de comunicação para a organização da conduta do grupo.” (Mead, 2006, p.305-306). Na comunicação, assim, os dois indivíduos se encontram igualmente implicados, são igualmente convocados, e ambos sofrem modificações. (FRANÇA, 2008, p. 79)

O conceito de reflexividade nos ajuda a olhar para o telejornal e compreender que as diferentes interações que o apresentador estabelece com os atores sociais são de mão dupla. No entanto, é preciso tomar alguns cuidados em relação à sua interpretação, pois quando Mead diz que o indivíduo tem o controle da resposta do outro, não significa que o sujeito tem o poder de manipular a fala do outro, ou de determinar o que o outro vai dizer, mas que, com suas falas e ações, ele tenta prever a reação do outro, justamente por, no momento de elaboração de sua fala, pensar também nas possíveis respostas e reações do seu interlocutor. Como explica Goffman (2012a), em qualquer conversação, o indivíduo deve não apenas manter seu próprio envolvimento na interação, como também agir de modo a garantir que os outros mantenham o deles. Para cumprir seu papel de participante da interação,

ele precisa ser capaz de rápida e delicadamente assumir o papel dos outros e sentir as qualificações que a situação deles deve trazer para a sua própria conduta para que eles não sejam atrapalhados por ela. Ele deve, simpaticamente, ter consciência dos tipos de coisas nos quais os outros presentes podem se envolver espontaneamente e apropriadamente, e então tentar modular sua expressão de atitudes, sentimentos e opiniões de acordo com a companhia. (GOFFMAN, 2012a, p. 113)

Mesmo que as interações entre apresentador e público não se deem pelo face a face, não podemos ignorar que também ali o apresentador, a partir da projeção de um público modelo, que compartilha determinados valores e pertence a determinada classe social - no caso do Cidade Alerta é predominantemente a classe C -, coloca-se no lugar desse espectador e constrói sua fala de modo a envolvê-lo e estabelecer diálogo a partir do compartilhamento de determinados valores e representações. Também o espectador, implicado nesta relação, responde de diferentes formas, reagindo ao que é falado por meio de gestos, expressões,

sentimentos e emoções; por meio de sua audiência, que sinaliza, em certa medida, seu envolvimento com o telejornal; com comentários nas redes sociais do programa e do próprio apresentador e também por meio de sua fidelidade àquele produto televisivo. Como afirma Erving Goffman (2012b), a plateia de um teatro - e aqui inserimos o telespectador do telejornal - não é de modo algum passiva, na medida em que o observar também implica um fazer. A resposta do espectador em risos ou lágrimas, sua concordância ou discordância em relação ao que é narrado provém, sobretudo, de seu envolvimento com aquilo que está sendo mostrado e com os atores sociais implicados em cada ação.

É também no momento da interação que os sujeitos configuram um espaço comum e compartilham sentidos e representações. Como explica Goffman (2012a), “sempre que surge a possibilidade física da interação falada, um sistema de práticas, convenções e regras de procedimentos entra em jogo, funcionando como um meio de orientar e organizar o fluxo das mensagens.” (GOFFMAN 2012a, p. 39). Ao se inserirem em qualquer situação social, os sujeitos já detêm uma biografia rica em interações passadas com os outros participantes e com um grande número de pressupostos culturais presumidamente partilhados. Ou seja, nossa leitura do outro é feita com base em leituras passadas e um saber cultural.

Qualquer cultura, e a nossa não é certamente excepção, parece dispor de um vasto saber oficial e imaginário no que diz respeito aos indicadores concretos de estatuto e de carácter que permitem interpretar um indivíduo. Assim, por uma espécie de pré-acordo, as situações sociais parecem ser perfeitamente concebidas para nos fornecerem uma evidência através dos diversos atributos do nosso interlocutor – ou mesmo para representar de maneira viva o que nós já sabemos. (GOFFMAN, 1999, p. 211)

Um fator importante relacionado à performance é que os atores podem desempenhar um papel38 sem se dar conta disso, como se fosse algo totalmente natural, intrínseco a ele, no entanto, por mais natural que pareçam, todos os papéis são aprendidos socialmente. Como explica Goffman (2011), o processo de socialização é que fornece ao indivíduo a oportunidade de aprender um número suficiente de formas de expressão para ser capaz de preencher e dirigir mais ou menos qualquer papel que provavelmente lhe seja dado. Ao mudar

38 Goffman (2012b) considera como papel a capacidade ou função especializada que o indivíduo desempenha durante uma determinada série de ocasiões. Enquanto parte de sua identidade pessoal, o indivíduo assumirá na vida social diferentes papéis, de funções e capacidades no âmbito pessoal, doméstico, profissional, etc. “Há uma tendência a admitir que, embora o papel seja uma questão ‘puramente’ social, o mecanismo que o desempenha – a pessoa ou o indivíduo – é de alguma forma mais que social, mais real, mais biológico, mais profundo, mais genuíno.” (GOFFMAN, 2012b, p. 333). Sendo que as características individuais de cada indivíduo também afetarão a performance de determinado papel.

de status social e assumir um novo papel, o indivíduo, na maioria das vezes, não é informado em detalhes sobre o modo como deve conduzir. Ele recebe algumas deixas, insinuações e instruções cênicas, pois se pressupõe que ele tenha em seu repertório uma grande quantidade de “pontas” de representação que serão exigidas no ambiente. Tal repertório é adquirido na vida cotidiana, nos vários espaços frequentados pelo indivíduo.

A vida cotidiana, religiosa ou artística consiste em grande parte em rotinas, hábitos e ritualizações e de recombinação de comportamentos previamente exercidos. O que é novo, original, chocante ou avantgarde é, quase sempre, uma recombinação de comportamentos conhecidos, ou o deslocamento de um comportamento do lugar onde ele é aceitável ou esperado, para um espaço ou situação em que este seja inaceitável ou inesperado. (SCHECHNER, 2003, p. 32)

Schechner ressalta que as performances, sejam elas artísticas, rituais ou cotidianas, são “feitas de comportamentos duplamente exercidos, comportamentos restaurados, ações performadas que as pessoas treinam para desempenhar, que tem que repetir e ensaiar.” (SCHECHNER, 2003, p. 32). Sendo a performance uma recombinação de comportamentos previamente exercidos, ela nunca é totalmente inventada por um único sujeito, mas fonte de recombinações, síntese, compilação de ações já praticadas. A maioria das performances, cotidianas ou não, têm assim mais de um autor, sendo “escritas por um ente coletivo Anônimo ou pela Tradição.” (SCHECHNER, 2003, p. 34). Cabe ressaltar, no entanto, que mesmo não derivando de um único autor, isso não significa que a performance não tenha originalidade ou que seja igual a todos as outras. Como explica Schechner, toda e qualquer performance é específica e diferente das outras, sendo que essas “diferenças incluem convenções formais e tradicionais dos gêneros de performance, escolhas pessoais dos performers, padrões culturais variados, circunstâncias históricas e particularidades de cada recepção.” (SCHECHNER, 2003, p. 35). Assim, por mais que olhemos para a performance de Marcelo Rezende buscando depreender características que sejam comuns aos apresentadores de telejornais policiais, há elementos na performance de Rezende que são próprios do indivíduo que desempenha o papel, marcas pessoais que o apresentador imprime em seu desempenho e que não aparecem, por exemplo, na performance de seu maior concorrente, o apresentador do Brasil Urgente, José Luiz Datena.

Seja o encontro social face a face ou mediado, a pessoa que performa adotará sempre uma determinada linha, ou seja, “um padrão de atos verbais e não verbais com o qual ela expressa sua opinião sobre a situação, e através disso sua avaliação sobre os participantes.” (GOFFMAN, 2012a, p. 13). Reconhecida esta linha, os outros participantes da interação

também irão se posicionar e orientar-se diante da situação, escolhendo uma fachada, que é definida por Goffman, como a “imagem do eu delineada em termos de atributos sociais aprovados” (GOFFMAN, 2012a, p. 14). Fruto das expectativas sociais por trás de determinado papel social, a fachada é todo o equipamento expressivo à disposição do sujeito durante a interação. Em A representação do eu na vida cotidiana, Goffman (2011) divide a fachada em três partes: cenário, aparência e maneira. O cenário refere-se à parte cênica do equipamento expressivo, ou seja, a tudo que tende a ser fixo: mobília, decoração, disposição física dos elementos. A aparência e maneira são itens do equipamento expressivo que identificamos com o próprio ator e que compõem sua fachada pessoal. Entre eles estão vestuário, idade, sexo, características pessoais, padrões de linguagem, atitude, expressões faciais, gestos. É a aparência que revela o status social do ator, sendo composta por seu vestuário, gestos, expressões faciais, idade, etc. Já a maneira, está relacionada aos estímulos que funcionam para nos informar sobre o papel de interação que o ator espera desempenhar na situação que se aproxima, ou seja, o modo como o ator age e que ajuda a definir a situação. Percebemos que a linha adotada por Rezende frente ao público – de cumplicidade e amizade - é diferente da que ele adota, por exemplo, em relação à produção – rigidez, ironia, raiva; ou frente a Percival, onde o tom que predomina é o da brincadeira, da comicidade.

Ainda em relação à fachada, Goffman explica que na organização social o domínio de um pequeno vocabulário de fachada é que nos ajuda a lidar com uma grande variedade de situações e a compor uma grande quantidade de papéis diferentes. Segundo Schechner, nossas