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Urgente: Renan Calheiros é afastado da presidência do Senado

7. ANÁLISE DA PERFORMANCE

7.1. ANÁLISE DA PERFORMANCE NO CIDADE ALERTA

7.1.4. Urgente: Renan Calheiros é afastado da presidência do Senado

Única notícia política das três emissões analisadas, a nota “Urgente: Renan Calheiros é afastado da presidência do Senado” foi veiculada na segunda feira, 05 de dezembro, e teve

6min44s. Fugindo do modelo de uma nota telejornalística padrão, na qual o apresentador lê o texto enquanto podem ou não ser exibidas imagens do acontecimento, a nota de Marcelo Rezende, nomeada em nossa análise como nota comentada, mescla informação e opinião. Longe de um texto previamente elaborado, temos uma construção da notícia que acontece no decorrer da fala do apresentador. Rezende informa com proximidade, demonstra domínio do assunto. No entanto, a falta de um texto prévio faz com que a informação não seja apresentada de forma linear; ao contrário, temos um vai e vem narrativo permeado por digressões do apresentador.

A apresentação da notícia acontece predominantemente no estúdio. Marcelo se movimenta pelo cenário, ficando a maior parte do tempo enquadrado em plano médio, tendo ao fundo a imagem de Renan Calheiros na televisão. O apresentador, que anteriormente noticiava o incidente com o avião da apresentadora Xuxa, mais especificamente, comentava um vídeo em que a apresentadora aparecia com a máscara de oxigênio, aproveita o gancho, para iniciar a nota sobre o afastamento de Calheiros: “Por falar na máscara cair. Me veio, me veio à cabeça. [imagem de Renan Calheiros em tela cheia] Eu nunca vi uma frase dita casualmente casar tão bem”. Percebemos já pelo tom inicial do apresentador, mesmo sem saber o conteúdo da notícia, o posicionamento contrário à figura de Calheiros. O termo “máscara cair” faz referência à descoberta da falsidade, ou seja, o político foi desmascarado, ou nos termos de Goffman (2012a), perdeu a fachada, teve a região de fundo exposta, não atendendo às expectativas por trás de seu papel.

De volta ao estúdio, o apresentador então prossegue com a informação. Rezende permanece parado, olha diretamente para a câmera e fala devagar, dando ênfase à pronúncia das palavras.

Rezende: O ministro do Supremo Tribunal Federal, Marco Aurélio Mello, decidiu afastar Renan Calheiros da presidência do Senado. É uma decisão ainda liminar, por quê? Por uma razão. Por ele ser réu, Renan não pode estar na linha de sucessão da Presidência da República. [caminha de costas em direção à tevê – plano aberto] O quê que ocorre. O Supremo Tribunal Federal fez uma reunião lá, [caminha para frente e volta para plano médio] pra decidir se quem está na linha de sucessão da presidência pode, sendo réu em alguma ação, continuar nessa linha de sucessão. A questão é a seguinte. Já foi decidido pelo plenário do Supremo Tribunal Federal, não há como reverter a situação. Xô mostrar [imagem de Renan em tela cheia] bem o Renan Calheiros aqui. E aí, o quê que acontece. O plenário já tinha decidido que não pode. Naquele momento o ministro Dias Toffoli, mesmo vendo que a questão já estava resolvida por maioria, decidiu pedir vistas do processo. Ao pedir vistas do processo, o ministro Dias Toffoli o quê que faz. Ele pega o processo e isso, ele tem o tempo que ele quiser de vistas. E com isso não sai a decisão final, fica em suspenso. (CIDADE ALERTA, 05 de dezembro de 2016).

Diferentemente das outras reportagens analisadas, vemos nesta nota comentada que Rezende adota mais movimentos à sua performance, principalmente com as mãos. O apresentador demonstra até mesmo certa agitação, indo e vindo pelo estúdio. O movimento das mãos acompanha sua fala, marca as pausas, reforça a negação, dando também a ideia de continuidade. Seus gestos também orientam a equipe e o público. Rezende aponta o dedo indicador para a câmera de modo a sinalizar que a imagem de Renan Calheiros seja exibida em tela cheia; caminha em direção à tevê para chamar a atenção do telespectador para a imagem de Calheiros. Seu semblante é sério e sinaliza a importância do assunto tratado, sendo sua performance vocal um elemento essencial para dar ritmo e quebrar a monotonia do discurso. O apresentador opta por frases curtas, acompanhadas de expressões que ajudam a localizar o telespectador no decorrer da narrativa: “Por uma razão”; “O quê que ocorre”; “A questão é a seguinte”. Apesar do uso de termos jurídicos, temos o predomínio do linguajar cotidiano, sendo os termos técnicos explicados de modo a facilitar a compreensão do público. Seu modo de falar, apesar de pausado, tem um tom enfático, estratégia que, somada à movimentação, visa dar ritmo a narrativa e facilitar que o público acompanhe o raciocínio construído.

Apesar de Renan Calheiros ser a figura central da notícia, o apresentador traz outros personagens, que auxiliam a compreensão do afastamento de Calheiros. O primeiro é o ministro Dias Toffoli, responsável pelo fato de o afastamento do senador ser uma decisão ainda liminar. A fala de Rezende coloca sob suspeita a intenção de Dias Toffoli, cria dúvidas em relação à sua conduta: “já estava resolvida por maioria” e ainda assim ele pediu vistas do processo. O pedido é enquadrado como uma ação desnecessária, uma estratégia para ganhar tempo: “ele tem o tempo que ele quiser de vistas. E com isso não sai à decisão final, fica em suspenso”. Por mais que o apresentador não acuse claramente, sua fala provoca a dúvida: estaria Dias Toffoli protegendo Calheiros? Dando continuidade à notícia, Rezende então explica como – apesar das vistas do processo – foi possível afastar Calheiros do Senado. Surge então o segundo personagem, o também ministro do STF, Marco Aurélio Mello.

Rezende: Só que o ministro Marco Aurélio Mello atendeu a um pedido do partido Rede Sustentabilidade e entendeu, né, que como o plenário já tinha decidido por maioria. Renan Calheiros é réu no Supremo então não pode continuar no cargo, né. No cargo, na Presidência do Senado, porque ele está na linha de sucessão, né, da Presidência da República. (CIDADE ALERTA, 05 de dezembro de 2016).

Se na narrativa, Dias Toffoli é quem atrasa a decisão, o ministro Marco Aurélio Mello é quem possibilita que ela aconteça, mesmo na forma de uma liminar. A fala de Rezende

posiciona o ministro como cumpridor de seu papel. Mello adiantou e concretizou a decisão do Plenário de que Calheiros, como réu, não poderia ficar no cargo. Se na reportagem “Pai acusado de matar a filha está em liberdade”, Rezende caracteriza a decisão de Marco Aurélio Mello de afastar Calheiros como errônea, inicialmente, percebemos que sua postura era diferente. Sem prever os desdobramentos da ação do ministro e o retorno de Calheiros, na mesma semana, ao Senado, o apresentador se mostra favorável à decisão de Mello de atender ao pedido do Partido Rede Sustentabilidade.

O terceiro personagem é Calheiros, que é desmascarado no decorrer da narrativa e enquadrado como um político corrupto. De modo a expor a fachada do senador, Rezende explica os motivos que tornaram Calheiros réu no Supremo: peculato, ou seja, apropriação indevida de verba pública.

Rezende: [...] há indícios de que Renan fraudou recebimento de empréstimos de uma locadora de veículos pra justificar uma movimentação financeira suficiente pra ele pagar uma pensão que ele teve fora do casamento com a jornalista Mônica Veloso. Ele teria usado verba indenizatória, que deveria ser usada, né, no exercício do cargo de senador pra pagar a locadora, mas não há indício de que o serviço foi realmente prestado. Além de ter questões envolvendo, questões envolvendo também, também, venda de boi. (CIDADE ALERTA, 05 de dezembro de 2016).

Com um tom acusatório, Rezende posiciona Calheiros como um criminoso: um político corrupto. O senador se apropriou de verba pública para benefício próprio: pagamento de pensão. No entanto, o apresentador não se contenta apenas com as acusações que tornaram Calheiros réu, e retoma ações anteriores do político que revelam uma conduta inapropriada na presidência do Senado.

Rezende: Resumo: nós podemos imaginar, né, ele [aponta pra tela] que queria fazer, que estava comandando, porque quando sai naquela noite em que a Câmara Federal aproveitou, aproveitou a tragédia que aconteceu com a Chapecoense, na mesma noite a Câmara desfigurou a medida do pacote anticorrupção e colocando um monte de jabuti, sabe o quê que é isso? Pega coisa que não tem nada a ver. Sabe aquela história, ué, jabuti sobe em árvore? E colocou, desfigurando uma coisa que saiu da sociedade civil com dois milhões de assinaturas. Imediatamente o que fez este senhor? [aponta imagem Calheiros] Ele foi no dia seguinte no Senado e quis votar com votação simbólica, por quê? Porque ele aí aprovava, né, uma mordaça pra juízes, procuradores e a Polícia Federal, que estão prestando excelentes serviços para o país, nos livrando dum monte de corrupto e dum monte de ladrão, né. (CIDADE ALERTA, 05 de dezembro de 2016).

Rezende expõe um posicionamento crítico à atuação do senador e revela seu abuso de poder na condução do Senado. Sua performance vocal é fundamental, sendo sua fala marcada por nuances. O apresentador aumenta o volume da voz para enfatizar determinadas palavras e

sua fala mantem o tom acusatório e de denúncia. Rezende continua gesticulando com as mãos, que o ajudam a dar ritmo à narrativa. Seu semblante é sério e expressa sua indignação com a gravidade da ação de Calheiros. A denúncia ao senador reafirma o papel do apresentador e também do telejornal como fiscais do telespectador, defensores de seus direitos. Rezende é o porta voz do povo e performa de modo a desmascarar Calheiros, deixando claro as reais intenções do Senador, ou seja, aquilo que Calheiros deseja deixar nos bastidores de sua performance: “quis votar com votação simbólica, por quê? Porque ele aí aprovava, né, uma mordaça pra juízes, procuradores e a Polícia Federal”. Longe de buscar os benefícios do povo, o apresentador deixa claro a falta de escrúpulos do senador, que aproveita o acidente com a Chapecoense para desfigurar uma medida que é fruto do esforço dos cidadãos brasileiros: o pacote anticorrupção. No entanto, se Calheiros emerge na narrativa como o vilão, o corrupto que precisa ser combatido, juízes, procuradores e a Polícia Federal acendem como heróis, cumprindo, segundo Rezende, seu papel de modo exemplar ao prestarem “excelentes serviços para o país” e livrá-lo “dum monte de corrupto e dum monte de ladrão”.

Por mais que a notícia seja política, uma temática pouco comum ao telejornalismo policial, percebemos que sua construção narrativa não perde de vista o melodramático. “Procura-se, o tempo todo, uma resposta ao sofrimento através de uma resolução moral, pela identificação dos culpados e pela cobrança de punição.” (RIBEIRO; SACRAMENTO, 2017, p. 83). A construção narrativa de Rezende, além de posicionar os personagens em papéis antagonistas: vilões (Calheiros, em parte também Dias Toffoli) e heróis (Marco Aurélio Mello, juízes, procuradores e a Polícia Federal), traz o telespectador (povo brasileiro) como vítima principal – roubado pelo Senador, traído em sua confiança depositada por meio do voto. A narrativa também exerce um papel regulador, expressa o desejo de moralidade, concretizado pelo afastamento de Calheiros, primeiro passo para a punição de seus atos.

Dando continuidade à sua fala, Rezende exemplifica os atos heroicos que juízes, procuradores e a Polícia Federal têm realizado. O apresentador cita a Petrobrás e também a investigação ao ex-governador do Rio de Janeiro, Sergio Cabral, outro político que, assim como Calheiros, é enquadrado pelo apresentador como criminoso: “A quadrilha dele, segundo a própria Polícia Federal, segundo a Procuradoria da República, essa gente desviou 225 milhões de reais. Dá pra explicar por que o Rio de janeiro tá naquela pindaíba”. Em seguida, Rezende retorna de sua digressão e retoma o assunto da votação simbólica proposta por Calheiros.